quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

ANTROPOLOGIA: Leia trechos do Cap 4 do novo livro de Mercio P. Gomes a ser lançado dia 25 de março

Capítulo 4

O SOCIAL

Parentesco, Grupos e Categorias Sociais

4.1. O tabu do incesto

Uma das grandes descobertas da Antropologia, ainda em seus primórdios, no último terço do século XIX, foi a constatação de que todas as sociedades então conhecidas adotavam como regra básica para a constituição de famílias e para a reprodução social a proibição do relacionamento sexual entre alguns tipos de parentes próximos, em especial entre pai e filha, mãe e filho, e entre irmão e irmã. A sanção para qualquer transgressão viria incontinenti, com rigor e violência, até com a morte. No correr dos anos e na ampliação do conhecimento empírico de novos povos, com novas culturas e sociedades, essa regra, que passou a ser conhecida como tabu do incesto, mostrou ser generalizada e universal; por conseguinte, necessária à essencialidade do ser humano e da cultura.

Há exceções e elas seriam explicadas como excrescências, por razões peculiares. As mais conhecidas são as dos reinados teocráticos do Egito Antigo e do Império Incaico. Em ambos os casos, os faraós e os incas, respectivamente, casavam-se, para fins de produzir herdeiros de seus tronos, com suas próprias irmãs por parte de pai. Em ambos os casos, eles também se casavam com um sem-número de outras mulheres, com quem tinham centenas de filhos. Mas os filhos nascidos de suas irmãs é que estariam na linha de sucessão, como herdeiros diretos e impolutos da divindade que representavam em vida. Entrementes, suas sociedades, isto é, os demais cidadãos e súditos do Egito e do Império Incaico praticavam o tabu do incesto normalmente.


4.2 Teoria da reciprocidade


4.3 Parentesco: teoria e prática

quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

Austrália pedirá desculpas a aborígenes

A Austrália mudou de governo há alguns meses, tendo agora um primeiro-ministro trabalhista, e resolveu fazer o quê os aborígenes vinham pedindo há muitos anos. O perdão pelos anos de política assimilacionista que praticou até 1969.

O que foi a política assimilacionista da Austrália?

Foi nada mais nada menos do que a retirada de crianças aborígenes para serem criadas por famílias brancas. Foi a escolarização forçada em missões. Foi a ausência de reconhecimento das terras aborígenes. Foi a expulsão sumária de grupos nômades aborígenes das terras valorizadas. Foi a matança em massa que ocorreu no século XIX.

Quando era representante do Brasil nas delegações internacionais, estive com alguns líderes aborígenes. O sonho deles era o reconhecimento do seu valor cultural e político para a formação da nação australiana. Admiravam-se da política indigenista brasileira, mesmo quando eu lhes dizia que também no Brasil houve épocas de matanças de índios, especialmente pelo governo português, quando declarava um povo indígena "incivilizável".

Falando em português, que me perdõem os amigos portugueses, mas o pior tempo para os povos indígenas do Brasil foi a chegada da Coroa há 200 anos atrás. Nessa ocasião Dom João VI, o príncipe regente, promulgou uma série de alvarás concedendo a qualquer pessoa o direito de armar uma tropa para atacar diversos povos indígenas, como os Botocudos (Pataxó e outros), os Kaingang (Coroados), os Avá-Canoeiros, os Timbira e outros mais. Ao atacá-los, tinham o direito de fazê-los escravos por 15 anos, como ressarcimento por suas despesas.

A situação da Austrália é bastante diferente da brasileira, e eles sabem disso. Mas o passo que estão dando é importante para uma grande reconciliação e mais respeito pelos aborígenes.

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Austrália pedirá desculpas a aborígenes

Giovana Vitola
De Sidney para a BBC Brasil

O pedido de perdão é prioridade do novo governo na Austrália.
O governo australiano anunciou nesta quarta-feira que fará seu primeiro pedido formal de desculpas à população aborígene por injustiças cometidas no passado.
De acordo com a ministra australiana de Assuntos Indígenas, Jenny Macklin, o pedido de perdão foi marcado para o primeiro dia de atividades do novo Parlamento do país, no dia 13 de fevereiro.

Segundo Macklin, o pedido formal é uma prioridade do novo governo e vai representar um novo começo nas relações entre povos aborígenes e o resto da população.

A ministra afirmou ainda que a decisão "é o primeiro passo para deixar o passado para trás e seguir em frente".

O governo quer se desculpar pela "política de assimilação", que permitia que crianças aborígenes fossem tiradas de suas famílias para viver com famílias brancas.

Milhares de crianças aborígenes foram vítimas dessa política, adotada pelo país entre 1915 e 1969.

Perdão

O primeiro-ministro eleito, Kevin Rudd, anunciou os planos de pedir perdão aos aborígenes durante seu discurso da vitória nas eleições gerais de novembro.

O pedido de perdão já havia sido formalizado pelos governos locais dos seis estados da Austrália. No entanto, o ex-primeiro-ministro John Howard se recusava a aceitar a decisão, dizendo que os abusos cometidos no passado não tinham relação com australianos de hoje.

Mas para o novo primeiro ministro, Kevin Rudd, “o pedido vai ajudar a unir o país”.

Líderes tribais e de organizações de defesa de direitos de aborígenes fizeram campanha pedindo bilhões de dólares de indenização por causa da política de assimilação.

Mas o governo rejeitou a proposta, prometendo criar um fundo para investir na educação e saúde em comunidades aborígenes.

O povo nativo australiano soma atualmente 450 mil pessoas e é considerado o grupo étnico mais pobre do país.

O grupo registra altos índices de analfabetismo e desemprego, e a expectativa de vida dos aborígenes é 17 anos inferior ao resto da população australiana.

ANTROPOLOGIA: Leia trechos do Cap 3 do novo livro de Mercio P. Gomes a ser lançado dia 26 de março

Capítulo 3

METODOLOGIA

Conhece-te a ti mesmo
Frase incrustada no Portal de Delfos
Grécia Antiga

3.1 Abrir-se para o Outro

Todo mundo reconhece que a admonição acima é das mais difíceis de ser cumprida. Era-o na Grécia Antiga, no alvorecer da filosofia, na era das intuições fundantes, e o é ainda hoje na Modernidade, na era da ciência, da sistematicidade do conhecimento e da Psicanálise. Sobre o conhecer-se, que cada um fale por si, e o psicanalista ... por si mesmo. Com efeito, há um certo entendimento de que o conhecimento de si é essencial, conditio sine qua non, para que se possa transpor a fronteira do Eu e se chegar ao entendimento do Outro. Do ponto de vista prático-existencial, porém, o corriqueiro conhecimento de si é suficiente para que cada indivíduo seja capaz de alcançar um certo conhecimento do outro, o que se dá pelo relacionamento, pelo diálogo e por outros modos da razão. Ninguém pode supor que conhece a si mesmo em completude, muito menos o outro, outra pessoa com profundidade. Mas o que é possível dá para o gasto.


