domingo, 9 de agosto de 2009

TRF 3ª Turma barra estudos da Funai em Mato Grosso do Sul

O desembargador Luiz Stefanini, da 3ª Turma do TRF, concedeu liminar à petição dos fazendeiros para interromper os estudos de delimitação das terras indígenas dos índios Guarani no Mato Grosso do Sul. Esses estudos deveriam ter sido iniciados no dia 20 de julho, porém o governador do Estado, André Puccinelli havia obtido uma prorrogação porque faltava indicar os nomes dos representantes do estado nos cinco GTs da Funai. Depois ficou para o dia 5 de agosto, e agora quem sabe para quando. Uma liminar pode levar quanto tempo os dezembargadores quiserem segurar para tomar uma decisão.

Isto é sério demais. É a primeira vez que um juiz de um tribunal superior aceita a argumentação de que as ressalvas feitas por ocasião da votação do STF sobre a homologação da T.I. Raposa Serra do Sol, em 19 de março de 2009, são aplicáveis nos casos atuais de estudos de delimitação.

O que será que vai acontecer daqui por diante?

Um dos procuradores da Funai está estudando o caso. Mas a AGU, pelo que já vimos no caso dos Pataxó versus Ibama, já acatou essas decisões do STF. O que fará o procurador da Funai diante desse quadro? Por seu lado, um jovem advogado do CIMI opiniou em matéria publicada abaixo que as ressalvas não são aplicáveis. O que dirá o principal advogado do CIMI sobre a questão?

Que argumentos poderão usar para contrapor aos argumentos da aplicabilidade das ressalvas estabelecidas pela votação de 19 de março? Um dos argumentos é de que a data da promulgação da Constituição Federal não ficou definida como marco temporal para adjudicar a legitimidade da ocupação tradicional. Que teria sido dita no voto do ministro Ayres Britto, mas não consta como uma das ressalvas. Que significará a interpretação desse fato? Outro é a ressalva 17 que reza que terra já demarcada não pode ser ampliada. O argumento proposto pelo advogado do CIMI é de que caso a demarcação tenha sido realizada antes da Constituição de 1988, ou por meios de não identificação antropológica, o preceito proibitivo de ampliação não valeria para a atualidade.

Sem dúvida, estamos no limiar de decisões importantíssimas para a continuação do processo de demarcação não só das terras dos Guarani como de outros povos indígenas. Por exemplo, a dos Tupinambá de Olivença, cuja contestação foi feita recentemente.

Agora, como estava previsto há muito tempo, tudo ficou por conta do STF. Essa instituição suprema da justiça brasileira vai decidir sobre suas próprias palavras.

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Funai analisa decisão que suspende estudos; entidade indigenista rebate Famasul
Jacqueline Lopes

O procurador da Funai (Fundação Nacional do Índio), Alexandre Jabur já analisa a decisão liminar proferida pelo desembargador federal Luiz Stefanini, do TRF (Tribunal Regional Federal) da 3ª região que suspende o início dos estudos antropológicos visando a demarcação das terras indígenas em Mato Grosso do Sul.

Os estudos antropológicos estavam previstos para começar anteontem, mas foram adiados para somente ocorrerem depois de uma reunião com todos os envolvidos que estava marcada, mas foi suspensa. Agora, a Funai vai tentar derrubar a liminar para começar os estudos.

Stefanini acolheu o apelo feito pela Famasul (Federação da Agricultura e Pecuária) e determinou a “suspensão do processo demarcatório de terras indígenas que tiveram as portarias 788, 789, 790, 791, 792 e 793 editadas pela Funai".

Segundo o advogado da entidade, Gustavo Passarelli, a decisão do TRF vale até o final do julgamento do processo da reserva Raposa-Serra do Sol, em Roraima.

“No processo de Raposa-Serra do Sol, a Funai impôs uma série de restrições que tornam os processos de demarcações de terras inviáveis em Mato Grosso do Sul”, destaca o advogado.

Contraponto

No entanto, o assessor jurídico do Cimi (Conselho Indigenista Missionário), Rogério Batalha, considera a interpretação do TRF 3ª equivocada. Segundo ele, os estudos são essenciais para que ocorra um raio-x de toda a região que engloba 26 cidades do Conesul no Estado. E isso daria condições para identificar latifúndios, terras produtivas, áreas tradicionalmente ou não indígenas. “Todos esperam por este diagnóstico fundiário. Não dá para fazer avaliação sem esse diagnóstico”, argumenta.

A Famasul acredita que em todo o Estado são 48 mil propriedades sendo 18 mil na região em disputa. Em Maracaju, por exemplo, são 900 fazendas em área de 550 mil hectares.

Segundo Batalha, no processo da Raposa Serra do Sol não está estipulado o chamado marco temporal, ou seja, que somente teria direito à terra os índios que nela estivesse no dia da promulgação da Carta Magna em 5 de outubro de 1988.

Outro ponto, segundo Batalha, seria relativo à ampliação, ou seja, ficaria impossibilitada o aumento do território indígena, conforme o argumento dos ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) no caso da Raposa Serra do Sol.

“Em Mato Grosso do Sul nunca ocorreu demarcação nos moldes da Constituição Federal. Não se amplia área que não foi demarcada. O que temos são reservas criadas na década de 20 pelo SPI (Serviço de Proteção ao Índio)”, diz.

Segundo ele, a medida tomada pela União naquela época foi para liberar os pastos e retirar os índios do território “acreditando-se naquela época de que seriam integrados na sociedade. Isso não aconteceu e nunca vai acontecer e hoje a gente vê o caos nas áreas pequenas sem condições”.

Indagado sobre o fato do desembargador ter decidido liminarmente (provisoriamente) acatar os argumentos dos produtores que temem conflitos sociais e frisam que a Constituição Federal é clara quanto ao marco temporal e também apostam no término do julgamento da Raposa Serra do Sol como marco jurídico, o advogado do Cimi mais uma vez contesta.

Raposa Serra do Sol

“A decisão da Raposa Serra do Sol é importante, foi histórica diante de uma luta de mais de 30 anos daquele povo. No Brasil ainda não foi regulamentada a súmula vinculante e os juízes continuam tendo maior liberdade. Aplicar o mesmo entendimento da Raposa Serra do Sol ao meu ver é interpretação equivocada”.

Pelo menos em um ponto, ruralistas e defensores da causa indígena concordam. A realidade de Mato Grosso do Sul não é a mesma de Roraima.

A Carta Magna reconhece a organização social, os costumes, as crenças e tradições dos indígenas, bem como o direito originário sobre suas terras.

4 comentários:

guilherme disse...

O TRF impedir a realização dos estudos que irão evidenciar a realidade fundiária atual e histórica é ir contra a essência e os fundamentos da busca do conhecimento para se praticar a JUSTIÇA fundiária no Brasil, pois esses estudos irão subsidiar o processo...

Esse Desembargador deve entrar na lista dos suspeitos que prejudicam o Estado de Direito e o interesse público. E ser averiguado quanto a sua "ideologia" discriminatória e racista.

Anônimo disse...

Bem...
O ranger dos dentes continua e continuará ainda por um bom tempo...
É necessário que se entenda que as RESSALVAS estão ai a manifestar uma posição da sociedade brasileira que quer ver os assuntos da natureza a que se refere tratados de forma mais democrática e que considere todas as partes interessadas em igual valor.
Entendo tudo isso como um movimento forte que enseja a mudança dos paradigmas em todas as esferas do estado.

Visconti disse...

Considerando a Terra Kayabi (MT) cuja demarcação está suspensa por liminar desde 2004, as perspectivas não são nada animadoras para os Guarani. Em meio a tudo isso, vamos aprovar um novo Estatudo dos Povos Indígenas que pode piorar o que já não é bom e deixar os direitos indígenas ainda mais fragilizados.

Anônimo disse...

Não podemos entender as RESSALVAS como uma posiçao da sociedade brasileira, pois o STF e TRF não representam a sociedade brasileira. Por suas posiçoes atuais, políticas, estao pretensos à vanglória de aparecerem na imprensa...mesmo que enraigados de preconceitos conservadores.

 
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