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domingo, 27 de fevereiro de 2011

La Boétie e Comparato falam de servidão voluntária

Esta semana seis funcionários da Funai foram surpreendidos com notificações de que estão sendo processados pelo órgão, em forma de processo administrativo disciplinar -- PAD --, por terem ajudado os índios que ficaram mobilizados por sete meses no Acampamento Indígena Revolucionário em protesto ao Decreto 7506/09, entre fevereiro e julho de 2010.

A mobilização indígena foi um dos atos mais extraordinários do indigenismo brasileiro e assim ficará para a história, quando ela for devidamente avaliada. Totalmente espontâneo, movido pela consciência de que estavam sendo oprimidos e anulados nos seus direitos humanos e civis, mais de 600 índios acamparam em frente ao Ministério da Justiça, passando por todos os tipos de agravos e dificuldades, sendo perseguidos pelas polícias militar, civil e federal, assediados pelos mensageiros das ONGs que estão aliadas à atual direção da FUNAI -- somente ajudados por alguns sindicatos de Brasília e pela solidariedade de estudantes e ... indigenistas!

Que ajuda teria sido essa? Conversas, explicações sobre o dito decreto, ajuda de alimentação, não mais do que isso -- e esse pouco com o aval da ANSEF, a associação dos servidores da própria FUNAI!

Entre os processados está o índio Xavante Jeremias, que também é político em sua região natal, Campinápolis, sendo atualmente vereador. Ser funcionário da FUNAI tirou-lhe o direito de ser índio!

A ajuda, o apoio foi dado por essas pessoas e por algumas outras, gatos pingados que viam nesse acampamento algo diferente, mas que temiam se expor na ajuda. Os que não ajudaram em nada estão curtindo o pesadelo de suas consciências, de suas atitudes abúlicas e infiéis à sua profissão.

Por que somente esses seis funcionários estão sendo visadas pela sanha persecutória da atual direção da FUNAI, não se sabe. Ajudar pessoas não somente não é contra a lei, como também é obrigação moral do indigenismo brasileiro ajudar índios que precisem de ajuda.

Em qualquer circunstância, o indigenista brasileiro, de tradição rondoniana, deve ajudar, até à custa e ao perigo de morte, seguindo o dístico máximo do humanismo do velho SPI:

 "Morrer se preciso for, matar nunca".

No caso da ajuda aos índios acampados  e que por algumas vezes foram recebidos no Senado Federal  (uma desses vezes, na marra!) protestando contra o decreto 7506, sob o beneplácito dos senadores, nem questão de morte era!

Era questão simplesmente de solidariedade e de moral indigenista.

A dúvida que paira no ar, nesse momento de transição de governo, é: por que os funcionários da FUNAI, os indigenistas que lá trabalham, jovens e veteranos, e os aposentados que continuam nesse mister, não fizeram até agora nada a respeito dessa perseguição descabida, que fere os princípios morais da grei indigenista!

Nem uma palavrinha de solidariedade alguns indigenistas deram, abscondidos que estavam em sua trepidez voluntária!

Para melhor entender essa dúvida, vale a pena ler o artigo abaixo, escrito pelo eminente jurista Fábio Konder Comparato, refletindo sobre um famoso livro de Étienne de la Boétie, o "Discurso sobre a Servidão Voluntária".

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A SERVIDÃO VOLUNTÁRIA

Fábio Konder Comparato


As rebeliões populares que sacodem atualmente o mundo árabe têm, entre outros méritos, o de derrubar, não só vários regimes políticos ditatoriais em cadeia, mas também um mito político há muito assentado. Refiro-me à convicção, partilhada por todos os soi-disant cientistas políticos, de que um povo sem organização prévia e não enquadrado por uma liderança partidária ou pessoal efetiva, é totalmente incapaz de se opor a governos mantidos por corporações militares bem treinadas e equipadas,  com o apoio do poder econômico e financeiro do capitalismo internacional.


Pois bem, há quatro séculos e meio um pensador francês teve a ousadia de sustentar o contrário. Refiro-me a Etienne de la Boëtie, o grande amigo de Montaigne.  No Discurso da Servidão Voluntária, publicado após a sua morte em 1563, ele pronunciou um dos mais vigorosos requisitórios contra os regimes políticos e governos opressores da liberdade, de todos os tempos.


