Em artigo publicado pelo jornal Folha de São Paulo, o Relator Especial para Direitos Indígenas da ONU, James Anaya, fala sobre o aniversário de um ano da Declaração Universal dos Direitos dos Povos Indígenas, votado pela Assembléia Geral da ONU.
Anaya discorre sobre a importância dessa Declaração para que os povos indígenas obtenham o respeito devido dos países onde vivem e tenta amenizar as dúvidas sobre os supostos perigos que essa Declaração pode suscitar nas mentes de nacionalistas dos diversos países onde há povos indígenas.
Como se sabe, a Declaração vem sendo criticada por muitas pessoas no Brasil. Entre elas, militares, nacionalistas e anti-indigenistas em geral. Mas também, surpreendentemente, pelo próprio ministro Carlos Ayres Britto, que recentemente proferiu um voto excepcional em favor dos índios da Terra Indígena Raposa Serra do Sol. Assim, uma explicação compreensiva seria de muita importância para que essas pessoas se abalizassem melhor do conteúdo, da importância e das conseqüências dessa Declaração no contexto de outras declarações universais e para os seus países.
No seu artigo, a defesa da Declaração feita por Anaya é cursiva. Parece que não intenciona persuadir ninguém, como se não considerasse que houvesse problemas, ou que os problemas fossem simples resultados de invencionices e preconceitos. Declara inclusive que a Declaração não está tendo problemas de aceitação em outros países, o que não me parece ser uma realidade. Diz que a votação na ONU foi tranqüila, quando, na verdade, teve oposição de muitos países, capitaneada pelo bloco africano, e precisou de muita diplomacia por parte de diversos países para se contornar as dúvidas. O próprio Brasil fez voto separado e com caveats no momento da votação.
Creio que a Declaração Universal dos Direitos dos Povos Indígenas é uma importante declaração para a humanidade. É um documento de redenção e de ascensão dos povos indígenas, o último segmento da humanidade que permanecia ignorado e esquecido, pois se o pensava em vias de desaparecimento da face da Terra. Acontece que muitos povos indígenas sobreviveram ao holocausto da invasão européia em seus países e agora pretendem ter o seu espaço no concerto da humanidade. Essa Declaração chama atenção para esse fato. O reconhecimento do valor dos povos indígenas, de suas culturas, tradições, terras e de seus direitos humanos, individuais e coletivos, é imprescindível para que a própria Humanidade se encontre consigo mesma. Eis o seu sentido maior.
Que perigo ela oferece para os países que a assinaram? Embora a Declaração contenha o artigo que explicita a autodeterminação, que é o conceito a partir do qual a ONU reconhece direitos de autonomia política a nações insurgentes, o que significa ipso facto o direito de povos livres determinarem sua condição política, esse conceito está circunscrito aos tempos políticos atuais em que a soberania dos países onde os povos indígenas estão inseridos prevalece sobre a intencionalidade subscrita no conceito de autodeterminação. A Declaração assim o concebe em espírito e na letra.
Muitos brasileiros de boa fé têm se preocupado com a Declaração e especialmente com as conseqüências que podem advir do conceito de autodeterminação. O Ministério das Relações Exteriores brasileiro tem sido atacado por ter assinado essa Declaração sem consulta com outras instâncias nacionais, inclusive o Ministério da Defesa e o Congresso Nacional.
Por sua vez, os anti-indigenistas tradicionais aproveitam dessa Declaração para vociferar sua atitude política contrária à permanência dos povos indígenas no panorama político brasileiro. Os fazendeiros cujas terras estão em disputa com os índios também clamam uma contrariedade sem fim. Até intelectuais do peso de Denis Rosenfield argumentam irracionalmente, como da razão não fizessem motivo de suas vidas, e como se essa Declaração pusesse o Brasil em perigo iminente de ser desmembrado em centenas de pedacinhos.
Acho, por tudo isso, que a Declaração merece ser discutida em nosso país. Não é matéria simples, mas também não pode ser condenada a esmo.
Conclamo o Congresso Nacional a fazer um seminário para isso e convide a todos para debater esse assunto. Eu mesmo fiz parte das últimas seis reuniões internacionais que discutiram esse tema. Alguns indígenas brasileiros, como Azelene Kaingang e Vilmar Guarany, também estiveram presentes nesses debates. O Itamaraty acompanhou todas as discussões e mantém minutas detalhadas de todos os pontos discutidos. Portanto, a hora é chegada. Assim teremos nossas próprias explicações sobre essa Declaração e uma melhor oportunidade para que todos formem sua melhor opinião sobre o assunto.
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Direitos dos índios não são ameaça
Folha de São Paulo, James Anaya
Os povos e indivíduos indígenas, suas culturas e modos de vida estão à altura de todos os outros em dignidade e valor
HÁ UM ano, no dia 13 de setembro de 2007, a Assembléia Geral da ONU adotou a Declaração sobre os Direitos dos Povos Indígenas, marcando o fim de anos de estudos e trabalhos conjuntos entre governos, povos indígenas e especialistas de todo o mundo.
Ao adotar a declaração, a mais importante instituição de sociedade organizada do mundo -as Nações Unidas- proclamou o que deveria ter sido afirmado há muito tempo, mas não era amplamente aceito: que os povos e indivíduos indígenas, suas culturas e modos de vida estão à altura de todos os outros em dignidade e valor.
A declaração não estabelece novos direitos exclusivos para os povos indígenas, mas simplesmente toma princípios básicos de direitos humanos, que são aplicáveis a todos, e os detalha dentro do contexto histórico, cultural, político e social específico dos povos indígenas. Ela visa superar a marginalização e a discriminação que os povos indígenas têm enfrentado em todo o mundo como resultado dos históricos processos de colonização, conquista e desapossamento.
A declaração é também um lembrete de que a opressão contra os povos indígenas infelizmente persiste até hoje e convoca os governos e a comunidade internacional a colocar um fim nessa opressão e a adotar medidas afirmativas para implementar os direitos humanos que têm sido negados aos povos indígenas. O Brasil é um dos 143 países cujos governos votaram pela adoção da declaração na Assembléia Geral da ONU, integrando um consenso global que tem sido construído ao longo dos anos. Apenas os governos de quatro países votaram contra a declaração e 11 se abstiveram.
É importante observar que cada um dos países que votaram contra a declaração -Austrália, Canadá, Estados Unidos e Nova Zelândia- explicou seu voto à Assembléia Geral, expressando apoio aos princípios fundamentais da declaração, mas apontando apenas para algumas disposições que eram vistas como problemáticas ou para imperfeições no processo que levou à adoção da declaração.
Muitos dos Estados que se abstiveram deram explicações semelhantes.
Nenhum governo manifestou oposição aos aspectos essenciais da declaração nem a enxergou como em conflito com suas Constituições ou sistemas políticos. Pelo contrário, a visão predominante, expressa pelos governos de todo o mundo ao votar a favor da declaração, foi a de que ela fortaleceria a construção de sociedades democráticas e de unidade nacional, com base no respeito à diversidade. A declaração avança um modelo de inclusão dos povos indígenas com o tecido social maior dos Estados que respeita padrões culturais distintos, sistemas de autoridade e formas de ocupação de terras tradicionais.
Esse modelo, em geral, é visto no mundo não apenas como compatível, mas também necessário para a construção de sistemas políticos e jurídicos democráticos fortes nos países em que os povos indígenas vivem.
O direito dos povos indígenas à "autodeterminação", como previsto na declaração, simplesmente significa que eles têm direito de controlar suas vidas e comunidades e de participar em todas as decisões que os afetem, dentro da estrutura vigente de unidade nacional e de integridade territorial de cada país.
O termo "territórios", também usado na declaração, é uma referência aos espaços geográficos nos quais os povos indígenas viveram e ainda buscam seguir vivendo e não tem nada a ver com uma possível soberania alternativa que afete a soberania nacional.
A referência da declaração aos grupos indígenas como "nações" ou "povos" serve para reconhecer seu caráter e existência como comunidades que transcendem gerações, com coesão política e cultural significativa, que eles procuram manter e desenvolver. Esses termos são usados no sentido de que nações e povos indígenas são distintos, mas também fazem integralmente parte da nação maior e do povo dos países em que vivem.
No mundo, as inquietações acerca da declaração com foco nesses termos estão diminuindo e é provável que desapareçam por completo, significando que a declaração e seus fundamentos de direitos humanos são mais bem compreendidos.
A tendência atual é acolher integralmente a declaração e dedicar-se à tarefa de fazer de seus termos uma realidade, bem como de construir ordens sociais e constitucionais mais justas para todos.
JAMES ANAYA , 49, professor do Programa de Direito e Política Indígena da Universidade do Arizona (EUA), é o relator especial das Nações Unidas para Direitos Humanos e Liberdades Fundamentais dos Povos Indígenas. Esteve em missão no Brasil em agosto deste ano.
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segunda-feira, 15 de setembro de 2008
Exército prepara intervenção em terras indígenas em Mato Grosso
Se essa notícia for verdadeira, então a Funai está perdida no mato e sem cachorro. Não é possível que o Exército esteja com planos de intervir diretamente em 22 terras indígenas na fronteira do estado do Mato Grosso com a Bolívia, sem que a Funai esteja sabendo e sem que haja motivos reais para tanto.
A justificativa que consta nessa notícia é de que essas terras indígenas estão "abandonadas" pela Funai, e fervilham com a presença de gente estranha, especialmente traficantes de drogas e Ongs. Os dois como se fossem iguais, o que é um absurdo. Esta justificativa e esse tal plano só existem porque a situação chegou a tal ponto que a Funai perdeu a legitimidade política de ser o órgão responsável para a intermediação entre o Estado e os povos indígenas brasileiros.
Por outro lado, a notícia relata o quanto o Exército está desequipado, sem recursos e sem pessoal. Com que base então o Exército interviria? Bem, parece que o plano seria a motivação principal para o Exército obter recursos e pessoal. Aí é demais! Não que o Exército não mereça se reequipar e exercer um papel mais forte nas fronteiras brasileiras, mas crescer em cima da coitada da Funai e do abandono dos índios é uma injustiça histórica!! Rondon não aceitaria isso.
O procurador da Funai, Cézar Lima do Nascimento, em entrevista, parece que se mostrou favorável à intervenção do Exército, em preferência à presença embusteira de Ongs e traficantes. É o desespero de funcionários do órgão que ainda buscam alguma saída com dignidade.
Com tanto recurso financeiro que o governo vem obtendo de impostos, é lamentável que nada tenha sido feito pela Funai e pelos índios até agora. Boa parte dos recursos são pulverizados entre diversas agências governamentais. Gasta-se desavergonhadamente com programas inventados pelos "companheiros", programas que nada acrescentam para o bem-estar dos povos indígenas, para a garantia de suas terras e para sua melhor participação na vida nacional.
Diante desse descalabro, o Exército quer ter sua vez. Eis o que apreendemos desse propósito.
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Exército prepara ocupação de terras indígenas em MT
A Gazeta, Cuiabá, Rose Domingues
Há estudos que apontam infiltração de grupos entre índios para praticarem tráfico de drogas, retirada ilegal de madeiras e biopirataria
O comando da 13ª Brigada da Infantaria Motorizada já aprontou o plano de ocupação de 22 terras indígenas em 28 municípios mato-grossenses que estão na faixa de fronteira com a Bolívia e na divisa com Rondônia, onde estão índios principalmente das etnias Paresis e Nhambiquara. O comandante da brigada, general Theófilo Gaspar Oliveira, diz que a proposta será formalizada aos ministérios da Defesa e de Assuntos Estratégicos até o dia 22 de outubro. O objetivo é impedir a utilização desses espaços para atuação do crime organizado, exploração de madeireiras e organizações não-governamentais (ONGs) que chegam a Mato Grosso para praticar biopirataria.
Ele diz que a situação é desoladora em algumas aldeias, como a Sararé, na região de Pontes e Lacerda, onde os índios têm sido afetados de maneira incisiva pela influência frequente dos homens brancos, ao transmitir todo tipo de doença. Nas investigações feitas na região que ocupa cerca de 700 km de fronteira seca, numa extensão de 1,3 mil km, parte da população desses povos está com desnutrição, alto índice de mortes por gripe, alcoolismo e até doenças sexualmente transmissíveis, como Aids. A legislação permite poder de polícia aos militares nesse território de segurança nacional. Na região de Cáceres, a estrada de acesso à Bolívia passará a ser intensamente fiscalizada com uma base do Exército e uma delegacia da Receita Federal que já está em fase de construção.
Por falta de efetivo na segurança, o Destacamento Militar de Corixa (71 km de Cáceres e 296 da Capital) entre Brasil e Bolívia está entregue à própria sorte. Qualquer pessoa pode atravessar o limite entre os países a pé ou de bicicleta ou de carro. O acesso é fácil a San Mathias. Mesmo diante desse problema, hoje apenas o 2º Batalhão de Fronteira faz toda guarda, com poucos homens em serviço. Para que o projeto de ocupação dê certo, será necessário o governo federal redirecionar das regiões Sul e Sudeste reforço mínimo de 4 mil soldados só na fronteira, incluindo a manutenção de bases em diversos municípios, como Tangará da Serra, Nova Olímpia, Porto Estrela, Comodoro, Vila Bela da Santíssima Trindade, Pontes e Lacerda e Campos de Julio.
Descaso - Mesmo estando na porta de entrada para a cocaína que alimenta o tráfico de drogas das principais favelas de São Paulo e Rio de Janeiro, o Estado está abandonado. Cerca de 2,5 mil soldados compõe o Exército, enquanto o vizinho Mato Grosso do Sul conta com 11 mil homens. Outro ponto crítico: as rodovias. Apenas 5% são pavimentadas. Diferente das demais faixas de fronteira brasileira, nessa região não há meios de trafegar em estradas ilegais, conhecidas por "cabriteiras". Sem equipamentos sofisticados, será complicado fazer o monitoramento. O general sugere a aquisição de veículos aéreos não tripulados (VANT), de fabricação iraniana, mas que têm protótipos em Porto Alegre (RS). São aeronaves conduzidas por controle remoto e equipadas com câmeras. Elas têm condições de captar imagens computadorizadas a altura acima de jatos comerciais.
Uma das primeiras providências já acertadas inclui a ida de um esquadrão de cavalaria para Pontes e Lacerda (448 km a oeste de Cuiabá). Já em Sinop, o reforço vem da implantação da segunda sede da Polícia Federal do Estado, com a transferência da companhia de Três Lagos (MS). A cooperação entre as corporações de segurança federais e estaduais servirão para intensificar a fiscalização, hoje deficitária. Os ônibus e veículos devem ser parados e revistados a partir da utilização de cães farejadores, o que vai minimizar o impacto junto à população. "Vamos reunir a experiência de cada uma das instituições para poder fazer frente ao crime organizado, que hoje leva vantagem".
Espionagem - A vigilância adequada exige também a aquisição de viaturas, embarcações, voadeiras (barcos com motores modernos e potentes) e reforço no serviço de inteligência. Depois de atuar 5 anos em Cáceres, a juíza da 2ª Vara Criminal, Selma Arruda, sabe em que terreno está pisando. A instabilidade política no país do presidente boliviano Evo Morales aumentou a tensão. "O problema social na Bolívia beira o caos e com um fundo criminoso, porque a produção da droga é o que sustenta a família dessa gente".
A juíza entende que há necessidade de intervenção imediata, o Estado precisa estender a atuação contra o crime organizado no atacado e não no varejo, porque senão perde a eficiência. É preciso olhar o aspecto histórico e geográfico, já que há indícios de que Mato Grosso esteja na mira de facções como Primeiro Comando da Capital (PCC), Comando Vermelho e das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) que já se instalaram em Rondônia.
Retomada histórica - Ainda não se sabe quanto ou o que exatamente virá para o Estado. O general pontua que já existem 3 grandes projetos para serem colocados em prática a partir do ano que vem, uma delas é a reativação da indústria bélica com aquisição mísseis terra-terra e terra-ar, compra de 51 helicópteros, sendo 17 para cada uma das Forças Armadas, com entrega prevista até 2010. Hoje, o Exército em Mato Grosso não conta com nenhum helicóptero. Depois dos "anos de chumbo" durante a Ditadura Militar, a corporação perdeu força e ainda é vista com certo receio pela população. "Nós devemos encontrar um meio de estar em atuação na sociedade".
FUNAI - O procurador federal designado para a FUNDAÇÃO NACIONAL DO ÍNDIO (FUNAI) em Mato Grosso, Cezar Lima do Nascimento, avalia de maneira positiva a ocupação das terras indígenas na fronteira, até como uma forma de levar outros serviços essenciais nas áreas da saúde e educação para as aldeias, além de ajudar na proteção efetiva dos territórios constantemente invadidos. "Tenho resistências às ONGs e às missões religiosas, porque acabam intervindo de maneira abrupta na cultura dos índios, mas o Exército me parece ter um código de ética rígido, vai ser importante tê-los por perto".
A justificativa que consta nessa notícia é de que essas terras indígenas estão "abandonadas" pela Funai, e fervilham com a presença de gente estranha, especialmente traficantes de drogas e Ongs. Os dois como se fossem iguais, o que é um absurdo. Esta justificativa e esse tal plano só existem porque a situação chegou a tal ponto que a Funai perdeu a legitimidade política de ser o órgão responsável para a intermediação entre o Estado e os povos indígenas brasileiros.
Por outro lado, a notícia relata o quanto o Exército está desequipado, sem recursos e sem pessoal. Com que base então o Exército interviria? Bem, parece que o plano seria a motivação principal para o Exército obter recursos e pessoal. Aí é demais! Não que o Exército não mereça se reequipar e exercer um papel mais forte nas fronteiras brasileiras, mas crescer em cima da coitada da Funai e do abandono dos índios é uma injustiça histórica!! Rondon não aceitaria isso.
O procurador da Funai, Cézar Lima do Nascimento, em entrevista, parece que se mostrou favorável à intervenção do Exército, em preferência à presença embusteira de Ongs e traficantes. É o desespero de funcionários do órgão que ainda buscam alguma saída com dignidade.
Com tanto recurso financeiro que o governo vem obtendo de impostos, é lamentável que nada tenha sido feito pela Funai e pelos índios até agora. Boa parte dos recursos são pulverizados entre diversas agências governamentais. Gasta-se desavergonhadamente com programas inventados pelos "companheiros", programas que nada acrescentam para o bem-estar dos povos indígenas, para a garantia de suas terras e para sua melhor participação na vida nacional.
Diante desse descalabro, o Exército quer ter sua vez. Eis o que apreendemos desse propósito.
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Exército prepara ocupação de terras indígenas em MT
A Gazeta, Cuiabá, Rose Domingues
Há estudos que apontam infiltração de grupos entre índios para praticarem tráfico de drogas, retirada ilegal de madeiras e biopirataria
O comando da 13ª Brigada da Infantaria Motorizada já aprontou o plano de ocupação de 22 terras indígenas em 28 municípios mato-grossenses que estão na faixa de fronteira com a Bolívia e na divisa com Rondônia, onde estão índios principalmente das etnias Paresis e Nhambiquara. O comandante da brigada, general Theófilo Gaspar Oliveira, diz que a proposta será formalizada aos ministérios da Defesa e de Assuntos Estratégicos até o dia 22 de outubro. O objetivo é impedir a utilização desses espaços para atuação do crime organizado, exploração de madeireiras e organizações não-governamentais (ONGs) que chegam a Mato Grosso para praticar biopirataria.
Ele diz que a situação é desoladora em algumas aldeias, como a Sararé, na região de Pontes e Lacerda, onde os índios têm sido afetados de maneira incisiva pela influência frequente dos homens brancos, ao transmitir todo tipo de doença. Nas investigações feitas na região que ocupa cerca de 700 km de fronteira seca, numa extensão de 1,3 mil km, parte da população desses povos está com desnutrição, alto índice de mortes por gripe, alcoolismo e até doenças sexualmente transmissíveis, como Aids. A legislação permite poder de polícia aos militares nesse território de segurança nacional. Na região de Cáceres, a estrada de acesso à Bolívia passará a ser intensamente fiscalizada com uma base do Exército e uma delegacia da Receita Federal que já está em fase de construção.
Por falta de efetivo na segurança, o Destacamento Militar de Corixa (71 km de Cáceres e 296 da Capital) entre Brasil e Bolívia está entregue à própria sorte. Qualquer pessoa pode atravessar o limite entre os países a pé ou de bicicleta ou de carro. O acesso é fácil a San Mathias. Mesmo diante desse problema, hoje apenas o 2º Batalhão de Fronteira faz toda guarda, com poucos homens em serviço. Para que o projeto de ocupação dê certo, será necessário o governo federal redirecionar das regiões Sul e Sudeste reforço mínimo de 4 mil soldados só na fronteira, incluindo a manutenção de bases em diversos municípios, como Tangará da Serra, Nova Olímpia, Porto Estrela, Comodoro, Vila Bela da Santíssima Trindade, Pontes e Lacerda e Campos de Julio.
Descaso - Mesmo estando na porta de entrada para a cocaína que alimenta o tráfico de drogas das principais favelas de São Paulo e Rio de Janeiro, o Estado está abandonado. Cerca de 2,5 mil soldados compõe o Exército, enquanto o vizinho Mato Grosso do Sul conta com 11 mil homens. Outro ponto crítico: as rodovias. Apenas 5% são pavimentadas. Diferente das demais faixas de fronteira brasileira, nessa região não há meios de trafegar em estradas ilegais, conhecidas por "cabriteiras". Sem equipamentos sofisticados, será complicado fazer o monitoramento. O general sugere a aquisição de veículos aéreos não tripulados (VANT), de fabricação iraniana, mas que têm protótipos em Porto Alegre (RS). São aeronaves conduzidas por controle remoto e equipadas com câmeras. Elas têm condições de captar imagens computadorizadas a altura acima de jatos comerciais.
Uma das primeiras providências já acertadas inclui a ida de um esquadrão de cavalaria para Pontes e Lacerda (448 km a oeste de Cuiabá). Já em Sinop, o reforço vem da implantação da segunda sede da Polícia Federal do Estado, com a transferência da companhia de Três Lagos (MS). A cooperação entre as corporações de segurança federais e estaduais servirão para intensificar a fiscalização, hoje deficitária. Os ônibus e veículos devem ser parados e revistados a partir da utilização de cães farejadores, o que vai minimizar o impacto junto à população. "Vamos reunir a experiência de cada uma das instituições para poder fazer frente ao crime organizado, que hoje leva vantagem".
Espionagem - A vigilância adequada exige também a aquisição de viaturas, embarcações, voadeiras (barcos com motores modernos e potentes) e reforço no serviço de inteligência. Depois de atuar 5 anos em Cáceres, a juíza da 2ª Vara Criminal, Selma Arruda, sabe em que terreno está pisando. A instabilidade política no país do presidente boliviano Evo Morales aumentou a tensão. "O problema social na Bolívia beira o caos e com um fundo criminoso, porque a produção da droga é o que sustenta a família dessa gente".
A juíza entende que há necessidade de intervenção imediata, o Estado precisa estender a atuação contra o crime organizado no atacado e não no varejo, porque senão perde a eficiência. É preciso olhar o aspecto histórico e geográfico, já que há indícios de que Mato Grosso esteja na mira de facções como Primeiro Comando da Capital (PCC), Comando Vermelho e das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) que já se instalaram em Rondônia.
Retomada histórica - Ainda não se sabe quanto ou o que exatamente virá para o Estado. O general pontua que já existem 3 grandes projetos para serem colocados em prática a partir do ano que vem, uma delas é a reativação da indústria bélica com aquisição mísseis terra-terra e terra-ar, compra de 51 helicópteros, sendo 17 para cada uma das Forças Armadas, com entrega prevista até 2010. Hoje, o Exército em Mato Grosso não conta com nenhum helicóptero. Depois dos "anos de chumbo" durante a Ditadura Militar, a corporação perdeu força e ainda é vista com certo receio pela população. "Nós devemos encontrar um meio de estar em atuação na sociedade".
FUNAI - O procurador federal designado para a FUNDAÇÃO NACIONAL DO ÍNDIO (FUNAI) em Mato Grosso, Cezar Lima do Nascimento, avalia de maneira positiva a ocupação das terras indígenas na fronteira, até como uma forma de levar outros serviços essenciais nas áreas da saúde e educação para as aldeias, além de ajudar na proteção efetiva dos territórios constantemente invadidos. "Tenho resistências às ONGs e às missões religiosas, porque acabam intervindo de maneira abrupta na cultura dos índios, mas o Exército me parece ter um código de ética rígido, vai ser importante tê-los por perto".
segunda-feira, 23 de junho de 2008
Tarso Genro quer PF nas terras indígenas de fronteira
O governo já tem uma proposta de decreto presidencial para regulamentar a presença de Ongs brasileiras e estrangeiras na Amazônia. Parece que tal proposta se deveu à pressão dos militares quanto ao perigo da soberania nacional em terras indígenas.
As Ongs passarão por um crivo dos ministérios da Defesa e da Justiça. Vai ser burocracia que não acaba mais, a eterna saída para não saber o que fazer neste país. Qualquer sociólogo ou pessoa de governo sabe que a burocracia no Brasil serve para excluir os indesejáveis e incluir aqueles que têm presença amigável junto aos órgãos reguladores. Isto é, as Ongs que já fazem parte do governo se darão bem. Como elas já são financiadas por Ongs estrangeiras, então certamente vão se dar ainda melhor. Vão receber recursos maiores das Ongs estrangeiras porque facilitarão a entrada dessas em terras indígenas ou na Amazônia ou serão propagandistas de seus interesses e visões do mundo.
Pergunto-me: Por que não simplesmente consolidar a presença do Estado nessas regiões? Bastaria recriar a Funai, reestruturá-la, fortalecê-la, bem como escoimar o Ibama de sua, digamos, tendência a deixar as coisas passarem, e dar-lhes Poder de Polícia, além de reforçar a presença do Exército nessas regiões fronteiriças. Melhorar as universidades locais, dar-lhes responsabilidade de firmar acordos mútuos com os povos indígenas, criar institutos de desenvolvimento econômico para os povos indígenas -- seriam idéias muito mais consistentes.
Quanto à proteção das terras indígenas em relação à soberania nacional, o decreto irá criar postos militares da Polícia Federal. O que será isso? Será que a Polícia Federal tem um código de ética e um sentimento de disciplina tão fortes quanto o Exército? Não é de se temer abusos?
Por que não o Exército, que tem uma tradição e é constitucionalmente o defensor da soberania nacional?
Em entrevista à revista Isto É, o ministro Tarso Genro declarou o seguinte:
ISTOÉ - Como o sr. vê a crítica de setores militares à política indigenista do governo?
Genro - Toda política pública sábia tem que ser periodicamente revisada. A preocupação dos militares é justa no seu conteúdo. Mas nossa visão da política indigenista vai ao encontro dessa preocupação dos militares. Nós queremos que o território indígena seja não apenas território nacional, mas propriedade jurídica da União. Ou seja, a soberania exercida de uma forma ainda mais forte. Então, a visão dos militares é justa, mas, me parece, equivocada. A Casa Civil já tem em mãos uma proposta de decreto formulada por mim e pelo ministro Nelson Jobim que determina um programa de instalação de postos militares da Polícia Federal nas zonas indígenas de fronteira.
As Ongs passarão por um crivo dos ministérios da Defesa e da Justiça. Vai ser burocracia que não acaba mais, a eterna saída para não saber o que fazer neste país. Qualquer sociólogo ou pessoa de governo sabe que a burocracia no Brasil serve para excluir os indesejáveis e incluir aqueles que têm presença amigável junto aos órgãos reguladores. Isto é, as Ongs que já fazem parte do governo se darão bem. Como elas já são financiadas por Ongs estrangeiras, então certamente vão se dar ainda melhor. Vão receber recursos maiores das Ongs estrangeiras porque facilitarão a entrada dessas em terras indígenas ou na Amazônia ou serão propagandistas de seus interesses e visões do mundo.
Pergunto-me: Por que não simplesmente consolidar a presença do Estado nessas regiões? Bastaria recriar a Funai, reestruturá-la, fortalecê-la, bem como escoimar o Ibama de sua, digamos, tendência a deixar as coisas passarem, e dar-lhes Poder de Polícia, além de reforçar a presença do Exército nessas regiões fronteiriças. Melhorar as universidades locais, dar-lhes responsabilidade de firmar acordos mútuos com os povos indígenas, criar institutos de desenvolvimento econômico para os povos indígenas -- seriam idéias muito mais consistentes.
Quanto à proteção das terras indígenas em relação à soberania nacional, o decreto irá criar postos militares da Polícia Federal. O que será isso? Será que a Polícia Federal tem um código de ética e um sentimento de disciplina tão fortes quanto o Exército? Não é de se temer abusos?
Por que não o Exército, que tem uma tradição e é constitucionalmente o defensor da soberania nacional?
Em entrevista à revista Isto É, o ministro Tarso Genro declarou o seguinte:
ISTOÉ - Como o sr. vê a crítica de setores militares à política indigenista do governo?
Genro - Toda política pública sábia tem que ser periodicamente revisada. A preocupação dos militares é justa no seu conteúdo. Mas nossa visão da política indigenista vai ao encontro dessa preocupação dos militares. Nós queremos que o território indígena seja não apenas território nacional, mas propriedade jurídica da União. Ou seja, a soberania exercida de uma forma ainda mais forte. Então, a visão dos militares é justa, mas, me parece, equivocada. A Casa Civil já tem em mãos uma proposta de decreto formulada por mim e pelo ministro Nelson Jobim que determina um programa de instalação de postos militares da Polícia Federal nas zonas indígenas de fronteira.
quarta-feira, 11 de junho de 2008
STF adia decisão sobre Raposa Serra do Sol para agosto
O presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, adiou para agosto a decisão a ser tomada sobre o mérito da homologação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol. Teremos assim mais tempo de tensão e expectativas.
O ministro falou que não teme que esse atraso (a retirada dos arrozeiros foi suspensa no começo de abril deste ano, em clima de alta tensão) traga nova "comoção" e alvoroço, se não violência. Considera que a presença de policiais federais irá dissuadir qualquer tentativa de mudança do quadro atual pelo uso da força ou da coação.
De um lado, os índios de Raposa Serra do Sol estão conclamando nova reunião entre eles para decidir que táticas usar diante dessa delonga. E, por sua vez, o governo Lula continua firme no apoio à homologação daquela terra indígena. Ontem mesmo os ministros Tarso Genro e Marina Silva defenderam a homologação com os argumentos de respeito aos direitos constitucionais dos índios e a ausência de perigo de terras indígenas em fronteiras nacionais.
De outro lado, os arrozeiros, os políticos de Roraima e os militares aposentados estão em alta campanha para angariar apoio popular e pressionar o STF a desfazer a homologação e permitir a permanência dos arrozeiros. É uma campanha vergonhosa e até ignominiosa. A defesa dos arrozeiros é um acinte à legalidade e a decência nacionais.
Já a defesa da soberania nacional merece mais atenção. De fato, ouvimos algumas pessoas de influência lá fora, como o ex-vice-presidente americano Gore, dizerem que o Brasil não pode ser o único responsável pela Amazônia. Há uma pressão meio abafada por vozes de bom senso no sentido de jogar uma culpa substantiva no Brasil pelo efeito estufa e atribuir à ineficiência nacional os desmantelos do desmatamento da Amazônia.
Porém, para que alguma ação contrária à soberania brasileira sobre seu território venha a acontecer, muitas desgraças teriam que vir a tona, tais como mudanças climáticas muito drásticas. Se isso acontecer, aí o problema será mesmo global, e aí nenhum país por si só dará conta das conseqüências.
Tal como vivemos hoje, não há a mínima chance de alguma país ter capacidade de influenciar algum povo indígena que vive em nossas fronteiras a buscar apoio internacional para se transformar em país ou estado indígena. O Brasil e suas instituições, mesmo como uma Funai fraca, continua a exercer poder de convencimento e lealdade dos índios.
Mesmo assim, nossos militares aposentados se apoquentam. Ontem, em São Paulo, fizeram uma grande reunião no Clube Espéria, com mais de 700 participantes, onde discursaram o deputado Aldo Rebelo, o arrozeiro-mor Quartiero, o general Luiz Gonzaga Lessa, o índio Makuxi Jonas Marcolino e o filósofo Dennis Rosenfield. Todos com medo das terras indígenas em fronteira. O índio Jonas Marcolino tem sido o porta-voz dos índios favoráveis à presença dos brancos na Terra Indígena Raposa Serra do Sol, e é bastante solicitado nessas reuniões. Fala com voz de pastor protestante e encanta as platéias pelo amor aos brasileiros e pelo desprezo ao modo cultural dos índios.
A paranóia brasileira sobre a influência de estrangeiros em relação a povos indígenas já é tradição nossa de muitos anos, herdada dos portugueses. No século XVI, quando os franceses levavam Tupinambá para mostrar aos seus patrícios em Paris e Rouen, os portugueses ficavam muitíssimos irritados. Até tinham certa razão, pois o principal motivo para essas homenagens era ganhar o apoio dos índios para o estabelecimento das colônias franceses no país, como a França Antártica, no Rio de Janeiro, e a França Equinocial, no Maranhão. Porém, os franceses foram expulsos do Brasil e a memória dos Tupinambá em França ficou restrita a entalhes da Festa de Rouen em um famoso edifício daquela cidade portuária francesa e ao famoso diálogo "Dos Canibais", do grande filósofo Michel de Montaigne. Mas o receio de índios brasileiro visitando a Europa e sendo homenageado pelo príncipe Charles (como aconteceu recentemente) e europeus vindo ao Brasil trazer solidariedade a eles continua fazendo furor.
Por tudo isso, e com o respeito a todos que defendem a soberania brasileira, no meu entender, a defesa da Amazônia brasileira, tal como vem sendo feito em reuniões de cunho patriótico e patrioteiro, não deveria apontar suas vozes de indignação contra os povos indígenas. Não será às custas da dignidade e do respeito aos índios que o Brasil poderá vir a ser uma grande nação. Ao contrário, para que isso venha a acontecer, o Brasil tem que resgatar para os índios o espaço cultural e político que eles merecem por serem os primeiros habitantes e por serem o que são na atualidade. Gonçalves Dias já nos fez essa predição há 160 anos.
Para garantirmos um futuro soberano ao Brasil, precisamos garantir uma vida decente para nossa população e para os povos indígenas. O fortalecimento da política indigenista é mais do que urgente.
Ponhamos o caso da Funai na mesa. É o órgão responsável pela proteção das terras indígenas, que constituem 12,7% do território nacional, e pela assistência aos povos indígenas, que somam cerca de 500.000, em 227 povos específicos. Em comparação com o Ibama, que cuida de 6% das terras protegidas da nação e tem 6.000 funcionários, a Funai tem tão-somente 2.000 funcionários com o dobro das terras a proteger.
E como dialogar com povos que vivem culturalmente 227 opções de ser e existir? Serão as Ongs, os estrangeiros, os militares, os funcionários sem capacitação indigenista os melhores indicados a dialogar com os índios?
Acho que não. Por essas e outras razões é que defendo o fortalecimento urgente da Funai.
O ministro falou que não teme que esse atraso (a retirada dos arrozeiros foi suspensa no começo de abril deste ano, em clima de alta tensão) traga nova "comoção" e alvoroço, se não violência. Considera que a presença de policiais federais irá dissuadir qualquer tentativa de mudança do quadro atual pelo uso da força ou da coação.
De um lado, os índios de Raposa Serra do Sol estão conclamando nova reunião entre eles para decidir que táticas usar diante dessa delonga. E, por sua vez, o governo Lula continua firme no apoio à homologação daquela terra indígena. Ontem mesmo os ministros Tarso Genro e Marina Silva defenderam a homologação com os argumentos de respeito aos direitos constitucionais dos índios e a ausência de perigo de terras indígenas em fronteiras nacionais.
De outro lado, os arrozeiros, os políticos de Roraima e os militares aposentados estão em alta campanha para angariar apoio popular e pressionar o STF a desfazer a homologação e permitir a permanência dos arrozeiros. É uma campanha vergonhosa e até ignominiosa. A defesa dos arrozeiros é um acinte à legalidade e a decência nacionais.
Já a defesa da soberania nacional merece mais atenção. De fato, ouvimos algumas pessoas de influência lá fora, como o ex-vice-presidente americano Gore, dizerem que o Brasil não pode ser o único responsável pela Amazônia. Há uma pressão meio abafada por vozes de bom senso no sentido de jogar uma culpa substantiva no Brasil pelo efeito estufa e atribuir à ineficiência nacional os desmantelos do desmatamento da Amazônia.
Porém, para que alguma ação contrária à soberania brasileira sobre seu território venha a acontecer, muitas desgraças teriam que vir a tona, tais como mudanças climáticas muito drásticas. Se isso acontecer, aí o problema será mesmo global, e aí nenhum país por si só dará conta das conseqüências.
Tal como vivemos hoje, não há a mínima chance de alguma país ter capacidade de influenciar algum povo indígena que vive em nossas fronteiras a buscar apoio internacional para se transformar em país ou estado indígena. O Brasil e suas instituições, mesmo como uma Funai fraca, continua a exercer poder de convencimento e lealdade dos índios.
Mesmo assim, nossos militares aposentados se apoquentam. Ontem, em São Paulo, fizeram uma grande reunião no Clube Espéria, com mais de 700 participantes, onde discursaram o deputado Aldo Rebelo, o arrozeiro-mor Quartiero, o general Luiz Gonzaga Lessa, o índio Makuxi Jonas Marcolino e o filósofo Dennis Rosenfield. Todos com medo das terras indígenas em fronteira. O índio Jonas Marcolino tem sido o porta-voz dos índios favoráveis à presença dos brancos na Terra Indígena Raposa Serra do Sol, e é bastante solicitado nessas reuniões. Fala com voz de pastor protestante e encanta as platéias pelo amor aos brasileiros e pelo desprezo ao modo cultural dos índios.
A paranóia brasileira sobre a influência de estrangeiros em relação a povos indígenas já é tradição nossa de muitos anos, herdada dos portugueses. No século XVI, quando os franceses levavam Tupinambá para mostrar aos seus patrícios em Paris e Rouen, os portugueses ficavam muitíssimos irritados. Até tinham certa razão, pois o principal motivo para essas homenagens era ganhar o apoio dos índios para o estabelecimento das colônias franceses no país, como a França Antártica, no Rio de Janeiro, e a França Equinocial, no Maranhão. Porém, os franceses foram expulsos do Brasil e a memória dos Tupinambá em França ficou restrita a entalhes da Festa de Rouen em um famoso edifício daquela cidade portuária francesa e ao famoso diálogo "Dos Canibais", do grande filósofo Michel de Montaigne. Mas o receio de índios brasileiro visitando a Europa e sendo homenageado pelo príncipe Charles (como aconteceu recentemente) e europeus vindo ao Brasil trazer solidariedade a eles continua fazendo furor.
Por tudo isso, e com o respeito a todos que defendem a soberania brasileira, no meu entender, a defesa da Amazônia brasileira, tal como vem sendo feito em reuniões de cunho patriótico e patrioteiro, não deveria apontar suas vozes de indignação contra os povos indígenas. Não será às custas da dignidade e do respeito aos índios que o Brasil poderá vir a ser uma grande nação. Ao contrário, para que isso venha a acontecer, o Brasil tem que resgatar para os índios o espaço cultural e político que eles merecem por serem os primeiros habitantes e por serem o que são na atualidade. Gonçalves Dias já nos fez essa predição há 160 anos.
Para garantirmos um futuro soberano ao Brasil, precisamos garantir uma vida decente para nossa população e para os povos indígenas. O fortalecimento da política indigenista é mais do que urgente.
Ponhamos o caso da Funai na mesa. É o órgão responsável pela proteção das terras indígenas, que constituem 12,7% do território nacional, e pela assistência aos povos indígenas, que somam cerca de 500.000, em 227 povos específicos. Em comparação com o Ibama, que cuida de 6% das terras protegidas da nação e tem 6.000 funcionários, a Funai tem tão-somente 2.000 funcionários com o dobro das terras a proteger.
E como dialogar com povos que vivem culturalmente 227 opções de ser e existir? Serão as Ongs, os estrangeiros, os militares, os funcionários sem capacitação indigenista os melhores indicados a dialogar com os índios?
Acho que não. Por essas e outras razões é que defendo o fortalecimento urgente da Funai.
quinta-feira, 5 de junho de 2008
Ministro Jobim defende Raposa Serra do Sol. STF vai definir critérios para novas demarcações
O ministro da Defesa, Nelson Jobim, que já foi deputado constituinte, ministro da Justiça e ministro do STF, esteve na Comissão de Defesa Nacional e Relações Exteriores da Câmara Federal e disse um monte de coisas interessantes e importantes sobre a questão Raposa Serra do Sol, soberania nacional, demarcação de terras indígenas e Forças Armadas.
Diversos jornais repercutiram a fala do ministro Jobim. Abaixo está a matéria de O Estado de São Paulo, talvez a mais completa.
Quero realçar dois pontos. O primeiro é que ele se eximiu de falar sobre a decisão que o STF irá proferir sobre os termos da homologação da terra indígena Raposa Serra do Sol. Ele próprio pode pensar uma coisa, e muitos de nós sabemos o que é, mas não fala. Tal como o ministro Mangabeira, está aguardando o pronunciamento do STF.
