Na fronteira de Mato Grosso do Sul com São Paulo vive um dos povos indígenas mais sofridos, os Ofaié-Xavante.
Ele viviam na bacia do Paranapanema, eram caçadores-coletores, e começaram a ser caçados, literalmente, nas últimas décadas do século XIX. Por volta da segunda década do século XX já estavam em números tão reduzidos que um antropólogo tão consciente como Curt Nimuendajú, que os visitou, achava que não iriam sobreviver. Com efeito, eles estavam na lista de povos extintos do SPI.
Entretanto, em fins da década de 1970, quando o estado de São Paulo foi fazer uma grande hidrelétrica na região, descobriu-se a presença de algumas famílias que se diziam indígenas. Logo se viu que eram remanescentes dos Ofaié, e a Funai foi-lhes ao encontro.
Durante os últimos trinta anos, essas famílias se reuniram, conseguiram uma gleba de terras, receberam mais uma pequena porção como compensação pela construção da hidrelétrica na região, e conseguiram formar-se como um povo, uma vez mais. No meio deles vivem algumas famílias de índios Guarani-Kaiowá, vindos do Mato Grosso do Sul, e alguns não indígenas.
O artito abaixo, vindo do jornal eletrônico AgoraMS, traz uma matéria sobre eles que vale a pena ser lida.
__________________________________________________________
O grito dos Ofaié tradicionais
*Ataíde Francisco Rodrigues
“A comunidade Ofaié vive bastante triste em relação à violência. Em 2007 foram três pessoas vítimas de espancamentos, duas delas bastante graves”. Assim começa o relato dirigido à Imprensa pelo ex-cacique Ofaié, Ataíde Francisco Rodrigues, Xehitâ-ha, do município de Brasilândia, no Mato Grosso do Sul.
Dessa comunidade, lembra o ex-cacique, “atualmente só restam 11 Ofaié que ainda falam o idioma”, sendo que os “Ofaié tradicionais” , como descreve, vivem uma “situação inaceitável: são atos que contrariam toda a história Ofaié. Os Ofaié nunca foram de fazer violência, mas sim sempre foram vítimas da violência, fisicamente e culturalmente”.
Segundo o indígena, de 51 anos de idade, “2008 já começou com mais duas vítimas, uma gravemente machucada”, denuncia.
A queixa de Xehitâ-ha pode ser entendida como o último grito de uma cultura tradicional de um povo que nunca foi reconhecido oficialmente. Suas palavras dirigem-se também à FUNAI que, segundo ele, “é pura omissão”.
Preocupado com a sobrevivência da pequena aldeia de 70 pessoas formada por Ofaié, Kaiowá e não-indígenas, o ex-cacique fala da ameaça de expulsão das famílias Kaiowá da aldeia, o que estaria sendo promovido pelo atual cacique José de Souza, Kói Ofaié.
“A expulsão das duas famílias Kaiowá é mais um ato do cacique José de Souza”, queixa-se Xehitâ-ha. Para ele, estão “expulsando essas duas famílias que moram com os Ofaié [há] mais de 15 anos. Esses índios contribuíram bastante para o resgate da comunidade Ofaié”, argumenta.
Também ele, o grande líder Xehitâ-ha, está ameaçado de expulsão, uma vez que sua esposa atual é Kaiowá, com quem Ataíde tem um filho.
O problema dos Ofaié também diz respeito à terra. A área de 605 hectares do território tradicional (cerca de 30% do total de 1.937 hectares declarados pela FUNAI como Terra Indígena), “segundo informações dos moradores (...) ela está sendo loteada e disseram também que um lote foi vendido para um não-índio. Alguns dos Ofaié desconhece esse loteamento da aldeia 2”, explica Xehitâ-ha.
A indignação está manifesta nas palavras do ex-cacique: “Como vai ficar tantos problemas? Quem vai resolver? Mais uma vez quem vai salvar os Ofaié? O cacique, a Funai? Achamos que não. Mesmo assim os Ofaié pedem socorro para viver como Ofaié, [povo] pacífico e humilde. Os Ofaié conseguiram um pedacinho de terra [e agora] querem viver em paz”, conclui o ex-cacique.
Há alguns meses, o grito de alerta foi dirigido também ao Ministério Público Federal, quando a Câmara Municipal de Brasilândia requereu a intervenção do MPF junto ao presidente da Associação Ofaié e do atual cacique sob a acusação de que haviam vendido gado, camionete e mangueiros oriundos de projetos do Governo do Estado.
Naquela ocasião dois funcionários da FUNAI foram convocados pelo MPF e visitaram Brasilândia-MS para se certificar das ocorrências. Mas, segundo alguns indígenas a FUNAI, Regional de Campo Grande, foi a primeira concordar com a venda dos animais e camionete zero km da comunidade para pagar contas de energia elétrica das 20 famílias que vivem na aldeia.
O ex-cacique, que entre 1986 e 1996 foi o grande responsável pela conquista da área considerada indígena pelo Ministério da Justiça através da Portaria nº 264/92, de 29 de maio de 1992, e também pelos 484 hectares adquiridos pela CESP e destinado aos Ofaié a título de ressarcimento pela inundação da hidrelétrica Eng. Sérgio Motta (ex-Porto Primavera) no rio Paraná, conclui sua nota com um apelo dramático:
“É lamentável que a gente fica assistindo toda essa cena de violência. A gente não tem com quem recorrer. Funai? Cacique? Ele próprio nos humilha, ele até nos tirou nossa dignidade. Se alguém não fizer nada, essa grande nação será extinta em poucos anos...”.
*Artigo de Ataíde Francisco Rodrigues, enviada pelo Prof. Mestre em História Indígena pela UFMS, Carlos Alberto dos Santos Dutra
domingo, 3 de fevereiro de 2008
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário