sexta-feira, 18 de abril de 2008

Presidente Lula cobra lealdade ao general Augusto Heleno


Mais uma vez, o presidente Lula cobra com muita firmeza respeito à questão indígena brasileira.

Ontem, o presidente chamou seu ministro da Defesa e o chefe do Exército para que eles tomem satisfação das falas que o general Augusto Heleno Ribeiro vem pronunciando contra a homologação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol.

Será que vai haver algo mais do que uma rusga entre o Presidente e o Exército? Esperamos que não! A homologação daquela terra indígena foi feita depois de muita ponderação por parte do ministro Márcio Thomas Bastos, com a participação efetiva da Funai. A resistência vem unicamente da meia dúzia de arrozeiros que lá se instalou ilegalmente.

Gostaríamos de pensar que só uma pequena rusga ficará de todo esse incidente. Porém, infelizmente, temos que entender que a questão de fronteiras e o papel do Exército vai continuar sendo um osso duro de roer. É preciso concordar com o general Augusto Heleno ao menos naquilo que ele falou, que os órgãos que cuidam da questão indígena têm que melhorar. Que o diálogo entre esses órgãos e o Exército tem que acontecer.

Há muitas outras terras indígenas nas nossas fronteiras. Aliás, um terço das nossas fronteiras são constituídas por terras indígenas. O entendimento com o Exército tem que haver, sem dúvida. E esse entendimento tem que ser maior do que simplesmente considerar que o Exército pode entrar em terra indígena quando houver necessidade. Disso ninguém duvida. A questão é garantir ao Exército que da parte dos índios não há possibilidade de haver qualquer desvio da soberania nacional.

Na verdade, o grande receio do Exército em relação à soberania nacional vem da presença ubíqua de alguns Ongs que tratam da questão indigenista. Uma delas, o ISA, trata o Alto Rio Negro, por exemplo, como se fosse um feudo seu. Tem uma grande casa em São Gabriel da Cachoeira e de lá supervisiona toda aquela paragem de terras e homens. Obtem recursos para as organizações indígenas e cobra pesado por essa participação. Em Roraima a presença de Ongs estrangeiras é também muito evidente e aqueles índios que não fazem parte do CIR olham de soslaio para essa participação. Os políticos ainda mais.

A solução para o bom entendimento da questão indígena com o Exército é o fortalecimento do órgão indigenista em sua capacidade de ação. Se o governo se desse conta disso e agisse nesse sentido a coisa ficaria muito mais simples. Do que jeito que está, mesmo que a crise atual seja debelada com o recuo do general Heleno, ela voltará à tona.

Os índios têm que pensar nisso.

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Lula cobra general por crítica a reserva
Presidente pediu ao ministro da Defesa, Nelson Jobim, que convoque comandante militar para dar explicações

Tânia Monteiro, Rui Nogueira e Lisandra Paraguassú, BRASÍLIA

Embora incomodados com as críticas à demarcação em área contínua da Reserva indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, assessores do presidente Luiz Inácio Lula da Silva admitiram ontem que o governo foi surpreendido com as declarações do general Augusto Heleno, comandante militar da Amazônia, e avaliaram que a “estocada” foi dada “com conhecimento de causa”. No Planalto, ninguém quis se manifestar “para não passar recibo”.

A única decisão prática, “para manutenção da autoridade”, partiu do próprio presidente, que mandou o ministro da Defesa, Nelson Jobim, e o comandante do Exército, Enzo Peri, convocarem Heleno para dar explicações sobre as críticas. O Estado apurou que o ministro Jobim cancelou ontem, pela terceira vez, a viagem que faria ao Rio Grande do Sul, onde visitaria uma indústria bélica, “para fazer as últimas contas sobre aumento de soldo dos militares e conversar, muito provavelmente, com o general Heleno”. Jobim repassará depois as explicações ao presidente.

Na quarta-feira, ao participar do seminário Brasil, Ameaças à sua Soberania, no Clube Militar, no Rio, o general Heleno chamou de “caótica” e “lamentável” a política indígena brasileira, considerou uma ameaça à soberania nacional a reserva contínua de 1,7 milhão de hectares na região de fronteira e ainda disparou sobre as cerca de 600 pessoas da platéia uma frase de efeito: “Não sou da esquerda escocesa, que, atrás de um copo de uísque 12 anos, sentada na Avenida Atlântica, resolve os problemas do Brasil inteiro. Já visitei mais de 15 comunidades indígenas, estou vendo o problema do índio.”

A crítica calou fundo no governo por três motivos: 1) porque foi feita por um dos militares mais respeitados do Exército, um “triplíce coroado”, isto é, primeiro colocado nos cursos da Academia Militar das Agulhas Negras, da Escola Superior de Aperfeiçoamento de Oficiais e da Escola de Comando e Estado-Maior, hoje considerado um “líder de tropa” inquestionável; 2) porque o general é considerado “ousado”, mas jamais comete as audácias em detrimento da disciplina; 3) e porque Heleno acompanhou de perto o processo político de decisão para demarcar a reserva ianomami, em novembro de 1991, no governo do presidente Collor (1990-1992), e sempre avisou que aquele seria o primeiro passo para outras demarcações contínuas que comprometeriam o controle de fronteira, inclusive na faixa dos 150 qulômetros determinados pela Constituição, que são de controle estrito do Estado.

Foi como assessor da Casa Militar que o general Heleno contribuiu para o parecer dos militares contrários à demarcação da reserva ianomami. À época, o então ministro da Justiça, Jarbas Passarinho, coronel da reserva do Exército, se definiu a favor da demarcação, mas cunhou no bastidor uma frase que ficou célebre: “Acho que a demarcação não representa perigo para a soberania do País, mas, se eu estiver errado, o meu Exército me corrigirá”.

O que mais preocupou o Planalto foi saber que “100% do Alto Comando” concorda com as críticas do general Heleno, feitas a partir do ponto de vista da “missão militar constitucional”, relatou ontem ao Estado um general. Segundo esse militar, não foi uma crítica política.

Para leitores da Folha de São Paulo, ver também essa matéria

Um comentário:

Olimpio Cruz Neto disse...

Mércio, parabéns pela lucidez.
Abração.

 
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