O segundo ponto é que ele adiantou que o STF vai se pronunciar sobre os critérios para a regularização de terras indígenas. Isto quer dizer, provavelmente, critérios para o reconhecimento, demarcação e homologação de novas terras indígenas. Como ele sabe disso, não disse. Talvez tenha tido conversas com os seus ex-colegas do STF.
Gostaria de lembrar os participantes desse Blog que há dois anos disse em entrevista à Agência Reuters que a demarcação de terras indígenas, dados os conflitos inerentes e crescentes na atualidade, quando a maioria dos processos terminam caindo nos tribunais e, por fim, no STF, que essas demarcações iriam desaguar no STF e que o STF é que acabaria definindo os critérios de demarcação.
Não é que considere isso a coisa certa. Não acho que o Legislativo nem o Judiciário devam determinar os termos da regularização de terras indígenas. Acho que a demarcação de terras indígena é e deve continuar a ser prerrogativa do Executivo. Isto envolve, em primeira instância, a Funai, em segunda, o Ministério da Justiça, e em terceiro, a presidência da República. Isto é que permitiu a demarcação das nossas terras indígenas. Se fosse ter que passar pelo Congresso, nada teria sido feito nesse país. Como, aliás, nenhuma terra indígena foi modificada nos últimos 90 anos nos Estados Unidos, onde a legislação sobre terras está no Congresso. Lembremos que os Estados Unidos se furtaram de assinar a Declaração Universal dos Direitos dos Povos Indígenas exatamente para não serem contestados em tribunais sobre os tratados que fizeram com povos indígenas para respeitar suas terras e que não foram cumpridos.
Entretanto, os conflitos têm sido muito intensos nos últimos dez anos. Principalmente nos estados de agricultura e pecuária intensivos, como Mato Grosso do Sul e Santa Catarina. Mas também no Mato Grosso e no Nordeste.
Quando era presidente da Funai conseguimos homologar 67 terras indígenas (total de 12 milhões de hectares), demarcar 31 (inclusive Trombetas-Mapuera, com 4 milhões de hectares) e reconhecer 51 novas terras indígenas. As doze terras cujas demarcações estavam sendo concluídas é que foram homologadas pelo presidente Lula no começo do ano passado. A nova gestão da Funai até agora não logrou demarcar nenhuma nova terra. Mesmo as que foram definidas a serem demarcadas em abril de 2007, somente duas conseguiram ser iniciadas.
Isto é, as Ongs e o CIMI que hoje comandam a Funai estão amargando o veneno que vinham plantando durante minha administração. Vão terminar deixando a Funai desmoralizados.
Não sabemos o quê dirá o STF sobre como reconhecer e demarcar novas terras indígenas. Se, de fato, vier uma instrução nesse sentido, esperamos que seja clara e definitiva. O Brasil não pode ficar mais a mercê da luta casuística. Tem que haver clareza sobre esse ponto. Os índios merecem.
________________________________
Ministro afirma que Lula só espera decisão do STF para enviar tropas às regiões de fronteira
O Estado de São Paulo
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva aguarda apenas a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a legalidade ou não da demarcação da reserva indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, para determinar a instalação de pelotões de fronteira do Exército em toda a área fronteiriça do País - seja ela ocupada ou não por índios. A informação foi dada ontem pelo ministro da Defesa, Nelson Jobim, durante audiência na Comissão de Defesa Nacional e Relações Exteriores da Câmara.
O ministro também informou que, atualmente, estão na Amazônia 21 mil homens do Exército. Sem definir números, ele enfatizou que a intenção de Lula é de que esse contingente cresça muito e que o sistema de defesa seja mais eficiente que o atual.
"No nosso sistema estratégico de defesa, o Exército deverá ter mobilidade e monitoramento", avisa Jobim. "O monitoramento nós já fazemos pelo céu. Agora, queremos os pelotões para atuar na parte de baixo das árvores, porque lá não é possível fazer o controle."
SOBERANIA
Para Nelson Jobim, o propalado "conflito entre terra indígena e soberania nacional é um equívoco", que foi "produzido pelo imaginário dos dois lados". Na sua opinião, a demarcação de terras indígenas em zonas de fronteira não coloca em risco a soberania. Esse seria o caso da Raposa - uma área de 1,7 milhão de hectares, na fronteira do Brasil com a Guiana e a Venezuela, habitada por cerca de 17 mil índios.
"De acordo com a Constituição, as terras indígenas pertencem à União. São cedidas aos índios, mas, se por uma infelicidade, uma dessas tribos deixar de existir, continua em poder da União", afirmou o ministro. Ele lembrou ainda que, ao contrário do que aconteceu nos Estados Unidos, onde os índios são considerados nações, no Brasil eles são, constitucionalmente, brasileiros índios.
"Índios no Brasil pertencem a tribos e não a nações", enfatizou. Com isso, argumentou, ninguém pode dizer que determinada área é dos índios, porque não é - é da União, em usufruto por eles, que são cidadãos brasileiros, explicou. Reservas não são zona de exclusão, mas áreas de integração de comunidades indígenas com a sociedade brasileira, segundo Jobim.
O ministro também disse aos parlamentares que é necessário providenciar a conciliação entre ambientalistas radicais, que defendem a transformação da Amazônia em um "parque para a comunidade internacional", e os desenvolvimentistas, que falam em nome do crescimento econômico a qualquer custo. A solução, recomendou Jobim, seria a elaboração de um projeto de desenvolvimento sustentável para a região, dentro do Plano Amazônia Sustentável (PAS).
O projeto deveria promover a preservação dos recursos naturais da Amazônia e permitir a sobrevivência digna dos 22 milhões de brasileiros que habitam a região. "A não ser que resolvamos retirar essas pessoas de lá. Pelo que sei, isso não está em cogitação", afirmou o ministro.
ESCLARECIMENTOS
Quanto à decisão do STF, Jobim disse esperar que a suprema corte do País, ao julgar a constitucionalidade da demarcação da reserva Raposa Serra do Sol, esclareça três pontos, todos dentro da Constituição: o regime jurídico das terras indígenas, a possibilidade ou não de demarcação dessas terras em região de fronteira e, principalmente, quais os critérios para o reconhecimento de terras indígenas.
Diversos jornais repercutiram a fala do ministro Jobim. Abaixo está a matéria de O Estado de São Paulo, talvez a mais completa.
Quero realçar dois pontos. O primeiro é que ele se eximiu de falar sobre a decisão que o STF irá proferir sobre os termos da homologação da terra indígena Raposa Serra do Sol. Ele próprio pode pensar uma coisa, e muitos de nós sabemos o que é, mas não fala. Tal como o ministro Mangabeira, está aguardando o pronunciamento do STF.
O segundo ponto é que ele adiantou que o STF vai se pronunciar sobre os critérios para a regularização de terras indígenas. Isto quer dizer, provavelmente, critérios para o reconhecimento, demarcação e homologação de novas terras indígenas. Como ele sabe disso, não disse. Talvez tenha tido conversas com os seus ex-colegas do STF.
Gostaria de lembrar os participantes desse Blog que há dois anos disse em entrevista à Agência Reuters que a demarcação de terras indígenas, dados os conflitos inerentes e crescentes na atualidade, quando a maioria dos processos terminam caindo nos tribunais e, por fim, no STF, que essas demarcações iriam desaguar no STF e que o STF é que acabaria definindo os critérios de demarcação.
Não é que considere isso a coisa certa. Não acho que o Legislativo nem o Judiciário devam determinar os termos da regularização de terras indígenas. Acho que a demarcação de terras indígena é e deve continuar a ser prerrogativa do Executivo. Isto envolve, em primeira instância, a Funai, em segunda, o Ministério da Justiça, e em terceiro, a presidência da República. Isto é que permitiu a demarcação das nossas terras indígenas. Se fosse ter que passar pelo Congresso, nada teria sido feito nesse país. Como, aliás, nenhuma terra indígena foi modificada nos últimos 90 anos nos Estados Unidos, onde a legislação sobre terras está no Congresso. Lembremos que os Estados Unidos se furtaram de assinar a Declaração Universal dos Direitos dos Povos Indígenas exatamente para não serem contestados em tribunais sobre os tratados que fizeram com povos indígenas para respeitar suas terras e que não foram cumpridos.
Entretanto, os conflitos têm sido muito intensos nos últimos dez anos. Principalmente nos estados de agricultura e pecuária intensivos, como Mato Grosso do Sul e Santa Catarina. Mas também no Mato Grosso e no Nordeste.
Quando era presidente da Funai conseguimos homologar 67 terras indígenas (total de 12 milhões de hectares), demarcar 31 (inclusive Trombetas-Mapuera, com 4 milhões de hectares) e reconhecer 51 novas terras indígenas. As doze terras cujas demarcações estavam sendo concluídas é que foram homologadas pelo presidente Lula no começo do ano passado. A nova gestão da Funai até agora não logrou demarcar nenhuma nova terra. Mesmo as que foram definidas a serem demarcadas em abril de 2007, somente duas conseguiram ser iniciadas.
Isto é, as Ongs e o CIMI que hoje comandam a Funai estão amargando o veneno que vinham plantando durante minha administração. Vão terminar deixando a Funai desmoralizados.
Não sabemos o quê dirá o STF sobre como reconhecer e demarcar novas terras indígenas. Se, de fato, vier uma instrução nesse sentido, esperamos que seja clara e definitiva. O Brasil não pode ficar mais a mercê da luta casuística. Tem que haver clareza sobre esse ponto. Os índios merecem.
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Ministro afirma que Lula só espera decisão do STF para enviar tropas às regiões de fronteira
O Estado de São Paulo
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva aguarda apenas a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a legalidade ou não da demarcação da reserva indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, para determinar a instalação de pelotões de fronteira do Exército em toda a área fronteiriça do País - seja ela ocupada ou não por índios. A informação foi dada ontem pelo ministro da Defesa, Nelson Jobim, durante audiência na Comissão de Defesa Nacional e Relações Exteriores da Câmara.
O ministro também informou que, atualmente, estão na Amazônia 21 mil homens do Exército. Sem definir números, ele enfatizou que a intenção de Lula é de que esse contingente cresça muito e que o sistema de defesa seja mais eficiente que o atual.
"No nosso sistema estratégico de defesa, o Exército deverá ter mobilidade e monitoramento", avisa Jobim. "O monitoramento nós já fazemos pelo céu. Agora, queremos os pelotões para atuar na parte de baixo das árvores, porque lá não é possível fazer o controle."
SOBERANIA
Para Nelson Jobim, o propalado "conflito entre terra indígena e soberania nacional é um equívoco", que foi "produzido pelo imaginário dos dois lados". Na sua opinião, a demarcação de terras indígenas em zonas de fronteira não coloca em risco a soberania. Esse seria o caso da Raposa - uma área de 1,7 milhão de hectares, na fronteira do Brasil com a Guiana e a Venezuela, habitada por cerca de 17 mil índios.
"De acordo com a Constituição, as terras indígenas pertencem à União. São cedidas aos índios, mas, se por uma infelicidade, uma dessas tribos deixar de existir, continua em poder da União", afirmou o ministro. Ele lembrou ainda que, ao contrário do que aconteceu nos Estados Unidos, onde os índios são considerados nações, no Brasil eles são, constitucionalmente, brasileiros índios.
"Índios no Brasil pertencem a tribos e não a nações", enfatizou. Com isso, argumentou, ninguém pode dizer que determinada área é dos índios, porque não é - é da União, em usufruto por eles, que são cidadãos brasileiros, explicou. Reservas não são zona de exclusão, mas áreas de integração de comunidades indígenas com a sociedade brasileira, segundo Jobim.
O ministro também disse aos parlamentares que é necessário providenciar a conciliação entre ambientalistas radicais, que defendem a transformação da Amazônia em um "parque para a comunidade internacional", e os desenvolvimentistas, que falam em nome do crescimento econômico a qualquer custo. A solução, recomendou Jobim, seria a elaboração de um projeto de desenvolvimento sustentável para a região, dentro do Plano Amazônia Sustentável (PAS).
O projeto deveria promover a preservação dos recursos naturais da Amazônia e permitir a sobrevivência digna dos 22 milhões de brasileiros que habitam a região. "A não ser que resolvamos retirar essas pessoas de lá. Pelo que sei, isso não está em cogitação", afirmou o ministro.
ESCLARECIMENTOS
Quanto à decisão do STF, Jobim disse esperar que a suprema corte do País, ao julgar a constitucionalidade da demarcação da reserva Raposa Serra do Sol, esclareça três pontos, todos dentro da Constituição: o regime jurídico das terras indígenas, a possibilidade ou não de demarcação dessas terras em região de fronteira e, principalmente, quais os critérios para o reconhecimento de terras indígenas.
sábado, 17 de maio de 2008
Breve análise sobre os acontecimentos desta semana em relação à questão Raposa Serra do Sol
boomp3.com
Este é o primeiro Podcast deste Blog. Vamos apresentar comentários agora também por meio de audio. Basta clicar no botãozinho acima e o leitor virará ouvinte. Porém, comentários dos ouvintes terão que ser escritos.
Espero que vocês gostem dessa novidade. Mais adiante tentarei usar videos e filmes para descrever assuntos com mais detalhes.

Este é o primeiro Podcast deste Blog. Vamos apresentar comentários agora também por meio de audio. Basta clicar no botãozinho acima e o leitor virará ouvinte. Porém, comentários dos ouvintes terão que ser escritos.
Espero que vocês gostem dessa novidade. Mais adiante tentarei usar videos e filmes para descrever assuntos com mais detalhes.
sexta-feira, 16 de maio de 2008
Minc fala de Paris e Quartiero passeia por Brasília

O ministro-indicado, mas ainda não empossado, Carlos Minc, deu uma extensa entrevista em Paris sobre suas idéias e o quê pretende fazer como substituto de Marina Silva.
Inicialmente, com humildade, disse que talvez não estivesse à altura do cargo, que entende pouco da Amazônia. Porém não se eximiu de tecer crítica aberta a Blairo Maggi, governador-sojeiro do Mato Grosso, ao dizer que, se pudesse, Maggi plantaria soja até nos Andes. Maggi não gostou do blague e respondeu com veemência. Ivo Cassol, governador de Rondônia, veio no socorro de seu colega vizinho. Os dois estados campeões de desmatamento do Brasil.
Disse que vai dar continuidade ao trabalho da Marina Silva em tudo e por tudo, exceto quanto à equipe, para a formação da qual ele tem "carta verde" do presidente Lula, e quanto aos trâmites burocráticos de licenciamento ambiental. Disse que pretende sugerir nova legislação a respeito, que seja mais rígida até, porém sem tantas firulas burocráticas. Minc ficou conhecido como acelerador de licenciamento ambiental no Rio de Janeiro. Nada contra, pelo contrário, porque bem sei que as exigências que a lei contempla são usadas de acordo com os interesses da burocracia ambiental. Mas será batalha dura criar nova lei mais dura ainda nessa altura do campeonato. Será que os deputados estão interessados?
Minc é a favor de biodiesel e etanol, exceto na Amazõnia e na Mata Atlântica. Coitados dos cerrados! Mas é contra florestas de eucalipto e pinus em áreas degradadas do Rio de Janeiro. E plantar mamona, pinhão e cana-de-açúcar nas áreas degradadas pode ou não pode? Dezoito por cento da Amazônia já são constituídos de área desmatada e parte degradada. A Vale anda reflorestando terreno degradado na região de Marabá e Imperatriz. Essas áreas podem ser usadas para reflorestamento comercial ou não? Questões quentes que necessitam de decisão.
Minc não conhece Mangabeira Unger, mas abriu um contencioso com o ministro de Assuntos Estratégicos ao dizer que vai sugerir ao presidente Lula que o ex-governador Jorge Viana seja nomeado secretário-executivo do PAS, Programa da Amazônia Sustentável. Jorge Viana se sentiu meio ofendido e disse que não precisava da indicação de Minc e não a quer, pois tem contato direto com o presidente Lula. Mas também se enrusgou com Mangabeira ao dizer que ele era "professor dos professores" na Universidade de Harvard, mas sobre a Amazônia era aluno.
Não sei se a entrée de Minc no MMA foi gloriosa, mas já veio espanando poeira mal sentada. Ele é mesmo espalhafatoso!
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De outro lado, o arrozeiro-mor de Roraima, Paulo César Quartiero, foi solto pelo TRF-1, de Brasília, na madrugada de ontem, e logo saiu passeando pelos gabinetes dos parlamentares que lhe dão apoio, no Congresso Nacional, e dando entrevistas por aí. Tem entrevista longa na Folha de São Paulo, no Globo e na Agência Brasil.
Cuspiu fogo contra o ministro Tarso Genro, chamando-o de terrorista e responsável pelo conflito com os índios Makuxi e Wapichana que adentraram a área que ele considera uma de suas fazendas. Acusou a Polícia Federal de prepotente e causadora do mal estar que hoje vive a população de Roraima. Só quer saber do Exército, que acredita que lhe dá cobertura por suas ações.
Quartiero tem se sentido tão poderoso que não mede palavras. Na entrevista à Folha de São Paulo, disse que os índios não somente são dominados por Ongs estrangeiras e pela Igreja Católica, como acha que eles não "querem evoluir como seres humanos".
Quartiero é de uma soberba impressionante. Tem desafiado o governo e a legalidade brasileira de um modo excepcional. É inacreditável que esteja solto como está. É prova viva de quanto o país está carente de autoridade legal. O Judiciário brinca de prender e soltar, de acordo com os caprichos dos juízes e desembargadores de plantão.
Quartiero disse que vai voltar a Roraima para retomar suas atividades de prefeito de Pacaraima e arrozeiro, e que vai esperar a decisão do STF sobre a homologação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol. Quem ouve assim pensa que é simples.
_________________________________
Por fim, os índios do Conselho Indígena de Roraima também recuaram quanto à tática de obstruir estradas e fazer outras ações à revelia da decisão do STF de sustar todas as ações naquela terra indígena até uma decisão final. Porém continuam com a forte retórica de que não aceitarão a presença de arrozeiros em suas terras.
A TV Globo lançou nas últimas três noites três programas no seu Jornal da Noite, repercutidos no Bom Dia Brasil, sobre a questão Raposa Serra do Sol. Os programas são bem feitos, com entrevistas de índios favoráveis e não favoráveis à homologação da Terra Indígena, com entrevistas de arrozeiros e juízes e políticos. Porém, transparece de forma sutil mas clara uma tendência de simpatia com as reivindicações dos não indígenas na Terra Indígena Raposa Serra do Sol. Mostrou uma cena do juiz federal Helder Girão, que sempre tem agido em suas decisões contra os índios de Roraima, dizendo que os laudos antropológicos são um pastiche, um arremedo de documento, com incompletudes e falsidades. A antropóloga da Funai, Maria Guiomar de Mello, foi convidada para gravar uma resposta, mas declinou do convite. Não sei porque não chamaram Paulo Santilli, que parece ter ajudado nesse relatório.
Enfim, s semana foi tomada por questões indígenas de diversas sortes, e Raposa Serra do Sol em especial. Outras notícias divulgadas são a de que o índio Kaiowá Adão Irapuitã Brasil, que trabalha na sede da Funai, em Brasília, anda reclamando de discriminação no trabalho. Outra divulgada pelo Correio Braziliense é de que a sede da Funai em Brasília está servindo de acampamento para um grupo de 30 Xavante que aguardam há semanas uma reunião com o presidente do órgão.
A próxima grande celeuma virá em breve: diz respeito a um Termo de Ajustamento de Conduta celebrado há alguns meses atrás entre a Funai, o Ministério Público e 23 lideranças indígenas de Mato Grosso do Sul. O TAC determina que a Funai criará diversos grupos de trabalho para analisar reivindicações de terras no Mato Grosso do Sul. Serão 31 novas terras a serem estudadas por esses grupos de trabalho.
Quartiero é de uma soberba impressionante. Tem desafiado o governo e a legalidade brasileira de um modo excepcional. É inacreditável que esteja solto como está. É prova viva de quanto o país está carente de autoridade legal. O Judiciário brinca de prender e soltar, de acordo com os caprichos dos juízes e desembargadores de plantão.
Quartiero disse que vai voltar a Roraima para retomar suas atividades de prefeito de Pacaraima e arrozeiro, e que vai esperar a decisão do STF sobre a homologação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol. Quem ouve assim pensa que é simples.
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Por fim, os índios do Conselho Indígena de Roraima também recuaram quanto à tática de obstruir estradas e fazer outras ações à revelia da decisão do STF de sustar todas as ações naquela terra indígena até uma decisão final. Porém continuam com a forte retórica de que não aceitarão a presença de arrozeiros em suas terras.