Seu raciocínio parte do sentimento de espanto e perplexidade diante de um fato que, embora difundido no mundo todo, nem por isso deixa de ofender a própria natureza e o bom-senso mais elementar. O fato de que um número infinito de homens, diante do soberano político, não apenas consintam em obedecer, mas se ponham a rastejar; não só sejam governados, mas tiranizados, não tendo para si nem bens, nem parentes, nem filhos, nem a própria vida.


Seria isso covardia? Impossível, pois a razão não pode admitir que milhões de pessoas e milhares de cidades, no mundo inteiro, se acovardem diante de um só homem, em geral medíocre e vicioso, que os trata como uma multidão de servos.


Então, “que monstruoso vício é esse, que a palavra covardia não exprime, para o qual falta a expressão adequada, que a natureza desmente e a língua se recusa a nomear?”


Esse vício nada mais é do que a falta de vontade. Os súditos não precisam combater os tiranos nem mesmo defender-se diante dele. Basta que se recusem a servi-lo, para que ele seja naturalmente vencido. Uma nação pode não fazer esforço algum para alcançar a felicidade. Para obtê-la, basta que ela própria não trabalhe contra si mesma. “São os povos que se deixam garrotear, ou melhor, que se garroteiam a si mesmos, pois bastaria apenas que eles se recusassem a servir, para que os seus grilhões fossem rompidos”.


No entanto – coisa pasmosa e inacreditável! –, é o próprio povo que, podendo escolher entre ser escravo ou ser livre, rejeita a liberdade e toma sobre si o jugo. “Se para possuir a liberdade basta desejá-la, se é suficiente para tanto unicamente o querer, encontrar-se-á uma nação no mundo que acredite ser difícil adquirir a liberdade, pela simples manifestação desse desejo?”


O que La Boëtie certamente não podia imaginar é que, durante os primeiros séculos do Brasil colonial, foi muito difundida a prática da servidão voluntária de indígenas maiores de 21 anos. Encontrando-se eles em situação de extrema necessidade, a legislação portuguesa da época permitia que se vendessem a si mesmos, celebrando um contrato de escravidão perante um notário público.


De qual quer modo, prossegue o nosso autor, a aspiração a uma vida feliz, que existe em todo coração humano, faz com que as pessoas, em geral, desejem obter todos os bens capazes de lhes propiciar esse resultado. Há um só desses bens que elas, não se sabe por quê, não chegam nem mesmo a desejar: é a liberdade. Será que isto ocorre tão-só porque ela pode ser facilmente obtida?


Afinal, de onde o governante, em todos os paises, tira a força necessária para manter os súditos em estado de permanente servidão? Deles próprios, responde La Boëtie.

“De onde provêm os incontáveis espiões que vos seguem, senão do vosso próprio meio? De que maneira dispõe ele [o tirano] de tantas mãos para vos espancar, se não as toma emprestadas a vós mesmos? E os pés que esmagam as vossas cidades, não são vossos? Tem ele, enfim, algum poder sobre vós, senão por vosso próprio intermédio?”


A conclusão é lógica: para derrubar os tiranos, os povos não precisam guerreá-los. “Tomai a decisão de não mais servir, e sereis livres”. Aí está, avant la lettre, toda a teoria da desobediência civil, que veio a ser desenvolvida muito depois que aquelas linhas foram escritas.


É de completa evidência, prossegue o autor, que somos todos igualmente livres, pela nossa própria natureza; e que o liame que sujeita uns à dominação dos outros é algo de puramente artificial. Mas então, como explicar que esse artifício seja considerado normal e a igualdade entre os homens não exista praticamente em lugar nenhum?


Para explicar esse absurdo da servidão voluntária, La Boëtie aponta algumas causas: o costume tradicional, a degradação programada da vida coletiva, a mistificação do poder, o interesse.


Foi por força do hábito, diz ele, que desde tempos imemoriais os homens contraíram o vício de viver como servos dos governantes. E esse vício foi, ao depois, apresentado como lei divina.


É também verdade que alguns governantes decidiram tornar mais amena a condição de escravo, imposta aos súditos, criando um sistema oficial de prazeres públicos; como, por exemplo, os espetáculos de “pão e circo”, organizados  pelos imperadores romanos.

