domingo, 11 de novembro de 2007

Índios Cintas-Largas reabrem o garimpo

A exploração de minérios de diamantes anda solta nos garimpos do Roosevelt. Os índios resolveram se associar a garimpeiros que acham que são de sua confiança e estão sem parar retirando diamantes, pagando suas contas e se endividando cada vez mais. Alegam que a Funai não lhes dá o suficiente para viverem. Também pudera! A Funai bem que tentou fazer projetos de criação de gado e plantio de palmeiras, mas precisa do trabalho braçal e dificilmente os índios queriam pegar no pesado.

O indigenista Rômulo Siqueira trabalhou com muito afinco nos últimos dois anos, até que foi demitido da Administração de Porto Velho, não sabemos porque.

Agora a situação está ao deus-dará. Ninguém pode prever o que irá acontecer. Fiar-se no bom relacionamento entre índios e garimpeiros é uma ilusão.

O porta-voz dos Cintas-Largas para questões do garimpo é Marcelo Cinta-Larga, um mestiço de Cinta-Larga com branco. Ele tem todo o discurso de perseguido e de sofrido para justificar as ações dos Cintas-Largas que resolveram reabrir o garimpo. Há conversas entre os índios que falam de um outro índio mais ladino por trás do Marcelo. Mas ele se comporta com discreção nessa área e trabalha no movimento indígena ganhando força política.

O projeto de mineração em terras indígenas, planejado pelo DNPM, MJ e Funai, quando eu era presidente, tem o intuito de resolver essa questão. A mineração em terras indígenas seria regulamentada com os índios tendo prioridade para minerarem. Poderão se associar ou simplesmente receber royalties. Se disserem não, não haveria mineração. Isso protege os índios Yanomami e outros que não querem mineração de jeito nenhum.

Porém as Ongs se mostram contra. O CIMI, que conhece o projeto através de seu procurador, Paulo Guimarães, sabe que é importante e necessário, mas marca ponto dizendo não. O movimento indígena faz discurso de que está contra, embora alguns dos seus membros estejam envolvidos em garimpo em outras áreas. Na Comissão Nacional de Política Indigenista decidiram que não iriam aceitar que o governo enviasse a proposta ao Congresso. Acontece que o Congresso já abriu discussão com o projeto do Senador Romero Jucá, que é horrível.

Enfim, tudo pode acontecer nessa área de confusão e discursos vazios. Se a discussão não for verdadeira, sem subterfúgios, a regulamentação poderá vir cheia de armadilhas.

Os Cintas-Largas dizem que não abrem mão de garimparem por conta própria, isto é, com a ajuda de garimpeiros locais e comercializando com o sistema ilegal que prevalece na região.

Para o governo isto é inaceitável. A coisa vai esquentar, esquentar, até estourar.

Calcula-se que, pelo valor das jazidas, a produção anual pode chegar a 1 a 2 bilhões de reais. É muito dinheiro para tudo dar certo sem um preço alto!!

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Cintas-largas são irredutíveis sobre direito a jazidas

Cacique avisa que haverá resistência se governo tentar tirar direito exclusivo de explorar riquezas da reserva

Vannildo Mendes, jornal O Estado de São Paulo

Alvo de indignação geral por causa do massacre de 29 garimpeiros em abril de 2004, os índios cintas-largas estão menos agressivos e mais recolhidos. Mas estão dispostos a resistir se o governo retirar deles a soberania sobre a Reserva Roosevelt, em Rondônia, e o direito exclusivo de explorar suas riquezas minerais e naturais. Quem avisa é o cacique Marcelo, presidente do Conselho Indígena Cinta-Larga, que reúne as nove aldeias da etnia.

"Estamos de braços abertos para negociar uma solução, não estamos em choque com o não-índio, mas se passarem por cima dos nossos direitos, vamos resistir até o último cinta-larga", promete Marcelo. Temerosos de retaliações, eles estocaram muitas armas e dividiram os guerreiros em equipes, como se fossem pelotões de selva.