A TV Globo lançou nas últimas três noites três programas no seu Jornal da Noite, repercutidos no Bom Dia Brasil, sobre a questão Raposa Serra do Sol. Os programas são bem feitos, com entrevistas de índios favoráveis e não favoráveis à homologação da Terra Indígena, com entrevistas de arrozeiros e juízes e políticos. Porém, transparece de forma sutil mas clara uma tendência de simpatia com as reivindicações dos não indígenas na Terra Indígena Raposa Serra do Sol. Mostrou uma cena do juiz federal Helder Girão, que sempre tem agido em suas decisões contra os índios de Roraima, dizendo que os laudos antropológicos são um pastiche, um arremedo de documento, com incompletudes e falsidades. A antropóloga da Funai, Maria Guiomar de Mello, foi convidada para gravar uma resposta, mas declinou do convite. Não sei porque não chamaram Paulo Santilli, que parece ter ajudado nesse relatório.
Enfim, s semana foi tomada por questões indígenas de diversas sortes, e Raposa Serra do Sol em especial. Outras notícias divulgadas são a de que o índio Kaiowá Adão Irapuitã Brasil, que trabalha na sede da Funai, em Brasília, anda reclamando de discriminação no trabalho. Outra divulgada pelo Correio Braziliense é de que a sede da Funai em Brasília está servindo de acampamento para um grupo de 30 Xavante que aguardam há semanas uma reunião com o presidente do órgão.
A próxima grande celeuma virá em breve: diz respeito a um Termo de Ajustamento de Conduta celebrado há alguns meses atrás entre a Funai, o Ministério Público e 23 lideranças indígenas de Mato Grosso do Sul. O TAC determina que a Funai criará diversos grupos de trabalho para analisar reivindicações de terras no Mato Grosso do Sul. Serão 31 novas terras a serem estudadas por esses grupos de trabalho.
Os fazendeiros e políticos de Mato Grosso do Sul já se encresparam, já foram falar com o ministro Tarso Genro e já estão dispostos a fazer leis contrárias a essas pretensões. A Funai vai ficar na berlinda e sob ataque de novo. Parece que tudo isso está sendo feito de caso pensado para abrir novas trincheiras de ataque ao órgão e enfraquecê-lo perante a opinião pública e perante o Governo Lula. Alguém quer ser transformado em herói gratuitamente. O contrário do que fez a ex-ministra Marina Silva ao se despedir de seu cargo executivo.
sexta-feira, 9 de maio de 2008
Presidente Lula defende índios e Raposa Serra do Sol

Não resta a mínima dúvida que o presidente Lula está determinado a defender seu ato de homologação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol.
Desta vez, numa reunião com quase todos os governadores da Amazônia, quando do lançamento de um plano de desenvolvimento da Amazônia, ele declarou explicitamente que a presença de terras indígenas nas nossas fronteiras não constitui motivo de preocupação da soberania nacional. Recado para o general Augusto Heleno Ribeiro e para os militares que teimam em fazer essa acusação.
Mas o presidente Lula deixa despercebido que o discurso de defesa da soberania da Amazônia transcende o problema indígena, e é por isso que o discurso do general Heleno repercutiu tão positivamente na opinião pública.
O presidente Lula precisa reformular as instituições que são responsáveis por atos governamentais na Amazônia. Isso inclui a Funai, o Incra, a Embrapa, a Funasa e o Exército.
Venho há meses difundindo a idéia de que sem uma Funai forte a questão indígena cai nas mãos das Ongs. É preciso não só uma Funai forte, atuante e renovada, mas um Ibama forte e honesto, uma Embrapa atuante, um Incra determinado e correto e um Exército com pelotões em todas as áreas da Amazônia, inclusive onde não há índios.
Veja matéria na Folha de São Paulo de hoje.
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Lula defende índios e ironiza governador
Presidente comenta ausência de José de Anchieta Júnior (PSDB) em evento; governante de RR queixa-se
EDUARDO SCOLESE
LETÍCIA SANDER
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Numa resposta aos que criticam a retirada dos arrozeiros da reserva indígena Raposa/ Serra do Sol (RR), o presidente Lula disse ontem que os índios são capazes de proteger a fronteira do país e que, em geral, somente reagem quando não recebem seus direitos do Estado.
Lula saiu em defesa dos indíos no lançamento de um plano de diretrizes para a Amazônia, todas reunidas no PAS (Plano Amazônia Sustentável). "Quem, um dia, ousou dizer que os nossos índios faziam o país correr o risco de perder a sua soberania, porque eles estão em lugares, muitos deles, fronteiriços com o Brasil?", questionou o petista, numa referência indireta a recentes declarações do general Augusto Heleno, comandante militar da Amazônia, que, ecoando o pensamento dos militares, afirmou que a demarcação contínua de terras indígenas na fronteira é uma ameaça à soberania.
Ironia
No mesmo evento, Lula ironizou a ausência do governador de Roraima, José de Anchieta Júnior (PSDB), contrário à homologação contínua da reserva e único governo da Amazônia ausente no Planalto. Ele não enviou nem representantes.
"Não está presente o companheiro governador de Roraima, por problemas que vocês estão acompanhando pela imprensa", disse. E completou, sorridente: "Deve ser por isso". O governador deu outra justificativa. "Realmente não fui porque o tratamento que o governo federal vem dando ao Estado de Roraima não é digno."
Terras Indígenas nas fronteiras terão pelotões militares
Uma das primeiras conseqüências de todo o imbroglio criado pela suspensão da extrusão dos arrozeiros é esta de aumentar os efetivos militares na Amazônia.
O Ministério da Justiça, junto com o Ministério da Defesa, estão preparando decreto presidencial, a mando do próprio presidente, em que obrigará o Exército a criar bases de fronteira em todas as terras indígenas que fazem fronteira com outros países.
É a resposta mais preclara do presidente aos reclamos dos militares e da sociedade brasileira preocupada com as notícias e os boatos, mais boatos que notícias, de que a soberania nacional corre perigo com a presença de terras indígenas nas nossas fronteiras.
A sociedade brasileira precisa ser esclarecida que, dos 17.500 km de fronteira territorial que o Brasil tem, 5.700 km são já de terras indígenas. A Terra Indígena Raposa Serra do Sol faz 500 km com a Guiana (Inglesa) e com a Venezuela. É metade do que faz a Terra Indígena Yanomami com a Venezuela, e metade do que fazem as terras indígenas do Alto Rio Negro com a Colômbia. Mas o escândalo ficou por conta da Raposa Serra do Sol
Ao saber disso a governadora Ana Carepa, do Pará, disse que está de acordo, pois os índios querem ser integrados à nação brasileira. A palavra usada foi integrado, não incluídos socialmente, que é a fórmula usada pelo Governo Lula e pelas Ongs. Parece que a governadora tem o sentimento maior da nação.
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Governadora apóia construção de bases militares em terras indígenas
Mariana Jungmann, Agência Brasil
BRASÍLIA - A governadora do Pará, Ana Júlia Carepa, disse nesta quinta-feira, que é favorável ao decreto que determina a construção de bases militares em terras indígenas que fiquem em regiões de fronteira.
- É uma proposta acertada do governo federal. Até mesmo porque são áreas de preservação ambiental e nós precisamos diminuir os conflitos que existem. Os indígenas não querem se sentir deslocados, eles querem se sentir integrados, eles se consideram brasileiros - disse a governadora, após encontro com o ministro da Justiça, Tarso Genro.
O decreto - anunciado por Tarso Genro e confirmado pelo ministro da Defesa, Nelson Jobim - altera outro, segundo o qual a construção de bases nessas áreas necessitava de autorização prévia do Conselho de Segurança Nacional e consulta à Fundação Nacional do Índio (Funai).
- O trânsito de militares sempre foi livre, a construção [de bases militares] é que dependia de requisitos - explica o secretário de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, Pedro Abramovay.
- Isso vem, sobretudo, para deixar claro que as terras indígenas favorecem a soberania nacional. Elas estão em terras da União e só por isso é possível construir as bases militares. Se fossem terras particulares, não seria possível - completou o secretário.
O Ministério da Justiça, junto com o Ministério da Defesa, estão preparando decreto presidencial, a mando do próprio presidente, em que obrigará o Exército a criar bases de fronteira em todas as terras indígenas que fazem fronteira com outros países.
É a resposta mais preclara do presidente aos reclamos dos militares e da sociedade brasileira preocupada com as notícias e os boatos, mais boatos que notícias, de que a soberania nacional corre perigo com a presença de terras indígenas nas nossas fronteiras.
A sociedade brasileira precisa ser esclarecida que, dos 17.500 km de fronteira territorial que o Brasil tem, 5.700 km são já de terras indígenas. A Terra Indígena Raposa Serra do Sol faz 500 km com a Guiana (Inglesa) e com a Venezuela. É metade do que faz a Terra Indígena Yanomami com a Venezuela, e metade do que fazem as terras indígenas do Alto Rio Negro com a Colômbia. Mas o escândalo ficou por conta da Raposa Serra do Sol
Ao saber disso a governadora Ana Carepa, do Pará, disse que está de acordo, pois os índios querem ser integrados à nação brasileira. A palavra usada foi integrado, não incluídos socialmente, que é a fórmula usada pelo Governo Lula e pelas Ongs. Parece que a governadora tem o sentimento maior da nação.
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Governadora apóia construção de bases militares em terras indígenas
Mariana Jungmann, Agência Brasil
BRASÍLIA - A governadora do Pará, Ana Júlia Carepa, disse nesta quinta-feira, que é favorável ao decreto que determina a construção de bases militares em terras indígenas que fiquem em regiões de fronteira.
- É uma proposta acertada do governo federal. Até mesmo porque são áreas de preservação ambiental e nós precisamos diminuir os conflitos que existem. Os indígenas não querem se sentir deslocados, eles querem se sentir integrados, eles se consideram brasileiros - disse a governadora, após encontro com o ministro da Justiça, Tarso Genro.
O decreto - anunciado por Tarso Genro e confirmado pelo ministro da Defesa, Nelson Jobim - altera outro, segundo o qual a construção de bases nessas áreas necessitava de autorização prévia do Conselho de Segurança Nacional e consulta à Fundação Nacional do Índio (Funai).
- O trânsito de militares sempre foi livre, a construção [de bases militares] é que dependia de requisitos - explica o secretário de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, Pedro Abramovay.
- Isso vem, sobretudo, para deixar claro que as terras indígenas favorecem a soberania nacional. Elas estão em terras da União e só por isso é possível construir as bases militares. Se fossem terras particulares, não seria possível - completou o secretário.
quarta-feira, 30 de abril de 2008
Homologação de Raposa Serra do Sol na berlinda
Repórteres que têm acesso aos gabinetes dos ministros do STF estão pessimistas em relação à decisão do ministro Ayres Britto sobre a preservação da homologação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol.
Ontem o procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza, deu seu parecer sobre uma das ações contra a homologação de RSS. Isso suscitará a decisão do ministro Ayres Britto. Argumentou que o processo de demarcação que levou ao ato presidencial foi integralmente legal, portanto, perfeito. Assim, sugere pela não recepção da tal ação, aberta pelo senador Mozarildo Cavalcanti, e pela permanência do ato homologatório. Essa matéria está na Folha de São Paulo, logo abaixo.
De que valerá esse parecer? Ao que indicam interlocutores do ministro Ayres Britto, não muito.
Parece que o ministro mudou totalmente sua opinião original que confirmou há três anos o ato homologatório presidencial. Por que tal virada de casaca?
Parece que ele se convenceu de que há moradores na região há muitos anos, falam alguns que têm antepassados que para lá vieram desde 1880, e alguns alegam títulos de propriedade de 1910. Será que foi isso que comoveu o ministro Ayres Britto? Será que ele não viu isso na primeira vez que cuidou do caso?
Parece que o ministro Ayres Britto se espantou com os termos da Declaração Universal dos Direitos dos Povos Indígenas, promulgado pela ONU em setembro de 2007, sobretudo o Art. 3 que fala no direito à auto-determinação dos povos indígenas por um ato voluntário. Tal artigo foi questão de discussão durante muitos anos. O Brasil terminou aceitando esse artigo com um voto condicionante, lido na própria Assembléia por ocasião da votação. O ministro Britto poderia ter pensado que 145 países, de todas as variações possíveis, da China e Índia (que têm as maiores populações indígenas do planeta, mais de 100 milhões cada uma), passando pela Indonésia e chegando à Finlândia e à Rússia. Todos países com populações indígenas que querem autonomia política e cultural e com muita força e população para tanto. Por que então o Brasil teria medo de que suas populações indígenas se declarassem auto-determinadas e exigissem um estatuto jurídico-político de igualdade? E por que a ONU aceitaria alguma tal demanda, se nem aceita as demandas de povos indígenas tão fortes como os Maitai da Índia, que têm mais de 4 milhões de membros e estão na fronteira com Mianmar?
Um diálogo mais forte com o STF e com as Forças Armadas brasileiras se faz necessário. Se a imprensa não pode fazer isso, que o Executivo ou o Legislativo o faça, sem alarmismo e alardes que só confundem os argumentos e espantam a verdade.
O STF e o Exército têm que saber que o conceito de auto-determinação, mesmo se apresentando nos termos da ONU, vem sendo interpretado diferentemente nos últimos 20 anos por muitos juristas do Direito Internacional. Auto-determinação não implica mais a possibilidade de auto-proclamação do conceito de Nação-Estado, com o quê a ONU poderia recepcionar um pedido de aceitação na comunidade das nações. Portanto, o perigo de um povo indígena, de uma nação indígena autônoma, como já falou Rondon, querer se auto-proclamar nação-estado está longe da realidade prática e mais longe do acatamento jurídico internacional. Auto-determinação tem sentido no interior de uma Nação-Estado, como o Brasil. Daí ter sido aceito por tantos países, até mesmo aqueles que têm muitas reivindicações históricas de separacionismo.
Uma matéria da Folha de São Paulo, assinada por diversos jornalistas, diz que o ministro Britto também se comoveu com a presença de não indígenas na Terra Indígena Raposa Serra do Sol desde o tempo da ditadura militar, que teria promovido a migração para aquele então território nacional. Acho isso inacreditável. Certamente a questão dos arrozeiros é a parte mais ignominiosa desse affair Raposa Serra do Sol. Sua presença é absolutamente ilegal, imoral e indigna. O ministro Ayres Britto sabe disso e não iria ser persuadido por um argumento desse jaez.
Seja como for, só podemos aguardar para saber o quê dirá o ministro Ayres Britto. Acho que se sua decisão for contrária a RSS, seja por que motivo for, isso irá desencadear uma série de pedidos de revisão de homologações já realizadas anteriormente. Não seria de bom alvitre o ministro fazer isso. Vai bagunçar todo o sistema de demarcação de terras que a tanto custo o Brasil estabeleceu na prática e juridicamente. Em meu artigo publicado segunda-feira, dia 28, em O Globo, em contraposição ao editorial do jornal, alertei para o perigo do ato de desfazimento da homologação.
Para os amigos antropólogos e indigenistas se lembrarem, há pouco mais de dois anos, alertei em entrevista a uma agência de notícias que muitas ações de demarcação estavam sendo contestadas e iriam parar no STF. Alguns pensaram maldosamente que eu estava dizendo que o STF iria barrar as reivindicações dos povos indígenas. Agora estão sentindo a verdade de minhas palavras. Com efeito, o STF tem em suas mãos mais de 100 ações sobre a questão indígena, algumas com mais de 25 anos, como a da Terra Indígena Caramuru-Paraguaçu. Alertei ainda que, eventualmente, o STF iria definir os parâmetros do que constitui o termo "tradicionalidade" ou "tradiconalmente", tal como está no Art. 231 da Constituição Federal. Tradicionalidade é um dos parâmetros que determinam o reconhecimento do direito de povos ou grupos indígenas sobre terras indígenas pela União.
Porém nunca pensei que o STF fosse fazer isso exatamente em relação à T. I. Raposa Serra do Sol, precisamente porque já tinha julgado sua legitimidade.
Por tudo isso, e pelo papel que o Exército está desempenhando nessa questão, especialmente julgando que as terras indígenas em fronteira constituem uma ameaça à soberania nacional, é que temos -- nós antropólogos, indigenistas, a população pró-indigenista brasileira -- que abrir um diálogo sincero e honesto com todas essas forças: o Exército, o STF, os poderes públicos, a Igreja. Não basta argumentar por razões indigenistas, pois essas estão passando ao largo do sentimento da população. É preciso esclarecer que os povos indígenas estão no Brasil, são brasileiros, e que a política indigenista almeja que os índios façam parte da Nação brasileira. Tal como diz o Estatuto do Índio, a política almeja a "integração harmoniosa" na Nação brasileira. A constituição não vai contra isso, como querem alguns exegetas. Ela apenas afirma com clareza que os índios têm direito a manterem seus costumes, línguas e tradições, algo que o Estatuto do Índio certamente nunca supôs o contrário.
As próximas semanas serão muito tensas para os povos indígenas que habitam a T.I: Raposa Serra do Sol, mas também para o indigenismo brasileiro. Cabe a nós nos prepararmos para o que der e vier e saber fazer a hora. O avexados de espírito, por favor, não comecem com a idéia de propor a mudança do Estatuto do Índio e declarar que a Constituição não quer o índio integrado na Nação. Que voltem a ler o conceito clássico de integração tal como explicado por Darcy Ribeiro e Roberto Cardoso de Oliveira, e não o confunda com assimilação. Pensem no tal conceito de "inclusão social", tão badalado nesse governo, ponham a mão na consciência, e vejam que funciona do mesmo jeito, se não mais determinista, que o conceito de integração.
Vejam as duas matérias direto da Folha de São Paulo:
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Parecer do procurador-geral é favorável a manter demarcação de área em Roraima
FELIPE SELIGMAN
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza, enviou ao Supremo Tribunal Federal parecer contrário à suspensão do decreto de demarcação da reserva indígena Raposa/Serra do Sol. Esse era o passo que faltava para que o ministro Carlos Ayres Britto leve o caso ao plenário do Supremo.
Britto afirmou que pretende disponibilizar seu relatório até o final da semana que vem. A partir de então, caberá ao presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, decidir quando a questão será julgada. "Como o presidente já se mostrou empenhado, é possível que até o final de maio realizemos esse julgamento tão importante."
O parecer trata sobre uma ação popular protocolada em 2005 pelos senadores Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR) e Augusto Botelho (PT-RR), pedindo o cancelamento do decreto editado naquele mesmo ano.
No texto, o procurador-geral afirma que "a alegação de ofensa ao equilíbrio federativo e à autonomia de Roraima está divorciada da realidade". "A área indígena Raposa/Serra do Sol representa pouco mais de 7% do território daquele Estado, que, desde sua criação, conta com a presença de numerosos grupos indígenas, sendo a população em questão ali residente a terceira maior do país."
O governo de Roraima, por sua vez, reclama que 46% do território do Estado já está tomado por reservas indígenas.
O procurador-geral diz que a área não traz risco à soberania nacional. "O risco de abalo à soberania nacional, se presente, haverá de ser eliminado, se for o caso, por mecanismos outros de proteção, sem sacrifício do direito dos povos indígenas."
Na ação, os parlamentares alegaram que a demarcação traria conseqüências "desastrosas" para o Estado.
________________________
STF deve votar contra saída de não-indígenas de reserva
Supremo também vai restringir MPs que mudam texto do Orçamento já aprovado
No caso da Raposa/Serra do Sol, ministros do tribunal argumentam haver cidades inteiras dentro da área demarcada como indígena
ELIANE CANTANHÊDE
COLUNISTA DA FOLHA
VALDO CRUZ
KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O STF (Supremo Tribunal Federal) restringirá a edição de medidas provisórias de créditos extraordinários do Orçamento da União. E tende a modificar o modelo de demarcação contínua da reserva Raposa/Serra do Sol, em Roraima.
No caso da reserva, o objetivo é evitar a remoção de não-indígenas. Segundo a Folha apurou, o STF deve criar "ilhas" na reserva, segundo a expressão ouvida no Supremo.
No das MPs, o Supremo avalia que há abuso do Executivo, que recorre ao artifício para modificar o texto do Orçamento aprovado no Congresso.
Ao julgar o modelo de demarcação da reserva, o Supremo deverá deixar claro que, apesar da pressão de setores e ONGs internacionais, as Forças Armadas não sofrerão constrangimento para atuar em território indígena em todo o país, porque a propriedade das reservas é da União.
O Brasil é signatário da "Declaração dos Povos Indígenas" da ONU (Organização das Nações Unidas), de 2007, que assegura o direito dos índios à terra e aos seus territórios. Isso preocupa as Forças Armadas, porque poderia caracterizar um território autônomo dentro do território nacional.
O comandante militar da Amazônia, general Augusto Heleno, admitiu publicamente que temia "ameaça à soberania nacional", já que a reserva fica em área de fronteira.
