Passada a primeira fase das eleições, com as posições das câmaras municipais definidas (embora com 2º turno para prefeito em 27 cidades), as lides políticas anteriores voltam à sua vigência.
Pois bem, a grande disputa política dos últimos meses em relação aos povos indígenas -- sem tirar a importância da disputa no STF sobre a homologação da T.I. Raposa Serra do Sol -- tem sido a resistência posta pelos fazendeiros e políticos de Mato Grosso do Sul, aliados aos colegas do Mato Grosso, contra os objetivos da FUNAI de abrir novos processos de demarcação de novas terras indígenas naqueles estados.
A resistência aumenta nessa semana. O movimento está partindo para o confronto. A matéria abaixo, do Estado de São Paulo, reflete as ações que estão para ser tomadas contra a FUNAI, nesta semana e nas próximas, em função de sua alegada pretensão de demarcar entre 500.000 e 1.000.000 de hectares no Mato Grosso do Sul.
O movimento anti-indígena foi acirrado por erros estratégicos da atual gestão da FUNAI, que não mede conseqüências em relação às suas tomadas de posição. Dominada pela ideologia ongueira, a FUNAI esquece da História e da Política e joga os índios na arena sem armas para se defenderem. Os índios Guarani e os Terena estão sob dura pressão das autoridades locais do Mato Grosso do Sul, bem como dos fazendeiros, seus vizinhos, por estarem no bojo de uma campanha mal elaborada e mal conduzida. O desconforto é grande, as tensões aumentam e só com palavras e manifestos não vai adiantar nada.
O governador do estado, André Pulcinelli, que acabou de reeleger o prefeito de Campo Grande, se posicionou à frente dos fazendeiros, contra a FUNAI, em busca de apoios políticos mais amplos. Tem conversado frequentemente com o ministro da Agricultura, que até agora não tomou posição pública, mas que está pronto para fazê-lo. Tem influenciado a bancada ruralista no Congresso Nacional, que ontem convocou o presidente da FUNAI para audiência no dia 21 de outubro.
Sua secretária de Desenvolvimento Agrário, Tereza Cristina da Costa Dias, está em plena atividade pró-fazendeiros. Faz reuniões nas cidades, dá entrevista batendo forte contra a FUNAI, ataca os índios em suas pretensões pelo aumento de terras e argumenta que são Ongs internacionais que estão insuflando os índios. Disse ontem que o estado vai entrar no STF contra a FUNAI no que diz respeito às demarcações de terras indígenas no Mato Grosso do Sul.
Dá o exemplo da Terra Indígena Cachoeirinha, dos índios Terena, perto de Aquidauana. Essa terra foi demarcada no tempo do marechal Rondon, com 2.670 hectares. A população Terena mais que triplicou desde então. Queriam ampliá-la um tanto mais, talvez uns 500 hectares. O antropólogo Gilberto Azanha foi contratado pela FUNAI para fazer um relatório de reconhecimento da terra pretendida, e a aumentou para 36.000 hectares. O ministro Tarso Genro, inadvertidamente, por mal assessorado, publicou uma portaria de demarcação. Agora os Terena querem mesmo os 36.000 hectares. Voltar atrás é que não pode. Fazer o quê?
Eis o busilis da questão fundiária, segundo a secretaria de Mato Grosso do Sul. Ontem ela esteve em São Paulo conversando e obtendo o apoio da Sociedade Brasileira de Agricultura em sua luta contra a FUNAI e a demarcação dessas novas terras. Alega que a situação fundiária de Mato Grosso do Sul foi equacionada há muitos anos, que todos os fazendeiros têm suas terras regularizadas (média de 700 hectares por fazenda) e que não adianta dar novas terras aos índios Guarani que eles não a aproveitam de qualquer jeito.
São argumentos capciosos, mas tocam nas mentes dos correligionários e colegas de classe. A SBA vai trazer mais subsídios para os fazendeiros de Mato Grosso do Sul, inclusive de que a incerteza que foi implantada pela FUNAI está causando perda de novos investimentos na agricultura e consequentemente na possível queda da produção agrícola do Brasil.
