Sexta-feira, dia 22, a Bienal do Livro de São Paulo, que congrega todo o sistema editorial brasileiro e atraiu mais de 500.000 pessoas nas duas semanas de funcionamento, proporcionou um debate sobre a questão indígena brasileira.
O título do debate era um pouco escandaloso e até desfocado. "Os índios são cidadãos de 2ª classe?"
Os debatedores foram esse antropólogo que vos escreve e o escritor Daniel Munduruku, indígena natural de Belém e que mora em São Paulo e tem desenvolvido uma carreira brilhante como escritor de contos com inspiração indígena.
O debate foi franco e complementar. Na verdade, não foi um debate, mas um pingue-pongue de informações e de reflexões pessoais convergentes sobre os diversos temas do indigenismo brasileiro. A participação do público foi interessante e demonstrou que uma parte da sociedade brasileira está atenta aos diversos assuntos atuais do indigenismo nacional.
O tema mais reconhecido foi a questão da homologação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol. Os participantes queriam saber sobre a disputa entre facções indígenas, a legitimidade ou não dos arrozeiros de estarem naquela terra, a questão da soberania nacional sobre esse território, a presença de Ongs estrangeiras e a necessidade ou não do Exército ter uma ação mais abrangente naquela Amazônia.
Um tema que surgiu inesperadamente foi a questão de infanticídio entre alguns povos indígenas e qual a opinião que os debatedores tinham sobre o assunto. Tanto Daniel quanto eu demonstramos reconhecer a importância do tema e a legitimidade dos povos indígenas de encontrarem um caminho próprio, consciente, para sobrepujar essa prática que, em muitos casos, não faz mais sentido histórico.
Na minha fala ponderei que achava que a grande maioria dos brasileiros era favorável aos índios. Que os via como parte da nacionalidade brasileira, que reconhecia a sua legitimidade como primeiros brasileiros, e que os admirava por manter sua visão de mundo. Mas essa visão generosa dos brasileiros era claudicante, mutável, de acordo com certas circunstâncias sociais e históricas. Que na atualidade, por causa da radicalização no discurso e na prátia que as Ongs indigenistas estão fazendo, levaram os povos indígenas a tomarem atitudes que terminam resultando em opinião desfavorável e contrária. Mesmo que por mal entendimento dos fatos.
A questão indígena brasileira está no limiar de grandes mudanças. Seja porque os índios querem comandar a política indigenista, seja porque as Ongs se profissionalizaram e precisam sempre de novas tarefas, seja porque o Estado brasileiro já acha que sua função pró-indígena está se esgotando.
A decisão a ser tomada nesta quarta-feira, dia 27 de agosto, pelo ministro Ayres Britto e em conjunto pelo STF, poderá trazer mudanças estranhas e graves. O quanto desencadearão de novas mudanças ainda não sabemos. Não podemos ficar pessimistas ao extremo, não podemos cair no desespero, venha o que vier. A história se faz muito mais por excepcionalidades do que pelo desenrolar lógica das causas passadas.
domingo, 24 de agosto de 2008
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Um comentário:
Olá, Mércio, estive lá assistindo a este debate, e ficou a impressão que, realmente, o debate foi amistoso e complementar, mas o Daniel parecia ainda ver alguma lógica nessa denominação "cidadão de 2ª classe", já que elencou pontos negativos na relação entre o Estado e o índio, enquanto v. destacava mais os avanços da questão. O que é natural, afinal, v. representavam ali duas visões bem diferentes. De ruim mesmo, só o certificado que eu esqueci de pegar no final; o debate, achei muito bom, obrigado pelos números e pelas idéias, um abraço.
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