quarta-feira, 6 de agosto de 2008

Entrevista de Mércio Gomes sobre PROUNI, no Correio Braziliense

O Correio Braziliense continua repercutindo o caso das fraudes no PROUNI. Desta vez apresenta uma entrevista comigo sobre esse assunto.

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Funai apurou fraudes

CORREIO BRAZILIENSE , Lúcio Vaz e Paloma Oliveto

Órgão procurou estudantes da cota indígena do programa e verificou irregularidades, levadas ao MEC em 2005. Comissão de Direitos Humanos da Câmara quer investigação


O ex-presidente da FUNDAÇÃO NACIONAL DO ÍNDIO (FUNAI) Mércio Pereira Gomes afirmou ontem à tarde ao Correio que repassou ao Ministério da Educação (MEC), em 2005, a informação de que grande parte dos estudantes que se declararam indígenas e receberam bolsas do Programa Universidade para Todos (ProUni), na verdade, não eram índios. O ministro da Educação, Fernando Haddad, havia afirmado, pela manhã, que o ministério tem interesse em apurar as irregularidades na cota de índios do ProUni, mas desde que "se chegue a casos concretos", pois considerou "difusas" as denúncias apresentadas até agora. Haddad negou que o MEC não tenha tomado providências quando soube das irregularidades há três anos. "Isso não é verdade. Tanto que, a partir de 2006, exigimos que fosse especificada a base territorial e a etnia do candidato, justamente com a ajuda do Mércio", disse.

Reportagem publicada pelo Correio no último domingo mostrou casos de pessoas que se autodeclararam indígenas no momento da inscrição no Prouni, mas que agora admitem que não são índios. Alguns deles se mostraram surpresos com a informação de que constavam como indígenas no cadastro do MEC. O programa prevê um percentual de bolsas de estudo destinado a autodeclarados indígenas e negros. Atualmente, das 385 mil bolsas ofertadas, 961 são reservadas para índios.

Mércio Gomes afirma que, no primeiro ano do ProUni, índios reclamaram que não haviam sido contemplados. Segundo as reclamações que chegavam à FUNAI, outras pessoas (não indígenas) estariam ocupando essas vagas. Gomes determinou então que a FUNAI fizesse uma checagem: "Descobrimos que muitas dessas pessoas não eram indígenas. Então, fui lá no ministério e falei com a Secretaria de Educação Superior e com a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade", diz (veja entrevista abaixo).

"Situação jocosa"

O presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara, Pompeu de Mattos (PDT-RS), vai solicitar ao MEC e à FUNAI a investigação das possíveis fraudes. "É uma situação bem jocosa. A confirmar esses dados, temos uma suposta fraude. Isso não inviabiliza o ProUni. Temos que preservar o programa. Assim, é preciso checar caso a caso. Não podemos atingir, mas também não podemos contaminar o programa". Ele considera que os casos relatados pela reportagem "são bastante representativos".

Antes de encaminhar os ofícios ao MEC e à FUNAI, porém, o deputado determinou que seu gabinete cheque os estudantes indígenas beneficiados no Rio Grande do Sul, seu estado de origem. A partir dessa amostragem, ele pretende elaborar o documento que será enviado pela comissão que preside. "Esse episódio mostra que o programa é bom. Tem gente criando subterfúgios para se enquadrar. Mas acho que o Ministério da Educação tem de tomar uma posição. Aqueles que estão sendo beneficiados injustamente prejudicam tanto os indígenas quanto os demais concorrentes, porque conseguem a vaga numa situação privilegiada", comenta Mattos.

Reunidos ontem no gabinete do deputado Henrique Afonso (PT-AC), um grupo de estudantes indígenas elaborou um pedido de investigação das supostas fraudes no ProUni. Eles protocolaram ofícios nas comissões de Educação, de Fiscalização e Controle e de Minorias da Câmara, e de Educação e Cultura do Senado. Hoje, vão entrar com representação na Procuradoria de Defesa do Cidadão do Ministério Público Federal.

O secretário de Educação Superior, Ronaldo Mota, comentou ontem a entrevista de Mércio: "A partir dos problemas abordados na época (2005), novos procedimentos foram definidos em 2006 e, aparentemente, sanados os casos graves. Sobre a conversa na época com o MEC, não podemos acrescentar muito, dado que ela se realizou com o secretário anterior da Sesu. Caso ainda existam, por parte da FUNAI, novas e melhores sugestões de como proceder, estamos abertos a ouvir e considerar as alternativas".

Entrevista - Mércio Pereira Gomes

Autodeclaração não pode ser o único critério

Em entrevista ao Correio, o ex-presidente da FUNDAÇÃO NACIONAL DO ÍNDIO (FUNAI) Mércio Pereira Gomes critica o critério exclusivo de autodeclaração para a seleção dos estudantes indígenas a serem contemplados com bolsas do ProUni. "Alguém sempre pode alegar, de boa-fé ou de má-fé, que tem uma bisavó indígena. Mas esse não é o entendimento que se tem no Brasil do que é o indígena. Indígena é alguém que pertence a uma comunidade", afirma o antropólogo, que presidia a FUNAI em 2005, ano em que o programa foi lançado.