Outro fator a concorrer para o mesmo efeito foi o ritual mistificador que os poderosos sempre mantiveram em torno de suas pessoas, oferecidas à devoção popular. O grotesco ditador Kadafi, com seus trejeitos de mau ator de opereta, nada mais fez do que reproduzir, mediocremente, vários tiranos do passado. “Antes de cometerem os seus crimes, mesmo os mais revoltantes”, lembrou La Boëtie, “eles os fazem preceder de belos discursos sobre o bem geral, a ordem pública e o consolo a ser dado aos infelizes”.


Por fim, a última causa geradora do regime de servidão voluntária, aquela que La Boëtie considera “o segredo e a mola mestra da dominação, o apoio e fundamento de toda tirania”, é a rede de interesses pessoais, formada entre os serviçais do regime. Em degraus descendentes, a partir do tirano, são corrompidas camadas cada vez mais extensas de agentes da dominação, mediante o atrativo da riqueza e das vantagens materiais.


No Egito de Mubarak, por exemplo, oficiais graduados das forças armadas ocupavam cargos de direção, muito bem remunerados, nas principais empresas do país, privadas ou públicas. Algo não muito diverso ocorreu entre nós durante o vintenário regime militar, com a tácita aprovação dos meios de comunicação de massa, a serviço do poder econômico capitalista.


Pois bem, se voltarmos agora os olhos para este “florão da América”, veremos um espetáculo bem diverso daquele que nos fascina, hoje, no Oriente Médio. Aqui, o povo não tem a menor consciência de ser explorado e consumido. As nossas classes dirigentes, perfeitamente instruídas na escola do capitalismo, nunca mostram suas fuças na televisão. Deixam essa tarefa para seus aliados no mundo político. Elas são anônimas, como a sociedade por ações. E o jugo que exercem é insinuante e atraente como um anúncio publicitário.


Por estas bandas o povão vive tranqüilo e feliz, na podridão e na miséria.

sábado, 21 de agosto de 2010

Marcha dos últimos defensores do AIR à FUNAI

Dia 9 de agosto, os últimos defensores do AIR fizeram uma marcha do Ministério da Justiça, na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, até a sede da Funai, no setor de Rádio e Televisão. Uns 4 a 5 km de marcha.

Chegaram lá cantaram e apresentaram sua lista de 15 reivindicações, entre elas a revogação do decreto 7506, a exoneração da atual direção da Funai, a criação de um conselho indígena com lideranças autônomas e não ligadas às ONGs, o direito dos povos indígenas serem ouvidos na sua representação, enfim, estão todos no video abaixo.

Pelo que sei ainda restam os últimos 15 moicanos no AIR. Meus cumprimentos, meus respeitos. Longa vida a todos.

sábado, 14 de agosto de 2010

Acampamento Indígena Revolucionário é forçado a sair do MJ e vai para o lado do Itamaraty

Sábado de manhã cedinho, os índios acampados no AIR receberam uma cordial visita da Polícia Militar do Distrito Federal. Não podem mais ficar onde estão. Não podem inclusive portar faixas de protesto! Há algo de errado com essa ordem.

O pequeno video feito por um jornalista dá conta singela de alguns aspectos dessa retirada. No fundo uma voz de uma índia Guajajara ecoa um lamento de protesto.

terça-feira, 13 de julho de 2010

Como num conto de William Faulkner, índios persistem...

Como num conto do escritor americano William Faulkner, que descreveu a resistência e persistência dos negros americanos ao domínio dos brancos, os índios brasileiros que há 159 dias montaram acampamento em frente ao Ministério da Justiça também persistem.

Por que essa persistência? Não deveria perguntar o governo Lula sobre isso? As forças policiais e militares, a Funai, o CIMI e as ONGs, unidas em contrário, já fizeram de tudo para tirar esse pessoal que se amontoa com dignidade diante do poder máximo que os representa: a Funai e o Ministério da Justiça.

Ainda assim, não desistem.

Em matéria abaixo, o Correio Braziliense, despertado para essa drama trágico, procura saber melhor o que está se passando na Esplanada dos Ministérios para informar seu público em Brasília. Entrevistaram alguns índios, o CIMI e a Funai. Deveriam entrevistar o ministro da Justiça, o chefe da Casa Civil.

Por que os índios persistem, se, supostamente, os auto-intitulados tutores do movimento indígena, o CIMI e as ONGs, já tentaram persuadi-los de que as razões para seu protesto não são verdadeiras. Os índios já não ligam mais para o que a atual direção da Funai lhes fala, haja visto as patranhas que fizeram com eles em janeiro, fevereiro e março, mas também nem querem mais falar com o ministro da Justiça, que os recebeu em junho, prometeu-lhes mudar o decreto, e ... nada.