No estado vizinho do Mato Grosso, na cidade de Brasnorte, foi feita uma carreata segunda-feira p.p. e depois uma reunião em que os principais líderes da classe de fazendeiros bateram forte contra a FUNAI e contra os índios. Tiveram a esperteza de levar alguns Xavante para discursarem a seu favor. O líder Xavante Domingos, da Terra Indígena Sangradouro, defendeu os fazendeiros pelo trabalho que fazem de produzir os alimentos para os brasileiros, mas também atacou a FUNAI por não fazer o necessário de que precisam para eles mesmos, os índios, produzirem e se tornarem independentes.
O pior de tudo é que os índios vão perdendo a confiança na FUNAI, o único órgão capaz ainda de defendê-los, pela desmoralização que o vai corroendo.
________________________________________
Agronegócio vê área indígena como ameaça
O Estado de São Paulo, por Roldão Arruda
Os levantamentos para a redefinição dos limites das áreas indígenas em Mato Grosso do Sul estão provocando uma situação de insegurança em todos os setores do agronegócio, segundo informações da titular da Secretaria do Desenvolvimento Agrário e da Produção do Estado, Tereza Cristina Corrêa da Costa Dias. "A polêmica envolve a região mais nobre do Estado, com as terras mais férteis, nas quais se concentram 70% da produção de soja e 70% da produção de milho", disse a secretária, em debate promovido ontem, em São Paulo, pela Sociedade Rural Brasileira.
O clima de intranqüilidade, de acordo com a secretária, pode inibir investimentos. "Mato Grosso do Sul passa por um processo de desenvolvimento, com a chegada de recursos para o setor sucroalcooleiro, rizicultura e frigoríficos, que agregam valor à produção de bovinos, suínos e frangos. O momento dessa polêmica não poderia ser pior."
A secretária observou que os levantamentos que estão sendo feitos pela FUNDAÇÃO NACIONAL DO ÍNDIO (FUNAI), com o intuito de ampliar as áreas indígenas, envolvem 26 municípios, nos quais predominam propriedades de médio porte, entre 600 e 700 hectares. "São terras totalmente regularizadas, com títulos concedidos pelo governo estadual ou federal", afirmou. "Não temos áreas devolutas nem temos áreas de invasões."
ONGS
O presidente da Sociedade Rural, Cesário Ramalho da Silva, defendeu a nacionalização do debate sobre demarcações de terras indígenas e criticou os estudos técnicos utilizados pelo governo federal. "Os laudos antropológicos que subsidiam o trabalho da FUNAI são feitos sob forte influência de ONGs estrangeiras, missões religiosas, entre outras organizações, que não deveriam ter essa autonomia", afirmou.
Na FUNAI, em Brasília, a situação dos índios guaranis de Mato Grosso do Sul é considerada uma das mais críticas do País. Com a expansão da pecuária e da agricultura no Estado, eles acabaram confinados em áreas consideradas pequenas, com elevados índices de violência, desnutrição infantil e também casos de suicídio entre jovens. Desde o início do primeiro governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2003, os diretores da FUNAI têm dito que a solução dos problemas dos guaranis, com a ampliação de suas reservas, é uma das prioridades em todo o País.
Os representantes dos proprietários rurais discordam, porém, dos métodos de demarcação de terras e levantam dúvidas sobre sua eficácia para resolver os problemas indígenas. "Em Miranda, um dos municípios onde a situação é mais crítica, os índios vivem numa área de 2.600 hectares e, até recentemente reivindicavam mais 500 hectares", contou ontem Tereza Cristina. "Mas, após um estudo encomendado pela FUNAI e realizado por um antropólogo ligado a organizações católicas, os 500 hectares se transformaram em 33 mil hectares, para uma população de 3 mil índios. Que critérios eles utilizam para mudanças dessa grandeza?"
O governo estadual e a FUNAI estão conversando, procurando soluções que não causem prejuízos ao agricultores. Não está descartada, porém, a possibilidade de uma ação cautelar perante o Supremo Tribunal Federal (STF), com o intuito de sustar as demarcações.
quinta-feira, 9 de outubro de 2008
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário