segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

Ashaninska do Brasil e do Peru se unem contra madeireiros

Os índios Ashaninka, também conhecidos como Campa, têm se destacado como dos povos mais conscientes de sua posição no mundo moderno. No Brasil, vivem no Acre, em cinco terras indígenas distintas, demarcadas e homologadas. Algumas lideranças têm presença política forte no Acre, sendo um deles o secretário de assuntos indígenas naquele estado.

Com a ajuda da Funai e de Ongs, estão buscando unir os esforços de seus patrícios no Peru para dar um basta no caos que está acontecendo naquele país com a presença de madeireiros nas terras indígenas. Inclusive com graves repercussões no Brasil. Já há alguns anos, madeireiros peruanos chegaram a invadir parte do território dos Ashaninka do rio Amônia, derrubar madeira e até mudar marcos de fronteira.

Quando era presidente da Funai fizemos reuniões com os ministérios do Meio Ambiente, da Defesa e das Relações Exteriores para estabelecer uma estratégia para combater essas invasões. De fato, as invasões pararam, após uma missão militar na região. Mas a ameaça continua. Além do mais, povos indígenas autônomos estão entrando no Brasil por causa da pressão dos madeireiros peruanos, e, às vezes, eles não sabem que é amigo e quem é inimigo.

Meu amigo, o indigenista José Carlos Meireles levou uma flechada no rosto, há 3 anos atrás, devido à chegada de um grupo de índios Piro ou Amahuaca. Felizmente conseguimos tirá-lo da Frente de Atração que ele comanda e ele logo se restabeleceu. Hoje continua lá, com "os parentes", como costuma dizer.

Ver mapa para localizar a posição do Acre e da fronteira com o Peru, com as terras indígenas em destaque. Cortesia jornal eletrônico Kaxiana, Rio Branco, Acre.

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Vera Olinda (*)
Kaxiana Notícias, Acre

O povo Ashaninka do Peru e do Brasil estará reunido entre os dias 24 a 28 de fevereiro na aldeia Sawawo, localizada no departamento de Ucayali (Peru), na fronteira com o estado do Acre, para um evento chamado de Encontro na Fronteira Brasil-Peru Comunidades Indígenas: Terra, Limites Fronteiriços, Convênios e Projetos.

O objetivo é discutir o impasse criado pela exploração madeireira na fronteira entre os dois países, os seus impactos socioambientais nas terras e comunidades indígenas e nos territórios dos índios isolados, como também discutir soluções de desenvolvimento não madeireiro.

Este encontro é organizado pela Apiwtxa com o apoio da CPI/Acre - Comissão Pró-Índio do Acre, do CTI - Centro de Trabalho Indigenista e da RCA - Rede de Cooperação Alternativa. Estarão presentes também organizações indígenas e indigenistas de ambos os países e contará com a participação do Governo Brasileiro, através da Coordenação Geral de Índios Isolados da Funai – Fundação Nacional do Índio.

A política ambiental do Governo Peruano é o que está motivando a realização do encontro. Essa política, através das concessões florestais, tem ameaçado a integridade do território de índios isolados que, fugindo dos desmatamentos, têm se deslocado em direção às Terras Indígenas do estado do Acre situadas na região de fronteira. A presença cada vez mais freqüente de grupos isolados nestas TIs é vista com apreensão pelos povos indígenas do lado brasileiro, cujos territórios delimitam a fronteira Brasil-Peru.

A invasão de madeireiros peruanos se intensificou a partir de 2000 com o regime de concessão florestal peruano e a promulgação da Lei Florestal no país. Desde essa época, foram abertos dois concursos de concessão de lotes permitindo aos madeireiros instalar empresas na região. O governo peruano, no entanto, não tem se mostrado capaz de fiscalizar a atividade madeireira dentro das concessões florestais: o Instituto Nacional de Recursos Naturales - INRENA (organismo do governo equivalente ao IBAMA no Brasil) não dispõe de estrutura adequada para realizar tal atividade; além disso, é notada a influência política dos madeireiros na região, seja em âmbito local ou departamental. O que se vê como resultado são quilômetros de floresta devastada e extração ilegal de madeiras nobres. Como, no lado peruano, algumas espécies de maior valor econômico já foram exploradas à exaustão, os madeireiros passaram a invadir a floresta do lado brasileiro.

Preocupadas com a situação, as lideranças indígenas e organizações da sociedade civil, brasileiras e peruanas, continuam se reunindo para discutir esses problemas, buscar soluções e exigir medidas governamentais para por fim às ações criminosas que estão destruindo os povos que habitam a região da fronteira Brasil-Peru.

Sobre os Ashaninka

A maioria dos Ashani1nka vive no Peru. Os grupos situados hoje em território brasileiro são também provenientes do Peru. Eles começaram a migrar para o Brasil pressionados pelos caucheiros peruanos no final do século XIX. Aqui os Ashaninka estão em cinco Terras Indígenas distintas e descontínuas, todas situadas na região do Alto Juruá.

1.TI Kampa do Rio Amônia, contígua ao Parque Nacional da Serra do Divisor, homologada, registrada no CRI e SPU (1992) com 87.205 hectares, no município de Mal. Thaumaturgo;

2. TI Kampa do Igarapé Primavera, homologada, registrada no CRI e SPU (2001) com 21.987 hectares, no município de Tarauacá;

3. -TI Kampa e Isolados do rio Envira, homologada e registrada no CRI e SPU (1998) com 232.795 hectares, no município de Feijó, onde habitam também grupos Amahuaka, inimigos históricos dos Ashaninka e que evitam o contato com indígenas e não-indígenas;

4. TI Kashinawa/Ashaninka do Rio Breu, homologada e registrada no CRI e SPU (2001) com 31.277 hectares, nos municípios de Marechal Thaumaturgo e Jordão;

5. TI Jaminawá/ Envira homologada e registrada no SPU (2003), nos municípios de Feijó e Santa Rosa do Purus, com 80.618 hectares; onde vivem também grupos Kulina e Jaminawa.

Os antropólogos que trabalharam com esse povo apresentam uma grande variação salientam a dificuldade de estabelecer um total populacional desse povo. No Peru os dados variam de 10 mil a mais de 50 mil indivíduos. Não obstante, todos os autores apresentam os Ashaninka como um dos maiores contingentes populacionais nativos da Amazônia peruana e mesmo da bacia amazônica em geral.

Os Ashaninka pertencem a família lingüística Aruak (ou Arawak). Eles são o principal componente do conjunto dos Aruak sub-andinos, também composto pelos Matsiguenga, Nomatsiguenga e Yanesha (ou Amuesha). Apesar de existirem diferenças, os Ashaninka apresentam uma grande homogeneidade cultural e lingüística.

(*) Representante da Comissão Pró-Índio do Acre


Elson Martins é jornalista acreano. Como repórter regional de O Estado de São Paulo, acompanhou a partir 1975 a primeira fase dos conflitos pela terra no Acre, ajudando a colocar Chico Mendes na mídia local e nacional. Foi um dos editores do jornal alternativo Varadouro, que tomou partido da luta dos seringueiros, índios e posseiros a partir de 1978. E-mail para contato: elson-martins@uol.com.br.

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