3.2 Observação participante

3.3 Método genealógico

25 Ongs serão investigadas pelo Ministério da Justiça

O Ministério da Justiça se incumbiu de investigar 25 Ongs que trabalham com a questão indígena, a exploração de recursos minerais e o meio ambiente. Algumas delas são listadas na matéria abaixo, do Jbonline.

Já era tempo de se investigar diversas Ongs que trabalham com povos indígenas, não só pelas falcatruas que elas fazem, com desvio de dinheiro para atividades dos seus membros, como pela má qualidade de seus serviços, pela doutrinação religiosa, pela criação da ilusão messiânica (ver artigo neste Blog).

A matéria abaixo traz informações bem interessantes e detalhadas sobre as ações de algumas dessas Ongs. Mas nem contempla as Ongs que têm um pé no governo, de onde recebem recursos dirigidos, e um pé no Exterior, de onde recebem recursos e passam informações privilegiadas. A Abin acha que sabe das coisas, mas está longe de encontrar o fio da meada.

Vamos ver no que dá, com a intervenção política que certamente haverá para proteger algumas dessas Ongs.

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Justiça vai investigar 25 ONGs

Jbonline

Um levantamento da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) encaminhado ao Ministério da Justiça para amparar a operação de combate à biopirataria, compra ilegal de terras, interferência indevida em áreas indígenas e exploração de recursos minerais, lista pelo menos 25 organizações não-governamentais (ONGs) com atuação na Amazônia e que devem ser investigadas pela força tarefa criada pelo Ministério da Justiça. No grupo estão as entidades mais expressivas com atuação nas áreas indígenas e na defesa do meio ambiente. O relatório traz um cadastro completo das entidades, nome ou razão social, origem, sede, dirigentes, fontes de financiamento, área de atuação e as atividades desenvolvidas, mas deixa claro que nem todas exercem atividades suspeitas.

A força-tarefa coordenada pela Secretaria Nacional de Justiça vai identificar todas as entidades com o auxílio da Polícia Federal e de outros órgãos públicos federais, como Forças Armadas, Funai e Ibama, para separar as que realizam um trabalho social das que usam a defesa dos índios e do meio ambiente para praticar crimes contra a soberania do país e exploração de recursos naturais.

- Vamos despolitizar esse debate e separar o joio do trigo - , afirma o secretário nacional de Justiça, Romeu Tuma Júnior. Sua primeira tarefa, no entanto, será encontrar um consenso de atuação entre os órgãos públicos para definir a prioridade da força tarefa e separar as entidades sérias das suspeitas. Segundo ele, quem não se sujeitar ao controle governamental tem outros objetivos:

- Estará violando a soberania ou preocupado com as riquezas naturais do país - diz o secretário.

Na lista de 25 ONGs, a Abin aponta 13 com atuação em áreas indígenas e, entre elas, as suspeitas. As que mereceram maior atenção são entidades como a Amazon Conservation (ACT), de origem americana, que desenvolveu campanhas para compra de terras e é suspeita de biopirataria. Dados coletados pela Abin, a entidade repassaria conhecimentos indígenas sobre substâncias extraídas de plantas e animais a laboratórios estrangeiras ligados à produção de cosméticos e medicamentos. Grupos indígenas chegaram a acusar a ACT de não prestar contas e nem repassar recursos prometidos às aldeias.

Outra ONG com atuação na área, a amazonense Comissão Pró-Yanomami (CCPY), segundo as anotações da Abin, chegou a celebrar convênio com o laboratório americano Shaman Pharmaceuticals, sem o conhecimento da Funai ou da Fundação Nacional da Saúde (Funasa), para repassar conhecimentos tradicionais dos índios sobre medicina em troca de recursos, o que caracterizaria, segundo o governo amazonense, a prática de etnobiopirataria.

Epidemias

A ONG indigenista amazonense Conselho Indigenista do Vale do Javari (CIVAJA), é apontada pela Abin como suspeita por má gestão de recursos públicos repassados pela Funasa, o que teria alastrado epidemias entre os índios. A entidade não prestou contas dos recursos alegando que na região em que atua, a fronteira, não consegue notas fiscais ou recibos que comprovem gastos com alimentação e transporte fluvial às equipes.

A Coordenação da União dos Povos Indígenas de Rondônia, Noroeste do Mato Grosso e Sul do Amazonas (CUNPIR), embora se apresente como entidade que combate a exploração ilegal de diamantes na Reserva Roosevelt, em Rondônia, seria dona de equipamentos de garimpagem descobertos na mesma área dos Cinta-Larga, numa localidade conhecida por Igarapé Laje. A entidade é financiada por ONGs alemãs e tem parte de suas despesas bancadas pela WWF - Brasil.

Cosmovisão

Uma outra entidade de nome esquisito, a norte-americana Jovens Com Uma Missão (JOCUM), desenvolve trabalho evangélico junto a grupos que nunca haviam sido procurados por missionários e arranjou encrenca com a principal ONG indigenista brasileira, o Conselho Indigenista Missionário (CIMI), ligado a igreja católica, e com a própria Funai. A JOCUM foi acusada de ameaçar a identidade das etnias e interferir na "cosmovisão" dos índios, introduzindo, através de rituais religiosos, entidades místicas estranhas à cultura dos índios Suruaha, no Amazonas.

A Missão Novas Tribos do Brasil (MNTB), seita de origem americana, é suspeita de usar o trabalho religioso como pretexto para destruir a cultura indígena, praticar a biopirataria, realizar prospecção ilícita do subsolo e contrabandear minerais de áreas indígenas. A MNTB atua em junto a mais de 40 etnias.

Entre as ONGs ambientalistas, um dos alvos certos da investigação é a inglesa Cool Earth, dirigida pelo milionário sueco Johan Eliasc, que oferece terras pela Internet no Amazonas, Mato Grosso e em determinadas regiões do Equador com o pretexto de arrecadar dinheiro para preservação de áreas "adotadas". Eliasc é suspeito de ter utilizado laranjas para comprar cerca de 160 mil hectares no Amazonas e de estimular outros empresários ingleses a comprar terras na região sob o argumento de que a bandeira preservacionista é um bom negócio. Uma entidade brasileira, o Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (IMAZON), premiada internacionalmente pelo trabalho de conservação, mas é citado no relatório por desenvolver projetos de pesquisas sobre desmatamentos financiados pelo governo e entidades filantrópicas americanas, utilizando imagens do satélite MODIS que pertence à NASA.

terça-feira, 29 de janeiro de 2008

SOS: Parque Nacional da Capivara

O Parque Nacional da Capivara, um santuário arqueológico e faunístico da caatinga nordestina, no Piauí, está para fenecer, se não houver aportes de dinheiro para cobrir as despesas básicas de sua manutenção.

A responsável pelo Parque, a cientista Niède Guidon, está em Brasília de pires na mão pedindo socorro ao Ministério do Meio Ambiente. Há meses ela vem abrindo o berreiro por ajuda.

O Parque Nacional da Capivara é lindo e importantíssimo para o Brasil e para a nossa pré-história. Tem que ser preservado!

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Parque com acervo de pinturas rupestres está ameaçado por falta de recursos

Wilson Dias/Abr

Brasília - A arqueóloga Niède Guidon, que faz pesquisas no Parque Nacional da Serra da Capivara, no Piauí, diz que o local poderá ser fechado no dia 31 por falta de verba para pagar funcionários
Brasília - O Parque Nacional da Serra da Capivara, localizado a 540 quilômetros de Teresina (PI), é conhecido mundialmente por abrigar a maior quantidade de pinturas rupestres (feitas pelo homem pré-histórico em cavernas) das Américas. Além de sua riqueza arqueológica, é uma área de preservação da caatinga e um pólo de turismo.

Todo esse patrimônio, no entanto, poderá ficar em risco a partir do fim deste mês, data em que expira o aviso prévio de 62 dos 84 funcionários da Fundação Museu do Homem Americano (Fumdham) que restaram para guardar toda a área do parque, mais de 240 quilômetros de perímetro, ou 140 mil hectares.

Aos 74 anos, a arqueóloga francesa Niède Guidon, com 34 anos de pesquisas na região, chegou ontem (28) a Brasília para pedir ao governo que não deixe as “portas” do parque fecharem. Ela afirma que a situação é caótica, e que o 13º salário dos funcionários foi pago com um empréstimo pessoal que fez.

Nesta semana, ela tentará uma audiência com os ministros Dilma Rousseff, chefe da Casa Civil, Gilberto Gil, da Cultura, e Marina Silva, do Meio Ambiente, para pedir ajuda. A Agência Brasil tentou, nessa segunda-feira, ouvir os ministérios, mas ainda não obteve retorno.

Agência Brasil: Qual é a atual situação do Parque Nacional da Serra da Capivara?
Niède Guidon: Nós estamos tendo que demitir os últimos funcionários. Nós tínhamos 270, hoje temos 84, dos quais 62 já estão com aviso prévio para o dia 31 de janeiro. O parque tem 28 guaritas, todas elas tinham funcionários para fazer a vigilância, impedir caçadores, incêndios, e agora nós já estamos há cinco meses com 20 guaritas fechadas e vamos ter que fechar as últimas oito.

ABr: E o que isso significa?
Niède: Isso significa que todo este imenso patrimônio brasileiro, não só a parte arqueológica, o sítio, as pinturas, que são patrimônio da humanidade, mas tudo o que foi construído lá dentro, cerca de US$ 15 milhões, as guaritas todas, elas mobiliadas com sistema de rádio, mais de 400 quilômetros de estradas mantidas, 128 sítios com todo o sistema para permitir a visitação, com passarelas, com tudo, vão ficar completamente sem manutenção, sem proteção.

ABr: Há quanto tempo começou a faltar dinheiro para a manutenção do parque?
Niède: Essa situação de dificuldade começou há dois anos e só faz piorar a cada dia. Quem está nos salvando atualmente são doações da Petrobras, mas para ela poder nos fazer doações nós temos que ter autorização do Ministério da Cultura. E, infelizmente a burocracia é imensa, tem que estar pedindo a renovação dessa autorização, nós pedimos em março de 2007 e até hoje não foi publicada, então a Petrobras tem recursos para nos passar e não pode.

ABr: De quanto foi o último repasse da Petrobras?
Niède: A Petrobras nos repassou, em dezembro de 2006, cerca de R$ 1,2 milhão, mas isso não foi suficiente para manter os 270 funcionários. Então, nós tivemos que ir despedindo e agora, como não saiu a autorização do Ministério da Cultura, a Petrobras não pode repassar uma nova parcela.

ABr: Quanto seria necessário para manter toda a estrutura do parque?
Niède: Nós precisamos, para manter todos os funcionários, para manter toda a proteção e conservação, de R$ 400 mil por mês. Com isso cria-se 270 empregos no Piauí, que é um estado onde a pobreza é muito grande, onde a seca não deixa a agricultura se desenvolver, e agora nós estamos entrando no terceiro ano de seca, então o turismo era uma solução.

ABr: Há estrutura no parque para desenvolver o turismo?
Niède: Já está sendo construído um aeroporto internacional, tudo está pronto, e agora falta dinheiro para manter aquilo que foi construído. A expectativa, quando tudo estiver pronto, o aeroporto, companhias hoteleiras que querem construir hotéis, será receber 3 milhões de turistas por ano. Esse é o resultado de um estudo feito por uma firma suíça, que foi quem fez todo o projeto. O parque já chegou a ter 15 mil visitantes por ano, mas como houve uma chuva muito forte em 2004, as estradas foram destruídas e o acesso ficou péssimo, então diminuiu muito, porque ficou muito difícil chegar até lá.

ABr: Há quanto tempo a senhora acompanha o Paque Nacional da Serra da Capivara?
Niède: Nós começamos a fazer pesquisa lá em 1973. Na ocasião, eu era professora em Paris (França) e vinha nas minhas férias, com os meus alunos, para fazer esse trabalho. Com isso, nós descobrimos uma quantidade imensa de sítios arqueológicos e foi criado o parque nacional em 1979, só que o Ibama [Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis] criou, mas não mandou nenhum funcionário. Então a depredação começou e depois, em 1991, o governo brasileiro solicitou à França que eu fosse emprestada para coordenar os trabalhos visando à proteção do parque nacional. Foi então que eu vim da França para cá, me instalei lá, e começamos a trabalhar com toda a minha equipe, fizemos um estudo e trouxemos especialistas técnicos do Banco Interamericano (BID), do governo da França, do governo da Itália, e a conclusão foi que a região não têm condições de sobreviver pela agricultura e que a única atividade economicamente rentável seria o turismo.

ABr: Se nada for feito, o que o Brasil poderá perder?
Niède: Ele perde todo um patrimônio cultural dos primeiro povos que viveram aqui, é o sítio mais antigo que nós temos nas três Américas, somente no museu hoje nós temos mais de um milhão de peças, belíssimas. Foi feito um museu para atrair os turistas, nós temos tudo lá, e o parque é uma paisagem maravilhosa, ele está muito bem preservado, e além disso naquela região, até há 10 mil anos atrás, nós tínhamos o encontro de dois grandes biomas brasileiros, que é a Mata Atlântica e a Floresta Amazônica, e até hoje dentro do parque nacional estão preservadas espécies dos dois biomas.

