Há dois meses os ministérios da Saúde e do Planejamento enviaram uma mensagem ao Congresso Nacional contendo um projeto de lei em que constava a criação e remanejamento de alguns cargos de assessoramento e uma nova Secretaria, dentro do MS, a qual teria por obrigação cuidar da saúde indígena. Para todos os efeitos, retirava-se da Funasa o atendimento das populações indígenas, ficando apenas com as tarefas de saneamento.
De lá para cá, o ministério da Saúde vem sofrendo a crítica mais contundente da própria Funasa, cujos dirigentes são membros do PMDB e querem tão-somente favorecer os interesses escusos de seus patrões. Esses dirigentes estão arregimentando diversas organizações indígenas para defender o status quo ante, isto é, a continuidade da Funasa na saúde indígena.
Note-se que o orçamento da Funasa para a questão indígena passa dos R$ 350 milhões, uma bagatela invejável para o pouco cuidado que se toma nos meandros azeitados dessa máquina.
Isto é mais que o dobro do orçamento atual da FUNAI. Em priscas eras, a FUNAI cuidava da saúde indígena com o equivalente a míseros R$ 25 milhões, isto é, menos de 10'% do orçamento da Funasa. Não fazia o suficiente, deixava a desejar, sem dúvida, mas tinha o respeito dos índios e um diálogo permanente que favorecia o conhecimento da saúde individual dos índios. Faltava-lhe recursos e pessoal. Imagine se pudesse ter metade do orçamento da Funasa! Era o que eu propunha ao governo quando era presidente da FUNAI: passar a saúde para a FUNAI e alavancar seu orçamento ao menos para a metade dos recursos da Funasa.
Em portaria expedida recentemente, o MS criou um Grupo de Trabalho para estudar e propor a existência dessa Secretaria. Nesse GT não se prevê nem a presença da FUNAI nem de índio!
Nessa altura da relacionamento interétnico e da autoconsciência indígena isto consiste num despautério sem limites!
Porém, enquanto esse GT não se reúne, não apresenta propostas sobre como deve funcionar a nova Secretaria, a Funasa continua atuando nos moldes de sempre. E as reclamações continuam pelo Brasil afora.
Recentemente, após longas negociações com o Instituto de Desenvolvimento e Tradições Indígenas (IDETI), uma instituição criada e comandada pelo Xavante Jurandir Siridiwê (o mesmo que inspirou o filme Estratégia Xavante), a Funasa tinha acordado que o IDETI iria cuidar da saúde indígena dos índios Xavante.
Lembrem-se que os Xavante somam cerca de 12.000 indivíduos divididos em 170 aldeias na região leste do estado do Mato Grosso, e que foram vítimas recentemente do escândalo do desvio de recursos da Funasa pela Universidade de Brasília, cuja fundação tinha um convênio com a Funasa. Essa fundação surrupiou nada menos de R$ 8 milhões no breve período de 2 anos de existência do convênio.
Pois bem, o IDETI trabalhou durante meses na elaboração de um programa de saúde, foi apresentá-lo em inúmeras aldeias, ganhou o apoio do Conselho Indígena de Saúde, assinou o convênio com a Funasa, e, quando tudo parecia certo, o convênio foi extraviado ao ser enviado para Cuiabá e aí o diretor de saúde Wanderley Guenka o deu por perdido e cancelado.
É certo que há interesses por trás disso, não para ajudar os Xavante em sua saúde, mas para encontrar meio de obter verbas manipuláveis e cargos para assessores. O fato real é que os Xavante sofrem das piores condições de saúde entre os índios brasileiros. Ultrapassam de longe os Guarani. Seus índices de mortalidade infantil, em média, chegam a 140 por mil. Só na aldeia Maraiwatsede, talvez a maior delas na atualidade, com mais de 650 pessoas, esse índice atingiu esse ano a casa dos 200 por mil.
Por sua vez, não são só os Xavante que sofrem com a questão da saúde. Os Yanomami já declararam guerra à Funasa e a diversas Ongs que vieram trabalhar com eles. Inclusive a UnB.
De fato, todos os índios estão preocupadíssimos com a possibilidade desse projeto de lei colocar a saúde indígena sob a responsabilidade dos municípios. Isto é, municipalizar a saúde indígena. Aí seria um deus nos acuda.
Muitos índios já se encontram em Brasília para protestar contra esse despautério e essa falta de respeito. Os Xinguanos e os Kayapó estiveram lá há três semanas e mal conseguiram falar com o presidente da Funai, que não lhes deu nenhum apoio para falarem com o ministro da Saúde.
A coisa vai esquentar porque não poderá ficar pior. Vamos aguardar para as próximas semanas o desenrolar dessa questão gravíssima.
terça-feira, 21 de outubro de 2008
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Um comentário:
Agora, onde está o CIMI e o ISA ?
E o Ministério Público Federal ?
No início da década de 1990 eles estavam trabalhando para retirar a saúde da FUNAI da maneira que foi, com cumplicidade de alguns servidores que posteriormente abriram ongs.
Chegaram a trabalhar para isso com política de "convênios" com prefeituras municipais.
NADA FOI APURADO ATÉ HOJE E DEZENAS DE ÍNDIOS MORRERAM COM ESSAS MUDANÇAS DEVIDO A PÉSSIM ASSISTENCIA IMPLANTADA.
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