O cacique Alfredo, tido como um dos mais valentes da etnia, é o coordenador do programa de treinamento militar, uma espécie de general dos cintas-largas. Hoje, a etnia já teria cerca de 200 guerreiros prontos para entrar em combate.

IGREJA

Mas o objetivo dos cintas-largas vai no sentido oposto, na medida em que eles se integram cada vez mais aos costumes dos não-índios e não abrem mão dos confortos modernos. Vários deles, inclusive guerreiros que participaram da chacina de 2004, viraram evangélicos, ligados à corrente pentecostal Assembléia de Deus.

A igreja tem uma sede suntuosa em Cacoal, um dos municípios vizinhos da reserva, e criou um trabalho missionário voltado para as comunidades indígenas. As aldeias dos cintas-largas são assistidas pelo pastor Lafaiete, que comanda três cultos por semana. Com doações de índios e garimpeiros, a igreja construiu em uma das aldeias um templo de alvenaria, bem estruturado, e outro no garimpo, mais rústico.

Depois do massacre de 2004 as adesões aumentaram e os evangélicos já são cerca de 70% do rebanho cinta-larga, nos cálculos do cacique Marcelo, que é católico. A religião tradicional da etnia, como a cristã, se baseia na crença em um só Deus, o que facilita a conversão.

A muito custo, o cacique concordou em falar ao Estado, mas com uma condição: não tocar no assunto do massacre de garimpeiros. "Quero olhar para frente e buscar soluções. Somos donos legítimos desta terra, somos brasileiros, não invasores, e não podemos perder nosso direito aos recursos naturais da nossa reserva", disse.

Com apenas 26 anos de idade, Marcelo conviveu com não-índios por algum tempo e concluiu o ensino fundamental e médio em Cacoal. Ele fala sobre os direitos indígenas com um discurso afiado. "Sempre fomos exterminados desde que o não-índio chegou ao Brasil. Hoje estamos atentos para que isso não se repita", afirma o cacique. "Só não queremos que o governo use seu poder armado para abusar do nosso direito. Queremos resolver tudo pacificamente, como seres humanos brasileiros."

Pelas contas da FUNDAÇÃO NACIONAL DO ÍNDIO (FUNAI), as nove aldeias da reserva dos cintas-largas somam cerca de 1.400 índios. Mas o cacique Marcelo acredita que os números estão defasados. Ele calcula que, com a recuperação populacional dos últimos anos, o total chegue perto de 2.500 índios.

A luta contra a cobiça na região, todavia, parece perdida. O garimpo foi reaberto pela quarta vez em setembro, com a chegada das chuvas, depois de quase um ano fechado, o que levou os índios a se endividarem nas cidades vizinhas. A dívida é estimada em mais de R$ 1 milhão. Os cintas-largas alegam que retomaram o garimpo porque o governo federal prometeu, mas não mandou ajuda financeira.

"Pelo menos desta vez está afastado o risco de chacina ou de confronto. Nós e os índios estamos nos entendendo muito bem", contou o garimpeiro J.F., que pediu para não ser identificado para não se prejudicar na Justiça, onde já responde a dois processos e uma condenação por tráfico de diamantes. Bem-sucedido após 15 anos batalhando em garimpos na Amazônia, hoje ele é um dos intermediários que se associaram aos cintas-largas.

Índios se associam a garimpeiros para explorar diamantes em reserva
Intermediários fazem ligação entre cintas-largas e traficantes de pedras preciosas, na maior parte estrangeiros

Vannildo Mendes

Endividados e sob forte pressão desde o massacre de 29 pessoas, num garimpo ilegal em suas terras, há três anos e meio, os índios da etnia cinta-larga fecharam uma sociedade informal com os garimpeiros para a exploração de diamantes na Reserva Roosevelt, em Rondônia. Eles se aliaram também a uma rede de sócios não-índios, tidos como capitalistas de garimpo, para viabilizar o negócio.