Quem poderia ser o interlocutor dos índios com o governo?

Por que não permitem aos próprios índios falarem por si mesmos?

Não podem? Não entendem o que estão fazendo? São irracionais?

Estas parecem ser as opiniões que se veiculam nos gabinetes do Governo Lula, e tais opiniões advém da própria Funai e das ONGs que a estão tutelando. A fala do atual presidente da Funai, abaixo na matéria, é típica do discurso que domina o Planalto em relação aos índios. É terrível, preconceituosa, enganatória e vexatória para todos que já trabalharam com povos indígenas.

Eis o dilema do presidente Lula. No ano do centenário da Política Indigenista Rondoniana eis que o governo é envolvido numa tal má política que está prestes a enterrar as próprias bases dessa política, feita com muita dedicação da parte de muitos brasileiros, e com muita inteligência também.

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Índios esperam mais 200 pessoas para apoiar movimentoIndignados com a reestruturação da Funai, líderes indígenas resistem à ordem judicial e mantêm acampamento na Esplanada dos Ministérios, dormindo debaixo de árvores, às margens da Via N1


Luiz Calcagno
Publicação: 13/07/2010 07:00 Atualização: 13/07/2010 07:36

Depois de 159 dias, os quase 100 representantes de 12 comunidades indígenas acampados na Esplanada dos Ministérios receberão reforços. Nos próximos dias, são esperados cerca de 200 índios. Apesar da retirada dos acampados pelas polícias militar, civil e federal, sábado último, em cumprimento a uma decisão judicial, eles resistem e prometem continuar debaixo das árvores, às margens da Via N1, no sentido Congresso Nacional/Rodoviária. Os líderes indígenas exigem a revogação do Decreto nº 7.056, assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 28 de dezembro último, dispondo sobre a reestruturação da Fundação Nacional do Índio (Funai). Eles reivindicam ainda nomeação de um representante indígena em lugar do atual presidente do órgão Márcio Meira e a criação do Conselho Nacional dos Direitos Indígenas, composto exclusivamente por índios.

Muitas crianças e jovens passam os dias no acampamento que completa, hoje, 159 dias. Mas, à noite, elas vão para abrigos e só os adultos pernoitam ao relento - (Carlos Silva/Esp.CB/D.A Press)
Muitas crianças e jovens passam os dias no acampamento que completa, hoje, 159 dias. Mas, à noite, elas vão para abrigos e só os adultos pernoitam ao relento
O clima no local é tenso. No acampamento há muitas crianças e jovens. Mas apenas os adultos pernoitam ao relento. Os manifestantes estão determinados a ficar o tempo que for preciso, até que o governo atenda às suas exigências. Mas temem uma nova tentativa de retirada pelas forças policiais. No último sábado, durante a ação, a polícia confiscou barracas, cobertores e alimentos, na tentativa de demovê-los da intenção de voltar à Esplanada. Muitos dos materiais confiscados foram doados por igrejas, pela população e pelo Sindicato dos Servidores Públicos Federais do DF (Sindsep-DF). Houve confronto. Um índio e um ativista do movimento indígena, que filmava a ação da polícia, foram detidos por policiais.

O Decreto nº 7.056 substituiu as antigas administrações executivas regionais e postos indígenas da Funai por coordenadorias técnicas. Os líderes tribais discordaram da mudança. Para eles, as administrações regionais e os postos eram os meios pelos quais as comunidades se conectavam com o governo federal. As negociações para reverter a alteração não deram resultado, o que levou os representantes indígenas a decidirem pela ocupação da Esplanada e, assim, chamarem a atenção das autoridades para a insatisfação das comunidades.

Mais servidores
O presidente da Funai, Márcio Meira, garante que a criação das coordenadorias técnicas é positiva, pois permitirá ao órgão a contratação de um número maior de servidores para atender às comunidades indígenas. Segundo ele, o decreto é apoiado pela Comissão Nacional de Política Indigenista e pela maioria das organizações indígenas do Brasil. Para Meira, os manifestantes não têm representatividade. “As coordenações técnicas têm equipes melhores. Ganhamos 85 cargos novos e estamos contratando 425 servidores. Serão 297 coordenadores técnicos locais e 36 coordenações regionais em todo o Brasil. Estamos realizando seminários para explicar a reestruturação. Só que isso fere interesses específicos de pessoas que perderam cargo e benefício”, afirma

Carlos Pankararu, um dos líderes do acampamento, discorda e afirma que a nova estrutura não tem poder para agir e apoiar os povos indígenas. “Eles tiraram a estabilidade da Funai. Eles fazem isso porque muitos dos projetos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) são em terras indígenas”, acusa Carlos Pankararu.

