Não sei se já como repercussão da viagem de Jacir José de Souza, o principal líder Makuxi da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, mas, certamente como forma de pressão sobre o STF brasileiro, ontem, a Comissária de Direitos Humanos da ONU, em Genebra, Sra. Louise Arbour, veio com uma declaração estranha sobre paternalismo brasileiro para com nossos povos indígenas. Falou também de uma nova concepção de auto-determinação, que merece mais consideração e sobre a qual escreverei em breve.
Sobre paternalismo, me pergunto: o que sabe a Sra. Arbour sobre esse assunto em relação aos povos indígenas brasileiros? De quem ela está lendo análises sobre o modo como se dá a política indígenista brasileira? Que atos precisamente ela está pensando quando fala em paternalismo para com os povos indígenas?
Hoje mesmo o presidente Lula vai estar um uma reunião da Comissão Nacional de Política Indigenista para ouvir de lideranças indígenas que vivem nas cidades e que articulam suas necessidades como demandas por políticas públicas. Que país do mundo faz isso? Será que isso pode ser chamado de paternalismo?
O conceito de paternalismo tem sido usado para descrever a relação entre poder público e povos indígenas por diversos antropólogos atuais. Certamente esse conceito tem razão de ser dentro da política indigenista de muitos anos atrás e sobre alguns aspectos. Porém mesmo aí ele encobre muitos comportamentos, alguns dos quais não têm nada a ver com paternalismo.
Para os mais interessados, tratei desse assunto no meu livro O Índio na História, no capítulo X, sobre a relação do Serviço de Proteção aos Índios com os índios do Maranhão.
De qualquer modo, a declaração da Comissária de Direitos Humanos, no meu entender, parece uma intervenção e uma provocação gratuitas ao governo brasileiro.
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ONU defende fim de paternalismo
O Estado de São Paulo, Jamil Chade, de Genebra
A alta comissária da ONU para Direitos Humanos, Louise Arbour, diz que os povos indígenas no Brasil precisam participar das decisões de Estado que os afetem. "Precisamos acabar com o padrão paternalista que sempre existiu no mundo."
A crise na reserva Raposa Serra do Sol, em Roraima, está chamando a atenção dos organismos internacionais e de governos estrangeiros. Na ONU, o tema também entrou na agenda e a entidade já enviou pedidos para que o Brasil explique a crise.
"Autodeterminação não significa que cada povo indígena tem o direito de ter seu próprio país. Mas garante que cada um deles tenha voz nas decisões de Estado que os afeta", explicou Louise. "Um dos problemas é que sempre há alguém que decide o que é melhor para os grupos indígenas. Isso precisa acabar e os grupos precisam fazer parte de todas as decisões que os impacte."
quinta-feira, 19 de junho de 2008
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2 comentários:
Mércio:
É verdade que este governo é muito mais democratico e participativo que os anteriores. É verdade que acontece a GESTAO COMPARTILHADA e os ENCONTROS... As consultas à população... Que temos melhorado muito... Mas acho que nao podemos negar que o PATERNALISMO, o ASSISTENCIALISMO continuam cristalizados em muitas esferas e especialmente em relaçao aos indigenas.
Acredito que ainda a maior parte das açoes promovidas para os indigenas contam na sua elaboracao com pouca participaçao dos mesmos indigenas e que lamentavelmente existe um esquema de corrupçao onde alguns servidores públicos da FUNAI se beneficiam junto a alguns índios e que para esse sistema ser derrocado, a transparencia e a verdadeira e ampla participaçao sao fundamentais... Acho que ainda é um desafio... onde já temos experiencias louvaveis mas que na visao panoramica ainda vemos muito pouco da participacao dos indigenas e do respeito a sua autodeterminacao!
Sr. Anônimo. Concordo com seu comentário. Acho, entretanto, que o termo paternalismo não é o adequado para explicar o que se passa ao não consultar os índios. Ao contrário, os índios são consultados no mesmo nível que outros cidadãos brasileiros. A consulta frequentemente é só pro-forma, ou é posteriori à decisão. Mas, se o governo pretende fazer hidrelétricas a qualquer custo, consultar os índios, os ribeirinhos, o CIMI, ou as Ongs ambientalistas, antes de fazer o projeto, seria inútil porque todos iriam contra. Assim, diante do impasse previsto, o governo só consulta para ver que compensações podem ser feitas. Mas nisso os índios são igualmente vítimas com outros cidadãos. Não é questão de paternalismo. Concordo que os índios devam participar não só das decisões, mas do planejamento da Funai, do MMA, do MDS, da Funasa e tudo mais que lhes concerne diretamente. Mas não serão através de Ongs, e sim, de participação responsável dentro desses órgãos. Quando presidente da Funai tentei trazer mais participação indígena nomeando índios para muitas posições importantes no órgão. E muitos deles corresponderam, com muita dedicação. Aumentar essa participação e ajudá-la a ser eficaz é a grande questão. Abraço, Mércio
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