O Supremo dirá que a declaração não é convenção, tratado nem tem força de lei. Trata-se de manifestação política.
A demarcação da reserva Raposa/Serra do Sol foi feita em 1998, no governo Fernando Henrique Cardoso, e homologada já na gestão Lula, em 2005. O Planalto começou a recuar na defesa da demarcação contínua devido à tensão gerada pelo processo de retirada dos não-indígenas da área.
Produtores de arroz, por exemplo, ameaçaram entrar em conflito contra índios e a Polícia Federal para ficar na reserva, e o STF suspendeu as ações de retirada dos não-índios para estudar a questão.
Em reunião com líderes indígenas no Planalto, Lula disse que apóia a demarcação contínua, mas, nos bastidores, torce para que o STF mude a regra. Se houver ônus político, será do Supremo, não do governo.
Na opinião da maioria dos ministros do STF, há argumento jurídico para manter na reserva populações não-indígenas que vivem na área, algumas desde 1880 e outras que foram estimuladas pela ditadura militar de 1964 a aderir à colonização de Roraima. A tendência do STF é reconhecer a legitimidade dessas ocupações. Ministros argumentam que há cidades inteiras dentro da reserva e não faria sentido sua remoção.
Atualmente, dentro da reserva já existem duas áreas de exclusão -dos municípios de Normandia e Uiramatã. Políticos do Estado defendem a criação de mais quatro -vale do Arroz, lago de Caracaranã, vila Surumu e a área da hidrelétrica do rio Cotingo, em construção.
Ontem o procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza, deu seu parecer sobre uma das ações contra a homologação de RSS. Isso suscitará a decisão do ministro Ayres Britto. Argumentou que o processo de demarcação que levou ao ato presidencial foi integralmente legal, portanto, perfeito. Assim, sugere pela não recepção da tal ação, aberta pelo senador Mozarildo Cavalcanti, e pela permanência do ato homologatório. Essa matéria está na Folha de São Paulo, logo abaixo.
De que valerá esse parecer? Ao que indicam interlocutores do ministro Ayres Britto, não muito.
Parece que o ministro mudou totalmente sua opinião original que confirmou há três anos o ato homologatório presidencial. Por que tal virada de casaca?
Parece que ele se convenceu de que há moradores na região há muitos anos, falam alguns que têm antepassados que para lá vieram desde 1880, e alguns alegam títulos de propriedade de 1910. Será que foi isso que comoveu o ministro Ayres Britto? Será que ele não viu isso na primeira vez que cuidou do caso?
Parece que o ministro Ayres Britto se espantou com os termos da Declaração Universal dos Direitos dos Povos Indígenas, promulgado pela ONU em setembro de 2007, sobretudo o Art. 3 que fala no direito à auto-determinação dos povos indígenas por um ato voluntário. Tal artigo foi questão de discussão durante muitos anos. O Brasil terminou aceitando esse artigo com um voto condicionante, lido na própria Assembléia por ocasião da votação. O ministro Britto poderia ter pensado que 145 países, de todas as variações possíveis, da China e Índia (que têm as maiores populações indígenas do planeta, mais de 100 milhões cada uma), passando pela Indonésia e chegando à Finlândia e à Rússia. Todos países com populações indígenas que querem autonomia política e cultural e com muita força e população para tanto. Por que então o Brasil teria medo de que suas populações indígenas se declarassem auto-determinadas e exigissem um estatuto jurídico-político de igualdade? E por que a ONU aceitaria alguma tal demanda, se nem aceita as demandas de povos indígenas tão fortes como os Maitai da Índia, que têm mais de 4 milhões de membros e estão na fronteira com Mianmar?
Um diálogo mais forte com o STF e com as Forças Armadas brasileiras se faz necessário. Se a imprensa não pode fazer isso, que o Executivo ou o Legislativo o faça, sem alarmismo e alardes que só confundem os argumentos e espantam a verdade.
O STF e o Exército têm que saber que o conceito de auto-determinação, mesmo se apresentando nos termos da ONU, vem sendo interpretado diferentemente nos últimos 20 anos por muitos juristas do Direito Internacional. Auto-determinação não implica mais a possibilidade de auto-proclamação do conceito de Nação-Estado, com o quê a ONU poderia recepcionar um pedido de aceitação na comunidade das nações. Portanto, o perigo de um povo indígena, de uma nação indígena autônoma, como já falou Rondon, querer se auto-proclamar nação-estado está longe da realidade prática e mais longe do acatamento jurídico internacional. Auto-determinação tem sentido no interior de uma Nação-Estado, como o Brasil. Daí ter sido aceito por tantos países, até mesmo aqueles que têm muitas reivindicações históricas de separacionismo.
Uma matéria da Folha de São Paulo, assinada por diversos jornalistas, diz que o ministro Britto também se comoveu com a presença de não indígenas na Terra Indígena Raposa Serra do Sol desde o tempo da ditadura militar, que teria promovido a migração para aquele então território nacional. Acho isso inacreditável. Certamente a questão dos arrozeiros é a parte mais ignominiosa desse affair Raposa Serra do Sol. Sua presença é absolutamente ilegal, imoral e indigna. O ministro Ayres Britto sabe disso e não iria ser persuadido por um argumento desse jaez.
Seja como for, só podemos aguardar para saber o quê dirá o ministro Ayres Britto. Acho que se sua decisão for contrária a RSS, seja por que motivo for, isso irá desencadear uma série de pedidos de revisão de homologações já realizadas anteriormente. Não seria de bom alvitre o ministro fazer isso. Vai bagunçar todo o sistema de demarcação de terras que a tanto custo o Brasil estabeleceu na prática e juridicamente. Em meu artigo publicado segunda-feira, dia 28, em O Globo, em contraposição ao editorial do jornal, alertei para o perigo do ato de desfazimento da homologação.
Para os amigos antropólogos e indigenistas se lembrarem, há pouco mais de dois anos, alertei em entrevista a uma agência de notícias que muitas ações de demarcação estavam sendo contestadas e iriam parar no STF. Alguns pensaram maldosamente que eu estava dizendo que o STF iria barrar as reivindicações dos povos indígenas. Agora estão sentindo a verdade de minhas palavras. Com efeito, o STF tem em suas mãos mais de 100 ações sobre a questão indígena, algumas com mais de 25 anos, como a da Terra Indígena Caramuru-Paraguaçu. Alertei ainda que, eventualmente, o STF iria definir os parâmetros do que constitui o termo "tradicionalidade" ou "tradiconalmente", tal como está no Art. 231 da Constituição Federal. Tradicionalidade é um dos parâmetros que determinam o reconhecimento do direito de povos ou grupos indígenas sobre terras indígenas pela União.
Porém nunca pensei que o STF fosse fazer isso exatamente em relação à T. I. Raposa Serra do Sol, precisamente porque já tinha julgado sua legitimidade.
Por tudo isso, e pelo papel que o Exército está desempenhando nessa questão, especialmente julgando que as terras indígenas em fronteira constituem uma ameaça à soberania nacional, é que temos -- nós antropólogos, indigenistas, a população pró-indigenista brasileira -- que abrir um diálogo sincero e honesto com todas essas forças: o Exército, o STF, os poderes públicos, a Igreja. Não basta argumentar por razões indigenistas, pois essas estão passando ao largo do sentimento da população. É preciso esclarecer que os povos indígenas estão no Brasil, são brasileiros, e que a política indigenista almeja que os índios façam parte da Nação brasileira. Tal como diz o Estatuto do Índio, a política almeja a "integração harmoniosa" na Nação brasileira. A constituição não vai contra isso, como querem alguns exegetas. Ela apenas afirma com clareza que os índios têm direito a manterem seus costumes, línguas e tradições, algo que o Estatuto do Índio certamente nunca supôs o contrário.
As próximas semanas serão muito tensas para os povos indígenas que habitam a T.I: Raposa Serra do Sol, mas também para o indigenismo brasileiro. Cabe a nós nos prepararmos para o que der e vier e saber fazer a hora. O avexados de espírito, por favor, não comecem com a idéia de propor a mudança do Estatuto do Índio e declarar que a Constituição não quer o índio integrado na Nação. Que voltem a ler o conceito clássico de integração tal como explicado por Darcy Ribeiro e Roberto Cardoso de Oliveira, e não o confunda com assimilação. Pensem no tal conceito de "inclusão social", tão badalado nesse governo, ponham a mão na consciência, e vejam que funciona do mesmo jeito, se não mais determinista, que o conceito de integração.
Vejam as duas matérias direto da Folha de São Paulo:
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Parecer do procurador-geral é favorável a manter demarcação de área em Roraima
FELIPE SELIGMAN
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza, enviou ao Supremo Tribunal Federal parecer contrário à suspensão do decreto de demarcação da reserva indígena Raposa/Serra do Sol. Esse era o passo que faltava para que o ministro Carlos Ayres Britto leve o caso ao plenário do Supremo.
Britto afirmou que pretende disponibilizar seu relatório até o final da semana que vem. A partir de então, caberá ao presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, decidir quando a questão será julgada. "Como o presidente já se mostrou empenhado, é possível que até o final de maio realizemos esse julgamento tão importante."
O parecer trata sobre uma ação popular protocolada em 2005 pelos senadores Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR) e Augusto Botelho (PT-RR), pedindo o cancelamento do decreto editado naquele mesmo ano.
No texto, o procurador-geral afirma que "a alegação de ofensa ao equilíbrio federativo e à autonomia de Roraima está divorciada da realidade". "A área indígena Raposa/Serra do Sol representa pouco mais de 7% do território daquele Estado, que, desde sua criação, conta com a presença de numerosos grupos indígenas, sendo a população em questão ali residente a terceira maior do país."
O governo de Roraima, por sua vez, reclama que 46% do território do Estado já está tomado por reservas indígenas.
O procurador-geral diz que a área não traz risco à soberania nacional. "O risco de abalo à soberania nacional, se presente, haverá de ser eliminado, se for o caso, por mecanismos outros de proteção, sem sacrifício do direito dos povos indígenas."
Na ação, os parlamentares alegaram que a demarcação traria conseqüências "desastrosas" para o Estado.
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STF deve votar contra saída de não-indígenas de reserva
Supremo também vai restringir MPs que mudam texto do Orçamento já aprovado
No caso da Raposa/Serra do Sol, ministros do tribunal argumentam haver cidades inteiras dentro da área demarcada como indígena
ELIANE CANTANHÊDE
COLUNISTA DA FOLHA
VALDO CRUZ
KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O STF (Supremo Tribunal Federal) restringirá a edição de medidas provisórias de créditos extraordinários do Orçamento da União. E tende a modificar o modelo de demarcação contínua da reserva Raposa/Serra do Sol, em Roraima.
No caso da reserva, o objetivo é evitar a remoção de não-indígenas. Segundo a Folha apurou, o STF deve criar "ilhas" na reserva, segundo a expressão ouvida no Supremo.
No das MPs, o Supremo avalia que há abuso do Executivo, que recorre ao artifício para modificar o texto do Orçamento aprovado no Congresso.
Ao julgar o modelo de demarcação da reserva, o Supremo deverá deixar claro que, apesar da pressão de setores e ONGs internacionais, as Forças Armadas não sofrerão constrangimento para atuar em território indígena em todo o país, porque a propriedade das reservas é da União.
O Brasil é signatário da "Declaração dos Povos Indígenas" da ONU (Organização das Nações Unidas), de 2007, que assegura o direito dos índios à terra e aos seus territórios. Isso preocupa as Forças Armadas, porque poderia caracterizar um território autônomo dentro do território nacional.
O comandante militar da Amazônia, general Augusto Heleno, admitiu publicamente que temia "ameaça à soberania nacional", já que a reserva fica em área de fronteira.
O Supremo dirá que a declaração não é convenção, tratado nem tem força de lei. Trata-se de manifestação política.
A demarcação da reserva Raposa/Serra do Sol foi feita em 1998, no governo Fernando Henrique Cardoso, e homologada já na gestão Lula, em 2005. O Planalto começou a recuar na defesa da demarcação contínua devido à tensão gerada pelo processo de retirada dos não-indígenas da área.
Produtores de arroz, por exemplo, ameaçaram entrar em conflito contra índios e a Polícia Federal para ficar na reserva, e o STF suspendeu as ações de retirada dos não-índios para estudar a questão.
Em reunião com líderes indígenas no Planalto, Lula disse que apóia a demarcação contínua, mas, nos bastidores, torce para que o STF mude a regra. Se houver ônus político, será do Supremo, não do governo.
Na opinião da maioria dos ministros do STF, há argumento jurídico para manter na reserva populações não-indígenas que vivem na área, algumas desde 1880 e outras que foram estimuladas pela ditadura militar de 1964 a aderir à colonização de Roraima. A tendência do STF é reconhecer a legitimidade dessas ocupações. Ministros argumentam que há cidades inteiras dentro da reserva e não faria sentido sua remoção.
Atualmente, dentro da reserva já existem duas áreas de exclusão -dos municípios de Normandia e Uiramatã. Políticos do Estado defendem a criação de mais quatro -vale do Arroz, lago de Caracaranã, vila Surumu e a área da hidrelétrica do rio Cotingo, em construção.
segunda-feira, 28 de abril de 2008
RADICALISMO X ALARMISMO: opiniões em O Globo
Além da matéria postada abaixo desta, o jornal O Globo publicou hoje um editorial chamado RADICALISMO contra a homologação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol. Publicou também uma opinião contrária, chamada ALARMISMO, dada pelo presente autor, defendendo a homologação da referida Terra Indígena.
Vale a pena ler as duas e compará-las. Contribuem para o grande debate da atualidade e para o esclarecimento sobre as posições antagônicas.
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RADICALISMO
EDITORIAL, O GLOBO
28/4/2008
O multifacetado governo Lula, parte dele formado por alguns sultanatos ideológicos, controlados por grupos políticos que há tempos atuam no PT e cercanias, formalizou em 2005 a constituição da reserva indígena Raposa Serra do Sol, no estado de Roraima, em terras contínuas. Foi uma vitória de um desses sultanatos, o dos indigenistas radicais. No outro lado, o dos derrotados, ficaram agricultores que cultivam arroz naquelas terras, parte dos índios, os que vivem dessas fazendas, e o governo de Roraima, cuja área territorial passará a ter metade sob o controle de tribos, considerando a já existente e ampla reserva Ianomâmi. Caso o desejo dos indigenistas oficiais seja de fato realizado, Roraima perderá receita tributária e deverá se inviabilizar como estado da Federação, sendo forçado a voltar à condição de território, dependente de repasses do governo federal.
Não fosse a providencial decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de suspender a operação deflagrada pela Polícia Federal para retirar arrozeiros e índios da Raposa Serra do Sol, e com isso reabrindo a questão da constituição da reserva - se em terras contínuas ou bolsões, como é mais sensato -, teria havido uma onda de violência na região de dimensões imprevisíveis.
O assunto tem grande capacidade de mobilização. O comandante militar da Amazônia, general Augusto Heleno, chegou a avançar o sinal da disciplina quando, numa palestra pública no Clube Militar, no Rio, fez duras críticas à política indigenista do governo.
Mesmo o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), vai contra a posição do Ministério da Justiça e da Funai, a favor da reserva contínua. Ele chegou a defender a exclusão de pelo menos quatro áreas da Raposa Serra do Sol, para Roraima não ser inviabilizado economicamente: o vale dos plantadores de arroz, o local da hidrelétrica do Rio Cotingo, em construção, a Vila do Surumu e a estrutura turística do Lago Caracaranã.
Não fosse suficiente essa argumentação contra o indigenismo radical, a reserva ainda fica em área de fronteira. Logo, também faz sentido a preocupação de militares.
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ALARMISMO
Mércio P. Gomes
Antropólogo e ex-presidente da Funai
Por mais inverossímil que pareça, o STF poderá levar a Nação brasileira a um retrocesso sem precedentes na história do indigenismo nacional. As declarações proferidas por alguns ministros antecipam uma grave mudança na Terra Indígena Raposa Serra do Sol, desmembrando-a em “ilhas” para acomodar sete arrozeiros que nela penetraram ilegalmente alguns anos atrás. A justificativa para tal ato seria o perigo à integridade territorial brasileira pela existência de terras indígenas nas nossas fronteiras e pela presença ostensiva de Ongs na Amazônia.
Do lado militar, o chefe do Comando Militar da Amazônia prossegue em franca campanha de atemorização nacional pela presença de terras indígenas em fronteiras, de estrangeiros na Amazônia e da possibilidade de entrarmos em guerra contra algum inimigo fronteiriço ou internacional.
O alarme reverbera na opinião pública. Ninguém parece se lembrar do papel dos índios na história brasileira, especialmente na inclusão de Roraima ao território nacional. Esquecem os militares de um de seus maiores patronos, o Marechal Rondon, que escreveu, em 1910, que os índios "são nações autônomas, com as quais o Brasil deve ter relações de amizade".
Quem era Rondon? Um venda-pátria, ou um dos maiores patriotas que a Nação já teve? Para Rondon os povos indígenas são parte essencial da Nação brasileira. Chama-os de nações no mesmo sentido que o Canadá chama seus povos indígenas de First Nations, isto é, Primeiras Nações. Será que o Canadá põe em perigo sua soberania ao chamar seus povos indígenas de nações?
Nunca na história brasileira o nosso território sofreu perda para outro país, muito menos por causa dos índios. Ao contrário, foi pela aliança de alguns povos indígenas com os portugueses que partes substantivas do nosso território passaram a pertencer ao que hoje é o território nacional.
Todos que almejam ver um Brasil digno e respeitado têm que começar respeitando os povos indígenas, os primeiros brasileiros. O STF não pode voltar atrás na homologação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, não só pelo ato já realizado, mas pelo que a homologação representa como ato jurídico que oficializa o reconhecimento do Estado e da Nação sobre as terras indígenas. Nos últimos cem anos, 600 segmentos do território nacional foram reconhecidos como terras indígenas e todas elas pertencem integral e constitucionalmente à União brasileira.
Vale a pena ler as duas e compará-las. Contribuem para o grande debate da atualidade e para o esclarecimento sobre as posições antagônicas.
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RADICALISMO
EDITORIAL, O GLOBO
28/4/2008
O multifacetado governo Lula, parte dele formado por alguns sultanatos ideológicos, controlados por grupos políticos que há tempos atuam no PT e cercanias, formalizou em 2005 a constituição da reserva indígena Raposa Serra do Sol, no estado de Roraima, em terras contínuas. Foi uma vitória de um desses sultanatos, o dos indigenistas radicais. No outro lado, o dos derrotados, ficaram agricultores que cultivam arroz naquelas terras, parte dos índios, os que vivem dessas fazendas, e o governo de Roraima, cuja área territorial passará a ter metade sob o controle de tribos, considerando a já existente e ampla reserva Ianomâmi. Caso o desejo dos indigenistas oficiais seja de fato realizado, Roraima perderá receita tributária e deverá se inviabilizar como estado da Federação, sendo forçado a voltar à condição de território, dependente de repasses do governo federal.
Não fosse a providencial decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de suspender a operação deflagrada pela Polícia Federal para retirar arrozeiros e índios da Raposa Serra do Sol, e com isso reabrindo a questão da constituição da reserva - se em terras contínuas ou bolsões, como é mais sensato -, teria havido uma onda de violência na região de dimensões imprevisíveis.
O assunto tem grande capacidade de mobilização. O comandante militar da Amazônia, general Augusto Heleno, chegou a avançar o sinal da disciplina quando, numa palestra pública no Clube Militar, no Rio, fez duras críticas à política indigenista do governo.
Mesmo o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), vai contra a posição do Ministério da Justiça e da Funai, a favor da reserva contínua. Ele chegou a defender a exclusão de pelo menos quatro áreas da Raposa Serra do Sol, para Roraima não ser inviabilizado economicamente: o vale dos plantadores de arroz, o local da hidrelétrica do Rio Cotingo, em construção, a Vila do Surumu e a estrutura turística do Lago Caracaranã.
Não fosse suficiente essa argumentação contra o indigenismo radical, a reserva ainda fica em área de fronteira. Logo, também faz sentido a preocupação de militares.
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ALARMISMO
Mércio P. Gomes
Antropólogo e ex-presidente da Funai
Por mais inverossímil que pareça, o STF poderá levar a Nação brasileira a um retrocesso sem precedentes na história do indigenismo nacional. As declarações proferidas por alguns ministros antecipam uma grave mudança na Terra Indígena Raposa Serra do Sol, desmembrando-a em “ilhas” para acomodar sete arrozeiros que nela penetraram ilegalmente alguns anos atrás. A justificativa para tal ato seria o perigo à integridade territorial brasileira pela existência de terras indígenas nas nossas fronteiras e pela presença ostensiva de Ongs na Amazônia.