ANTROPOLOGIA: Novo livro de Mercio P. Gomes. Leia trechos iniciais do Capitulo 2

Capítulo 2

CULTURA E SEUS SIGNIFICADOS

Os múltiplos sentidos de cultura


Nosso conceito de cultura

segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

ANTROPOLOGIA: Novo livro de Mercio P. Gomes, a sair em breve. Leia trechos iniciais do Capitulo 1

CAPÍTULO 1

A ABRANGÊNCIA DA ANTROPOLOGIA

Antropologia é uma palavra iluminante que chama a atenção pelos dois substantivos que a compõem, ambos de origem grega: anthropos = homem; logos = estudo, e também, razão, lógica. “Estudo do homem” ou “lógica do homem” são duas possíveis definições distintas, porém convergentes, daquilo que se entende por Antropologia. No primeiro caso, a Antropologia faz parte do campo das ciências -- ciência humana – tal como a sociologia ou a economia; no segundo caso, ela está relacionada a temas que estão no campo da filosofia, a lógica, a metafísica e a hermenêutica, como se fora uma coadjuvante mais sensitiva.

Apesar de sua etimologia, não foram os geniais gregos criadores da filosofia que inventaram a Antropologia. Eles se consideravam tão superiores aos povos e nações vizinhos, seus contemporâneos, a quem chamavam de “bárbaros”, que mal tinham olhos para os ver e os apreciar. Para surgir a Antropologia – cuja característica mais essencial é mirar o Outro como um possível igual a si mesmo – seria preciso um tempo de dúvidas e ao mesmo tempo de abertura ao reconhecimento do valor próprio de outras culturas. Tal tempo só surgiria séculos depois, quando a Europa, em vias de perder sua velha identidade medieval, ainda incerta sobre o que viria a ser, duvidou de si mesma e pôde assim olhar e conceber outros povos, ao menos teoricamente, como variedades da humanidade, cada qual com seus próprios valores e significados.

O pensar antropológico, o pensar sobre o aparente paradoxo de o homem ser um só, como ser-espécie da natureza, e ao mesmo tempo ser múltiplo em suas expressões coletivas, a cultura; o pensar sobre o diferente ser o mesmo; sobre as potencialidades reais e recônditas de cada cultura – é fruto desse momento criativo do Iluminismo. Assim, no seu primórdio iluminista, a Antropologia se situa no campo da filosofia, da especulação sobre o homem e suas possibilidades de ser e de agir. É um método de conceber o homem em sua variedade cultural e reconhecer nessa variedade faces diferentes de um mesmo ser. Para falar em termos filosóficos, a Antropologia é um modo de pensar a variedade do homem, outras culturas, o Outro, num mesmo patamar em que se coloca a cultura de onde surge esse pensar, a cultura européia, isto é, o Mesmo. Podemos, brincando com as palavras, dizer que, para a Antropologia, o Mesmo e o Outro são o Mesmo; ou, o Outro e o Mesmo são o Outro.

Para se obter esse pensar é preciso ter-se ou criar-se a capacidade de sair ou tomar distância de sua própria cultura, dos valores por ela cultivados, para daí penetrar e entender outras culturas pelos valores dessas outras culturas, não de sua própria. Tal método de pensar é condição sine qua non para existir o pensamento antropológico; mas é um ideal a ser alcançado, está em permanente construção, porquanto ele induz o homem a vivenciar uma ética difícil de ser realizada plenamente. Como, diante das evidências gritantes das diferenças e das desigualdades entre culturas, entre povos, podemos e devemos ver tais diferenças num plano de igualdade e respeito? Em suma, a Antropologia nasceu como um modo revolucionário e radical do homem pensar a si mesmo, que empurra o homem ao esforço de superar seus preconceitos, sua própria cultura, para poder entender e vivenciar a cultura do outro, ou seja, qualquer cultura.

Portanto, a Antropologia nasceu dentro do campo da filosofia, como se fosse uma filosofia da cultura. Mais tarde, com a chegada retumbante da teoria da evolução, que integrava todos os seres vivos numa escalada de transformações ao longo do tempo, motivada por um processo de luta incessante pela sobrevivência, a Antropologia passou a ser pensada como uma ciência que iria contribuir para enquadrar o homem e suas culturas num plano contínuo, ou ao menos paralelo ao plano biológico. Desde então, o pensar antropológico tem se desenvolvido tanto como ciência quanto como pensar filosófico; tanto como teoria quanto como especulação; tanto como explicação quanto como interpretação. Antropólogos, os praticantes da Antropologia, têm se pautado ora pelos cânones da ciência, adaptando-os para a compreensão do ser humano e de suas culturas, ora pelas modalidades da filosofia, tentando retirar desta os conceitos mais gerais da essencialidade humana, e ao mesmo tempo tentando injetar na filosofia os conceitos obtidos pela observação e pela prática nos trabalhos empíricos que dão sustentação ao pensar antropológico.

Vejamos como essas duas perspectivas da Antropologia se desenvolvem, definem seu objeto e se complementam na concepção desse objeto.

Antropologia como ciência

Como “ciência do homem”, a Antropologia toma o homem, isto é, o ser humano, no sentido integral de homem e mulher, de coletividade, mas também de espécie da natureza e de ser da cultura e da razão, como um objeto de estudo. Isto quer dizer que o homem pode ser objetivado, esquadrinhado, medido, calculado, dimensionado no tempo e no espaço, tal qual outros objetos científicos, como o cosmo (cosmologia ou astronomia), a terra (geologia) e os seres vivos (biologia).

Grande parte dos antropólogos, no Brasil e mundo afora, trabalha no entendimento de que são cientistas, definindo seu objeto de muitas maneiras, por muitos ângulos, sempre no empenho de estar contribuindo para ampliar, renovar em alguns aspectos, consolidar em outros, o conhecimento sobre o homem. É nesse sentido que a Antropologia se coloca como uma ciência lado a lado com a sociologia, a politicologia, a economia, a psicologia e suas respectivas especialidades e subdisciplinas – todas agrupadas pelo termo “ciências humanas” ou “ciências sociais”. As ciências humanas têm o ser humano como seu objeto de estudo, mas cada qual o faz privilegiando ora um aspecto, ora uma parte, ora uma dimensão.

------------------------------------- Box das Ciências Humanas ------------------------

A Sociologia, como sugere seu nome, cuida da sociedade, o homem como ser coletivo vivendo em família, em grupos, em cidades, repartido em classes sociais, em castas, em nações; ou problematizado em lutas, conflitos e revoluções.
A Economia estuda o homem em seu aspecto material, a produção de bens de uso, que se transformam em bens de troca, as instituições de distribuição, e as conseqüências advindas do eventual mal resultado, ou do resultado desigual da distribuição e do consumo desses bens. Para muitos, a economia é uma “ciência desgraçada” (dismal science, em inglês), já que ela parte do chamado “princípio da escassez”, segundo o qual o desejo dos homens para possuir bens é infinito, enquanto as possibilidades de realizá-lo são bem menores. Daí o descompasso entre meios escassos e fins infinitos; daí a repartição desses bens terminar pesando mais para uns do que para outros, resultando em desigualdades sociais. Para muitos, a economia é a ciência humana que mais se aproxima de uma ciência sistemática, capaz de medição, de controle e de probabilidade. Quase todo mundo considera que a economia influencia todas as ações humanas, desde o modo de existir até o pensamento religioso. Também pelo fato de tratar de riqueza é que os economistas são tão admirados e tão freqüentemente chamados para planejar e dirigir os países. Já outros consideram o pensar economicista uma limitação ao pensar humano.