Como se fossem representantes comerciais da selva, esses intermediários fazem a ligação dos caciques das aldeias com traficantes de pedras preciosas, na maior parte estrangeiros, que circulam na região. Mais de 90% dos diamantes extraídos na área saem do País ilegalmente rumo à Europa, ao Oriente Médio e aos Estados Unidos.

Com aval dos caciques e auxílio dos índios, os garimpeiros construíram uma rede de acessos clandestinos na floresta para fugir das barreiras da polícia nas principais estradas que levam à reserva. Segundo estimativas das autoridades locais, cerca de 1.500 garimpeiros já voltaram sorrateiramente à área de mineração. Trabalhando em ritmo frenético, eles infestam uma faixa de 22 quilômetros às margens do Rio Roosevelt e seus afluentes. A destruição ambiental se amplia, enquanto as autoridades esperam a regulamentação do garimpo em terras indígenas.

"Precisamos de uma definição urgente que contemple todos os lados: os índios, os garimpeiros, o município e a União", reclama a prefeita de Espigão, Lúcia Tereza Rodrigues dos Santos.

A cidade é a mais próxima do garimpo. A prefeita defende a exploração das jazidas por cooperativas que agreguem garimpeiros, índios e empresas de alta tecnologia no ramo, evitando a evasão de impostos que ocorre hoje. "Do jeito que está, virou uma mina de corrupção, onde poucos colhem e muitos sofrem ou morrem", diz a prefeita. Entre os principais destinos dos diamantes extraídos ilegalmente estão Israel, Portugal e Bélgica. As pedras são adquiridas em estado bruto e vendidas por um valor até dez vezes maior no exterior, depois de trabalhadas.

O juiz de Espigão, Leonel Pereira da Rocha, se diz impressionado com a quantidade de estrangeiros circulando na sua pequena comarca. "Estão levando nossas riquezas para fora do Brasil debaixo dos nossos olhos", afirma.

"Eles não devem estar lá fazendo turismo", diz o deputado Aldo Rebelo (PC do B-SP), que acompanha o drama da reserva dos cintas-largas desde o grande massacre de abril de 2004, quando era ministro da Articulação Política.

A fato chocou o Brasil e o mundo. A PF indiciou por homicídio triplamente qualificado 23 índios, entre caciques e guerreiros, além do coordenador da Funai na região, Walter Blos. Só Blos foi preso. Nenhum índio. O inquérito está paralisado à espera de laudo antropológico que ateste se eles têm ou não condições de avaliar a gravidade do ato. A lei brasileira considera os índios "relativamente incapazes" e, portanto, inimputáveis.

ROTINA

O delegado Guilherme Mattos de Oliveira, encarregado do inquérito, disse que a ação foi premeditada e os índios executaram as vítimas com extrema crueldade, sem lhes dar a mínima chance de defesa. Segundo ele, a matança é rotina no garimpo e os mortos já chegam a 57 desde 2001.

Apanhados numa emboscada num local chamado Gruta do Sossego, onde 200 garimpeiros extraíam diamantes clandestinamente, os 29, que não conseguiram fugir, foram amarrados e trucidados, um a um, a tiros, flechadas e golpes de tacape. Participaram do ataque 53 guerreiros, mas há suspeitas, não confirmadas, de que não-índios ajudaram no planejamento e na matança. As vítimas só foram retiradas da floresta duas semanas depois, com os corpos estraçalhados. Nove ainda permanecem não identificados.

O juiz e o deputado defendem não só a regularização, mas a profissionalização da extração mineral no Brasil, sobretudo em terras indígenas, para eliminar o risco de novas tragédias e pôr fim à rede de ilegalidades na região.

A área não-indígena da região também é rica em diamantes, além de esmeraldas e outros minérios, sobretudo cassiterita. Grupos de traficantes se valem de licenças de pesquisa obtidas por empresas de mineração no Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) para extrair ilegalmente as pedras. Nos municípios de Cacoal, Pimenta Bueno e Espigão do Oeste, vizinhos da Reserva Roosevelt, existem seis grandes mineradoras e cerca de 20 de pequeno porte atuando.

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