Nesta sexta-feira passada o Acampamento Indígena
Revolucionário foi surpreendido com a visita de um oficial de justiça que trazia em mãos um mandado judicial expedido pela 6ª Vara da Justiça Federal
de Brasília.
Os líderes do AIR sabiam que algo estava para acontecer. Um
membro do CIMI já os tinha alertado de que a FUNAI e o Ministério da Justiça,
junto com a AGU, tinham acionado a Justiça Federal para que o AIR fosse
desalojado da Esplanada dos Ministérios, por conseguinte, fosse disperso e destruído.
Apesar de bem recebido, o oficial de justiça tremeu ao entregar o ofício, que não foi assinado de volta por nenhum dos índios que o recebeu. Logo ele atirou ao chão o ofício e saiu correndo do Acampamento. Mais tarde, uma comissão de representantes do AIR foi à sede da Polícia Federal para falar com o delegado Kalil, a pedido do mesmo.Sem agressividade, mas sem titubear, os representantes do AIR tiveram uma reunião de mais de duas
horas. Reunião tensa, sobretudo porque o sentido inicial que o delegado da PF
queria dar era de que os índios deveriam sair imediatamente de onde estavam.
Mas o AIR tem advogados indígenas no seu meio, e eles rebateram. Como já tinham lido o Mandado de Interdito Proibitório, assinado pela Juíza Substituta Maria Cecília de Marco Rocha, os representantes demonstraram a falsidade do que alegava o delegado, desmoralizando-o por suas palavras. Ao mesmo tempo apresentaram suas razões legais para não sair de onde estavam, apesar da ameaça de que, se não saíssem, no sábado, sofreriam consequências. Não saíram.
Acontece que o mandado continha aspectos interessantes e
inesperados.
Em primeiro lugar, não destituía o Acampamento Indígena
Revolucionário. Ao contrário, reconhecia sua legitimidade e o chamava por esse
nome mesmo! ACAMPAMENTO INDÍGENA REVOLUCIONÁRIO. Quanta honra! Os 400 e tantos
índios que se encontram abrigados em tendas e barracas em frente ao Ministério
da Justiça têm a legitimidade para estar aí e protestar por seus direitos! Isto
é uma vitória do AIR porque o legitima perante a Justiça brasileira.
Em segundo lugar, a ordem não era para serem desalojados de
onde estavam, e sim, para se mudarem para 1 quilômetro de distância, vejam bem,
1 km do prédio do Ministério da Justiça, essa vestal dos ministérios que aparentemente
não pode ver índios acampados e protestando contra a FUNAI. Na verdade, nem é
verdadeiramente contra o Ministério da Justiça que o AIR protesta, e sim contra
um órgão que faz parte do MJ. Os índios do AIR protestam contra a FUNAI pelo
que sua atual direção fez e vem fazendo em matéria de política e atitudes
anti-indígenas.
Em terceiro lugar, a ordem explicitava que o motivo
principal desse distanciamento de 1 km do Ministério da Justiça não se devia a
um pedido do Ministro da Justiça, e sim do presidente da FUNAI. O motivo é que,
na segunda-feira, dia 31 de maio, e pelos dois seguintes, vai se dar uma
reunião da Comissão Nacional de Política Indigenista nas premissas do MJ, e o
presidente da FUNAI e os índios que compõem o CNPI estão com medo de que os
índios do AIR queiram participar dessa reunião e para isso invadam o Ministério
da Justiça e aborreçam os inocentes membros do CNPI! O pedido da FUNAI é de que há "suspeita de invasão!" Isso mesmo, a direção atual da FUNAI suspeita de que o AIR invada as premissas do MJ para chatear os índios membros da CNPI. Durma-se com um barulho desse! Tanto falta de escrúpulo para uma direção da FUNAI!
A meritíssima Juíza Substituta, na verdade, não concedeu
aquilo que o MJ, a FUNAI e a AGU pediam, qual seja, a saída intempestiva do
Acampamento Indígena Revolucionário. Concedeu sentença parcial, qual seja, do
AIR ficar a 1 km de distância!
É como se o AIR fosse um litigante de alguém e esse alguém
pedisse proteção. Coisa de briga de vizinhos, ou separação de marido e mulher,
vejam só! Imaginem o AIR, uma simples organização de índios, lutando por seus
direitos, desafiar, ameaçar o Ministério da Justiça!
Mesmo parcialmente, mesmo reconhecendo a legitimidade do
Acampamento Indígena Revolucionário, é uma vergonha que uma medida judicial
ordene que esse movimento indígena revolucionário se posicione a 1 km de
distância de uma reunião que vai tratar, inclusive, do Decreto, que é um dos
dois motivos principais contra os quais o AIR está protestando!
Certamente que o Ministério Público Federal, se quisesse, se
fosse defender os direitos constitucionais e específicos de índios que não
estão a favor da atual direção da FUNAI, teria boas razões para acionar contra
essa medida.
Por que o Ministério Público Federal, a 6ª Câmara, que trata
de direitos difusos e de minoria, inclusive dos povos indígenas, não defende os
direitos do AIR?
O Ministério Público Federal vem devendo a defesa dos índios
que protestam contra a atual direção da FUNAI desde que uma ordem judicial foi
dada em 14 de novembro de 2009 para retirar um pequeno grupo de índios Xavante
que protestavam contra ações anti-indígenas por parte da atual direção da
FUNAI. Deve por isso, deve por não ter acionado contra um Decreto presidencial
que não consultou os índios, deve por não defender os índios que vieram protestar
e deve agora, no caso dessa medida, se não tomar providências.
E olha que o Ministério Público Federal faz parte da CNPI,
como convidado permanente!
Por tudo isso, é preciso que os índios de todo o Brasil
saibam o que está acontecendo em Brasília e como os índios que fazem parte do
Acampamento Indígena Revolucionários estão criando uma nova atitude indígena,
um novo posicionamento diante da atual direção da FUNAI e, no futuro próximo,
diante de seu destino.
Dificilmente os mais de 400 índios que fazem parte do
Acampamento Indígena Revolucionário – cujo contingente está aumentando a cada
dia que passa e esta semana chegará a mais de 600 – sairão de onde estão por
causa de uma reunião que consideram ilegítima, já que a CNPI foi rejeitada para
virar conselho pelo Congresso Nacional em recente decisão. De fato, o AIR acha
que a CNPI nem devia mais se reunir, por ser ilegítima.
Assim, caso o Ministério da Justiça não tome providências
mais sensatas para rever o Decreto presidencial e mudar a FUNAI, o movimento do
Acampamento Indígena Revolucionário tende a radicalizar, pois a radicalização
está vindo do lado contrário. Essa tentativa de judicializar sua presença é exemplo claro, mas há também outras ações inescrupulosas que estão sendo tomadas pela atual direção da FUNAI.
Os índios do Acampamento Indígena Revolucionário querem
dialogar com o ministro da Justiça e com o presidente da República. Querem ser
ouvidos quanto a políticas que afetam suas vidas diretamente e que mudam negativamente a FUNAI, o órgão oficial que os assiste. Não
aceitam que um Decreto, que atingiu negativamente ao menos metade das
populações indígenas brasileiras, não tenha sido discutido com eles e com os
demais povos indígenas, e que prevaleça contra a vontade de pelo menos metade
dos povos indígenas.
Só a boa vontade e a magnanimidade do Governo Lula poderão evitar um desgaste maior no relacionamento entre o Governo e os povos indígenas, e um desastre que pode acontecer a qualquer momento.
QUE VIVA O ACAMPAMENTO INDÍGENA REVOLUCIONÁRIO!!!