quarta-feira, 11 de julho de 2007

Jornalista paraense quer Amazônia na ciência

Vejam o que diz o grande jornalista paraense Lúcio Flávio Pinto sobre as agruras da Amazônia, por ocasião da reunião da SBPC.

Sua visão é ambiciosa, quer que a Amazônia vire um celeiro de produção científica e aplicação tecnológica moderna para obter sua nova vocação no mundo da hecatombe ambiental.

Lúcio Flávio tem sido um crítico ácido e corajoso de quantos planos mirabolantes já houve para a Amazônia. Tem sido um dos maiores inimigos das estradas que cortam esse território. Quer a volta da via de acesso pelos rios.

Respeitêmo-lo!

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Chance histórica

Por Fábio de Castro, de Belém

Agência FAPESP – Para impedir os progressos da devastação ambiental e encontrar sua identidade a Amazônia precisa de cientistas pesquisando na região. A afirmação é do jornalista e sociólogo Lúcio Flávio Pinto, professor aposentado da Universidade Federal do Pará (UFPA), na 59ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, em Belém.

Visto como um dos principais conhecedores das questões relativas a meio ambiente e conflitos de terra na Amazônia, Pinto, que recebeu uma homenagem especial da SBPC na reunião deste ano, apresentou nesta terça-feira (10/7) a palestra “Qual é o lugar da Amazônia no século 21?”.

“A Amazônia nunca encontrou sua vocação. Ela já foi usada por seringueiros, madeireiros, mineiros, grileiros e fazendeiros. O resultado é que a região nunca saiu de sua dependência. O pioneirismo que nos resta é a ciência. Se a Amazônia abrigar pólos científicos poderá, finalmente, aproveitar uma oportunidade histórica de adquirir uma identidade”, disse.

Para Pinto, no entanto, não basta trazer cientistas para estudar a região com um olhar externo. “Nós não conhecemos a Amazônia, mas ela muda rapidamente e seus problemas exigem respostas rápidas, que a pesquisa científica não consegue acompanhar por não ser feita localmente. Precisamos transformar a Amazônia em uma Antártica, em termos de foco de pesquisa científica. Mas a região não precisa da ciência pronta, ela precisa de ciência feita aqui, ou continuará à margem”, afirmou.

De acordo com o jornalista, que recebeu quatro prêmios Esso e edita há 14 anos o Jornal Pessoal, a região tem especificidades que não permitem seu estudo a partir de teorias gerais. “O que a história nos ensina é que perdemos todas as oportunidades para iniciar uma trajetória regional independente. Desde o início o problema esteve na incorporação da Amazônia ao território nacional.”

A dificuldade de incorporação da Amazônia aconteceu e continua acontecendo, de acordo com Pinto, porque nunca houve um propósito específico para a região. A Amazônia sempre foi impenetrável, em termos de conhecimento, tanto para grupos internacionais como para o governo federal. Nos dois casos, os interesses eram provenientes sempre de expectativas genéricas de quem não sabia muito sobre a região. “Nós aceitamos isso porque também não sabemos o que somos. Falta ciência produzida localmente para descobrirmos nossa identidade”, disse.

Quando se tinha um projeto que vinha de fora, de acordo com Pinto, a reação brasileira era contrária por puro nacionalismo, embora também não se oferecessem alternativas melhores. Um exemplo, segundo ele, foi o caso do projeto elaborado em 1967 por Hermann Kahn, do Instituto Hudson, de Nova York, a serviço do Departamento de Estado dos Estados Unidos. Previa-se barrar o rio Amazonas, na altura de Óbidos, para construir uma hidrelétrica.

“Havia o argumento de que o projeto iria desenvolver a região, mas sabia-se também que havia intenção de facilitar o acesso às terras altas em que se encontravam os minérios e a floresta. O projeto foi mal interpretado e divulgou-se que havia um perigo iminente de os estrangeiros tomarem conta da Amazônia. A alternativa a isso, escolhida pelo governo federal, foi a construção das estradas. Nada foi tão traumático na história da Amazônia”, destacou.

Segundo o jornalista, em uma região que foi uma civilização fluvial durante toda sua história, o processo de construção de rodovias teve como resultado a maior destruição florestal de todos os tempos. “Tudo por medo do ‘perigo iminente’ estrangeiro. Essa argumentação se repete até hoje. E a reação nacional – sem o auxílio da ciência – sempre foi pior do que a suposta ameaça estrangeira.”

O jornalista propõe um novo zoneamento com foco na ciência, trazendo pesquisadores – da graduação até os mais altos níveis – para estudar não nas capitais, mas no interior. “São Félix do Xingu é o maior produtor de gado do Pará, o que é um monumento à irracionalidade. Lugares como esse deveriam ser pólos científicos, mas é preciso que o cientista venha e fique e não que diga o que fazer e vá embora – esse é o problema do extensionista”, destacou.

Para tal projeto, de acordo com Pinto, seria preciso apoio governamental, de modo que o cientista pudesse ter bons recursos financeiros para se instalar na região. “O zoneamento tem que trazer cientistas, não fazendeiros. Se o fazendeiro quiser vir, que venha com recursos privados. Não se trata de ciência para aprender e ensinar, mas para criar e fazer”, disse.

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