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terça-feira, 18 de dezembro de 2012

O indigenismo rondoniano está vivo no governo federal: o caso de Maraiwatsede

A oportuna decisão e a inflexivel determinação do governo federal, que abraçou a causa dos índios Xavante sobre a T.I. Maraiwatsede, têm sido um alívio para a causa indígena na atualidade. Demonstram o quanto ainda existe de indigenismo rondoniano inserido neste governo e o quanto o Estado brasileiro tem ainda senso de responsabilidade para com a causa indígena.

O governo Dilma, que vem sendo criticado por antropólogos, indigenistas, pelas ONGs e pelo CIMI, e especialmente pelas associações indígenas, em tantas questões, tem suportado todo tipo de pressão de políticos de Mato Grosso, à frente o seu atual governador, bem como por políticos já de cunho nacional, a exemplo da presidenta do CNA e senadora por Tocantins, para negociar o território xavante. Algum tempo atrás o governador do Mato Grosso quis negociar essas terras por um outro território, onde está um parque estadual de proteção ambiental, inutilmente.

Apraz-me sobremodo, devo confessar, ver políticos se metendo a negociar com os índios e quebrando suas caras de pau. Sonho que tal aconteça igualmente quando o Congresso jogar suas fichas para a abertura de terras indígenas à mineração. Deputados se metendo em negociação de mineração me dá calafrios.

Deve ser reconhecido, igualmente, que também têm passado por pressão o Congresso Nacional, diversos tribunais federais e o STF. Os fazendeiros e políticos interessados têm vindo com frequência a essas instituições para demonstrar que são pequenos lavradores as vítimas da desintrusão da T:I. Maraiwatsede, visando provocar um sentimento de empatia por sua causa. O STF, o MPF e as tantas varas de justiça têm sido inflexíveis em suas interpretações sobre a legitimidade da ocupação dessas terras pelos índios Xavante.

Por sua vez, a mídia local, estadual e nacional, especialmente do próprio estado do Mato Grosso, não tem medido esforços para informar e demonstrar que o interesse maior pela não desocupação daquelas terras advém é de grandes fazendeiros, ou ao menos de médios fazendeiros, pelos módulos amazônidas, com fazendas de gado e soja de 5.000 a 10.000 hectares de terra. A imprensa mato-grossense tem idenficado políticos, advogados e até desembargadores aposentados como donos de imensas glebas de terras, todas obtidas após a bandalheira de invadir essas terras, na ocasição formalmente pertencentes à empresa italiana AGIP, feita pelos políticos locais por ocasião da doação da empresa aos seus legítimos donos, em 1992.

De parabéns também está a FUNAI pela presença e solidariedade aos índios Xavante de Maraiwatsede. A tradição indigenista rondoniana não está perdida. O esforço de tantos indigenistas e antropólogos para, ao lado dos Xavante, re-obter as terras de Maraiwatsede, é merecedor de nosso reconhecimento e ficará na história do indigenismo brasileiro.

A retomada dessas terras, de onde cerca de 170 Xavante foram retirados em 1967, pela persuasão de missionários salesianos e funcionários do SPI, sob o tacão da ditadura militar e seu apoio ao grande latifúndio, tem uma história gloriosa. Ela começou a acontecer quando os jovens Xavante que haviam sido deslocados, começaram a tomar tento de suas vidas e da injustiça que haviam passado, com tantas mortes e sofrimentos indizíveis. Os velhos Xavante nunca deixaram de lembrar que estavam em outras terras xavante temporariamente, e que um dia voltariam às terras onde haviam nascido e se criado. Terras de mata densa, medonha, terras de cerrados altos.

A partir de fins da década de 1980, esses novos líderes Xavante começaram a refazer o seu caminho de volta. Conseguiram o apoio da FUNAI e de antropólogos que conheciam a sua história. A terra estava nas mãos da empresa italiana AGIP, que a havia comprado de um poderoso grupo liderado por um famoso grileiro de origem paulista. Dizia-se que esse grileiro possuía mais de 1 milhão de hectares de terras naquela região. Por meados de 1990 a terra havia sido reconhecida por um GT da FUNAI e em 1991 ela foi delimitada formalmente. Em 1992, por ocasião da Conferência de Meio Ambiente do Rio -- a RIO 92 -- o grupo AGIP fez a doação de seus direitos aos Xavante, de forma solene e em sua inteireza.

Entretanto, por baixo dos panos, um gerente da fazenda que controlava essa terra, em conluio com políticos locais, abriu, por assim dizer, as portarias da fazenda para a entrada de políticos, funcionários públicos, comerciantes e, enfim, até de pequenos lavradores, para entrar e demarcar seus lotes, como se fosse uma corrida de terras do velho oeste americano. Quando os índios e a FUNAI chegaram já grande parte estava invadia e loteada. Mesmo assim, a FUNAI prosseguiu em seu ofício indigenista, um novo GT delimitiu a terra, com a ajuda dos próprios índios, foi feita a demarcação in locu e em 1998 o presidente Fernando Henrique Cardoso a homologou.

Sem que um índio Xavante estivesse lá dentro.  Nos anos seguintes os Xavante tentaram entrar nessas terras, mas eram dissuadidos a voltar. Até que, em outubro de 2003, o então presidente da FUNAI, este que está a escrever, recebeu uma comitiva de Xavante pedindo ajuda para entrar na área, disposto a todo sacrifício, se a FUNAI os apoiasse. Sim, a FUNAI os irá apoiar.

Quando cerca de 150 Xavante acamparam à beira da estrada e ameaçaram entrar, levantou-se disposta a tudo uma horda de gente da outra margem do riacho que fazia a divisa sul da terra. Gritavam, soltavam foguetões, rajadas de revólver para o alto. Os Xavante não se atemorizaram. A FUNAI se apresentou com toda sua determinação e coragem, à frente Edson Beiriz e Cláudio Romero. O presidente da FUNAI visitou a área em novembro de 2003 e prometeu aos Xavante que essa terra lhes seria devolvida em breve.

Mais e mais Xavante começaram a aparecer, seja porque faziam parte das famílias que de lá haviam sido desalojadas em 1967, seja em solidariedade aos seus compatriotas. Foi um tempo heroico para os Xavante e para a FUNAI. Alojados em barracas de lona, sob sol escaldante e chuvas torrenciais, com carência de alimentação e água potável, ao sacrifício de cinco crianças e um velho, lá permaneceram de outubro de 2003 e julho de 2004.

Nesse período a FUNAI não deixou de lutar também no setor jurídico, com a presença de seus procuradores, com ações em diversos tribunis, até alcançar o STF, que,  afinal, concedeu que os Xavante nela penetrassem e tomassem posse de um pequeno trecho de uns 15.000 hectares, numa fazenda cujo dono abrira mão de seus supostos direitos por vontade própria, sem qualquer ressarcimento. Aliás, ele já havia derrubado a mata em grande parte, como tantos outros que lá estavam.

Desde então, os Xavante de Maraiwatsede têm estado presente, sofrendo pressões de todos os lados, inclusive de dentro de suas próprias hostes e por compatriotas confusos e um tanto frágeis politicamente.

Agora, nesses dias, é o governo federal que toma as rédeas do processo de desintrusão. E o tem feito com destemor e determinação. A Polícia Federal e a Guarda Nacional montaram uma estratégia eficiente de desintrusão, seguindo todos os ritos democráticos, dando tempo aos posseiros para se retirarem, sendo flexíveis em alguns pontos, rígidos em outros, conforme as pressões e as motivações dos posseiros e fazendeiros. O judiciário brasileiro está também de parabéns pela decisão, custosa e demorada, mas que, como diz o ditado, que um dia haveria de chegar.

Tudo isto é motivo de celebração das tradições indigenistas brasileiras. Que a chama do indigenismo rondoniano não apagou, que a luz rondoniana continua a brilhar.

Abaixo a última declaração da FUNAI em seu site, com o resumo dos últimos acontecimentos.

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Balanço da 1ª semana - Operação de desintrusão da Terra Indígena Marãiwatsédé (MT)

Completou, nesta segunda-feira (17), uma semana da operação voltada à desocupação da Terra Indígena Marãiwatsédé, no Mato Grosso. Participam da força-tarefa, oficiais de justiça, equipes da Força Nacional, Polícia Rodoviária Federal, Polícia Federal e Exército, além de representantes do governo federal.

Até ontem (17), 31 fazendas tinham sido vistoriadas, 15 das quais já foram oficialmente retomadas. Nas demais, os ocupantes receberam um prazo dos oficiais de justiça de 24 horas para retirar pertences, à exceção de uma fazenda que foi intimada para, em 10 dias, retirar gado e outras posses.