Edileida Guajajara, da etnia guajajara, afirmou que o decreto provocou um clima de incerteza em sua aldeia sobre o atendimento de itens básicos como educação e até emissão de documentos. Ela explica que teme não ter acesso aos direitos garantidos a todos os cidadãos brasileiros. “Quando tem invasores nas terras, acionamos a Funai, que chama a Polícia Federal, que nos protege. Essa proteção, a gente não tem mais, desde que surgiu esse decreto”, reclama

Para o secretário adjunto do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Cléber Busato, ambos os lados precisam fazer concessões. “É preciso contextualizar a crise. Por um lado, a situação criada tem relação direta com a iniciativa do governo federal, que restruturou a Funai sem considerar as participações dos povos indígenas na elaboração do decreto. A indignação deles vem daí. Por outro lado, os acampados são contrários à criação do Conselho Nacional de Política Indigenista, como previsto em um projeto de lei em tramitação no Congresso Nacional, resultado de debates com as lideranças indígenas nos últimos anos”, explica. Embora o Cimi compreenda o entendimento dos acampados, diverge da resistência do grupo em relação ao projeto de lei.

Resistência dos índios começa a ser reconhecida pela imprensa

Nem um dia sequer a Esplanada dos Ministérios ficou sem a presença de índios. Apesar da desocupação forçada, da retirada das barracas e das comidas, dos pertences dos índios, ELES E ELAS resolveram ficar.

Eram 40, já são 80, pois ontem mesmo já tinha chegado mais um ônibus do Maranhão com representantes dos Guajajara. Virão mais em breve, não tem outra.

Todos estão apreensivos. Que resistência formidável! Que determinação!

Por outro lado, que crueldade da Funai e do governo Lula!

Eles vão ter abrir, com ou sem vergonha. Os índios resistirão!

PS O lamentável nessas reportagens, especialmente a do Estado de São Paulo, é que querem reduzir o protesto indígena à recuperação de cargos, pela demissão de alguns índios funcionários com DAS. Esta é a atitude que a atual direção da Funai vem divulgando interna e externamente, e os jornalistas mais ingênuos se apegam a isso. Não vêm o que está acontecendo com os povos indígenas pelo Brasil a fora e usam de uma explicação simplória para encobrir sua ignorância.

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Índios afirmam que ficam


Justiça determinou desocupação da área e Operação recolheu barracas e utensílios

TRIBUNA DO BRASIL
Emanuelle Coelho

Os cerca de 80 índios que ocupam a Esplanada dos Ministérios há seis meses garantem que vão permanecer no local. A Justiça determinou que eles desocupem a Esplanada. Em uma operação no sábado passado, policiais militares, civis, federais e fiscais do governo recolheram as barracas e utensílios.  Sem a mínima estrutura, com banheiro improvisado, dormindo em redes, e com dificuldades para se alimentar, afirmam que o acampamento não é feito de lona, mas sim de pessoas. Algumas mulheres e crianças foram encaminhadas para abrigos nas regiões administrativas de Vicente Pires e Paranoá, mas algumas ainda permanecem no acampamento. 

O índio Taponoyê Xukuru, um dos líderes do movimento, diz que o espaço é público e que ninguém pode tirar o direito do cidadão de ir e vir. “Estamos passando frio à noite e ficando no sol durante o dia. Não podemos receber doações porque os policias não deixam. Mas ninguém sai daqui enquanto não atenderem nossas reivindicações”, afirma. A luta é pela destituição imediata do presidente da Funai, Márcio Meira, a reabertura de unidades regionais da Fundação Nacional do Índio e a pela revogação do  Decreto Presidencial 7056/09. O documento extingue 42 administrações regionais, 400 postos indígenas e substitui antigos servidores da Fundação Nacional do Índio (Funai). “Com esse decreto, não respeitam nossos direitos. Estão fazendo com que os brancos tenham acesso às aldeias para mineração em terras indígenas”, especifica Taponoyê. 