O ministro da Educação afirmou hoje que não recebeu uma denúncia concreta. A FUNAI chegou a fazer uma denúncia concreta ao MEC?

Na época em que eu era presidente da FUNAI, logo que saiu o ProUni e foram anunciadas as primeiras bolsas para povos indígenas, eu pedi à Coordenação Geral de Educação da FUNAI para checar quem eram as pessoas (beneficiadas), porque muitos índios disseram que não haviam conseguido entrar. No início, eram poucas bolsas, cerca de 190. Era o que tinha sobrado. Nós descobrimos que muitas dessas pessoas não eram indígenas. Então, fui lá no ministério e falei com a Secretaria de Educação Superior e também com a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade. Pedi para que esse sistema de autodeclaração fosse avalizado pela FUNAI - porque qualquer pessoa pode chegar e dizer que é indígena e, de fato, tomar possíveis vagas dos nossos índios. Quando a FUNAI verificou que essas pessoas não eram indígenas, ficou mais evidente.

Quantas pessoas estavam com essa irregularidade?

Nós checamos cerca de 100, cento e poucas pessoas.

E, dessas, quantas não eram indígenas?

A maior parte não era de indígenas. Eram pessoas que haviam se declarado dessa forma. Alguém sempre pode alegar, de boa-fé ou de má-fé, que tem uma bisavó indígena, como 30% da população brasileira efetivamente tem. Mas esse não é o entendimento que se tem no Brasil do que é o indígena. Indígena é alguém que pertence a uma comunidade. Como já dizia Darcy Ribeiro, não existe índio genérico no Brasil. O índio genérico, que não tem um povo, não tem uma cultura, é um brasileiro comum. (Índio) é aquele que nasceu do processo histórico e tem sangue indígena.

Como essa informação foi encaminhada ao MEC?

Eu fui pessoalmente e falei o que estava ocorrendo. O pessoal dessas secretarias pediu uma listagem das pessoas que foram checadas pela FUNAI. Houve um certo diálogo, e prometeram que, no ano seguinte, os beneficiados seriam avalizados, que haveria uma forma de conceituar melhor aqueles que são verdadeiramente indígenas.

E, para trás, haveria investigação?

Não interessava à FUNAI punir quem havia feito isso. Nós não estávamos aí para perseguir ninguém. Isso está baseado em um interpretação equivocada da declaração da OIT (Organização Internacional do Trabalho), que diz que a autodeclaração de ser indígena é fundamental. Como se fundamental significasse único critério. No Brasil, esse critério é pertencer a um povo que tem uma cultura que se relaciona com um passado pré-cabralino. Mesmo que essa cultura tenha mudado. Você pode não ter mais uma língua indígena, mas tem características indígenas e (faz parte de) um povo coeso.

Você comunicou ao então ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, sobre isso na época?

Nós conversamos sobre isso e comuniquei que eu tinha falado sobre esse assunto com o MEC e estava vendo como a FUNAI poderia ajudar. Mas foi uma conversa muito mais rápida do que a que eu tive com o Ministério da Educação

4 comentários:

Anônimo disse...

Esse caso é muito grave e dee ser resolvido com seriedade.
Fingir que é índio para ocupar, em vantagem, o lugar de um índio autêntico deve haver punição sim, com inquérito disciplinar e afastamento do fraudador.

Anônimo disse...

O território tradicionalmente ocupado é aquele que o levantamento antropológico vai apontar. É o território em que os índios e seus ancestrais nasceram, viveram, morreram, e foram sepultados antes da chegada do branco, afirmou Almeida. Só não determinamos a demarcação de territórios indígenas no Nordeste, por exemplo, pois lá não há índios. Não porque eles nunca existiram, mas porque foram dizimados. (informações da Agência Brasil)


Como? não tem índios no Nordeste? Pataxós, Canelas, Guajajaras, Xukurus etc são o que??
http://www.agenciabrasil.gov.br/noticias/2006/12/08/materia.2006-12-08.2004069368/view

Rob Walker disse...

Caro Mercio,
Desculpa mudar de assunto mas estou tentando conseguir umas noticias do morte do meu amigo Gradimir Djurovic. Queria saber se o senhor sabe dos detalhes de que passou (foi o cancer?). Talvez tem email de Wellington Gomes Figueiredo? Gradimir sempre falou muito bem de voces dos.
Atenciosamente,
Robert robwal75(at)yahoo.com

Anônimo disse...

Prezado senhor Mercio,
A exemplo de Rob Walker tambem estou procurando saber noticias da morte de Gradimir, ele foi meu amigo de Belgrado. Muito agradecida.
E-mail: anita.franulovic@yahoo.com.br

 
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