A operação foi integralmente planejada para ocorrer de forma pacífica e garantir, de um lado, o direito constitucional do povo Xavante de viver em seu território tradicional e, de outro, a possibilidade de legalização fundiária aos pequenos ocupantes não indígenas, promovendo assim, uma vida digna aos envolvidos nesse processo.

Desta forma, o governo federal se comprometeu a realizar o reassentamento das famílias que atendem aos critérios e normativas do programa de reforma agrária. Até o momento, o Incra já cadastrou 183 famílias, 80 das quais se adequam ao perfil. As famílias reassentadas receberão um Contrato de Concessão de Uso da Terra, que se constitui no primeiro passo para o acesso à terra e aos créditos iniciais. Também serão integradas ao Cadastro Único do governo federal e, por meio dele, poderão acessar programas sociais como Bolsa Família, Brasil Sorridente, Brasil Carinhoso, entre outros. A partir de terça-feira (18), será realizada a mudança das primeiras cinco famílias que se cadastraram no programa de reforma agrária. Elas serão levadas ao assentamento Santa Rita, localizado em Ribeirão Cascalheira (MT).

No que se refere às grandes fazendas, informações coletadas pela Funai, Incra e Ibama, convergem no sentido de identificar 22 propriedades, detentoras de um terço das terras. Estas fazendas foram as principais responsáveis pelo rápido desmatamento da área. Conforme dados da Funai, em 1992, cerca de 66% (108.626 ha) da área total de Marãiwatsédé eram compostos de floresta e 11% (18.573 ha) de Cerrado. Atualmente, esta é a terra indígena com maior área desmatada da Amazônia Legal, com 61,5% do território desmatados, convertidos, em sua maioria, para atividades de agricultura e pecuária.

Em toda a terra indígena, 455 pessoas foram notificadas a deixar a área, por meio de mandados judiciais, expedidos entre os dias 7 e 17 de novembro.  Venceu ontem (17/12) o último prazo, de 30 dias, concedido pela Justiça Federal do Mato Grosso para que os não indígenas desocupem o território.

A desintrusão da área segue conforme o planejado e será realizada de forma contínua.

Ameaças
Desde o início da ação de desintrusão da Terra Indígena Marãiwatsédé, em agosto de 2012, registram-se diversos casos de ameaças de morte a membros da equipe que integra a força-tarefa de desocupação. Também foram ameaçados Dom Pedro Casaldáglia, bispo da Prelazia de São Félix do Araguaia (MT); o cacique Xavante Damião Paradziné, da Terra Indígena Marãiwatsédé e Wanderley Perin, atual prefeito do município de Alto Boa Vista (MT). A Polícia Federal já abriu inquérito para investigar tais intimidações e o governo federal encaminhou reforço de efetivos policiais para a região.

Além das ameaças de morte, manifestantes que resistem em deixar a área bloqueiam rodovias e dificultam o acesso das equipes que trabalham para desocupar a terra indígena. Na quinta-feira (13), árvores e outros obstáculos foram colocados nas estradas para inviabilizar o acesso da força-tarefa e foram abertos buracos em alguns trechos com o mesmo objetivo.

No primeiro dia da ação de desocupação (10), integrantes da Força Nacional, Polícia Federal e Polícia Rodoviária foram atacados com pedras por manifestantes contrários à saída da terra indígena. Os policiais revidaram com gás de efeito moral e balas de borracha. O confronto ocorreu na Fazenda Jordão, a cinco quilômetros do local vistoriado pelos oficiais de justiça, e não impediu o trabalho de desocupação.

Cartas
Em carta entregue ao Ministério Público Federal (MPF), o cacique de Marãiwatsédé, Damião Paradziné, falou do sofrimento do povo, nesses anos de luta pela terra, e da expectativa de voltar a viver em seu território. "Quem sempre ocupou essa terra foi o índio". Ele denuncia que vários índios já foram mortos nesse processo e fala da importância da desocupação para seu povo.
Emocionado com o relato do cacique, a liderança do povo Tapirapé Nivaldo Korira'i enviou uma carta de solidariedade ao povo Xavante de Marãiwatsédé, em que afirma que o povo não está sozinho, “nós estamos aqui para fazer qualquer coisa pelos Xavantes. Os Xavantes necessitam de apoio para ser mais forte na luta. Temos certeza que o nosso pai Myraty está olhando para o povo Xavante que vai dar tudo certo na conclusão da operação”.
Leia as cartas na íntegra.
A Terra Indígena Marãiwatsédé foi reconhecida pelo Estado brasileiro como terra tradicional indígena, homologada por decreto presidencial em 1998, o que, pelos termos do Art. 231 da Constituição, tornam nulos todos os títulos nela incidentes, não gerando direito a indenizações, salvo pelas benfeitorias de boa-fé.
Na década de 1960, a Agropecuária Suiá-Missú se instalou na região, onde sempre viveu o povo Xavante de Marãiwatsédé, dando início ao desmatamento da área e provocando a retirada dos indígenas para outra localidade. Os indígenas nunca se conformaram com a remoção e, sucessivas vezes, tentaram voltar ao seu território.
Em 1980, a fazenda Suiá-Missu foi vendida para a empresa petrolífera italiana Agip, que, durante a ECO 92, após reconhecimento público do direito indígena à terra, manifestou ao governo brasileiro o interesse de colaborar com a demarcação da terra indígena.
Enquanto a decisão se concretizava, ocorreram invasões ao local, gerando um clima de instabilidade e tensão entre indígenas e não indígenas, que se estende aos dias atuais. De acordo com o processo sobre o caso, em poder do Ministério Público Federal no MT, as invasões de não indígenas foram planejadas e incentivadas por lideranças, muitas das quais ocupam hoje grandes fazendas dentro da terra indígena. A intenção é relatada durante reunião, ocorrida na localidade de Posto da Mata e transmitida ao vivo pela Rádio Mundial FM, no dia 20 de junho de 1992. A gravação compõe o processo, que está disponível para consulta no MPF.
Desocupação
A ação de desocupação dos não índios da TI Marãiwatsédé teve início em agosto de 2012, atendendo decisão do Juízo da Primeira Vara de Cuiabá/MT, que, em julho deste ano, determinou o prosseguimento da execução da sentença para efetuar a retirada dos não índios e garantir o usufruto exclusivo e a posse plena do povo Xavante sobre a Terra Indígena Marãiwatsédé, conforme determina o Artigo 231 da Constituição Federal.
A ação de retirada dos ocupantes não indígenas foi planejada por uma equipe de trabalho interministerial do Governo Federal – formada por Ministério da Justiça, Fundação Nacional do Índio (Funai), Secretaria Geral da Presidência da República, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis/Ministério do Meio Ambiente (Ibama/MMA), Ministério da Defesa, Secretaria Especial de Saúde Indígena/Ministério da Saúde (Sesai/MS), Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária/ Ministério do Desenvolvimento Agrário (Incra/MDA), Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia (Censipam), Polícia Federal, Força Nacional de Segurança Pública e Polícia Rodoviária Federal – com apoio logístico do Exército brasileiro, a fim de garantir uma desintrusão pacífica, com segurança e dignidade para todos, indígenas e não indígenas.
A saída dos não indígenas é uma determinação da Justiça, comunicada via mandado judicial aos ocupantes ilegais da Terra Indígena Marãiwatsédé.
Dados da TI Marãiwatsédé
A terra indígena tem 165.241 hectares e está localizada entre os municípios mato-grossenses de São Félix do Araguaia e Alto Boa Vista. Atualmente, 928 indígenas Xavante habitam uma pequena parte da terra.

segunda-feira, 25 de junho de 2012

Xavante em conflito

Gostaria de apresentar essa matéria jornalística do site Olhar Direto, de Cuiabá, com a expressão: Não me tirem do sério!

É que ela mostra que está ocorrendo um conflito extremamente sério na Terra Indígena Maraiwatsede devido à resistência dos posseiros e fazendeiros lá instalados, que se recusam a obedecer a ordem judicial para se retirar de lá. Porém, tanto pior porque o conflito está exacerbado devido às desavenças internas e a resultante desunião dos Xavante quanto à legitimidade de sua posse sobre essa terra indígena, que foi reconhecida como indígena em 1992, demarcada em 1995 e homologada em 1998, parte da qual os Xavante só conseguiram recuperar em 2004. Um grupo de tantos Xavante, não sei dizer ao certo, não sei se posso acreditar que sejam 150 deles, estão junto com os posseiros, tendo vindo de diversas outras terras indígenas xavante!

Quem poderá suportar uma coisa dessas! Qual o indigenista, qual o antropólogo, qual o funcionário da FUNAI que aguenta saber de uma coisa dessas!?

Só pode ser invencionice de algum modo. Ou exagero.

