O 4º Abril Indígena começou nesta segunda-feira com a montagem do acampamento em frente ao Palácio da Justiça, e com a presença esperada de 400 a 600 indígenas de diversas partes do Brasil. Vêm com o propósito de protestar contra o que consideram um retrocesso na política indigenista brasileira no Governo Lula, um descaso com os principais problemas que afetam as populações indígenas e a falta de participação de lideranças indígenas na tomada de decisões sobre políticas que afetam sua existência. Vêm também com o intuito de fazer uma demonstração de força simbólica para as autoridades e para angariar simpatias pela causa indígena por parte da sociedade brasileira. Isto é que o mais importante, e espero que seja bem sucedido nesse esforço.
Lembro-me do 1º Abril Indígena que transcorreu exatamente alguns dias depois do embate violento entre Cintas-Largas e garimpeiros, que resultou na morte de 29 garimpeiros. A questão principal daquele evento era pressionar o Governo Lula para homologar a Terra Indígena Raposa Serra do Sol, que fica no extremo norte do Brasil, no estado de Roraima. Quando cheguei ao acampamento fui alegremente recepcionado por uma comissão de mulheres indígenas, que me levaram para dançar com elas formando uma roda. Prestigiei o evento e prometi lutar para a homologação dessa terra indígena, como de fato veio a ocorrer um ano depois.
Mas o interesse dos jornalistas era sobre o caso Cintas-Largas versus garimpeiros. Foi aí que proferi a frase de que lamentava pela morte dos garimpeiros mas achava que os Cintas-Largas estavam defendendo seu território de um esbulho que parecia não ter fim. A notícia saiu em todos os jornais e repercutiu pelos dias seguintes, semanas e meses. Fui chamado por todos os nomes por muitos colunistas famosos, por políticos e fazendeiros. Estes últimos diziam que eu tinha dado aos índios licença para matar, os políticos que eu estava envolvido com o tráfico de diamantes, os jornalistas que eu era antihumanista. Mas os índios que ouviram e viram pela televisão as minhas falas compreenderam o que eu estava dizendo e demonstram seu reconhecimento ao meu destemor.
No acampamento pouco se comentou sobre isto, e as organizações indigenistas se calaram, até que a celeuma passou e aí apresentaram seus votos de solidariedade aos Cintas-Largas.
No 2º Abril Indígena, o presidente Lula tinha acabado de assinar a homologação de Raposa Serra do Sol, no dia 15 de abril. Eu mesmo telefonei para Jacy Makuxi, o maior líder Makuxi, dando-lhe a notícia. Foi, reconhecidamente, a maior vitória do indigenismo brasileiro desde a homologação da Terra Indígena Yanomami, a mais difícil de todas as homologações já feitas. A torcida contrária era grande e poderosa: a grande maioria do povo de Roraima, toda a bancada do estado, governador e prefeitos, uma grande parte do Congresso Nacional, inclusive de partidários do Governo, e até uma parte impressionante da sociedade brasileira que acompanhou o caso. Tão grande vitória foi pouco comemorada pelo Abril Indígena daquele ano. Num seminário realizado no auditório da Procuradoria Geral, o interesse dos participantes se desviou para outros casos. Parecia que o generoso ato do presidente Lula era um ato protocolar.
Há que se lembrar, também, que, no Dia do Índio de 2005, o presidente Lula recebeu e homenageou uma comissão de 30 Sábios Indígenas, gente do porte de Raoni, Simão e Gabriel Xavante, Virgulino Guajajara, Dona Quitéria, que representavam todos os índios que deram suas vidas pela defesa de suas terras e de suas culturas. Muitos deles nunca antes haviam estado em Brasília, mas foram os grandes alicerces no reconhecimento de seus territórios e nas suas demarcações.
O 3º Abril Indígena foi ofuscado pela realização da grande Conferência Nacional dos Povos Indígenas, que, após nove conferências regionais que contaram com a participação de mais de 2.000 delegados, contou com a presença de 800 delegados nomeados que representavam 210 povos indígenas. Só faltaram os povos isolados e alguns que, por influência externa, resolveram boicotar o evento. A Conferência Nacional produziu um documento luminar que deve servir de base para as futuras decisões da Comissão Nacional de Política Indigenista, a ser instalada dia 19 de abril. Se não for, os índios estarão perdendo os resultados do maior acontecimento coletivo em toda a história indígena brasileira.
Este 4º Abril Indígena se realiza com os mesmos apoios de sempre: o CIMI, o CTI, o ISA e outros apoios nacionais e internacionais. As discussões parecem estar mais maduras. Algumas lideranças que nunca vinham, como Raoni e Aniceto, estão presentes e influenciarão os resultados desse evento. No discurso das lideranças costumeiras, como Jecinaldo Barbosa, coordenador da COIAB, os índios demandam mais participação nas decisões sobre atos que podem impactar suas vidas e suas terras. Protestam contra a não inclusão de lideranças indígenas nas decisões sobre o PAC, que, sem dúvida, os afetará de vários modos. Protestam também contra os desmandos da assistência de saúde, a demora na demarcação de novos territórios e o sistema extremamente ineficiente da educação que lhes é ministrada pelo Brasil afora.
Embora saibam da importância da Funai para suas vidas, pouco pedem por ela. Os patrocinadores querem mais é o contrário.
terça-feira, 17 de abril de 2007
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