Do lado militar, o chefe do Comando Militar da Amazônia prossegue em franca campanha de atemorização nacional pela presença de terras indígenas em fronteiras, de estrangeiros na Amazônia e da possibilidade de entrarmos em guerra contra algum inimigo fronteiriço ou internacional.
O alarme reverbera na opinião pública. Ninguém parece se lembrar do papel dos índios na história brasileira, especialmente na inclusão de Roraima ao território nacional. Esquecem os militares de um de seus maiores patronos, o Marechal Rondon, que escreveu, em 1910, que os índios "são nações autônomas, com as quais o Brasil deve ter relações de amizade".
Quem era Rondon? Um venda-pátria, ou um dos maiores patriotas que a Nação já teve? Para Rondon os povos indígenas são parte essencial da Nação brasileira. Chama-os de nações no mesmo sentido que o Canadá chama seus povos indígenas de First Nations, isto é, Primeiras Nações. Será que o Canadá põe em perigo sua soberania ao chamar seus povos indígenas de nações?
Nunca na história brasileira o nosso território sofreu perda para outro país, muito menos por causa dos índios. Ao contrário, foi pela aliança de alguns povos indígenas com os portugueses que partes substantivas do nosso território passaram a pertencer ao que hoje é o território nacional.
Todos que almejam ver um Brasil digno e respeitado têm que começar respeitando os povos indígenas, os primeiros brasileiros. O STF não pode voltar atrás na homologação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, não só pelo ato já realizado, mas pelo que a homologação representa como ato jurídico que oficializa o reconhecimento do Estado e da Nação sobre as terras indígenas. Nos últimos cem anos, 600 segmentos do território nacional foram reconhecidos como terras indígenas e todas elas pertencem integral e constitucionalmente à União brasileira.
domingo, 27 de abril de 2008
Ongs dominam a política indigenista brasileira
O jornal O Globo traz hoje uma longa reportagem, como principal manchete de capa e com três páginas, sobre a atuação desastrada da política indigenista brasileira, sobre os disfuncionamentos da Funai, Funasa e outros órgãos federais, e sobre a presença avassaladora das Ongs nos órgãos indigenistas.
Como trata de assuntos em que eu próprio sou entrevistado, deixo para os leitores sua avaliação.
A matéria abaixo saiu no Globo Online, a matéria completa está no jornal dominical, o qual não pude inserir nesse Blog.
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Política indigenista: governo repassa centenas de milhões para ONGs e está ausente das aldeias
O Globo Online
BRASÍLIA - Dispersa em vários órgãos do governo, e alvo das críticas do general Augusto Heleno, comandante militar da Amazônia, que a chamou de "lamnetável, para não dizrer caótica", a política indigenista está entregue a Organizações Não-Governamentais (ONGs) e não consegue atender os 740 mil índios em todo o país. Com a ausência do Estado nas aldeias, proliferam a criação de organizações, muitas arrancando para si vultosas quantias do orçamento destinado à saúde indígena; outras interessadas em catequizar e evangelizar esses povos. É o que mostra reportagem de Maria Lima, Evandro Éboli e Chico de Gois na edição deste domingo de 'O Globo'. Há no meio militar receio de que entidades ligadas a ONGs estrangeiras estejam de olho não só nos índios, mas na riqueza florestal e mineral da Amazônia.
A política indigenista brasileira não funciona na prática
- A política indigenista brasileira não funciona na prática - diz o ex-presidente da Funai Mércio Pereira Gomes, que ocupou o cargo em quase todo o primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e em parte do segundo.
Além da Funai, as ações do governo para os índios estão espalhadas pelos ministérios da Educação, Saúde e Meio Ambiente.
Na Saúde, por exemplo, 51 ONGs cuidam dos indígenas, mas 26 delas foram trocadas, desde 2007, por irregularidades. Algumas são suspeitas até mesmo de desviar recursos. No início do mês, a Fundação Nacional de Saúde (Funasa) editou portaria tornando mais rígida a contratação dessas organizações. As novas regras passam a valer em 1º de junho.
O atual presidente da Funai, Márcio Meira, empregou o antropólogo Paulo Santilli, irmão de Márcio Santilli, ex-presidente da Funai e sócio-fundador do Instituto Socioambiental (Isa), que realiza trabalhos para a fundação. Seu trabalho é fazer a demarcação física da terra indígena, com abertura de picadas, fixação de placas e marcos nas áreas.
- O critério foi a competência. Não há qualquer relação com o fato de ser irmão do Márcio Santilli, que só vim a conhecer recentemente - disse.
O advogado Aloizio Azanha, que também foi do Isa, atua como assessor na Diretoria de Assuntos Fundiários. Márcio Meira negou que qualquer um dos três tenha ligação com organizações não-governamentais.
Não há ninguém de ONG na Funai. E se houvesse, qual seria o problema?!
- Não há ninguém de ONG na Funai. E se houvesse, qual seria o problema?! - diz.
Hoje, a Funai administra 488 reservas indígenas ou 105,6 milhões de hectares, o equivalente a 12% do território brasileiro. Outras 201 áreas estão na fila para também se tornar reservas homologadas. Com isso, 15% das terras do país serão destinadas aos índios. O índio Teuê Camaiurá, do Parque Nacional do Xingu, desistiu de buscar ajuda na Funai. Conta que ao lado do parque, em Mato Grosso, há um posto da Funai que está caindo aos pedaços, e que a presença do órgão na aldeia quase não existe.
Um exemplo de ONG que tem despertado a suspeita de militares sobre sua atuação é a Jovens Com Uma Missão (Jocum), criada em 1960 pelo californiano Loren Cunningham. Tem bases em todo o Brasil e em dezenas de países. A principal fica em Porto Velho, responsável pela catequização e assistência a 16 tribos da Amazônia. Mike Bunn cuida do programa de rádio e aviação. A rádio da ONG tem uma estação em cada aldeia onde atua. As antenas de Porto Velho despertaram a atenção dos órgãos de segurança. O missionário Reinaldo Ribeiro e a esposa, Bráulia, são os responsáveis pela base de Porto Velho. Ele diz que a ONG atua na região há mais de 20 anos:
- Mas não nos envolvemos em conflitos por demarcação.
Com a sociedade civil de parceira, é possível compartilhar a gestão para melhor atender os povos indígenas
Márcio Meira considera que a política indigenista do país é um sucesso. Ele também defende a atuação das ONGs nas reservas.
- Com a sociedade civil de parceira, é possível compartilhar a gestão para melhor atender os povos indígenas - disse Meira.
As bases da política indigenista do governo, segundo o presidente do órgão, ainda têm como ponto central a política de estado lançada pelo Marechal Rondon em 1910, ou seja, há quase cem anos.
- O foco central é que os índios sejam protegidos e sobrevivam. O índio precisa viver. Então vem dado certo, na medida que o índio está sobrevivendo e a população indígena, crescendo substancialmente. Para isso, o mais importante é que sejam protegidos e suas terras, garantidas - disse Márcio Meira.
Mércio Gomes concorda com a crítica do general Augusto Heleno de que a política indigenista é caótica.
- Concordo. Acho a política indigenista brasileira uma das melhores do mundo, mas está sendo conduzida de maneira caótica. O general prestou um grande serviço à nação ao alertar para o perigo da ameaça à soberania, mas apontou o rifle para o lado errado. A culpa não é dos índios, mas do Estado, que não fortalece o Ibama, a Funai e o próprio Exército, órgãos que devem proteger a Amazônia.
Como trata de assuntos em que eu próprio sou entrevistado, deixo para os leitores sua avaliação.
A matéria abaixo saiu no Globo Online, a matéria completa está no jornal dominical, o qual não pude inserir nesse Blog.
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Política indigenista: governo repassa centenas de milhões para ONGs e está ausente das aldeias
O Globo Online
BRASÍLIA - Dispersa em vários órgãos do governo, e alvo das críticas do general Augusto Heleno, comandante militar da Amazônia, que a chamou de "lamnetável, para não dizrer caótica", a política indigenista está entregue a Organizações Não-Governamentais (ONGs) e não consegue atender os 740 mil índios em todo o país. Com a ausência do Estado nas aldeias, proliferam a criação de organizações, muitas arrancando para si vultosas quantias do orçamento destinado à saúde indígena; outras interessadas em catequizar e evangelizar esses povos. É o que mostra reportagem de Maria Lima, Evandro Éboli e Chico de Gois na edição deste domingo de 'O Globo'. Há no meio militar receio de que entidades ligadas a ONGs estrangeiras estejam de olho não só nos índios, mas na riqueza florestal e mineral da Amazônia.
A política indigenista brasileira não funciona na prática
- A política indigenista brasileira não funciona na prática - diz o ex-presidente da Funai Mércio Pereira Gomes, que ocupou o cargo em quase todo o primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e em parte do segundo.
Além da Funai, as ações do governo para os índios estão espalhadas pelos ministérios da Educação, Saúde e Meio Ambiente.
Na Saúde, por exemplo, 51 ONGs cuidam dos indígenas, mas 26 delas foram trocadas, desde 2007, por irregularidades. Algumas são suspeitas até mesmo de desviar recursos. No início do mês, a Fundação Nacional de Saúde (Funasa) editou portaria tornando mais rígida a contratação dessas organizações. As novas regras passam a valer em 1º de junho.
O atual presidente da Funai, Márcio Meira, empregou o antropólogo Paulo Santilli, irmão de Márcio Santilli, ex-presidente da Funai e sócio-fundador do Instituto Socioambiental (Isa), que realiza trabalhos para a fundação. Seu trabalho é fazer a demarcação física da terra indígena, com abertura de picadas, fixação de placas e marcos nas áreas.
- O critério foi a competência. Não há qualquer relação com o fato de ser irmão do Márcio Santilli, que só vim a conhecer recentemente - disse.
O advogado Aloizio Azanha, que também foi do Isa, atua como assessor na Diretoria de Assuntos Fundiários. Márcio Meira negou que qualquer um dos três tenha ligação com organizações não-governamentais.
Não há ninguém de ONG na Funai. E se houvesse, qual seria o problema?!
- Não há ninguém de ONG na Funai. E se houvesse, qual seria o problema?! - diz.
Hoje, a Funai administra 488 reservas indígenas ou 105,6 milhões de hectares, o equivalente a 12% do território brasileiro. Outras 201 áreas estão na fila para também se tornar reservas homologadas. Com isso, 15% das terras do país serão destinadas aos índios. O índio Teuê Camaiurá, do Parque Nacional do Xingu, desistiu de buscar ajuda na Funai. Conta que ao lado do parque, em Mato Grosso, há um posto da Funai que está caindo aos pedaços, e que a presença do órgão na aldeia quase não existe.
Um exemplo de ONG que tem despertado a suspeita de militares sobre sua atuação é a Jovens Com Uma Missão (Jocum), criada em 1960 pelo californiano Loren Cunningham. Tem bases em todo o Brasil e em dezenas de países. A principal fica em Porto Velho, responsável pela catequização e assistência a 16 tribos da Amazônia. Mike Bunn cuida do programa de rádio e aviação. A rádio da ONG tem uma estação em cada aldeia onde atua. As antenas de Porto Velho despertaram a atenção dos órgãos de segurança. O missionário Reinaldo Ribeiro e a esposa, Bráulia, são os responsáveis pela base de Porto Velho. Ele diz que a ONG atua na região há mais de 20 anos:
- Mas não nos envolvemos em conflitos por demarcação.
Com a sociedade civil de parceira, é possível compartilhar a gestão para melhor atender os povos indígenas
Márcio Meira considera que a política indigenista do país é um sucesso. Ele também defende a atuação das ONGs nas reservas.
- Com a sociedade civil de parceira, é possível compartilhar a gestão para melhor atender os povos indígenas - disse Meira.
As bases da política indigenista do governo, segundo o presidente do órgão, ainda têm como ponto central a política de estado lançada pelo Marechal Rondon em 1910, ou seja, há quase cem anos.
- O foco central é que os índios sejam protegidos e sobrevivam. O índio precisa viver. Então vem dado certo, na medida que o índio está sobrevivendo e a população indígena, crescendo substancialmente. Para isso, o mais importante é que sejam protegidos e suas terras, garantidas - disse Márcio Meira.
Mércio Gomes concorda com a crítica do general Augusto Heleno de que a política indigenista é caótica.
- Concordo. Acho a política indigenista brasileira uma das melhores do mundo, mas está sendo conduzida de maneira caótica. O general prestou um grande serviço à nação ao alertar para o perigo da ameaça à soberania, mas apontou o rifle para o lado errado. A culpa não é dos índios, mas do Estado, que não fortalece o Ibama, a Funai e o próprio Exército, órgãos que devem proteger a Amazônia.
O que pensa Aldo Rebelo sobre a Terra Indígena Raposa Serra do Sol
O deputado Aldo Rebelo, grande figura no Congresso Nacional, possível candidato à prefeitura de São Paulo, membro do Partido Comunista do Brasil, apresenta nessa entrevista em O Estado de São Paulo sua visão da questão Raposa Serra do Sol.
Não dá para deixá-lo falando sozinho. Aldo merece nosso respeito, mesmo tendo uma visão tão simples do processo de demarcação de terras indígenas e da questão da presença dessas terras em nossas fronteiras.
Aldo Rebelo é um nacionalista ferrenho. Nascido em Alagoas, numa fazenda, filho de vaqueiro, fez-se homem por seu próprio mérito. Embora não acredite na ideologia americana do self-made man, Aldo vê o Brasil como um país que, nas frechas de um sistema de classes rígido, quase de castas, pode haver oportunidades para aqueles que sabem fazer a hora e se alçar no panorama nacional, tanto político como econômico.
Aldo leu seu Casa Grande e Senzala, seu Raízes do Brasil, seu O Povo Brasileiro, seu Formação do Brasil Colonial, seu Formação Econômica do Brasil, seu A Revolução Burguesa no Brasil, esses grandes livros de análise e de esperança no Brasil, respectivamente de Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda, Darcy Ribeiro, Caio Prado Jr., Celso Furtado e Florestan Fernandes.
Aldo não acredita mais em revolução comunista, como acreditava antes, mas acredita no Brasil como um país que um dia trará igualdade e felicidade para seu povo, sendo esse povo protagonista de sua história. Eis as bases fundamentais do pensamento do deputado Aldo Rebelo.
No que eu concordo em 90%. Porém, os 10% que faltam são essenciais para uma compreensão melhor do que é o Brasil e do que ele poderá vir a ser. Nesse sentido, redimir a história do Brasil em relação aos povos indígenas é essencial, é o primeiro grande passo para o Brasil ter um encontro consigo, abrir todo seu potencial de grande nação, e esse trabalho começa com a garantia das terras indígenas que podem ser obtidas, resgatadas e consignadas como de direito pleno aos povos indígenas concernentes.
O deputado Aldo Rebelo é um homem corajoso, fala o que pensa, não teme ser identificado como um homem anti-indígena. Ele se declara pró-brasileiro! Mas falta-lhe a compreensão superior da formação do Brasil como povo e como cultura. Grande leitor que é, ele precisa ler alguns livros essenciais sobre a história dos povos indígenas. Assim, poderá vir a compreender que os povos indígenas foram fundamentais na formação do povo brasileiro, mas continuam sendo, aqueles que sobreviveram como tais, e que querem se manter como povos com culturas específicas. Eles contribuem na defesa e proteção do meio ambiente (apesar de alguns indígenas venderem madeira) e eles contribuem como exemplos de povos diferenciados que vivem em nosso país, falando 180 línguas distintas, detendo 13% do território nacional e sendo reconhecido pelos demais brasileiros como os "primeiros brasileiros".
Os povos indígenas são brasileiros pela constituição brasileira, mas o são também por afinidade e por amor, por lealdade e por vontade própria. Seus territórios em fronteiras não põem em perigo a soberania nacional. Se assim pensa a maioria dos militares brasileiros, o diálogo entre eles e os índios tem que ocorrer. Imediatamente!
A entrevista do deputado Aldo Rebelo vem a seguir.
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'O Exército não pode desterrar os não-índios'
Para Aldo, União não pode simplesmente declarar extinção de municípios e solucionar conflito com exclusão de uma das partes
Rui Nogueira
No debate em torno da demarcação da reserva indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, o alagoano José Aldo Rebelo de Figueiredo, 52 anos, é uma voz imbuída do espírito de José Bonifácio (1763-1838), o patriarca da independência que propunha a “intransigência na causa, mas com flexibilidade nos caminhos”. Aldo Rebelo (PC do B), deputado representante de São Paulo desde 1991 na Câmara, deve ser o paulista por adoção política que mais conhece a reserva indígena e que mais andou pela calha do Amazonas.
Consolidou, por isso, um caminho que, a grosso modo, passa ao largo do nacionalismo alarmista e da antropologia paternalista. Nesta entrevista, ele pede que se protejam os índios da reserva demarcada em abril de 2005 pelo presidente Lula, mas que não se use o Exército para “desterrar” os não-índios como se eles fossem menos brasileiros que os demais brasileiros. A Operação Upakaton 3, da Polícia Federal, para retirar do 1,7 milhão de hectares os não-índios, está suspensa até que o Supremo Tribunal Federal (STF) tome uma decisão sobre o assunto.
Qual é a essência do problema do conflito em Roraima, na reserva Raposa Serra do Sol?
Nós reduzimos o problema a um duelo de pontos de vista sobre se a demarcação contínua é certa ou errada. O certo é que a situação expõe razões que, se consideradas isoladamente, deformam o todo. O que nós queremos? Impor uma derrota aos índios que reivindicam a demarcação contínua? Queremos derrotar os que defendem a demarcação em reservas ilhadas? Simplesmente não corresponde à verdade dizer que há ali, na região, apenas meia dúzia de arrozeiros. Quem já esteve lá, e eu estive lá mais de uma vez, e quem leu o relatório da Comissão Externa da Câmara (leia abaixo) sabe e viu como foram construídos aqueles municípios dos não-índios em Roraima. Tem gente que chegou lá no século 19 e no início do século passado.
O sr. tem falado em “erro geopolítico” e “paroxismo” envolvendo a política da demarcação da reserva.Explique.
Se não conseguimos julgar uma política com antecedência, devemos, então, julgá-la pelas conseqüências. E a conseqüência do que está acontecendo em Roraima é a instalação de um grave conflito entre populações do mesmo País.
O sr. acha que o Exército está sendo usado para fins políticos?
O Exército pode dar proteção a participantes de uma conferência internacional, no Rio, por exemplo, contra o crime organizado. Mas o Exército não pode ser usado para proteger as populações indígenas brasileiras e, ao mesmo tempo, desterrar populações não-índias e igualmente brasileiras. Pior: o Exército costuma ser barrado quando quer entrar numa reserva.
Isso é paradoxal. E a questão geopolítica?
Há populações na região da Reserva Raposa do Sol que vivem ali muito antes de parcela das populações indígenas que atravessaram as fronteiras vindas de guerras tribais do Caribe. Creio que devemos receber e acolher essas populações indígenas juntamente com as populações indígenas que já existiam no Brasil. Mas devemos acolher, também, os brasileiros não-índios que ali chegaram há muitos anos e ali construíram suas vidas. Como é que nós podemos simplesmente, em um processo de demarcação, declarar a extinção desses municípios, que é o caso do município de Normandia, que é de 1904, Pacaraima e mesmo Uiramutã. O de Uiramutã, nós (os parlamentares) conseguimos retirar da lista de extinção em meio a uma negociação difícil. As pessoas tinham ali as suas raízes, a sua infância, suas famílias, sua história. A prefeita de Uiramutã me contou que o avô dela chegou ali em 1908. Como é que nós vamos promover o desterro dessa população? A decisão embute um erro geopolítico. Quem não considera isso um problema grave não está considerando o conjunto do problema. Nós não podemos buscar a solução para o conflito com a exclusão de uma das partes.
Os índios ainda são vítimas de uma incompreensão generalizada da sociedade branca?
Ainda que algumas pessoas não gostem de ouvir o que vou dizer, o certo é que o índio, no imaginário da sociedade brasileira, tem uma imagem positiva. As nossas cidades não estão cobertas de monumentos a exterminadores de índios, como estão as cidades norte-americanas. Não temos um herói como Buffalo Bill. Quando eu era menino, lembro que nos desfiles da escola havia sempre um grupo que desfilava representando os índios do País. Eu desfilava com orgulho, apesar de ser um pouquinho mais branco, nesse grupo que representava os índios.
Mas é comum ouvir que os dias de hoje continuam a refletir o início de uma história de colonização, de 500 anos atrás.
Essa é uma visão pessimista e derrotista do nosso processo histórico. Sou mais otimista, sem deixar de ver que a nossa história é carregada de erros e deformações, mas também é cheia de virtudes e acertos. É claro que ainda há incompreensões para com a população indígena, mas também há incompreensões para com as populações não-indígenas, caboclas, miscigenadas que vivem, no caso da reserva Raposa Serra do Sol, em áreas próximas às dos índios.