Sinto-me estranho diante dessa acontecimento e da desunião dos Xavante. Quando entrei na presidência da Funai a terra estava homologada mas não havia nenhum Xavante dentro dela. Por anos eles tentavam entrar e retomar sua soberania sobre o que havia sido demarcado, mas eram sempre dissuadidos por fazendeiros locais. A entrada dos Xavante em parte dessa terra se deu a partir de uma comunicação que eles me fizeram em outubro de 2003, com pedido de apoio à sua luta.

Pois bem, dei-lhes total apoio, de muitas maneiras. Com frequência os recebia em Brasília, os advogados da Funai conseguiam audiências com ministros do STJ e do STF, para onde os acompanhava, e enviei uma equipe das mais dedicadas da Funai, liderada por Edson Beiriz, administrador de AER Goiânia, com a ajuda prestimosa de Cláudio Romero e outros indigenistas.

Em certo momento enfrentei políticos e fazendeiros em Cuiabá, em conturbada reunião convocada pelo governador Blairo Maggi, e com a presença do vice-presidente, atuando como presidente, o falecido José de Alencar, todos pressionando para que eu aceitasse transferir os Xavante para uma pequena gleba de terras a 130 km de distância de sua terra já homologada. Lembro-me que, ao dizer que não faria isso ao presidente em exercício levantou-se um burburinho de que eu estaria desobedecendo ao presidente da República e que, portanto, seria demitido incontinenti. Não fui demitido, evidentemente, não sei por quê ou por obra e graça de quem.

O certo é que os Xavante persistiram e depois de passarem sete meses acampados na beira de uma estrada poeirenta, a BR-158,  ameaçados pelos posseiros e os capangas dos fazendeiros, tendo-lhes morrido duas crianças, conseguimos uma decisão do STF que os permitia finalmente penetrar na área e assentar aldeia. E isso foi feito para sua honra e para a glória da FUNAI.

Agora os Xavante estão desunidos e alguns dizem que essa não é terra deles?!

Tem algo de errado nisso, e precisa ser esclarecido. De todo modo, eis a matéria jornalística, escrita com parcimônia e objetividade. Creiam os que queiram!

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Xavantes se dividem e quatro caciques se aliam a posseiros em bloqueio da BR-158 (veja fotos)


Da Redação - Renê Dióz
Foto: Aprosum/Olhar Direto
À esquerda, bloqueio realizado por posseiros contrários à demarcação da Funai; à direita, lideranças xavantes aliadas ao cacique Damião durante a Rio+20
À esquerda, bloqueio realizado por posseiros contrários à demarcação da Funai; à direita, lideranças xavantes aliadas ao cacique Damião durante a Rio+20
Trezentos posseiros e 150 índios xavantes, liderados por quatro caciques, participam do bloqueio na rodovia federal BR-158, na região do Araguaia, desde a noite de sábado (23).

O ato é uma forma de protesto contra a decisão judicial federal que determina a desintrusão da área remanescente da antiga fazenda Suiá Missú, cujo território foi usado na demarcação da Terra Indígena Maraiwatsede pela Fundação Nacional do Índio (Funai). Também foram anunciados bloqueios nas rodovias federais 080 e 242, mas a inda não há confirmação de que tenham se concretizado.

Os posseiros se opõem à medida judicial alegando que a demarcação da Funai foi fraudulenta, pois a área de ocupação tradicional indígena, segundo eles, não fica na região de Suiá Missú.

O mesmo argumento é utilizado pelos líderes indígenas aliados aos posseiros; eles não reconhecem a liderança do cacique Damião Paridzané, principal figura indígena a reivindicar as terras de Maraiwatsede tais como foram demarcadas pela Funai.

O cacique Damião, que participou da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20), ainda deve chegar do Rio de Janeiro, onde proferiu discurso inflamado cobrando do governo federal, da Funai e do Ministério Público Federal (MPF) celeridade na elaboração do plano de desintrusão que deverá promover o retorno dos xavantes liderados por ele a Maraiwatsede.

As informações são da TV Record Norte Araguaia, baseada em Confresa, segundo a qual apenas pouco mais de 120 índios ficaram dentro de uma das aldeias da região. Desses, apenas pouco mais de 20 insistem em permanecer nas terras.

Caciques

Ao lado dos posseiros no bloqueio da BR-158 estão os caciques Cristóvão, da aldeia xavante de Barra do Garças, José Luis, da aldeia de Campinápolis, Paulo César, de Nova Xavantina, e Nicolas, que veio de Canarana. O líder dos caciques é o ancião Policato, de 89 anos, tio de Damião Paridzané, nascido no Norte Araguaia e que declara nunca ter vivido nas terras de Suiá Missú. Além do tio Policato, um irmão de Damião, Rufino, participa de protestos contra a demarcação no Posto da Mata, informou a TV Record Norte Araguaia.

Contra a demarcação da terra indígena da maneira como a Funai procedeu, o ancião Policato argumenta com o próprio significado de Maraiwatsede: “mata misteriosa”. Segundo ele, por temor da mata fechada, os xavantes tradicionalmente sempre evitaram ocupar áreas do tipo, preferindo regiões de cerrado.

A verdadeira terra indígena que deveria ser demarcada seria a área de cerrado entre os municípios de Novo Santo Antônio e Serra Nova Dourada, mas o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) já realizou assentamentos ali. Do outro lado, a Funai não volta atrás da demarcação de Maraiwatsede, considerada equivocada e fraudulenta por parte dos xavantes liderados pelo ancião e também por parte dos posseiros.

Além disso, o grupo de Policato aponta que a Justiça Federal, temerosa de uma repercussão negativa, desconsiderou os referidos argumentos ao proferir decisão pró-Maraiwatsede devido à iminência da Rio+20, evento durante o qual a questão seria inevitavelmente exposta à comunidade internacional – tal como foi durante a Eco-92, vinte anos antes, também com destaque para a figura do cacique Damião.
 
Permuta


Por isso, os caciques do grupo aceitam o proposto pelo governo do Estado por meio de projeto de lei aprovado em junho do ano passado para resolver o impasse sobre as terras de Suiá MIssú: o Estado propôs transferir os xavantes que reivindicam permanecer na região para uma outra área, o Parque Estadual do Araguaia. A lei que autoriza a permuta com a União, de número 9.564, foi apontada como inconstitucional pelo MPF.

Funai

A assessoria de imprensa da Funai em Brasília informou que o órgão já foi notificado da decisão, proferida pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), que determina a desintrusão da área de Maraiwatsede. Os técnicos estão trabalhando no projeto de retirada dos não-índios e têm prazo de 20 dias para concluí-lo.

sexta-feira, 27 de abril de 2012

Marta Azevedo se sai bem em seu "batismo de fogo"


Hoje foi o primeiro dia da nova presidente da Funai, Marta Azevedo. E ela começou seu dia recebendo um grupo de 30 líderes Xavante, entre os mais expressivos das terras indígenas Sangradouro, São Marcos, Parabubure e Marechal Rondon. São lideranças tradicionais e experimentadas, como Celestino, Aniceto e Pio, junto com novos líderes como Jeremias, Paulo César e Arnaldo. Os funcionários da Funai ficaram boquiabertos, esperando ansiosos pelo modo como a nova presidente se sairia.


E ela se saiu muito bem desse seu verdadeiro "batismo de fogo." Ouviu cada um dos Xavante, conversou com eles, argumentando e se comprometendo. Pediu tempo, mas não vacilou em compromissos. No essencial, Marta Azevedo deu confiança e teve respeito pelos Xavante, o que é algo que não se via na Funai há cinco anos. Só por isso já valeu pelo seu primeiro dia.

Aliás, o "batismo" de Marta já começara ontem, na sua posse, quando, para fazer uma média política, se declarou uma continuadora da gestão que estava substituindo. Inclusive chegou a elogiar a "re-estruturação" da Funai. Seu antecessor tentou convencer a plateia do seu papel na "salvação" da Funai, inclusive chegando ao ponto de dizer que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso havia sugerido ao presidente Lula para "acabar" com a Funai. Ora, isso não era conhecido de ninguém, mesmo porque Lula não era de ouvir FHC, ao contrário, como todo mundo sabe.

Na cerimônia de posse havia um evidente desconforto do ministro José Eduardo Cardozo com esse discurso sem sentido. Por onde é que a questão indígena havia chegado!!!

De todo modo, na reunião com os Xavante, a presidente Marta Azevedo fez questão de apresentar-lhes sua nova e principal assessora, a advogada Luzia, que já ficou como representante e intermediária de Marta na relação com os Xavante.

Os Xavante não têm papas na língua. Protestaram que seu discurso de continuidade à gestão anterior não podia ser aceito por eles, que muito vinham sofrendo com o fim dos postos indígenas e das administrações regionais, com o descaso da presidência anterior e com o domínio do CTI e seus representantes sobre assuntos xavante e sobre suas terras, passando por cima da tradição xavante de discutir todos os temas no warã, nas suas assembleias diárias.

Os Xavante ouviram de Marta que ela vai mudar o rumo que a Funai vem tomando. Vai mudar diretores e coordenadores, conforme os avaliar como negativos ou positivos para o projeto que ela quer imprimir no órgão. Nesse sentido, no entender dos Xavante, Marta já destituiu um desses coordenadores, no ato mesmo da conversa com eles, para ser substituído por sua assessora.

Os Xavante saíram bem impressionados, e voltam para suas terras para contar das novas. Que os demais índios saibam disso e procurem seus direitos e ajudem a mudar a Funai.

sábado, 19 de junho de 2010

Aldeia Xavante escreve em apoio ao Acampamento Indígena Revolucionário


Carta Xavante ao Acampamento Revolucionario Indígena:

Podem dar continuidade à luta porque nós aqui estaremos apoiando. Estamos conscientes de que vocês estarão lutando até ser atingida a realidade que nós queremos. E queremos que vocês se lembrem de nossos ancestrais que estarão nos ajudando na hora do perigo. Queremos apoiar a todas as pessoas que lutam por nossos direitos, para que continuem nos apoiando, e que isso aconteça com respeito ao que nos deixaram nossos ancestrais. E a luta não acaba aqui, temos que lutar pelo nosso futuro criança, pela lembrança, a verde mata ligada ao universo. Temos que pensar ao que vamos deixar aos que vem depois de nós.

Na nossa comunidade a maioria de nós não fala português, os velhos temem que as crianças não falem mais nossa língua nativa. Lutamos pela nossa cultura, para que continue existindo. Nós não queremos o mesmo que o branco quer para ele nem o que o branco quer para nós, eles querem que paguemos impostos e vivamos como eles querem. Mas a nossa cultura vale mais do que todo o dinheiro, entoamos o grito lançado por nossos ancestrais na mata. A água e a mata pedem socorro. A água do rio que ainda bebemos pede socorro. A mata que ainda nos traz a saúde e o alimento, e que usamos de acordo com a tradição também pedem socorro.  Estamos lutando junto com o grito de nossos ancestrais.

O mundo do branco tem de entender que nós compartilhamos o espaço para ser respeitado, para que a nossa cultura seja respeitada. A nossa luta não é só por um povo, mas pela humanidade, cuidamos das árvores que trazem o ar puro para todos os brasileiros. Mas o desrespeito é tão grande que ninguém mais se reconhece, as pessoas estão ficando alheias umas das outras. Os empresários não estão pensando nisso.

Mas se formos uma nação, vamos dar as mãos porque somos um povo, uma sociedade, que luta pela vida de todos. O que vale é a vida, a sobrevivência, não o preconceito. Dizemos não à discriminação. Que não se dê mais continuidade à miséria em que estamos. Não devemos pensar pensar que os que estamos neste país devem seguir matando e discriminando. Temos que nos ajudar para lutar pela liberdade, não contra nós mesmos. Enquanto nós ficarmos lutando contra nós mesmos os que querem tirar proveito acham bom.

Aqui, seja branco, negro, japonês ou o que for, nossa luta é pela harmônia entre todos. Não defendemos os ricos, mas o direito de todos, e queremos continuar sendo como somos, povo nativo, e ser valorizado como tal. Não estamos originando conflitos com políticos e fazendeiros, são eles que estão gerando esse conflito com a gente porque não nos deixam viver em paz, de nosso jeito. Que haja respeito a cada nação.

Nossa preocupação faz com que nossa luta seja no sentido de manter nossa liberdade e nossos direitos, para que o povo indígena não seja mais tratado como criança, somos adultos, temos filhos, netos e queremos ser tratados como tal. Chega de nos dar tapa na cara como fazem com suas crianças. Está na hora de que os indígenas sejamos respeitados como pessoas que somos. Nossa luta é para todos. Onde vamos beber? Onde vamos pescar? Onde vamos caçar? Cuidamos do meio ambiente. Um dono não bate em seus animais domésticos, mas os indígenas somos tratados pior do que eles.

Todos somos seres vivos, como seres humanos, somos seres vivos, todos queremos sobreviver. Levantamos a bandeira da paz, não queremos a guerra. Nenhum de nós está atrapalhando a vida das pessoas na cidade, estamos vivendo em paz em nossa comunidade, fazendo nossas danças. Queremos parabenizar a luta dos acampados, sabemos que pensam em nós e em todas as comunidades, lutam por todos.

Que o Presidente da República e o Ministro entendam que somos um povo, nenhum deles sequer esteve na Terra Indígena. Devem nos respeitar, trazer aquilo que seja válido para a comunidade, que os políticos tenham essa compreensão para que não aconteça mais esse desrespeito e etnocídio com as comunidades indígenas.

Carta escrita pela Comunidade Indígena
A’uwê Aldeia Belém
Terra Indígena Pimentel Barbosa
Junho 5 de 2010 Mato Grosso

segunda-feira, 8 de março de 2010

Senado Federal propõe não precisar consultar índios para fazer hidrovias em seus rios!!

A administração da questão indígena brasileira está fugindo dos limites da racionalidade e da boa intenção!

Agora é o Senado Federal que se aproxima do ponto em que ousa legislar diretamente sobre os interesses dos povos indígenas sem consultá-los e propositadamente à sua revelia.

Voltamos à ditadura militar??

O presente projeto, da iniciativa da bancada ruralista, declara que pode-se fazer uma hidrovia que atinja os rios Araguaia e das Mortes, ao lado dos quais estão terras indígenas dos Xavante, Karajá, Tapirapé e outros povos indígenas . Essa licença é dada por si mesma, independentemente de estudos e viabilidade econômica, social, étnica e política, e intenciona facilitar a vida das empresas de tal modo que não vai ser preciso consultar os índios sobre impactos ambientais, sociais e econômicos que incidam diretamente sobre suas terras e sobre suas sociedades.

O projeto estabelece o instituto do decurso de prazo, segundo o qual, se em tal período, digamos 90 dias, os interessados não apresentarem suas razões, seja contrárias, sejam favoráveis, para projetos como a construção de hidrovias no rio das Mortes, o caso está automaticamente aceito e sacramentado. Bem, para que contestar se automaticamente o projeto já foi aprovado?!

Realmente, a coisa fugiu dos limites.

Porém, há de se perguntar: de onde vem o exemplo para tal despropósito?

A atual direção da Funai também não se deu ao trabalho de consultar os povos indígenas, nem formal nem informalmente, sobre a reestruturação da própria Funai!! E sobre dezenas de outras ações que só vêm prejudicando os povos indígenas do Brasil.

Por que então, o Senado Federal iria fazê-lo?

Eis o exemplo negativo que sai da própria Funai e se esparrama perigosamente pelas instituições do país. Com que moral a atual gestão da Funai vai contestar a intenção da bancada ruralista do Senado?

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Projeto do Senado autoriza obra de hidrovia em áreas indígenas