Ontem pela manhã, os indígenas se reuniram com o senador Cristovam Buarque. O encontro discutiu a ação dos policiais. Para os índios, houve abuso de poder durante a operação de sábado. Na reunião, o senador teria dito que vai estudar o decreto, para propor uma reforma ou uma revogação. Os manifestantes foram ainda no Ministério Público do Distrito Federal e dos Territórios (MPDFT) para tentar reaver os pertences confiscados no sábado.

Também nesta segunda-feira, um ônibus com aproximadamente 40 indígenas da tribo Guajajara ( Maranhão) chegou ao local para reforçar o  movimento. De acordo com as lideranças locais, mais índios de todas as partes do país chegarão durante a semana. 

Para a cacica Antônia de Souza Guajajara, da Aldeia Tamarindo, no Maranhão, a situação está muito precária. “Estamos arriscando nossas vidas. Mas vai valer a pena por estamos aqui para defender nossos direitos. Não temos mais atendimento nem da saúde nem da educação, não temos remédios, não temos nada. Não respeitaram nosso Estatuto. Índios nós somos e vamos morrer índios”, frisa. 

Chorando, a  índia Edileide Guajajara diz que está no local porque foram retirados seus direitos. “Invasores estão entrando em nossas áreas, caçadores entram em nossas terras. Vamos ficar aqui até quando resolverem nossas causas para nós. Posso morrer, mas vou morrer com dignidade aqui”, relata. 

A Polícia Militar permanece monitorando o movimento A corporação afirma que não pode proibi-los de ficar no local, mas que eles não têm permissão de montar novas barracas. 

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Depoimento de testemunha da destruição do AIR

Companheir@s,

Estive no acampamento indígena na manhã quando se dava a ação truculenta do
BOPE. Quando chegamos, eu e um companheiro do movimento indígena varamos o
cordão policial em torno dos indígenas, e começamos a mobilizar a imprensa e
jornalistas que conhecíamos. Não pudemos fazer muito, pois a polícia militar
começou a operação covardemente as 05h da manhã, e só fomos avisados quando
já era dia.

Quando chegamos lá havia aproximadamente 3 a 4 policiais para cada indígena,
e imediatamente começamos a fazer o que podíamos. Levamos uma advogada à 5a
DP, onde estavam detidos o documentarista que teve sua câmera quebrada e
seus filmes roubados, como ele mesmo registrou em queixa na delegacia. O
índio tupinambá estava machucado, com muito medo, e assim que saímos de lá
ele foi encaminhado ao IML. Quando estávamos na 5a DP imediatamente um
funcionário da FUNAI, supostamente "ouvidor", nos interpelou agressivamente,
enquanto outro nos fotografava. Os enfrentamos e a resposta cínica foi que
as perguntas e as fotos eram porque eles eram "curiosos".

Quando voltamos ao acampamento, ainda com as crianças muito assustadas e
algumas chorando, a menina citada na carta - menor de idade - voltava do
hospital. Seus documentos foram tomados pela FUNAI para que não pudessem
servir de base para processar o Estado. Como na carta das mulheres está
escrito, ela havia abortado uma gestação de aproximadamente 3 meses, e como
se não bastasse esta violência,  sofreu grande violência psicológica e
ameaças para que não levasse o caso adiante.

Nessa hora voltava ao acampamento o índio Corubo, a quem os policiais
tentaram prender também sem acusação, mas que havia conseguido fugir. Mesmo
sem saber falar bem português, ele foi ao Supremo Tribunal Federal e
requisitou uma audiência com o plantonista que lá estava. Ao chegarem no STF
a ordem recebida nos portões era de não deixar os índios entrarem.

Fiquei muito impressionado com o que li no Correio Braziliense e no Globo
(G1). Os jornalistas que presenciaram tudo estavam chocados com as histórias
que ouviram, de crianças de 2 e 4 anos vomitando sangue e se contorcendo por
terem tomado gás de pimenta no rosto, enquanto o BOPE arrancava seus pais de
seus barracos no frio da madrugada aos gritos "Acorda vagabundos!". Nada
disso saiu nos jornais, onde a tônica era que a polícia foi chamada a "fazer
cumprir a lei". Ninguém reportou quem os chamou, ou qual lei foi cumprida.