A Politicologia, ou Ciência Política, se reporta ao estudo da dimensão do poder que permeia as relações entre os homens, as classes sociais, as instituições, especialmente o Estado, as sociedades e as nações. A Política foi pensada pelos filósofos gregos como um saber e uma arte de equilibrar interesses díspares em prol de um bem comum. Foi considerada por Aristóteles como o modo ou a arte mais nobre de convivência. Porém, desde Maquiavel, Hobbes, e mais recentemente, Foucault, o poder é visto como uma dimensão da opressão do homem sobre o homem, quase, para falar religiosamente, como o lado mal do ser humano. Pois que, o uso, ou mal uso, do poder sempre se dá em detrimento de alguém. Por isso, a Ciência Política refere-se muito mais a conflito do que a negociação e convivência.

Já a Psicologia perscruta a psique dos homens, sua formação mental e emocional, a relação própria de cada pessoa com o ambiente em que vive. É uma ciência bipartida entre o aspecto fisiológico e o aspecto mental do homem. A figura mais destacada é Sigmund Freud (1854-1938), que descobriu que o inconsciente humano tem sua própria razão de ser e seu modo próprio de agir, aquém e além do consciente. A Psicologia discorre, portanto, sobre o ser humano como indivíduo tanto consciente quanto inconsciente de si.

--------------------------------------Fim do Boxe sobre Ciências Humanas -----------

Num sentido muito ambicioso, a Antropologia é a ciência humana que presume abordar um pouco de tudo que cada outra ciência humana aprecia. Primeiramente, ela busca tratar da questão básica da natureza do homem, de sua condição fundamental de ser uma espécie biológica, localizada na ordem dos primatas, na subordem dos antropóides, na família hominóidea, no gênero dos hominídeos, como a espécie Homo sapiens. Em segundo lugar, essa ciência visa o homem como ser de cultura, um modo de ser para além dos condicionamentos da natureza, para o que se subentende uma inteligência capaz de encarar o mundo através de convenções simbólicas, as quais são sistematizadas e transmitidas de geração a geração não pelo instinto ou pela carga genética, mas pela linguagem, que é a quintessência da comunicação humana. Num sentido metafísico, cultura é uma espécie de “segunda natureza” do homem, uma mediação, uma qualidade de filtro ou lente que permite ao homem formar noções sobre si mesmo e sobre o mundo e, ao mesmo tempo, agir. Num sentido empírico, cultura é tudo que o homem faz parcialmente consciente e parcialmente inconsciente, além daquilo que sua natureza biológica o permite fazer. Fazer significa não somente produzir os meios de sua sobrevivência (economia), mas também pensar (filosofia), desejar (psicologia) e relacionar-se uns com os outros (sociologia e política). Adicione-se a esses atributos a idéia de que o homem, embora pense e faça as coisas como ser individual, tem seu pensamento e seu comportamento condicionados por sua existência numa coletividade, a sociedade. Tal explicação pode parecer auto-evidente, mas serve para identificar um dos temas mais importantes da sociologia, que é entender a relação do indivíduo com a sociedade.

Dando conta dessa divisão de tarefas, entre entender o homem como ser da natureza e ser da cultura, a Antropologia como ciência se apresenta nos currículos das universidades mundo afora em quatro subdisciplinas: Antropologia Física ou Biológica; Arqueologia; Lingüística; e Antropologia Cultural ou Social. A questão da posição do homem na natureza, que compreende as temáticas de evolução, distribuição e adaptação pelos quatro cantos da Terra, as características e os potenciais biológicos são estudados no âmbito da Antropologia Biológica. A Arqueologia subsidia com dados essa questão, mas vai adiante ao auxiliar a Antropologia Cultural na formulação dos processos das transformações da cultura ao longo do tempo. Trataremos aqui também da Lingüística, como uma das subdisciplinas que subsidia o conhecimento do homem como ser da cultura. Entretanto, deixaremos para tratar da Antropologia Cultural por seu próprio mérito a partir do Capítulo 2, reconhecendo que é esta subdisciplina que representa o grande esforço do pensamento antropológico da atualidade.

Antropologia Biológica

Para o público que ouve falar de Antropologia, mormente em documentários de cunho científico, através de programas de televisão educativa e por reportagens mais chamativas de noticiários, a Antropologia Biológica representa, freqüentemente, a imagem do que parece ser a Antropologia. A busca da origem do homem, a comparação com os macacos, o poder do instinto sobre a cultura e a civilização. Há razões para se pensar assim. É que esses e outros temas, alguns tratados com certa mistificação, foram, provavelmente, os primeiros a cativar o interesse do público e dos pesquisadores no momento em que a Antropologia, paralelamente à Sociologia, estava começando a surgir como uma ciência.

O mundo se quedou abismado a partir do momento em que um certo esqueleto descoberto no vale do Neander, na Alemanha, em 1856, foi proposto como sendo de um provável ancestral do homem. O chamado Homem de Neanderthal virou “o elo perdido” entre o homem e os grandes símios, eis como foi conjeturada e alardeada essa descoberta – e eis como o tema continua a prevalecer no imaginário coletivo até hoje. Consolidando esse imaginário pela ciência, surgiu, em 1859, a publicação da Evolução das Espécies, do biólogo inglês Charles Darwin, cuja teoria iria revolucionar a forma de o homem pensar a diversidade das espécies da natureza e o sentido científico da vida. A teoria de Darwin concebe que a vida, além de depender de uma série de processos químicos de troca de energia, está sujeita a um imperativo fundamental, que é a sua continuidade, a qual depende da capacidade de disputa de cada espécie dentro do ambiente em que está inserida. A famosa frase “a sobrevivência do mais apto” sintetiza a teoria da evolução, mesmo que se compreenda modernamente que a disputa entre as espécies dá vez, com freqüência, a processos cooperativos. Com o destemor de quem estava certo das conseqüências ideológicas de sua teoria, Darwin não fugiu ao desafio de pôr o homem como um ser da natureza, que, portanto, passaria pela mesma injunção de competir com outras espécies e, provavelmente, consigo mesmo, pela sobrevivência.