Enviada em 8 de março de 2010 – Imprimir – Enviar para um amigo
Projeto do Senado autoriza obra de hidrovia em áreas indígenas Em tramitação há seis anos, o projeto regulamenta o uso de trechos dos rios das Mortes, Araguaia e Tocantins em regiões de Mato Grosso, Goiás, Tocantins e Pará
A bancada ruralista do Senado aprovou um projeto de decreto legislativo para autorizar obras da hidrovia Araguaia-Tocantins em áreas indígenas homologadas e demarcadas pela União. O texto da Comissão de Agricultura do Senado também fixa um prazo máximo de 90 dias para a análise dos estudos antropológicos e de relatórios de impactos ambientais em órgãos federais.
A criação do chamado “decurso de prazo” deve forçar uma aprovação mais rápida do licenciamento ambiental pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama) e também acelerar o sinal verde da Fundação Nacional do Índio (Funai). Se não houver a análise desses estudos em até 90 dias, o projeto da hidrovia de 3 mil quilômetros passa a ser considerado aprovado.
“Isso é para forçar os órgãos a não dormir com o projeto. Eles têm que dizer sim ou não”, justifica a relatora do texto, senadora Marisa Serrano (PSDB-MS). “Mas isso é apenas um marco de tempo. As comunidades devem ser ouvidas antes.” A obra deve ser incluída na segunda fase do Programa de Aceleração do Crescimento, o chamado PAC 2.
Em tramitação há seis anos, o projeto nº 232 regulamenta o uso de trechos dos rios das Mortes, Araguaia e Tocantins em regiões de Mato Grosso, Goiás, Tocantins e Pará. “Precisamos acelerar a concessão dessas licenças. Precisamos de estudos técnicos de viabilidade e de relatórios ambientais”, diz o senador Gilberto Goëllner (DEM-MT), autor das emendas de limite temporal para as análises de Ibama e Funai.
As ONGs ambientalistas apontam o projeto como uma nova tentativa dos parlamentares ruralistas de pressionar e intimidar os técnicos do Ibama. “É uma pressão política para apressar o licenciamento ambiental no Ibama”, diz a secretária-executiva da ONG Instituto Socioambiental (ISA), Adriana Ramos.
Em maio de 2009, a Câmara Federal aprovou, em uma medida provisória, o “decurso de prazo” no licenciamento ambiental das obras de recuperação de rodovias. “É outra “pegadinha” reincidente. A tática visa acabar com o rito do licenciamento. Antes, a obra. E só depois o projeto da obra”, aponta a ambientalista. O problema da hidrovia Araguaia-Tocantins é, segundo ela, “de origem”, já que seria necessário autorização para uma “dragagem permanente” dos leitos dos rios devido às suas características geológicas particulares.
A obra da hidrovia é considerada fundamental pelos ruralistas para o desenvolvimento do setor agropecuário do Centro-Oeste. A área de influência da Araguaia-Tocantins teria, segundo relatório do Ministério dos Transportes, potencial de produção estimado em 35 milhões de toneladas de grãos até 2020.
O rio Tocantins já é navegável em 250 km de extensão, da barragem de Tucuruí (PA) até a foz do rio Amazonas (AP). Mas a hidrovia precisará de grandes obras de alto impacto ambiental, como o derrocamento de corredeiras e a construção de canais auxiliares, terminais de transbordo e de eclusas em usinas hidrelétricas. Boa parte disso deve ocorrer em áreas de reservas indígenas.
No rio das Mortes, considerado o elo mas frágil da hidrovia, cerca de 550 quilômetros seriam navegáveis entre São Félix do Araguaia e Nova Xavantina (MT). No Araguaia, outros 1.230 quilômetros entre Aruanã (GO) e Xambioá (TO) comporiam o chamado Corredor Multimodal Centro-Norte, conectado às ferrovias Carajás e Norte-Sul, além da rodovia BR-153. O destino final das cargas seria o porto de Itaqui (MA). “Teríamos uma enorme economia de recursos, tempo e vidas com essa hidrovia”, defende Goëllner, um grande produtor de grãos de Rondonópolis (MT).
Além das ONGs ambientalistas, a hidrovia enfrenta resistência de algumas etnias indígenas. A Constituição Federal submete ao Congresso Nacional a autorização para exploração de recursos hídricos nas áreas homologadas e demarcadas pela Funai. Os índios xavantes já pediram, na Justiça, a suspensão das obras da hidrovia nas terras à beira do rio das Mortes.
Fonte: Valor Econômico (Por Mauro Zanatta)
Foto: Rio Das Mortes/Gaspargyn/Baixaki

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

Carta dos Xavante entregue ao presidente Lula. APIB protesta timidamente

Eis uma das cartas entregues em Goiânia ao presidente Lula, sexta-feira p.p.

Foi escrita pelo representante de uma associação indígena de Nova Xavantina, que tem a sua própria verve e ênfase.

Não foi escrita por escribas brancos de Ongs como o foram muitas das cartas que a atual direção da Funai publicou no seu site em apoio ao decreto de reestruturação.

Aliás, sobre esses apoiamentos, basta ver que as cartas escritas por associações indígenas vindas do rio Madeira são todas da mesma lavra, contém não somente os mesmos argumentos mas quase as mesmas palavras. Que vergonha! Qual Ong fez a carta e indicou os índios para assiná-la. Qual? Ninguém sabe?

Por sua vez, o documento assinado por três das cinco associações da APIB, quais sejam, a Coiab, a Apoinme e a Arpinpan, e que está publicado no seu site, também foi escrito por pessoas que vivem de fazer esses documentos e que não têm ligação com lideranças indígenas de raiz.

O documento é anódino, burocraticamente redigido, água com açúcar, como se o problema que os índios e funcionários da Funai estão vivendo fosse uma simples questão burocrática. Não contem nenhuma indignação com o que está acontecendo por mais da metade do Brasil indígena, apenas constata o movimento indígena que ocorreu em Brasília à sua revelia. Aponta timidamente  as ilegalidades cometidas no decreto, desde a falta de consulta aos índios até a extinção de administrações e postos indígenas, Não faz nenhuma menção sobre as possíveis consequências políticas que já ocorrem e que continuarão a ocorrer por conta desse decreto e dos protestos que continuarão. Naturalmente o documento nem menciona quem é seu autor, qual seu propósito maluco e não pede a demissão da cúpula da Funai, como os demais documentos críticos o fazem.

 Segundo o que consta no Blog da APIB, a cúpula da Funai recebeu os representantes dessas associações e prometeu-lhes que iria corrigir o decreto, reconhecendo seu erro (algo que não fez em nenhum caso de comissões indígenas e indigenistas que com a cúpula estiveram recentemente), mas que não faria nada em relação ao concurso público que não traz nenhuma possibilidade dos índios aumentarem suas chances no tal concurso público.

O documento faz uma ameaça mais do que explícita no sentido de que, se o decreto não for "reformulado", ele será denunciado pela APIB na ONU. Ora, na ONU, por que não o denuncia ao Ministério Público no nosso país? À ABI, à OAB, à imprensa em geral???

Não tem mais cabimento ameaças dessa natureza. O Brasil não se importa mais com o quê alguns gatos pingados da ONU vão achar sobre esse decreto. Por aqui já esteve o relator da ONU para os direitos indígenas, escreveu relatório negativo sobre diversos aspectos da atual política indigenista e o que aconteceu? Nada. Por sua vez, está mais do que claro que o atual governo não liga a mínima para esse tipo de pressão, se não não teria prosseguido com a transposição do rio São Francisco e a licença dada pela Funai e pelo Ibama para a construção de Belo Monte.

Pelo contrário, denúncias feitas no Exterior terminam repercutindo negativamente entre as autoridades brasileiras do mais alto nível. Por exemplo, no voto do ministro do STF, Carlos Ayres Britto, sobre a homologação da T.I. Raposa Serra do Sol, ele menciona que o Brasil não deve dar ouvidos às propostas de fora porque, segundo ele, nossa política indigenista é das melhores do mundo, e não precisa de tutela internacional. Semanas antes desse voto, diversas comissões compostas de indígenas e missionários andaram pela Europa falando mal da política indigenista brasileira e conclamando os europeus para intervirem na questão indígena brasileira. Bem, no final, deu no que deu com as terríveis ressalvas contidas naquele voto do dia 19 de março de 2009.

Na verdade, nem o decreto será reformulado nem a promulgação de novo edital de concurso público será feito por promessas da atual cúpula da Funai.  Já não importa muito o que ela pensa diante dos acontecimentos gerais que atingem mais da metade dos povos indígenas diretamente e a todos indiretamente. A atual cúpula da Funai faz ouvidos de mercador para as reclamações e sugestões feitas por indigenistas e indígenas. Será impossível aconchambrar as falhas do decreto sem revogá-lo em sua totalidade. E tal coisa não será feita de boa vontade. O decreto só será revogado pela continuidade da ação política dos índios e indigenistas, inclusive junto ao novo ministro da Justiça e o presidente Lula, como já vem sendo feito.

Eles é que decidirão a revogação desse decreto e a renovação da Funai, com a pressão política e cultural dos povos indígenas e dos indigenistas.

Seria muito bom se o movimento indígena incrustado nas Ongs se desse conta de seu papel, pusesse a mão na consciência e passasse a agir de um modo incisivo e dedicado aos povos indígenas que estão em suas terras necessitando da solidariedade e da ajuda de todos.


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sábado, 13 de fevereiro de 2010

Presidente Lula recebe documentos dos índios em Goiânia

O presidente Lula recebeu ontem novo documento pedindo a revogação do decreto de reestruturação da Funai.

Foi uma festa só.

Veja a foto de Arnaldo Tsererõ com o presidente, que segura a mão de outro índio Xavante.

Que será que o presidente vai dizer agora?

Foto Pádua

PÓS-ESCRITO

Arnaldo Tsererõ relatou a conversa com Lula e como chegou no palanque do presidente na sexta-feira, em Goiânia. Disse que foi levado por um deputado federal que tinha sido amigo de Mário Juruna, o grande cacique Xavante e deputado federal pelo Rio de Janeiro.

Lula foi receptivo à fala de Arnaldo, bem como às falas dos bispos Dom Tomás Balduino e Dom Washington Cruz, arcebispo de Goiânia, sobre a revogação do decreto.

No final, Lula garantiu a Arnaldo que iria tratar desse assunto com o ministro da Justiça Luiz Paulo Barreto.

Vamos ver o que se passará no fim do Carnaval.