O que é, então, uma decisão minimamente justa para esse caso?
A responsabilidade da Nação, do Estado, dos intelectuais deve ir no sentido de compatibilizar a proteção e segurança das populações indígenas com a mesma proteção e segurança a conceder às população não-indígenas.
O sr. trata índios e não-índios como brasileiros, mas a antropologia pensou a demarcação como modo de preservar o diferente.
Eu sou tributário da minha formação marxista, da luta pela igualdade. Hoje, há uma grande parcela da esquerda que, depois de capitular diante das dificuldades para transformar o mundo, dedica mais esforço a cultuar e a reforçar a diferença, em vez de buscar a igualdade. Sei que isso tem peso muito grande na formação das opiniões sobre, por exemplo, convivência étnica. Mas a realidade em Roraima não se manifesta assim, eu sei porque vi, percorri toda aquela calha da fronteira, entrei nas áreas indígenas.
O sr. viu o quê?
Fui a uma reserva ianomâmi, perto de um pelotão de fronteira do Exército, e visitei uma maloca. Me deparei com umas 50 famílias convivendo dentro de um ambiente fechado, de penúria. Muitos fogos dentro da maloca para as famílias assarem bananas e mandiocas, muita poluição, muita fuligem, um ambiente com incidência muito grande de doenças infecciosas. Até tuberculose. Fui recepcionado por uma moça de uma organização não-governamental, a ONG Urihi. Perguntei por que não se puxava do pelotão água e luz para dentro da comunidade indígena, o que daria mais conforto à população. A moça da ONG disse que não, que isso ia deformar o modo de vida dos índios. Nessa visita, o comandante militar que estava comigo não pôde entrar na área indígena. Um grupo de crianças jogava futebol, e eu joguei um pouco com elas. Comentei com a moça da ONG: “Pelo menos o futebol é um fator de integração, pois todos torcemos pela mesma seleção.” A moça me respondeu: “Não. O senhor torce pela seleção brasileira, e os índios torcem para a seleção deles.” Nada mais falei e nada mais perguntei.
Isso é sintoma do quê?
Vi que havia ali uma incompreensão. Em outro município, perto do Pico da Neblina, as ONGs barraram, com a ajuda do Judiciário, uma construção do Exército. Só depois que a decisão foi revogada na Justiça é que o Exército pôde fazer a obra.
Há mesmo índios que querem conviver com os não-índios?
Uma parcela dos antropólogos defende, com razão, que a cosmogonia dos índios, a visão de seu surgimento e da evolução do universo, é incompatível com a convivência com os brancos e seus costumes. O problema em Roraima é que os índios já estão, de certa forma, integrados. As meninas índias de 15, 16 anos não querem viver mais da pesca, da coleta, não querem andar pela floresta com roupas tradicionais. A aspiração é ter uma vida social, vestir-se como se veste um adolescente. O isolamento para essas pessoas é uma ameaça, é a perda da possibilidade dessa convivência. A cosmogonia tem valor para as populações que não tiveram contato com os não-índios.
É alarmista falar da cobiça internacional sobre a Amazônia?
As manifestações em favor da submissão da Amazônia a uma espécie de tutela internacional só podem causar repulsa aos brasileiros com um mínimo de dignidade. As declarações e os estudos cobiçando a Amazônia são reais, desde o século 17. Dom Pedro 2º, numa carta à Condessa de Barral, já explicava por que não atendeu ao pedido de um conterrâneo meu, o então deputado Tavares Bastos, para abrir a calha da Amazônia à navegação estrangeira. Se fizesse isso, disse dom Pedro, iríamos ter protetorados na Amazônia iguais ao que foram criados na China pelas potência estrangeiras. Sabia o que estava em jogo.
Qual é o desconforto objetivo que a demarcação contínua da Raposa do Sol provoca no Exército?
O desconforto vem das restrições e das campanhas que se fazem dentro e fora do País contra a presença das Forças Armadas nas áreas indígenas.No caso da reserva Raposa do Sol, se a demarcação incluir os 150 quilômetros da terra que corre junto à fronteira da Guiana e da Venezuela, a ação do Exército fica muito dificultada, a fronteira não poderá ser vivificada. A melhor forma de controlar uma região fronteiriça é construir municípios na área, povoá-la, preenchendo-a com a presença de brasileiros índios e não-índios, gente que trabalhe, produza, que gere atividade econômica, política, social e cultural.
Não dá para deixá-lo falando sozinho. Aldo merece nosso respeito, mesmo tendo uma visão tão simples do processo de demarcação de terras indígenas e da questão da presença dessas terras em nossas fronteiras.
Aldo Rebelo é um nacionalista ferrenho. Nascido em Alagoas, numa fazenda, filho de vaqueiro, fez-se homem por seu próprio mérito. Embora não acredite na ideologia americana do self-made man, Aldo vê o Brasil como um país que, nas frechas de um sistema de classes rígido, quase de castas, pode haver oportunidades para aqueles que sabem fazer a hora e se alçar no panorama nacional, tanto político como econômico.
Aldo leu seu Casa Grande e Senzala, seu Raízes do Brasil, seu O Povo Brasileiro, seu Formação do Brasil Colonial, seu Formação Econômica do Brasil, seu A Revolução Burguesa no Brasil, esses grandes livros de análise e de esperança no Brasil, respectivamente de Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda, Darcy Ribeiro, Caio Prado Jr., Celso Furtado e Florestan Fernandes.
Aldo não acredita mais em revolução comunista, como acreditava antes, mas acredita no Brasil como um país que um dia trará igualdade e felicidade para seu povo, sendo esse povo protagonista de sua história. Eis as bases fundamentais do pensamento do deputado Aldo Rebelo.
No que eu concordo em 90%. Porém, os 10% que faltam são essenciais para uma compreensão melhor do que é o Brasil e do que ele poderá vir a ser. Nesse sentido, redimir a história do Brasil em relação aos povos indígenas é essencial, é o primeiro grande passo para o Brasil ter um encontro consigo, abrir todo seu potencial de grande nação, e esse trabalho começa com a garantia das terras indígenas que podem ser obtidas, resgatadas e consignadas como de direito pleno aos povos indígenas concernentes.
O deputado Aldo Rebelo é um homem corajoso, fala o que pensa, não teme ser identificado como um homem anti-indígena. Ele se declara pró-brasileiro! Mas falta-lhe a compreensão superior da formação do Brasil como povo e como cultura. Grande leitor que é, ele precisa ler alguns livros essenciais sobre a história dos povos indígenas. Assim, poderá vir a compreender que os povos indígenas foram fundamentais na formação do povo brasileiro, mas continuam sendo, aqueles que sobreviveram como tais, e que querem se manter como povos com culturas específicas. Eles contribuem na defesa e proteção do meio ambiente (apesar de alguns indígenas venderem madeira) e eles contribuem como exemplos de povos diferenciados que vivem em nosso país, falando 180 línguas distintas, detendo 13% do território nacional e sendo reconhecido pelos demais brasileiros como os "primeiros brasileiros".
Os povos indígenas são brasileiros pela constituição brasileira, mas o são também por afinidade e por amor, por lealdade e por vontade própria. Seus territórios em fronteiras não põem em perigo a soberania nacional. Se assim pensa a maioria dos militares brasileiros, o diálogo entre eles e os índios tem que ocorrer. Imediatamente!
A entrevista do deputado Aldo Rebelo vem a seguir.
___________________________________________
'O Exército não pode desterrar os não-índios'
Para Aldo, União não pode simplesmente declarar extinção de municípios e solucionar conflito com exclusão de uma das partes
Rui Nogueira
No debate em torno da demarcação da reserva indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, o alagoano José Aldo Rebelo de Figueiredo, 52 anos, é uma voz imbuída do espírito de José Bonifácio (1763-1838), o patriarca da independência que propunha a “intransigência na causa, mas com flexibilidade nos caminhos”. Aldo Rebelo (PC do B), deputado representante de São Paulo desde 1991 na Câmara, deve ser o paulista por adoção política que mais conhece a reserva indígena e que mais andou pela calha do Amazonas.
Consolidou, por isso, um caminho que, a grosso modo, passa ao largo do nacionalismo alarmista e da antropologia paternalista. Nesta entrevista, ele pede que se protejam os índios da reserva demarcada em abril de 2005 pelo presidente Lula, mas que não se use o Exército para “desterrar” os não-índios como se eles fossem menos brasileiros que os demais brasileiros. A Operação Upakaton 3, da Polícia Federal, para retirar do 1,7 milhão de hectares os não-índios, está suspensa até que o Supremo Tribunal Federal (STF) tome uma decisão sobre o assunto.
Qual é a essência do problema do conflito em Roraima, na reserva Raposa Serra do Sol?
Nós reduzimos o problema a um duelo de pontos de vista sobre se a demarcação contínua é certa ou errada. O certo é que a situação expõe razões que, se consideradas isoladamente, deformam o todo. O que nós queremos? Impor uma derrota aos índios que reivindicam a demarcação contínua? Queremos derrotar os que defendem a demarcação em reservas ilhadas? Simplesmente não corresponde à verdade dizer que há ali, na região, apenas meia dúzia de arrozeiros. Quem já esteve lá, e eu estive lá mais de uma vez, e quem leu o relatório da Comissão Externa da Câmara (leia abaixo) sabe e viu como foram construídos aqueles municípios dos não-índios em Roraima. Tem gente que chegou lá no século 19 e no início do século passado.
O sr. tem falado em “erro geopolítico” e “paroxismo” envolvendo a política da demarcação da reserva.Explique.
Se não conseguimos julgar uma política com antecedência, devemos, então, julgá-la pelas conseqüências. E a conseqüência do que está acontecendo em Roraima é a instalação de um grave conflito entre populações do mesmo País.
O sr. acha que o Exército está sendo usado para fins políticos?
O Exército pode dar proteção a participantes de uma conferência internacional, no Rio, por exemplo, contra o crime organizado. Mas o Exército não pode ser usado para proteger as populações indígenas brasileiras e, ao mesmo tempo, desterrar populações não-índias e igualmente brasileiras. Pior: o Exército costuma ser barrado quando quer entrar numa reserva.
Isso é paradoxal. E a questão geopolítica?
Há populações na região da Reserva Raposa do Sol que vivem ali muito antes de parcela das populações indígenas que atravessaram as fronteiras vindas de guerras tribais do Caribe. Creio que devemos receber e acolher essas populações indígenas juntamente com as populações indígenas que já existiam no Brasil. Mas devemos acolher, também, os brasileiros não-índios que ali chegaram há muitos anos e ali construíram suas vidas. Como é que nós podemos simplesmente, em um processo de demarcação, declarar a extinção desses municípios, que é o caso do município de Normandia, que é de 1904, Pacaraima e mesmo Uiramutã. O de Uiramutã, nós (os parlamentares) conseguimos retirar da lista de extinção em meio a uma negociação difícil. As pessoas tinham ali as suas raízes, a sua infância, suas famílias, sua história. A prefeita de Uiramutã me contou que o avô dela chegou ali em 1908. Como é que nós vamos promover o desterro dessa população? A decisão embute um erro geopolítico. Quem não considera isso um problema grave não está considerando o conjunto do problema. Nós não podemos buscar a solução para o conflito com a exclusão de uma das partes.
Os índios ainda são vítimas de uma incompreensão generalizada da sociedade branca?
Ainda que algumas pessoas não gostem de ouvir o que vou dizer, o certo é que o índio, no imaginário da sociedade brasileira, tem uma imagem positiva. As nossas cidades não estão cobertas de monumentos a exterminadores de índios, como estão as cidades norte-americanas. Não temos um herói como Buffalo Bill. Quando eu era menino, lembro que nos desfiles da escola havia sempre um grupo que desfilava representando os índios do País. Eu desfilava com orgulho, apesar de ser um pouquinho mais branco, nesse grupo que representava os índios.
Mas é comum ouvir que os dias de hoje continuam a refletir o início de uma história de colonização, de 500 anos atrás.
Essa é uma visão pessimista e derrotista do nosso processo histórico. Sou mais otimista, sem deixar de ver que a nossa história é carregada de erros e deformações, mas também é cheia de virtudes e acertos. É claro que ainda há incompreensões para com a população indígena, mas também há incompreensões para com as populações não-indígenas, caboclas, miscigenadas que vivem, no caso da reserva Raposa Serra do Sol, em áreas próximas às dos índios.
O que é, então, uma decisão minimamente justa para esse caso?
A responsabilidade da Nação, do Estado, dos intelectuais deve ir no sentido de compatibilizar a proteção e segurança das populações indígenas com a mesma proteção e segurança a conceder às população não-indígenas.
O sr. trata índios e não-índios como brasileiros, mas a antropologia pensou a demarcação como modo de preservar o diferente.
Eu sou tributário da minha formação marxista, da luta pela igualdade. Hoje, há uma grande parcela da esquerda que, depois de capitular diante das dificuldades para transformar o mundo, dedica mais esforço a cultuar e a reforçar a diferença, em vez de buscar a igualdade. Sei que isso tem peso muito grande na formação das opiniões sobre, por exemplo, convivência étnica. Mas a realidade em Roraima não se manifesta assim, eu sei porque vi, percorri toda aquela calha da fronteira, entrei nas áreas indígenas.
O sr. viu o quê?
Fui a uma reserva ianomâmi, perto de um pelotão de fronteira do Exército, e visitei uma maloca. Me deparei com umas 50 famílias convivendo dentro de um ambiente fechado, de penúria. Muitos fogos dentro da maloca para as famílias assarem bananas e mandiocas, muita poluição, muita fuligem, um ambiente com incidência muito grande de doenças infecciosas. Até tuberculose. Fui recepcionado por uma moça de uma organização não-governamental, a ONG Urihi. Perguntei por que não se puxava do pelotão água e luz para dentro da comunidade indígena, o que daria mais conforto à população. A moça da ONG disse que não, que isso ia deformar o modo de vida dos índios. Nessa visita, o comandante militar que estava comigo não pôde entrar na área indígena. Um grupo de crianças jogava futebol, e eu joguei um pouco com elas. Comentei com a moça da ONG: “Pelo menos o futebol é um fator de integração, pois todos torcemos pela mesma seleção.” A moça me respondeu: “Não. O senhor torce pela seleção brasileira, e os índios torcem para a seleção deles.” Nada mais falei e nada mais perguntei.
Isso é sintoma do quê?
Vi que havia ali uma incompreensão. Em outro município, perto do Pico da Neblina, as ONGs barraram, com a ajuda do Judiciário, uma construção do Exército. Só depois que a decisão foi revogada na Justiça é que o Exército pôde fazer a obra.
Há mesmo índios que querem conviver com os não-índios?
Uma parcela dos antropólogos defende, com razão, que a cosmogonia dos índios, a visão de seu surgimento e da evolução do universo, é incompatível com a convivência com os brancos e seus costumes. O problema em Roraima é que os índios já estão, de certa forma, integrados. As meninas índias de 15, 16 anos não querem viver mais da pesca, da coleta, não querem andar pela floresta com roupas tradicionais. A aspiração é ter uma vida social, vestir-se como se veste um adolescente. O isolamento para essas pessoas é uma ameaça, é a perda da possibilidade dessa convivência. A cosmogonia tem valor para as populações que não tiveram contato com os não-índios.
É alarmista falar da cobiça internacional sobre a Amazônia?
As manifestações em favor da submissão da Amazônia a uma espécie de tutela internacional só podem causar repulsa aos brasileiros com um mínimo de dignidade. As declarações e os estudos cobiçando a Amazônia são reais, desde o século 17. Dom Pedro 2º, numa carta à Condessa de Barral, já explicava por que não atendeu ao pedido de um conterrâneo meu, o então deputado Tavares Bastos, para abrir a calha da Amazônia à navegação estrangeira. Se fizesse isso, disse dom Pedro, iríamos ter protetorados na Amazônia iguais ao que foram criados na China pelas potência estrangeiras. Sabia o que estava em jogo.
Qual é o desconforto objetivo que a demarcação contínua da Raposa do Sol provoca no Exército?
O desconforto vem das restrições e das campanhas que se fazem dentro e fora do País contra a presença das Forças Armadas nas áreas indígenas.No caso da reserva Raposa do Sol, se a demarcação incluir os 150 quilômetros da terra que corre junto à fronteira da Guiana e da Venezuela, a ação do Exército fica muito dificultada, a fronteira não poderá ser vivificada. A melhor forma de controlar uma região fronteiriça é construir municípios na área, povoá-la, preenchendo-a com a presença de brasileiros índios e não-índios, gente que trabalhe, produza, que gere atividade econômica, política, social e cultural.
sexta-feira, 25 de abril de 2008
APELO AO STF PELOS POVOS INDÍGENAS
Apelo ao STF pelos povos indígenas
Mércio P. Gomes
Antropólogo e ex-presidente da Funai
Por mais inverossímel que pareça, o STF está elaborando os argumentos que poderão conduzir a Nação brasileira a um retrocesso sem precedentes na história do indigenismo nacional. As indicações são diversas, mas as mais evidentes são as declarações dadas por alguns dos seus eminentes ministros. Tais declarações são produto da suspensão liminar do processo de desintrusão que estava ocorrendo na Terra Indígena Raposa Serra do Sol, cuja homologação, realizada há precisamente três anos, requeria a retirada dos não indígenas daquela terra. Se esses argumentos se firmarem, talvez a T.I. Raposa Serra do Sol venha a sofrer um desmembramento de sua integridade territorial para satisfazer a permanência de alguns seis arrozeiros que lá penetraram ilegalmente na década de 1990. As justificativas para um tal ato do STF estariam em um suposto perigo à integridade territorial brasileira pela existência de terras indígenas nas fronteiras do Brasil com outros países sulamericanos, na presença ostensiva de Ongs influenciando os povos indígenas com o intuito de os fazerem independentes, e, enfim, em uma afronta a uma frágil soberania nacional.
Enquanto isso, no outro lado da questão indígena, as Ongs indigenistas, que estão dirigindo o movimento indígena nacional, praticam a ilusão de que quanto mais pressão puserem sobre o Governo Federal, o STF e o Congresso Nacional, mais essas entidades irão condescender em atender suas reivindicações.
Santa irresponsabilidade, santa e terrível alienação!
Não bastassem as declarações do ministro Carlos Ayres Britto, que vem sendo o relator de todas as ações pertinentes a essa homologação, do ministro Eros Grau e do ministro Gilmar Mendes, para citar só esses três que chegaram a falar sobre o assunto, o general Augusto Heleno, do Comando Militar da Amazônia, prossegue na sua campanha de demonstrar seu receio sobre as terras indígenas em fronteiras, sobre as Ongs e sobre a possibilidade de guerra no Brasil e mais precisamente na Amazônia.
Por sua vez, os jornais põem em suas manchetes e em seus editoriais notícias e comentários alarmistas, sem abrir espaço para argumentações mais ponderadas, calçadas na história e na antropologia nacionais. Evocam o tamanho da T.I. Raposa Serra do Sol, evocam a presença de terras indígenas em nossas fronteiras, evocam a Declaração Universal dos Direitos dos Povos Indígenas como elementos perigosos para a soberania brasileira.
Não querem se lembrar da importância dos povos indígenas na história brasileira, no papel dos índios de Roraima na inclusão desse território no território brasileiro. Esquecem os militares de um de seus maiores patronos, o Marechal Cândido Mariano da Silva Rondon, que disse, em 1910, que os índios "são nações autônomas, com as quais o Brasil deve ter relações de amizade".
Quem era Rondon? Um anti-patriota, ou um dos maiores patriotas que a Nação já teve? O que queria dizer Rondon? Que o Brasil deveria ser dividido em pequenas nações?!
Não, nada disso. Rondon propôs à Nação brasileira que os povos indígenas deveriam ser respeitados como coletividades autônomas, que ele honorificamente chama de nações! Vejam bem, nações não no sentido de estados soberanos, mas no sentido iluminista do termo, o qual engloba o sentimento de povo, cultura, territorialidade e autonomia política interna. No mesmo sentido que o Canadá chama seus povos indígenas de First Nations, isto é, as Nações Primeiras. Será que o Canadá é irresponsável a ponto de pôr em perigo sua soberania ao chamar seus povos indígenas de nações?
Os militares brasileiros têm muito de que se orgulhar pela Pátria grande que têm e que eles têm como dever defendê-la. Após cinco séculos de colonização e formação de um povo novo, o brasileiro, a presença de 225 povos indígenas, falando 180 línguas distintas, espalhados na imensidão do território nacional, é a demonstração viva e conceitual do quanto o Brasil é um país especial, extraordinário e único no mundo.