Novamente, como no ano passado em que os Kayapós agrediram um engenheiro da
CHESF e foram rotulados de ignorantes e instransigentes, não se deu voz aos
índios para contarem sua versão história. Naquele momento, não mostraram a
fala em que este engenheiro transformado em vítima pela mídia os provoca e
ofende insinuando que a alternativa para as mulheres era a prostituição, e
aos homens Kayapó vender  pipoca nas obras. Nada disso é de hoje, mas
novamente a informação não chega as pessoas. Desta vez a estratégia foi
abafar o caso, e amanhã provavelmente nada sairá nos jornais, televisões e
portais de notícias.

Estes índios protestam contra a extinção de postos indígenas que ligam suas
aldeias a quem os devia proteger - a FUNAI, mas que covardemente nega a eles
até mesmo o reconhecimento de serem povos indígenas! Estas autoridades não
estavam lá, e não ouviram as maldições que em várias línguas foram lançadas
contra elas nas pajelanças daqueles que elas dizem não serem índios.

Estas pessoas que o governo diz não serem índios estavam lá protestando
contra a mineração e os grandes empreendimentos em terras indígenas, como a
funesta Usina de Belo Monte. Onde houveram estas obras antes no Brasil e em
outros países elas somente trouxeram doenças, prostituição, alcoolismo e
crime para os povos tradicionais. Isto é inclusão social pela prostituição e
a marginalidade nos centros urbanos. Nada diferente dos militares.

Este ato criminoso do Estado Brasileiro contra seus povos originais
demonstra não apenas o intenso desprezo e preconceito das autoridades.
Demonstra a completa percepção de impunidade na violação dos Direitos
Humanos quando os atingidos são os povos indígenas, mesmo estando a 1km do
Congresso Nacional, dos Tribunais e do Palácio do Planalto.

Mesmo assim eles continuam no local. Ongs, professores, sindicalistas,
voluntários e militantes estão os ajudando de todas as maneiras que podem.
Sua comida foi jogada fora pela polícia. Seus cobertores foram levados. Até
mesmo a fossa séptica instalada foi retirada. Mas eles continuam no local.

Divulgue a carta das mulheres e esta mensagem.


Marcos Woortmann - voluntário

domingo, 11 de julho de 2010

Nem tudo está perdido: 50 índios do AIR permanecem em frente ao Ministério da Justiça

A resistência indígena parece sem limites. Pois não é que 50 índios continuam a fazer ponto no Ministério da justiça?! Armaram suas redes debaixo das árvores que ficam na Esplanada dos Ministérios, como se estivessem na caça de espera!

Tanta vontade, tanta determinação. Algo importante no panorama indigenista está com esses índios. É um espirito digno de heroísmo.

Por sua vez, é uma vergonha que o Ministério da Justiça e que o governo Lula como um todo não respeitem isso e não revejam a posição que tomaram a favor dessa atual direção do órgão.

E as associações indígenas, a COIAB, a APOINME, a ARPINSUL, a ARPIPAN e outras -- não fazem nada? Não se dão conta dessa bravura e dessa determinação? Vão abandonar esse povo que aí está em Brasília?

E as ONGs, o CIMI, o que fazem? Por que não vêm o que está acontecendo? Ao contrário, parecem estar felizes com a desgraceira que tomou conta da Funai e com o desprezo que os povos indígenas vêm sofrendo!

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Índios permanecem na Esplanada dos Ministérios e dormem embaixo de árvores



Correio Braziliense
Camila de Magalhães
Publicação: 11/07/2010 08:41 Atualização: 11/07/2010 10:29

Apesar da retirada das barracas montadas no gramado da Esplanada dos Ministérios na manhã de sábado (10/7), cerca de 50 indígenas ainda permanecem no local. Eles se abrigaram embaixo de um conjunto de árvores próximo ao Palácio da Justiça e passaram a noite em redes, com os poucos pertences que sobraram.

Não houve tumulto durante a noite, e a Polícia Militar permanece monitorando o movimento. A corporação afirma que não pode proibi-los de ficar no local. Eles não têm permissão, no entanto, de montar novas barracas ou outro tipo de construção.

Ontem, após a ação de retirada, eles receberam alimentos e outros donativos de Organizações Não-Governamentais, associações e sindicatos. Parte das mulheres e crianças foi encaminhada para abrigos em Vicente Pires e no Paranoá, mas ainda restam algumas delas no acampamento.