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Agora a liderança está com os Xavante e Pankararu

Índios ameaçam acampar no CCBB até que Lula os receba

Além de ignorarem o prazo da Justiça para que deixassem a sede da Fundação Nacional do Índio (Funai), em Brasília, até as 17 horas de ontem, os índios acampados em frente ao edifício-sede da fundação afirmam que começam hoje uma manifestação em frente ao Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), local onde o presidente Luiz Inácio Lula da Silva está despachando, por conta das obras no Palácio do Planalto. O protesto, que reúne em Brasília, desde o dia 11, índios de mais de 15 tribos, é contra o decreto que reestrutura a Funai e, segundo eles, acaba com administrações e postos do órgão que atendiam às demandas das comunidades indígenas. Eles afirmam que a decisão foi tomada pelo presidente da fundação, Márcio Meira, sem ouvir a opinião dos índios e, agora, querem conversar com Lula para pedir a revogação do decreto. 

“Decidimos permanecer na Funai e acampar em frente ao CCBB até que o presidente Lula nos receba. Queremos mostrar a ele as negativas consequências que esse decreto trouxe para os indígenas. Nós não teremos mais as nossas demandas atendidas”, martela o representante Jeremias Xavante, que destaca ainda que as tribos querem a saída imediata de Márcio Meira. 

Na última quarta-feira, o assessor da Secretaria Nacional de Articulação Social da presidência, Manoel Messias, recebeu os índios e anotou todas as reivindicações feitas por eles. Segundo Jeremias, ele ficou de passar para o presidente Lula e combinar o encontro, mas a data ainda não foi marcada. 

Em relação à desocupação da Funai, Xavante disse que eles vão continuar negociando com a Justiça sobre a ordem de liberar o prédio. A tentativa de retirá-los do local já havia sido feita na sexta-feira, mas uma negociação permitiu a permanência de todos.

domingo, 17 de janeiro de 2010

Xavante relatam reunião no MJ; Presidente Lula receberá movimento indígena na terça-feira


Relato de uma reunião entre lideranças Xavante e a cúpula da FUNAI

A principal estratégia usada pela cúpula da Funai para quebrar o movimento indígena revolucionário tem sido a de convidar grupos indígenas para reunir-se com ela no Ministério da Justiça para prometer-lhes que, nos seus casos particulares, a cúpula da Funai teria uma saída para seus problemas e demandas particulares. A outra estratégia é cansar o movimento por delongas e pressão para que o presidente Lula não reconheça a legitimidade do movimento indígena revolucionário e não receba representantes do movimento.

Ao que tudo indica, entretanto, o presidente Lula irá receber uma comissão eleita pelo movimento indígena na terça-feira. Parece que um dos líderes Xavante recebeu um telefonema do secretário particular de Lula, Gilberto Carvalho, que reconheceu a validade do movimento e as importantes sugestões que o governo vem recebendo no sentido de pacificar o povo indígena com a decisão correta que todos esperam. Os avisos de amigos de vários quadrantes políticos chegam aos ouvidos do presidente diretamente ou via seus auxiliares mais próximos.

Esse assunto terá consequências importantes para o movimento indígena, que deverá se posicionar brevemente sobre a questão da reintegração de posse e a continuidade da luta. Uma frustração será desastrosa para todos.

Em breve trataremos sobre isso.

Por enquanto, cabe relatar aqui uma reunião ocorrida nesta sexta-feira, dia 15, no MJ, entre um grupo de 11 índios Xavante e a cúpula da Funai. O propósito dessa reunião era o mesmo daquelas realizadas com outros grupos indígenas. Desviá-los da luta pela revogação do decreto e a saída da cúpula da Funai.

Foi assim que ocorreu com os índios que vieram de São Félix do Araguaia, MT, foi assim com o grupo de Kayapó que veio de Redenção, PA, e, aparentemente, foi assim com as lideranças do Alto Xingu. Tentaram com alguns grupos menores de índios nordestinos e com dois ou três grupos Xavante.

Entretanto, muitos participantes desses grupos têm relatado o mal estar em que essas reuniões ocorrem. Muitos saem com vergonha de terem participado de tais reuniões. 

Eis aqui o relato de um grupo Xavante sobre uma reunião que teve nesta sexta-feira passada, dia 15, já à tardinha. Essa história foi relatada pelo cacique Dominguinho à Assembleia Indígena presente no auditório da Funai pouco tempo depois e por outros Xavante posteriormente.

Numa sala de reunião do Ministério da Justiça estavam presentes, pelo lado da cúpula da Funai: o atual presidente, Márcio Meira, a atual diretora de assuntos fundiários, Maria Auxiliadora, a chefe de Gabinete, Maria Salete, e a chefe-substituta da diretoria de assistência indígena, Irânia. Junto a eles, dando-lhes um constrangidíssimo apoio ao caso, com pouca convicção e certo temor, os Xavante Edmundo, Félix, atual administrador de Barra do Garças, Hiparendi, de Sangradouro, e Isaac, do Kuluene.

Os principais caciques presentes eram José Luiz, Pio, Pedro, filho de Benjamim, Dominguinho e Arnaldo. Havia ainda os jovens Crizanto e Agnelo, ambos de Barra do Garças, e com experiência política em associações indígenas, inclusive na Coiab e no CNPI. Para a cúpula da Funai esses dois últimos seriam confiáveis, mas na reunião eles demonstraram estar a favor do movimento indígena revolucionário.

A reunião, como costuma ser entre os Xavante, é iniciada pelas falas dos caciques, numa ordem hierárquica discutida por eles, cada qual se levantando da cadeira e falando de pé. O teor e os assuntos de todos as falas foram extremamente duros, francos, sinceros e sem subterfúgios, unânimes, no sentido de demonstrarem a completa desconfiança na pessoa do atual presidente, na análise sobre as consequências nefastas desse decreto para com as administrações xavante e as dos demais povos indígenas, contrário ao caráter sigiloso e ardiloso usado na elaboração do decreto e em sua publicação, e absolutamente contrário ao modo como a situação vem sendo tratada pela cúpula da Funai.

Todas as vezes que a voz de um dos Xavante que estava ao lado da cúpula e a favor do decreto era levantada para explicar, os demais Xavante a rebatiam com argumentos claros e inequívocos. Todos replicavam que não toleram mais ouvir o discurso de que esse decreto vai favorecer a Funai, quando está evidente que não vai. O cacique Pedro, depois de seu discurso, concluiu dizendo que não estendia a mão ao presidente porque não confiava nele. Todos os caciques Xavante exigiriam que não necessitavam mais falar com o presidente da Funai, e sim com o presidente da República, porque só este tem poder para revogar o decreto.

Segundo os Xavante presentes, a principal defesa que o atual presidente faz de sua posição é de que tem a total confiança do presidente Lula, que gosta muito dele, e que lhe dá cobertura para suas ações políticas, inclusive a elaboração desse decreto. Os Xavante lembraram que também durante a gestão curtíssima do primeiro presidente da Funai nomeado pelo presidente Lula, o indigenista Eduardo Almeida, ele também se valia da mesma ladainha de dizer ter o apoio de Lula. Parece que é o modo que alguns usam para prevalecer sobre quem eles acreditam sejam crédulos e ingênuos. Mas os Xavante, como os demais índios que participam do movimento indígena revolucionário, já conhecem essa ladainha e não se intimidam com isso.

A reunião terminou seca e ríspida. Ao final da fala de Arnaldo Tserererõ, ele se retirou da sala de reunião e esperou a saída dos demais. Foi abordado pelo presidente da Funai que perguntou se ele tinha algum assunto particular que desejasse tratar pessoalmente com ele, ao que Arnaldo retrucou que não tinha nenhum assunto particular a ser compartilhado com ele.

A segurança dos Xavante continua firme. Não vão desistir enquanto o decreto não for revogado e a cúpula exonerada da Funai.

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Falha estratégia da atual gestão da Funai de dividir os Xavante

Os dois primeiros grupos de Xavante que chegaram a Brasília ontem, por volta de 10 horas da manhã, que tinham uma reunião marcada para falar com a direção da Funai, terminaram não sendo recebidos em conjunto. Foram estrategicamente divididos em dois grupos. O grupo maior, comandado por João Xavante, do NAL Norotã, de Campinápolis, ficou na Funai, enquanto o grupo liderado por Celestino, de Xavantina, foi levado ao Ministério da Justiça.

A atual direção da Funai raramente vai ao órgão e prefere as dependência do MJ para impressionar os índios do poder que têm. Mas os índios não se intimidaram nem um pouco.

O pessoal de Xavantina é o mesmo para quem a atual direção da Funai tinha criado uma administração regional, no dia 10 de novembro p.p., e depois revogado a portaria uma semana depois alegando que ela fora publicado sob coação dos índios. É o mesmo grupo para o qual a atual direção da Funai pedira e obtivera uma liminar judicial para expulsá-lo das dependências da sede, o que constituiu uma das maiores vergonhas da Funai desde os tempos dos militares.