Temer que os povos indígenas levem o País a algum tipo de desmembramento de seu território é algo inacreditável. Nunca aconteceu isso em nossa história. Ao contrário, foi pela aliança de alguns povos indígenas com os portugueses que partes substantivas do nosso território passaram a pertencer ao Reino de Portugal, pelos Tratados de Madri (1759) e de São Idelfonso (1798), e que, com a Independência, passaram ao Brasil. O impressionante Pantanal matogrossense, para dar um exemplo, pertence ao Brasil por causa da aliança espontânea dos Kadiwéu, antes chamados de Guaicuru, com os portugueses. Aliás, com esse povo indígena Portugal fez o único tratado de paz e amizade em toda sua história, o que ocorreu em 1791, no Rio de Janeiro.
O Brasil é o que é e tem o território que tem por causa do bom relacionamento dos estados português e brasileiro com os povos indígenas que viviam no limiar das terras pretendidas por cada um desses estados. Este é o sentido dado por Rondon em sua frase magistral.
Apelo para os ministros do STF para abrirem suas mentes para a realidade superior dos interesses estratégicos do Brasil. O interesse maior do Brasil é ser uma Nação de primeiro mundo em um futuro próximo. Não é uma república de bananas, com medo de ONU, Ongs e OEA. A paranóia que vem tomando conta da opinião pública, por causa de declarações de arrozeiros, editoralistas, militares e políticos menores, não pode tomar conta das mentes dos nossos ministros.
Por sua vez, chega do movimento indígena ser dominado por Ongs sem nenhuma responsabilidade com os interesses maiores do País ! Essas Ongs só pensam nos seus interesses próprios e em levar os índios a seguirem seus ditames. Basta ao estado brasileiro fortalecer seu órgão indigenista, a Funai, para que essa influência esmaeça e desapareça em pouco tempo.
Todos que almejam ver o Brasil respeitado por sua soberania política e econômica, com uma cultura respeitada no mundo, com um povo alegre, digno e igualitário, têm que se unir aos povos indígenas e chamá-los, por atitudes de diálogo e amizade, a integrar a grande Nação brasileira. Num sentido capital, o STF não pode voltar atrás na homologação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, não só pelo mérito do ato realizado pelo presidente Luís Inácio Lula da Silva, mas pelo que o ato de homologação representa como ato jurídico que oficializa o reconhecimento do Estado e da Nação sobre as terras indígenas. A demarcação e a homologação de terras indígenas, nos últimos cem anos, reconheceram 600 segmentos do território nacional como terras indígenas as quais, mesmo sendo de usufruto exclusivo dos povos indígenas, fazem parte essencial e constitucional da União brasileira.
Mércio P. Gomes
Antropólogo e ex-presidente da Funai
Por mais inverossímel que pareça, o STF está elaborando os argumentos que poderão conduzir a Nação brasileira a um retrocesso sem precedentes na história do indigenismo nacional. As indicações são diversas, mas as mais evidentes são as declarações dadas por alguns dos seus eminentes ministros. Tais declarações são produto da suspensão liminar do processo de desintrusão que estava ocorrendo na Terra Indígena Raposa Serra do Sol, cuja homologação, realizada há precisamente três anos, requeria a retirada dos não indígenas daquela terra. Se esses argumentos se firmarem, talvez a T.I. Raposa Serra do Sol venha a sofrer um desmembramento de sua integridade territorial para satisfazer a permanência de alguns seis arrozeiros que lá penetraram ilegalmente na década de 1990. As justificativas para um tal ato do STF estariam em um suposto perigo à integridade territorial brasileira pela existência de terras indígenas nas fronteiras do Brasil com outros países sulamericanos, na presença ostensiva de Ongs influenciando os povos indígenas com o intuito de os fazerem independentes, e, enfim, em uma afronta a uma frágil soberania nacional.
Enquanto isso, no outro lado da questão indígena, as Ongs indigenistas, que estão dirigindo o movimento indígena nacional, praticam a ilusão de que quanto mais pressão puserem sobre o Governo Federal, o STF e o Congresso Nacional, mais essas entidades irão condescender em atender suas reivindicações.
Santa irresponsabilidade, santa e terrível alienação!
Não bastassem as declarações do ministro Carlos Ayres Britto, que vem sendo o relator de todas as ações pertinentes a essa homologação, do ministro Eros Grau e do ministro Gilmar Mendes, para citar só esses três que chegaram a falar sobre o assunto, o general Augusto Heleno, do Comando Militar da Amazônia, prossegue na sua campanha de demonstrar seu receio sobre as terras indígenas em fronteiras, sobre as Ongs e sobre a possibilidade de guerra no Brasil e mais precisamente na Amazônia.
Por sua vez, os jornais põem em suas manchetes e em seus editoriais notícias e comentários alarmistas, sem abrir espaço para argumentações mais ponderadas, calçadas na história e na antropologia nacionais. Evocam o tamanho da T.I. Raposa Serra do Sol, evocam a presença de terras indígenas em nossas fronteiras, evocam a Declaração Universal dos Direitos dos Povos Indígenas como elementos perigosos para a soberania brasileira.
Não querem se lembrar da importância dos povos indígenas na história brasileira, no papel dos índios de Roraima na inclusão desse território no território brasileiro. Esquecem os militares de um de seus maiores patronos, o Marechal Cândido Mariano da Silva Rondon, que disse, em 1910, que os índios "são nações autônomas, com as quais o Brasil deve ter relações de amizade".
Quem era Rondon? Um anti-patriota, ou um dos maiores patriotas que a Nação já teve? O que queria dizer Rondon? Que o Brasil deveria ser dividido em pequenas nações?!
Não, nada disso. Rondon propôs à Nação brasileira que os povos indígenas deveriam ser respeitados como coletividades autônomas, que ele honorificamente chama de nações! Vejam bem, nações não no sentido de estados soberanos, mas no sentido iluminista do termo, o qual engloba o sentimento de povo, cultura, territorialidade e autonomia política interna. No mesmo sentido que o Canadá chama seus povos indígenas de First Nations, isto é, as Nações Primeiras. Será que o Canadá é irresponsável a ponto de pôr em perigo sua soberania ao chamar seus povos indígenas de nações?
Os militares brasileiros têm muito de que se orgulhar pela Pátria grande que têm e que eles têm como dever defendê-la. Após cinco séculos de colonização e formação de um povo novo, o brasileiro, a presença de 225 povos indígenas, falando 180 línguas distintas, espalhados na imensidão do território nacional, é a demonstração viva e conceitual do quanto o Brasil é um país especial, extraordinário e único no mundo.
Temer que os povos indígenas levem o País a algum tipo de desmembramento de seu território é algo inacreditável. Nunca aconteceu isso em nossa história. Ao contrário, foi pela aliança de alguns povos indígenas com os portugueses que partes substantivas do nosso território passaram a pertencer ao Reino de Portugal, pelos Tratados de Madri (1759) e de São Idelfonso (1798), e que, com a Independência, passaram ao Brasil. O impressionante Pantanal matogrossense, para dar um exemplo, pertence ao Brasil por causa da aliança espontânea dos Kadiwéu, antes chamados de Guaicuru, com os portugueses. Aliás, com esse povo indígena Portugal fez o único tratado de paz e amizade em toda sua história, o que ocorreu em 1791, no Rio de Janeiro.
O Brasil é o que é e tem o território que tem por causa do bom relacionamento dos estados português e brasileiro com os povos indígenas que viviam no limiar das terras pretendidas por cada um desses estados. Este é o sentido dado por Rondon em sua frase magistral.
Apelo para os ministros do STF para abrirem suas mentes para a realidade superior dos interesses estratégicos do Brasil. O interesse maior do Brasil é ser uma Nação de primeiro mundo em um futuro próximo. Não é uma república de bananas, com medo de ONU, Ongs e OEA. A paranóia que vem tomando conta da opinião pública, por causa de declarações de arrozeiros, editoralistas, militares e políticos menores, não pode tomar conta das mentes dos nossos ministros.
Por sua vez, chega do movimento indígena ser dominado por Ongs sem nenhuma responsabilidade com os interesses maiores do País ! Essas Ongs só pensam nos seus interesses próprios e em levar os índios a seguirem seus ditames. Basta ao estado brasileiro fortalecer seu órgão indigenista, a Funai, para que essa influência esmaeça e desapareça em pouco tempo.
Todos que almejam ver o Brasil respeitado por sua soberania política e econômica, com uma cultura respeitada no mundo, com um povo alegre, digno e igualitário, têm que se unir aos povos indígenas e chamá-los, por atitudes de diálogo e amizade, a integrar a grande Nação brasileira. Num sentido capital, o STF não pode voltar atrás na homologação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, não só pelo mérito do ato realizado pelo presidente Luís Inácio Lula da Silva, mas pelo que o ato de homologação representa como ato jurídico que oficializa o reconhecimento do Estado e da Nação sobre as terras indígenas. A demarcação e a homologação de terras indígenas, nos últimos cem anos, reconheceram 600 segmentos do território nacional como terras indígenas as quais, mesmo sendo de usufruto exclusivo dos povos indígenas, fazem parte essencial e constitucional da União brasileira.
quinta-feira, 24 de abril de 2008
Projeto de Lei busca refrear atuação de Ongs na Amazõnia
Apesar de já ter comentado ontem sobre o Projeto de Lei enviado pelo Ministério da Justiça para a Casa Civil, o qual visa regulamentar a atuação das Ongs na Amazônia, hoje o jornal O Estado de São Paulo traz a notícia mais completa. Há comentários do ministro Tarso Genro e do secretário de Justiça, Romeu Tuma. Parece que eles entendem do riscado.
As Ongs terão que fazer requerimento para os ministérios da Justiça e da Defesa para poderem atuar na Amazônia. Vai dar chiadeira geral. Vão apelar para a Europa e Estados Unidos para que essa legislação não passe.
Tudo isso advém das declarações do general Augusto Heleno, que criticou a política indigenista brasileira por ser "lamentável e caótica". O general não tem razão quanto aos princípios da política indigenista brasileira, que, guiada pelo Estatuto do Índio, não tem nada disso. Porém, tem razão quanto à sua prática atual, que, para todos os fins, está lamentável e caótica.
Se considerarmos que a política indigenista brasileira atual está sendo regida pela Funai, Funasa, MDS, MinC, MMA, MPOG, Casa Civil, Secretaria-Geral, TCU, CGU, Ministério Público, governos dos estados e dos municípios, Ongs e as diversas igrejas, e inclusive o Exército, aí sim, a coisa está mesmo caótica. Os índios estão num miserê sem fim, correndo no mato sem cachorro, apelando para todos sem encontrar guarida de nenhum. Só os espertos, individualmente e não coletivamente, é que se dão bem, especialmente os aliciados pelas Ongs.
Estou aguardando que a próxima ação do Ministério da Justiça será o fortalecimento da Funai ou a criação de um órgão que agregue todos os recursos que estão pulverizados por aí. Agregue ao menos Funai e Funasa sob uma só direção e filosofia de trabalho. Crie a Carreira Indigenista, abra Concurso Público para preencher um novo quadro de servidores, estabeleça um Instituto de Indigenismo, e submeta todas as ações indigenistas do Estado a esse novo órgão.
Essa resposta tem que vir como consequència de toda a celeuma e discussões que foram feitas nessa semana que passou.
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ONGs só atuarão na Amazônia com autorização expressa da Defesa
Governo também vai criar um estatuto específico para regulamentar o trabalho dessas entidades em todo o País
Vera Rosa, O Estado de São Paulo
O Planalto vai fechar o cerco às organizações não-governamentais (ONGs), na tentativa de coibir a biopirataria, a influência internacional sobre os índios e a venda de terras na floresta amazônica. A primeira ação de controle consta do projeto da nova Lei do Estrangeiro, que está na Casa Civil e será enviado ao Congresso até junho. Se a proposta for aprovada, estrangeiros, ONGs e instituições similares internacionais, mesmo com vínculos religiosos, precisarão de autorização expressa do Ministério da Defesa, além da licença do Ministério da Justiça, para atuar na Amazônia Legal. Sem esse procedimento, o “visitante” do exterior terá seu visto ou residência cancelados e será retirado do País.
Preparado pela Secretaria Nacional de Justiça, o projeto prevê multas que vão de R$ 5 mil a R$ 100 mil para os infratores. A ofensiva não pára aí: além dessa iniciativa, o governo alinhava estatuto específico para regulamentar a atuação das ONGs em todo o País. O alvo são organizações que atuam em terras indígenas, reservas ecológicas e faixas de fronteira. Trata-se de instituições que, apesar do endereço doméstico, são patrocinadas por dólares, euros, libras e outras moedas fortes.
SOBERANIA
“Grande parte dessas ONGs não está a serviço de suas finalidades estatutárias”, diz o ministro da Justiça, Tarso Genro. “Muitas delas escondem interesses relacionados à biopirataria e à tentativa de influência na cultura indígena, para apropriação velada de determinadas regiões, que podem ameaçar, sim, a soberania nacional.”
O estatuto vai revisar o licenciamento de um grupo de ONGs que cuidam de questões ambientais, mas não apenas na Amazônia. Sua confecção está a cargo de um grupo de trabalho formado por integrantes do Ministério da Justiça, que há quatro meses estuda o assunto ao lado de técnicos da Advocacia-Geral da União (AGU), da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e da Controladoria-Geral da União (CGU).
“Ninguém aqui quer espionar ONGs”, afirma o secretário nacional de Justiça, Romeu Tuma Júnior. “Mas também não queremos que organizações de fachada, disfarçadas de ONGs, espionem o território brasileiro e prejudiquem nossa soberania. Não vamos aceitar testa-de-ferro de ação internacional.”
Pelos cálculos dos militares, existem no Brasil 250 mil ONGs e, desse total, 100 mil atuam na Amazônia. Outras 29 mil engordam o caixa com recursos federais, que somente em 2007 atingiram a cifra de R$ 3 bilhões.
O governo admite não ter controle de quem compra terras na região. Pior: como a floresta amazônica é uma exuberante reserva de carbono, há estrangeiros de olho nesse tesouro, que, segundo estudo publicado na revista científica Environmental Research Letters, está na casa de 80 bilhões de toneladas e corresponde a quase um terço do estoque mundial.
Na semana passada, ao escancarar o descontentamento com a demarcação da reserva Raposa Serra do Sol, o general Augusto Heleno Ribeiro Pereira, comandante militar da Amazônia, fez um alerta: contou que ONGs internacionais estimulam índios a lutar pela divisão do território. Heleno definiu a política indigenista do governo de Luiz Inácio Lula da Silva como “lamentável, para não dizer caótica”, mas foi logo enquadrado pelo Planalto.
Tuma Júnior disse que o governo faz um “mapeamento” da Amazônia para impedir, por exemplo, a venda de terras da União, a bioprospecção e a apropriação de conhecimentos indígenas por indústrias estrangeiras de cosméticos. Nessa tarefa, o Ministério da Justiça tem entrado em contato com governadores, prefeitos e cartórios.
“Não temos interesse em criminalizar as ONGs”, insistiu o secretário nacional de Justiça. “O que queremos é reconhecer as organizações sérias, separar o joio do trigo e dar mais condições de trabalho para aquelas instituições que agem dentro da lei.”
As Ongs terão que fazer requerimento para os ministérios da Justiça e da Defesa para poderem atuar na Amazônia. Vai dar chiadeira geral. Vão apelar para a Europa e Estados Unidos para que essa legislação não passe.
Tudo isso advém das declarações do general Augusto Heleno, que criticou a política indigenista brasileira por ser "lamentável e caótica". O general não tem razão quanto aos princípios da política indigenista brasileira, que, guiada pelo Estatuto do Índio, não tem nada disso. Porém, tem razão quanto à sua prática atual, que, para todos os fins, está lamentável e caótica.
Se considerarmos que a política indigenista brasileira atual está sendo regida pela Funai, Funasa, MDS, MinC, MMA, MPOG, Casa Civil, Secretaria-Geral, TCU, CGU, Ministério Público, governos dos estados e dos municípios, Ongs e as diversas igrejas, e inclusive o Exército, aí sim, a coisa está mesmo caótica. Os índios estão num miserê sem fim, correndo no mato sem cachorro, apelando para todos sem encontrar guarida de nenhum. Só os espertos, individualmente e não coletivamente, é que se dão bem, especialmente os aliciados pelas Ongs.
Estou aguardando que a próxima ação do Ministério da Justiça será o fortalecimento da Funai ou a criação de um órgão que agregue todos os recursos que estão pulverizados por aí. Agregue ao menos Funai e Funasa sob uma só direção e filosofia de trabalho. Crie a Carreira Indigenista, abra Concurso Público para preencher um novo quadro de servidores, estabeleça um Instituto de Indigenismo, e submeta todas as ações indigenistas do Estado a esse novo órgão.
Essa resposta tem que vir como consequència de toda a celeuma e discussões que foram feitas nessa semana que passou.
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ONGs só atuarão na Amazônia com autorização expressa da Defesa
Governo também vai criar um estatuto específico para regulamentar o trabalho dessas entidades em todo o País
Vera Rosa, O Estado de São Paulo
O Planalto vai fechar o cerco às organizações não-governamentais (ONGs), na tentativa de coibir a biopirataria, a influência internacional sobre os índios e a venda de terras na floresta amazônica. A primeira ação de controle consta do projeto da nova Lei do Estrangeiro, que está na Casa Civil e será enviado ao Congresso até junho. Se a proposta for aprovada, estrangeiros, ONGs e instituições similares internacionais, mesmo com vínculos religiosos, precisarão de autorização expressa do Ministério da Defesa, além da licença do Ministério da Justiça, para atuar na Amazônia Legal. Sem esse procedimento, o “visitante” do exterior terá seu visto ou residência cancelados e será retirado do País.
Preparado pela Secretaria Nacional de Justiça, o projeto prevê multas que vão de R$ 5 mil a R$ 100 mil para os infratores. A ofensiva não pára aí: além dessa iniciativa, o governo alinhava estatuto específico para regulamentar a atuação das ONGs em todo o País. O alvo são organizações que atuam em terras indígenas, reservas ecológicas e faixas de fronteira. Trata-se de instituições que, apesar do endereço doméstico, são patrocinadas por dólares, euros, libras e outras moedas fortes.
SOBERANIA
“Grande parte dessas ONGs não está a serviço de suas finalidades estatutárias”, diz o ministro da Justiça, Tarso Genro. “Muitas delas escondem interesses relacionados à biopirataria e à tentativa de influência na cultura indígena, para apropriação velada de determinadas regiões, que podem ameaçar, sim, a soberania nacional.”
O estatuto vai revisar o licenciamento de um grupo de ONGs que cuidam de questões ambientais, mas não apenas na Amazônia. Sua confecção está a cargo de um grupo de trabalho formado por integrantes do Ministério da Justiça, que há quatro meses estuda o assunto ao lado de técnicos da Advocacia-Geral da União (AGU), da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e da Controladoria-Geral da União (CGU).
“Ninguém aqui quer espionar ONGs”, afirma o secretário nacional de Justiça, Romeu Tuma Júnior. “Mas também não queremos que organizações de fachada, disfarçadas de ONGs, espionem o território brasileiro e prejudiquem nossa soberania. Não vamos aceitar testa-de-ferro de ação internacional.”
Pelos cálculos dos militares, existem no Brasil 250 mil ONGs e, desse total, 100 mil atuam na Amazônia. Outras 29 mil engordam o caixa com recursos federais, que somente em 2007 atingiram a cifra de R$ 3 bilhões.
O governo admite não ter controle de quem compra terras na região. Pior: como a floresta amazônica é uma exuberante reserva de carbono, há estrangeiros de olho nesse tesouro, que, segundo estudo publicado na revista científica Environmental Research Letters, está na casa de 80 bilhões de toneladas e corresponde a quase um terço do estoque mundial.
Na semana passada, ao escancarar o descontentamento com a demarcação da reserva Raposa Serra do Sol, o general Augusto Heleno Ribeiro Pereira, comandante militar da Amazônia, fez um alerta: contou que ONGs internacionais estimulam índios a lutar pela divisão do território. Heleno definiu a política indigenista do governo de Luiz Inácio Lula da Silva como “lamentável, para não dizer caótica”, mas foi logo enquadrado pelo Planalto.
Tuma Júnior disse que o governo faz um “mapeamento” da Amazônia para impedir, por exemplo, a venda de terras da União, a bioprospecção e a apropriação de conhecimentos indígenas por indústrias estrangeiras de cosméticos. Nessa tarefa, o Ministério da Justiça tem entrado em contato com governadores, prefeitos e cartórios.
“Não temos interesse em criminalizar as ONGs”, insistiu o secretário nacional de Justiça. “O que queremos é reconhecer as organizações sérias, separar o joio do trigo e dar mais condições de trabalho para aquelas instituições que agem dentro da lei.”
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