Para a Antropologia Biológica o homem é visto e definido como um ser da natureza que evoluiu fisicamente até chegar, há uns 80.000 anos (a partir de seu surgimento há cerca de 200.000 mil anos), à condição atual, desde então praticamente sem mudanças essenciais, a não ser aquelas derivadas de adaptações físicas aos quatro cantos da Terra. A evolução humana teria se realizado por processos idênticos aos dos demais animais, isto é, condicionada aos processos da lei da evolução. Entretanto, o homem se tornou um ser especial por ter adquirido aquilo que de modo geral se chama cultura. Inclui-se aqui a capacidade de comunicação por um sofisticado sistema lingüístico, a fabricação e a utilização de ferramentas -- o fogo em primeiro lugar --, e a adoção generalizada de um costume social excepcional, a proibição do incesto, isto é, de relações sexuais entre pais e filhos e irmãos e irmãs, como regra fundamental da sociedade humana. Os antropólogos biólogos se preocupam com os aspectos fisiológicos da evolução do homem, mas não podem deixar de reconhecer que os aspectos culturais, desde o início, ajudaram na evolução biológica. Por exemplo, quando o fogo passou a ser usado para cozinhar alimentos, os grandes molares, encontrados nos fósseis de alguns ancestrais humanos e próprios para triturar sementes, ficaram dispensados dessa função, já que sementes cozidas são mais facilmente mastigáveis. Assim, para reconstituir como os ancestrais do homem viviam, os antropólogos biólogos freqüentemente recorrem a modelos e explicações criados pelos antropólogos culturais, de vez em quando adicionando uma idéia que surge na tentativa de imaginar os percalços dessa evolução.

Duas questões de grande importância científica orientam as pesquisas da Antropologia Biológica: a primeira é localizar a posição do homem enquanto Homo sapiens na sua ordem e na sua escala de evolução. Importa saber como o homem evoluiu fisicamente, por quais motivos e influências, sob quais condições. Importa saber essa história, seu trajeto de evolução e como se espalhou e se adaptou por todo o globo. A segunda questão é entender o quanto de “animal”, de ser da natureza, de orgânico, ainda existe no homem tal qual ele é hoje. O quanto que o homem faz vem diretamente de seus instintos de animal e o quanto deriva de comportamentos adquiridos no curso de sua evolução biológica ou das transformações culturais. Tal questão tem desdobramentos em vários setores das ciências humanas e até da filosofia. É grande ainda o debate sobre o quanto o homem age como um animal em busca de sua sobrevivência pessoal e coletiva e o quanto ele age por preceitos adquiridos através da cultura, da religião, da ética. O modo e as intenções como essa última questão é abordada terminam influenciando, hoje em dia, quem acredita na possibilidade de as nações e as sociedades viverem em bons termos ou quem considera que o homem é incapaz de sobrepujar seu instinto de luta pela sobrevivência, tal qual os animais, em nome de um ideal cultural maior.

------------------------Box do Quadro Evolutivo do Homo sapiens-------------

Um dos quadros mais cambiantes da Antropologia Biológica é o da reconstituição da evolução da linhagem humana. A cada momento os resultados de novas pesquisas arqueológicas parecem mudar radicalmente aquilo que se tinha por certo alguns meses antes. O mesmo se dá no campo da Biologia Molecular, que tanto tem contribuído para se entender esse processo através dos estudos sobre a evolução da mitocôndria do DNA. Há muita divergência de opinião entre os antropólogos, e mesmo quando alcançam um consenso mudam na primeira notícia de novas descobertas. Mas uma coisa até agora é certa. Homo sapiens e toda sua linhagem surgem e evoluem na África. Assim, o quadro que se apresenta aqui é apenas o estado da arte em agosto de 2007, podendo mudar em setembro ou em 2008. Homo sapiens é o resultado de um processo evolutivo que começa há uns 6 milhões de anos atrás (6Maa) quando nosso primeiro ancestral o Australopithecus se desmembra de uma família mais ampla que incluía os chimpanzés. Antes, por volta de 10 Maa, os dois haviam se desmembrado de uma linhagem que continha os gorilas e os orangutangos. Os Australopithecus já tinham uma postura ereta ou semi-ereta, e isto é o que mais os distingüe dos chimpanzés, já que o tamanho de seus cérebros era quase igual, em torno de 400 cc. Os Australopithecus permaneceram na Terra até cerca de 1,4 Maa e tiveram várias espécies, uns mais robustos e outros mais graciosos. Dos graciosos, provavelmente o Australopithecus africanus, é que surgiu o primeiro hominine do gênero Homo. Isto por volta de 2,5 Maa. Da primeira fase do gênero Homo se desenvolvem ao menos duas espécies, o habilis e o rudolphensis, e talvez do habilis, já com o uso de utensílios de pedras, surgem ao menos três espécies: erectus, ergaster e heidelbergensis, todos por volta de 1,9 Maa. Todas essas espécies se espalharam da África para a Europa e Ásia e conviveram entre si. Homo erectus sobreviveu no sudeste asiático até pelo menos 53 mil anos atrás (53 maa). Em algum momento por volta de 200 maa surgem duas espécies muito próximas em termos de tamanho do crânio e capacidade lingüística, o Homo neanderthalensis e o próprio Homo sapiens. Alguns antropólogos consideram o neanderthal uma variação do Homo sapiens, outros, seu precursor. De todo modo, eles conviveram e provavelmente disputaram entre si até 28 maa. Daí por diante não há mais sinal de neanderthal. A não ser que o Homem das Montanhas seja um sobrevivente! Homo sapiens alcançou a Austrália por volta de 60 maa, parece que ainda sem arco e flecha, mas chegou às Américas, via Estreito de Behring, que ligava a Sibéria ao Alasca, por volta de 35 maa, já armado de arco e flecha. Por volta de 12 maa já havia grupos humanos na ponta da América do Sul e em todas as partes do mundo.

_______________Fim do Box Quadro evolutivo do Homo sapiens_____

De certo modo, a temática mais importante da Antropologia Biológica é tentar encontrar o lugar do homem na Natureza e ao mesmo tempo conhecer a especificidade de sua natureza. Para tanto, ela está em permanente diálogo e busca subsídios em várias ciências biológicas, a começar pela Anatomia. Isto se dá, principalmente, porque os principais indícios que ajudam a formular as passagens da evolução biológica do homem estão nos restos de ossos e esqueletos fossilizados. A Arqueologia trata de descobrir esses remanescentes ósseos, como logo veremos, mas são os antropólogos biólogos que se dedicam ao estudo e à comparação do esqueleto humano com os esqueletos dos demais primatas, os quais dão pistas sobre a proximidade do homem com esses animais e, ao mesmo tempo, permitem formular hipóteses sobre como se deram as mudanças nas suas estruturas ósseas, por que razões e em que períodos. Importante é saber como o homem tornou-se ereto e bípede, como aumentou a sua capacidade craniana, qual tem sido sua dieta ao longo desses anos, como ele adquiriu a capacidade de fabricar instrumentos e, enfim, de falar.