A tentativa de dividir os Xavante falhou. Falhou também a tentativa de promessas de que Xavantina iria se transformar numa "comissão técnica" e que iria receber recursos para se estabelecer. A reunião foi dura e os índios foram veementes, diante de várias autoridades do Ministério da Justiça, de que não queriam saber de palavras inúteis.

Os Xavante que chegaram ontem são a ponta de lança do movimento indígena de base, de raiz, contra a reestruturação da Funai e contra a irresponsabilidade e a insensatez que assolam o órgão indigenista.

Não aceitam outra coisa senão a revogação do decreto presidencial de reestruturação e o fim dessa calamitosa administração, que está levando a Funai, seus servidores e os povos indígenas ao desespero. Querem que o presidente Lula revogue seu decreto, demita a direção atual por completo, e crie um grupo composto por índios e por indigenistas indicados pelos índios para fazer um novo projeto de reestruturação dentro de 3 meses.

Eis o que está se vislumbrando como objetivo desse movimento indígena de raiz.

Faz sentido.

PS
Esses dois grupos avançados dos Xavante chegaram para resolver a parada de qualquer jeito. Tanto que já veio cada qual com seu fogareirozinho, sal e um saco de arroz para fazer suas refeições mínimas, caso a Funai não providenciasse. À noite, sem alojamento, dormiram na própria Funai. Os estudantes de Brasília já começam um movimento de solidariedade ao movimento indígena de raiz.

Logo mais chegarão mais 80 Xavante da região de Campinápolis.

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

NOTA DE PESAR

Faleceram ontem à noite, por volta das 21:30 nove índios Xavante da Terra Indígena Areões. De manhã, eles, em número de 17, entre crianças e mulheres, tinham vindo à cidade de Nova Xavantina para participar dos preparativos para o deslocamento de delegações Xavante a Brasília. Na volta à sua aldeia, chamada Pequi, o pequeno caminhão que os levava saiu da sua faixa e bateu violentamente contra um ônibus.

Segundo testemunhas, sete Xavante faleceram de imediato, sendo que os demais 10 foram transportados para Barra do Garças, onde mais dois deles vieram a falecer em consequência dos graves ferimentos.

Com isso, a delegação de índios Xavante da Terra Indígena Areões não pode vir a Brasília para participar dos protestos contra a reestruturação da Funai.

Todos os demais índios Xavante se solidarizaram com os familiares dos falecidos e prometeram honrar o nome Xavante na empreitada que decidiram realizar proximamente.

Esse Blog lamenta profundamente o acontecido e se entristece com todos por essa perda tão sofrida e trágica.

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O jornal eletrônico local aguaboanews.com.br relatou que a hipótese principal do acidente foi falha mecânica.


O chefe substituto da administração Nau-Parabuburi da Funai, Orestes Teserenhotbza Edzane diz que os índios são de uma aldeia pequena distante cerca de 60km da cidade: “São mais ou menos 50 pessoas, é um vilarejo pequeno, foi separada da aldeia Mutum há pouco tempo”. Segundo ele, será realizado um funeral indígena com tradições cerimoniais para enterrar os mortos: “Os índios vão pintar o corpo, raspar a cabeça e ficar em silêncio”.
Segundo a PRF, latas e garrafas de cerveja foram encontradas na caminhonete dos indígenas. O chefe substituto da Funai admite que os índios podem ter bebido: “Não podemos afirmar que o acidente foi causado pela bebida, mas sabemos que o alcoolismo entre indígenas da etnia xavante é um grave problema social grave”. Orestes Edzane, no entanto, diz que falta estrutura para atender adequadamente os índios na questão do transporte: “Não existe outra forma de locomover esses índios, na maioria dos casos as caminhonetes estão em estado precário, como a do acidente de ontem”.



Luiz Cláudio Brito é agente da PRF de Água Boa. Ele atendeu a ocorrência e concedeu uma entrevista por telefone ao site TVCA (para conferir na íntegra a entrevista clique no ícone abaixo). “Uma testemunha nos procurou e disse ter ouvido forte barulho na suspensão”, disse.
A perícia da Polícia Judiciária Civil não compareceu ao local na hora do acidente pois estavam trabalhando no caso do assalto em Canaranaa (820 km de Cuiabá) e por isso não puderam realizar a perícia na hora do acidente. “Mas o veículo vai ficar guardado à disposição dos peritos para descobrir as causas do acidente”, afirma o agente.

sábado, 12 de dezembro de 2009

Indigenista da Funai conclama colegas a repudiar ato de expulsão dos Xavante

Num ato de extrema lucidez e percuciência e de destemor orgulhoso, o indigenista Rogério Oliveira, da Funai, com larga experiência de campo desde os idos da década de 1970, entre os Xavante, até o presente, onde exerce função não gratificada na Coordenação Geral de Índios Isolados, escreveu a carta abaixo aos seus colegas servidores e funcionários da Funai.

Na carta, Rogério faz uma análise dos motivos que levaram a atual direção da Funai a pedir à AGU para entrar com uma ação de reintegração da posse com despejo de índios Xavante que se encontravam no prédio da Funai. Não são bons os motivos. São ignóbeis, para falar a verdade. E conclama seus colegas indigenistas e servidores a levantar a cabeça e não deixar se esmorecer diante do que está acontecendo.

Essa carta é um sinal dos tempos. Rogério, pela sua coragem de se expor, junto a muitos outros indigenistas e servidores da Funai demonstram que não estão abúlicos diante do poder atual e protestam contra o que está acontecendo, contra o que vem acontecendo nesses longos e desastrosos dois anos e meio na Funai, antecipando o pior que está para vir, se a coisa continuar pelo mesmo caminho.

Há que lembrar que desde 2007 não se demarcava tão poucas terras pela Funai. Na verdade, a atual gestão não demarcou uma terra indígena sequer. Todas as terras homologadas em 2007 vieram das demarcações feitas na gestão anterior, por este que vos escreve. O ano passado nenhuma terra foi demarcada ou homologada. Este ano, prometido para o dia 23 próximo, o presidente Lula irá homologar três terras indígenas que foram demarcadas em 2006. Uma delas é a Terra Indígena Trombetas-Mapuera, com quase 4 milhões de hectares, demarcada em 2006 e só agora pronta para ser homologada.

Há que lembrar que, por efeito reativo desastroso causado pela retórica desmesurada das Ongs, do CIMI e da atual gestão da Funai, o STF lançou uma série de vinte ressalvas ou condições para a demarcação de terras indígenas. Essas ressalvas praticamente inviabilizaram a recuperação de terras indígenas usurpadas em passado recente.

Esse legado horrível tem donos, nomes e endereços. Estão aí, na mídia eletrônica, nos interstícios das aldeias indígenas, nos gabinetes do governo. Não são os indigenistas da Funai, nem é este antropólogo que aqui escreve. São atores esdrúxulos, pequenos potentados que tomaram de assalto o órgão, expulsando raivosa e desavergonhadamente o espírito rondoniano que deveria prevalecer na questão indígena brasileira e que tem sido o inspirador de atos e ações humanas da mais nobre dedicação nos últimos 100 anos em nosso país.

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O indigenismo é para poucos, e é formado e lapidado na existência nas aldeias, no caminho das roças, nas estradas enlameadas, nas trilhas na mata, nas subidas das serras, no remar das canoas nos igarapés, nos rituais que vimos, nas mortes que compartilhamos, nas tempestades que passamos debaixo de árvores, nas carrocerias dos velhos toyotas bandeirantes, as conversas intermináveis em volta de uma fogueira.
Para muitos, isso nunca aconteceu, e para tantos esse tempo passou, ou como dizem os novos entendidos, "estamos ultrapassados". (Moacir Santos, Indigenista – dez 2009)


Colegas,


A citação acima, de um colega indigenista, retrata bem o choque de entendimentos que ocorre atualmente na Funai. Hoje, o grupo que se encontra na Direção da Funai, nega esse capital institucional, e se delicia com uma aparente vitória, quando obtiveram na Justiça, induzida por argumentos francamente preconceituosos, a decisão de expulsar os índios que se encontravam ocupando o prédio da Funai.
Esta carta tem um objetivo claro. Obter o maior numero possível de assinaturas em apoio à Nota de Repúdio que foi redigida por um grupo de pessoas que não concordam com a decisão adotada pela atual Direção da Funai de, por meio de ação judicial, expulsar os índios que estavam ocupando[i] o prédio da Funai, com a falsa acusação de que os mesmos estariam colocando em risco a integridade física dos servidores.
Nesse sentido, é preciso que antes de se decidir pelo apoio ou não a referida NOTA DE REPÚDIO, cada servidor deve ler os Termos da ação que motivaram a decisão da justiça, bem como entender a participação dos personagens envolvidos.
A Ação denominada de Reintegração de Posse foi solicitada pela Direção da Funai, representada pelo Presidente, Diretor de Assistência, Chefe de Gabinete e Diretora de Assuntos Fundiários. Mas dizem que com o apoio de alguns Coordenadores Gerais.
Todos esses personagens acima, a exceção do Presidente, tiveram participaram direta no recente e lamentável episódio quando os índios xavante levaram o Diretor de assistência à força para o auditório e lá o teriam obrigado a atender suas reivindicações, e no tumulto formado, algumas mulheres xavante teriam ameaçado de morte a Chefe de Gabinete.
A tão lamentável episódio, infelizmente recorrente com diversos colegas não só na sede, mas em diversas Administrações Regionais,  obviamente que devemos deixar claro nossa posição de repúdio, já que é inadmissível qualquer ato de violência contra qualquer servidor. Mas a acusação contra os xavante, de colocar a integridade física dos servidores em risco só é verdadeira se for estendida exclusivamente à Direção da Funai, que como tal são servidores. E ai, o que se poderia desejar, seria a solidariedade dos demais servidores, num salutar espírito-de-corpo, para condenar explicitamente o ato dos xavante contra o Diretor.
Mas só é possível exigir tal solidariedade, quando verdadeiramente se atua em ambiente de recíproco respeito e sentimento de colaboração. E infelizmente, não é assim que a atual Direção trata os servidores. O pouco que se sabe, são manifestações de escárnio proferidos contra os servidores. Tratados por “os antigos servidores da Funai, ultrapassados, assistencialistas, manipuladores de índios”. E talvez, a maior prova do sentimento de desconfiança que nutre a atual Direção contra “esses servidores antigos”, seja a forma como conduzem a discussão da reestruturação do órgão, do qual a maioria dos servidores foi excluída.
Então, o silêncio dos servidores que se seguiu ao episódio entre o Diretor e os xavante, pode em parte ser explicado por esta razão.
Mas haveria uma explicação a motivar a decisão dos índios? Bom, desde que a atual Direção da Funai assumiu, muitas das práticas condenáveis de atender as reivindicações de lideranças, em moldes clientelistas e assistencialistas foram mantidos. Dentre elas, nomeações de índios, criações e extinções de unidades administrativas, sem nenhum estudo de viabilidade, se repetiram à exaustão. E sobre isto, o TCU já fez diversas determinações à Funai.
A cada AER, Núcleo ou nomeação de DAS conquistado por um grupo xavante, se seguia a imediata reação do grupo que se julgava prejudicado se deslocando para Brasília para reivindicar o mesmo tratamento. Sendo uma pratica insustentável é lógico e trágico o que se poderia esperar desse modelo de indigenismo.
Desde então, conviver diariamente com cenas de tradicionais lideranças xavante, mulheres e crianças dormindo nos corredores, na garagem e em frente aos elevadores, tem sim um significado de DRAMÁTICA VIOLÊNCIA! E é obvio que não é a violência dos índios, mas contra eles.
Em ambiente de tão gritante desrespeito e escárnio à dignidade humana, faltava pouco para acender o estopim que culminou com a agressão (reação?) ao Diretor. E tentar criminalizar esta reação dos xavante será um crime ainda maior, por esconder o fracasso daqueles que defendem praticar um novo e moderno indigenismo[ii].
É preciso que se diga que não foi o primeiro conflito do Diretor de Assistência com comunidades indígenas presentes aqui na sede. Mas citar diversos exemplos que resultaram em claros “constragimentos”, digamos assim, vividos pelo Diretor, e do conhecimento da maioria dos servidores, poderia provocar o equivoco de criar falsos debates.
Mas o fato é que houve uma clara diferença de tratamento dispensado pela atual Direção para semelhantes casos de “constrangimento” vivenciados em outras ocasiões, apesar da situação análoga aquela que os xavante são agora denunciados.
Sabemos que a questão xavante suscita acalorados debates e divergências de opiniões, mesmo entre servidores da Funai. Vistos por alguns como excessivamente agressivos em suas reivindicações, em detrimento de outras etnias, podem provocar reações de apoio às medidas duras como as que agora foram adotadas pela Direção. Mas é um equivoco abissal adotar este entendimento. Acreditem. Há sutilezas gravíssimas neste episódio. Os índios xavante estão sendo acusados pela atual Direção de colocarem em risco a integridade física dos servidores. Isto não é verdade e a Justiça não pode ser induzida, por deliberada má fé, a proferir uma decisão baseada neste entendimento. Somos nós, servidores, que herdaremos as conseqüências nefastas deste entendimento, que terá conseqüências em tenebroso ambiente, cuja superação para restabelecer o diálogo com os índios, será contaminada por desconfianças mutuas.
No novo cenário de atuação indigenista que se descortina, o maior capital que uma instituição possuirá, será justamente a capacidade de diálogo com as comunidades indígenas. E Neste quesito, a Funai, é disparada, a que tem o maior patrimônio. Mas que está sendo jogada fora pela atual Gestão.
Sou servidor lotado aqui na sede, e como tantos outros, venho assistindo a uma tentativa silenciosa para acabar com a Funai, em favor de uma nova instituição que eles insistem em esconder da gente.
Tenho algumas suspeitas, mas não é o caso de se tratar neste documento.
Somente uma forte reação do conjunto dos servidores poderá impedir o êxito desse grupo de pessoas.
E uma demonstração clara de que os servidores não ficarão parados diante de decisões arbitrárias que signifiquem a desmoralização da instituição, dos índios e dos servidores, depende da reação individual de cada um de nós, servidores e indios.
Decisões claras e incisivas são necessárias em momentos de risco. E acreditem, não tomar tais decisões, significará o fortalecimento daqueles que precisam do enfraquecimento da Funai.
Neste momento, com minhas convicções, eu estou assumindo tais riscos. Deixar claro que existe um projeto em curso, que se levado adiante, sem a resistência do servidores e índios, levará ao enfraquecimento, desmoralização e finalmente a extinção da Funai.
Por isso, a minha decisão de assinar o documento Nota de Repudio.
Por isso, a minha decisão de pedir aos demais colegas da Funai e índios que assinem uma lista de abaixo-assinados em favor da Nota de Repúdio e consigam o máximo de assinaturas possível.
Eles contam com nosso medo! Eles contam com o apoio político de aliados que sempre odiaram a Funai! Eles contam com o apoio de aliados que precisam de uma Funai fraca, para legitimarem suas atividades! Eles precisam de uma Funai fraca para poderem continuar viajando pelo mundo (e somente no primeiro mundo) para provar como o estado brasileiro é incompetente para proteger e cumprir a política indigenista.
E tudo isto eles conseguirão somente com o nosso silêncio. Insisto! Cada um de nós que escolher o silêncio, fornecerá a principal arma que eles precisam para se fortalecer.
Reflitam e decidam. Cada um de nós tem nas mãos a condição de impedir esse projeto irresponsável, que, com o enfraquecimento e extinção da Funai, jogará os índios em um arriscado cenário de conflitos!
Enviar respostas para roger.eo@uol.com.br com cópias para ansef@funai.gov.br e repudio.100anosindigenismo@gmail.com. Podem também fazer um abaixo assinado  identificando a AER e enviar para o Fax da ANSEF - (61) 3226-6697 ou 3225-0747
Brasília, 07 de dezembro de 2009

Rogerio Eustáquio de Oliveira
Técnico Indigenista


PS.: ouve-se muitas manifestações de repúdio nos corredores, mas poucas explicitas. De colegas que estão fora da Funai, surgem atitudes corajosas como o email que está circulando pela internet, de uma conhecida indigenista (Blog do Mércio: Índios, Antropologia, Cultura: ESCÂNDALO NA FUNAI: Juiz Federal determina expulsão dos Xavante!).  Mas falta algo: A clara manifestação dos servidores!



[i] Muitos xavantes saíram pacificamente do prédio na ultima sexta-feira, 04/12 (após a notícia da morte do cacique Carlos Xavante). Numa cena lamentável, em silêncio cerimonioso, mulheres e crianças embarcaram em ônibus na porta da Funai, levando malas e bagagens de doações de roupas usadas recebidas de moradores de Brasília – seriam estes os xavante que estariam colocando a integridade física dos servidores em risco?.
[ii] Está análise é uma simplificação apenas para ilustrar a parte superficial da crise. Fatos muito mais complexos, que exigiriam uma análise igualmente profunda, devem e precisam ser tratados em outra oportunidade. Ao tentar atingir os xavante com esta medida violenta de expulsão, a atual direção revela uma luta surda nos bastidores, e o objetivo seria atingir grupos políticos que eles acreditam serem seus inimigos.

 
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