O grupo diz que não se manifestará neste domingo (11/7), mas que ao longo do dia e nesta segunda-feira, 500 indígenas de todo o Brasil devem chegar à capital para uma manifestação junto ao Congresso Nacional.

sábado, 10 de julho de 2010

VERGONHA NACIONAL: covardemente Governo destroi Acampamento Indígena Revolucionário

Para comemorar os 100 de indigenismo brasileiro o Governo Lula monta um desmesurado aparato de destruição de uma das mais interessantes experiências já feitas no Brasil por índios.

O Acampamento Indígena Revolucionário foi desmontado à força hoje de manhã pelas tropas da Policia Federal, Guarda Nacional, BOPE, Polícia Civil e Polícia Militar, a pedido do Ministério da Justiça e do Distrito Federal. Um mês atrás o ministro da Justiça tinha recebido diversas lideranças do AIR pedindo para que ele fosse desmontado. Em troca, o ministro prometera atender algumas das principais reivindicações do AIR. Porém, nada disso aconteceu.

A destruição do AIR foi realizada à força, na base da intimidação. Nem ordem de despejo tinham em mãos os policiais que chegaram hoje de manhã.

1.000 policiais foram jogados contra 140 índios, a maioria mulheres e crianças, que permaneciam feito testemunhas de protesto contra a pouca vergonha montada pela atual administração da Funai.

Nunca antes na história desse país o governo federal tinha investido brutalmente contra um grupo de indígenas que protestavam contra um ato devastador para suas vidas e para a continuidade da assistência do Estado para com suas comunidades.

Em nota à imprensa a atual direção da Funai declara que as negociações com os indígenas do AIR haviam se esgotado. Ora, quando, em 100 anos de história do indigenismo, se considerou que houve finalização nas negociações com índios! O indigenismo é uma negociação permanente entre sociedade brasileiro e povos indígenas !!! Na verdade, não houve negociações e sim imposições. Nenhuma das reivindicações dos índios foi tratada! O âmago das reivindicações era o Decreto 7506/09 que havia extinto 23 Administrações Regionais e 327 postos indígenas, substituindo parte deles por coordenações localizadas em cidades. Até agora, apesar de uma determinação expedida pelo ministro da Justiça, nenhuma mudança nesse decreto aconteceu.

100 anos de indigenismo rondoniano jogados no ralo.

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Indígenas acampados na Esplanada dos Ministérios são retirados à força por policiais




Correio Braziliense
Ana Elisa Santana
Naira Trindade
Publicação: 10/07/2010 09:14 Atualização: 10/07/2010 10:44


Aos gritos de "acorda, bando de vagabundo", os cerca de 100 índios que estavam acampados na Esplanada dos Ministérios há mais de seis meses foram retirados à força na manhã deste sábado (10/7).

A operação de retirada começou por volta das 5h, com a participação de cerca de mil policiais militares e soldados do Batalhão de Operações Especiais (Bope). De acordo com os índios, eles chegaram ao local jogando spray de pimenta em qualquer pessoa que contrariasse a ordem de sair do gramado, e não pouparam nem mesmo crianças. Todas as barracas foram destruídas.

Os policiais não apresentaram aos índios uma ordem de despejo. De acordo com a assessoria do Minsitério da Justiça, o pedido de retirada teria saído do Governo do Distrito Federal (GDF).

Quatro pessoas precisaram ser hospitalizadas. Duas crianças, uma de 2 e outra de 6 anos, foram levadas ao Hospital Materno Infantil de Brasília (HMIB). Uma jovem de 18 anos teve uma crise nervosa e foi encaminhada ao Hospital Regional da Asa Norte (HRAM), junto a uma mulher de 27 anos, grávida de cinco meses, com dores na barriga. Há suspeita de que a gestante tenha perdido o bebê.

Outros quatro foram presos, entre eles dois índios, um homem que seria assessor dos indígenas, e um estrangeiro, que foi encaminhado à Polícia Federal.

Por volta das 9h10, os indígenas faziam uma "dança do luto" em frente ao Congresso Nacional.

Reivindicação

O acampamento, que começou em janeiro, é uma manifestação para pedir revogação do Decreto Presidencial 7.056/09, que extingue 40 administrações regionais e 337 polos indígenas, além de substituir antigos servidores da Fundação Nacional do Índio (Funai). Ao todo, 15 administrações serão fechadas ou reestruturadas em diversos estados do país. 

Os índios pedem ainda a destituição do cargo do presidente da Funai, Márcio Meira.

 
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