Com a Genética a Antropologia Biológica quer total proximidade, sobretudo porque as descobertas dos últimos 30 a 40 anos nessa área têm ajudado a projetar similitudes e diferenças entre as espécies que antecederam o homem e a subordem dos antropóides, afinando, desse modo, o quadro evolutivo que se projeta para o homem. Um exemplo é a corroboração genética de que o homem, bem como todos seus antecedentes de família e gênero, evoluíram no continente africano. Tal teoria surgiu a partir da descoberta, em 1912, na África do Sul, de um esqueleto fossilizado de um hominóideo que ficou cognominado de Australopithecus, por seu descobridor, Eugene DuBois, cuja descoberta foi seguida de inúmeras outras semelhantes que permitiram reconstruir uma trajetória que passa por outras espécies do gênero dos australopithecinos até chegar ao gênero Homo, o qual, por sua vez, passa pelas espécies erectus e neanderthalensis até chegar ao sapiens. Consolidando essa teoria além das evidências arqueológicas e anatômicas, a descoberta da persistência da célula hipocondrial aventa com a teoria de que todos os homens da atualidade teriam vindo de uma Mãe Primeva ou Ancestral, e que esta mãe provavelmente teria evoluído nas mesmas condições ambientais de onde teriam surgido as espécies hominídeas anteriores, qual seja, na África.
Um dos afazeres mais visíveis da Antropologia Biológica são as pesquisas que os seus estudiosos fazem sobre os demais primatas, especialmente os antropóides superiores, aqueles que mais proximamente podem ser comparados em sua carga genética e em seu comportamento com o homem. A idéia por trás dessa atividade é descobrir o quanto de “animal” existe no homem, o quanto seu comportamento social é próximo ou distante do comportamento social dos seus primos antropóides; mas também o quanto de inteligente e “cultural” existe nos próprios antropóides. Será que o chimpanzé aprenderá um dia a pensar? Esse ramo da Antropologia Biológica se chama Etologia e é exercida tanto em laboratórios, por meio de pesquisas genéticas e pesquisas controladas sobre comportamento, quanto em campo, observando o comportamento ao natural, nas savanas (por exemplo, hordas de babuínos), nas florestas africanas (especialmente chimpanzés e gorilas), nas florestas do subcontinente indiano (macacas), nas ilhas da Indonésia (gibões e orangotangos), além do Japão e na Floresta Amazônica (macacos em geral). É portanto uma atividade científica das mais cheias de aventura e questionamentos a que os antropólogos biólogos se dedicam. Aventura porque a pessoa se deslocar para savanas e florestas para observar o comportamento de animais exige coragem, desprendimento e dedicação; questionamento porque experiências de laboratório com animais que apresentam tal vivacidade de inteligência freqüentemente tocam os sentimentos éticos e morais dos pesquisadores por estarem manipulando seres que, de algum modo, entendem o que se está fazendo com eles. (Porém este é um problema que atinge a todos os pesquisadores de laboratórios, até os que trabalham com camundongos.)

Arqueologia

A Arqueologia é a outra subdisciplina que auxilia na compreensão da evolução do homem ao longo do tempo. Mas ela é também fundamental para se reconstituir antigas sociedades e culturas. Segundo sua etimologia grega, Arqueologia pode ser definida como o “estudo dos tempos primevos”. Assim, os arqueólogos se dedicam ao estudo tanto de remanescentes ósseos que podem elucidar na compreensão da escalada evolutiva do homem, quanto de sociedades que não mais existem, ou ainda aquelas de tempos pretéritos que hoje em dia são bastante diferentes do que eram. A idéia é reconstruir o passado por meio das evidências concretas que podem ser, literalmente, desenterradas: lascas de pedras que um dia foram facas, furadores e raspadores; ossos, esqueletos e corpos mumificados, que podem dar dados sobre idade, doenças, hábitos alimentares, status social; pólens e dejetos fossilizados que podem indicar hábitos alimentares; madeira carbonizada, que ajuda a determinar a idade de seu uso e, portanto, a idade do sítio arqueológico; cerâmica, que indica técnicas, arte, alimentação; monumentos, templos, tumbas, enterramentos, cemitérios, depósitos de lixos, etc., que podem indicar nível econômico, organização política e religiosa, sedentarização, transumância ou nomadismo.

A Arqueologia parece uma aventura em desertos, em ruínas, em cidades desaparecidas, ou na busca de segredos do passado. As imagens de descobridores de túmulos com pedras preciosas, de câmaras escondidas em pirâmides, ou de escavadores de sítios e cavernas estão no imaginário do público em geral. Porém, a Arqueologia não é só sensação. Noventa por cento é trabalho árduo, suor e poeira, viver em acampamento e passar horas tentando limpar um esqueleto ou colar os cacos de um vaso. É, acima de tudo, uma sistematização científica de uma série de técnicas de pesquisa, com a definição de um objeto específico que tem uma temporalidade e com propósitos de explicação e teorização sobre esse objeto. O que interessa à Arqueologia é contribuir para o conhecimento do homem tanto em sua diversidade cultural, quanto em suas transformações culturais, só que concentrando naquilo que já se foi.

Por isso é que a Arqueologia está no âmbito das preocupações da Antropologia Cultural, ajudando-a, com dados do passado, a confirmar ou rejeitar teorias sobre aspectos da cultura e das culturas da atualidade. Por outro lado, a Arqueologia é um meio imprescindível pelo qual os antropólogos biólogos buscam dados para formular os modelos e as teorias sobre a evolução biológica do homem. Nesse último sentido, a Arqueologia é uma coadjuvante de peso para a Antropologia Biológica.

----------------------- Box com foto de um sítio arqueológico no Brasil--------------

A Arqueologia, subordinada destarte aos objetivos teóricos da Antropologia Biológica e da Antropologia Cultural, torna-se acima de tudo uma atividade de técnicas de descoberta, análise e reconstrução de dados concretos que podem ser transformados em hipóteses factuais, para serem elaboradas em teorias. Descobrir um sítio arqueológico, por exemplo, se até trinta anos atrás era uma questão de sorte, ou acontecia quando alguém já o tivesse encontrado e, provavelmente, estragado, consiste, hoje em dia, numa tarefa meticulosa que usa técnicas de leitura de fotos de satélites, conhecimento do solo, avaliação de probabilidades da existência de sítios advindas de dados hipotéticos, como trajetória de migrações de povos ou de guerras. Abrir e escavar um tal sítio requer técnicas e experiência para não perder dados, como ossos, pedaços de argila, cotocos de pau, restos alimentares, (inclusive já digeridos), para preservá-los e para conhecê-los na disposição original encontrada a fim de que possam indicar, em sua reconstituição, a posição e o seu significado em determinado tempo. É trabalho fatigante e meticuloso, o qual tem-se que gostar para agüentá-lo; por isso é que todo estudante de arqueologia é levado a fazer escavações desde cedo em seus estudos.

Muitas técnicas de pesquisa vêm de outros saberes científicos, como a geologia, a ecologia, a paleontologia, a química, a própria anatomia, etc. O arqueólogo tem que ter conhecimento de muitos aspectos dessas ciências para melhor avaliar o seu objeto de pesquisa. Determinar a idade de um sítio arqueológico, por exemplo, necessita tanto do conhecimento de química, no caso, da passagem do isótopo de carbono 14 para carbono 12, quanto de geologia, no caso, da identificação de camadas geológicas onde se encontra o sítio. Amostras dessas substâncias são analisadas em laboratórios especializados, mas o arqueólogo tem que saber retirá-las sem contaminá-las com outros dados, e tem que saber posicioná-las no lugar próprio de onde vieram para que a reconstrução faça sentido. Com efeito, as disputas mais acirradas da Arqueologia se referem à idade e à temporalidade de determinado sítio arqueológico, e a validade dessas disputas depende, em geral, de como foram retirados os materiais usados para a datação.

No Brasil pouco se faz em matéria de Antropologia Biológica. Afinal, pouca gente duvida que o homem quando chegou ao continente americano já era o próprio Homo sapiens. Nosso interesse biológico está mais voltado para o conhecimento da diversidade física das populações indígenas, africanas e européias, suas cargas genéticas, suas composições imunológicas, e, especialmente, a miscigenação que aqui ocorreu. O conceito de raça e suas características genéticas e supostamente culturais, que se desdobravam numa hierarquização e pareciam confirmar sua validade pelo preconceito, já foram motivo de grandes preocupações no passado, no tempo em que o mundo estava dominado pela ideologia do darwinismo social. A Antropologia Cultural, entretanto, superou esse tempo ao propor e consolidar a idéia de que o homem, apesar de suas diferenças biológicas – isto é, cor da pele, formato do rosto, cabelo, tendências musculares, etc., - é o mesmo em inteligência e em potencial cultural. De modo que o termo raça, como conceito é um mal-entendido, embora continue a ser usado por inércia intelectual, pois serve tão-somente para identificar traços fenotípicos genéricos de determinadas populações, ou, por ideologia, para identificar minorias étnicas e suas condições político-culturais em sociedades marcadas pela desigualdade social.

Já a Arqueologia tem um espaço mais consistente em várias das nossas universidades. Importa-nos saber há quanto tempo o homem está nas Américas e chegou ao Brasil, como se espalhou, de que modo se adaptou aos diversos meios ambientes, como desenvolveu suas culturas. Sítios arqueológicos se encontram em todas as regiões brasileiras, desde os famosos sambaquis, que se apresentam como uns morrotes de calcário formados pela decomposição físico-química das cascas de conchas, moluscos e crustáceos, que foram jogados e amontoados por pescadores e mariscadores nas praias e mangues; as cavernas líticas e suas itacoatiaras, ou pinturas rupestres, nos cerrados centrais e nas caatingas nordestinas que serviam de abrigo a caçadores e coletores; até os extensos terraços da ilha de Marajó, que são plataformas de terra e barro acima do nível de alagamento, sobre os quais se erguiam templos e residências da elite, e de onde já foram retiradas as vistosas cerâmicas que caracterizam sociedades que tinham protoclasses sociais, sacerdotes e templos, algo que não mais existia quando os portugueses aqui aportaram.

Faz-se muito no Brasil aquilo que se chama de “arqueologia de salvamento”. A construção de barragens para usinas hidrelétricas, estradas que cortam terras virgens e mesmo o desmatamento para roças e pastos; e nas cidades, túneis para metrôs e construção de prédios – freqüentemente esbarram em e destroem valiosos sítios arqueológicos. A legislação brasileira exige que os empreendedores contratem firmas de arqueologia ou arqueólogos avulsos para fazerem levantamentos do patrimônio arqueológico e resgatarem ao menos aquilo que for salvável. Às vezes os arqueólogos e o Instituto Brasileiro de Patrimônio Histórico conseguem até desviar o curso de determinado projeto de construção para salvar e preservar algum bem de maior valor para nosso patrimônio.

Lingüística

A Lingüística é uma ciência humana das que mais se aproxima do modelo de ciência sistemática (o que os americanos costumam chamar de hard science), como a física e a biologia. Em muitos departamentos de Antropologia nos Estados Unidos e Europa ela faz parte do currículo da Antropologia como uma subdisciplina com seus próprios méritos. Seu objeto é, evidentemente, a língua, as línguas humanas, suas estruturas internas, suas conecções mútuas, suas histórias, sua capacidade de mudança e, especialmente, o significado que elas dão ao homem e à cultura. Os antropólogos lingüistas estudam em especial as línguas não européias, particularmente as dos povos indígenas, africanos e oceânicos. Ao fazerem isso têm em mente que as línguas são o principal (alguns falam em “único”) meio pelo qual o homem apreende o mundo da natureza e o mundo da cultura. A língua seria o veículo da cultura, que, por sua vez, é a intermediação entre o homem e a natureza.
Conhecida inicialmente como Filologia, a Lingüística surgiu, ainda em fins do século XVIII, quando estudiosos de línguas se deram conta de que as línguas se parecem umas com as outras, portanto, estão conectadas umas com as outras, como se fossem irmãs e derivassem de outras anteriores. Daí a metáfora de que elas formam famílias, que juntas formariam super-famílias, e daí troncos lingüísticos, etc., num processo histórico regressivo que terminaria, se fosse possível traçar todos esses passos, por chegar a uma primeira língua mãe.

Primeiramente demonstraram que quase todas as línguas faladas na Europa (exceção de húngaro, lapão, estoniano, finlandês e basco) teriam derivado de uma única língua, que foi convencionado chamá-la de “proto-Indo-Europeu”, a qual teria sido trazida para a Europa da região dos Urais por um povo que se espalhara por todos os seus cantos, além de se ter expandido até a Pérsia e a Índia. Tal acontecimento original teria se dado há uns 7.000 anos. Em seguida, foi sendo demonstrado que as demais línguas em todas as partes do mundo fazem parte de semelhantes famílias e por idênticos processos históricos. O que aconteceu com as línguas do tronco Indo-Europeu teria acontecido com as línguas dos troncos siamo-chinês, tibeto-burmês, hamito-semítico, bantu, etc., etc. Por conseqüência, todas as línguas adviriam de uma mesma e única língua, tal qual todos os homens, pela teoria evolucionista, advêm de uma única mãe, de uma única espécie. Daí que o mesmo processo histórico-evolutivo explicaria, grosso modo, tanto as transformações lingüísticas quanto as biológicas. A teoria do monogenismo (uma única origem) das línguas é contestada hoje pela idéia do plurigenismo, segundo o qual, em determinado momento da diversificação do Homo sapiens, mais de uma sociedade humana teria estabelecido sua língua original, como se foram descobertas simultâneas e independentes. Muito mais de pesquisa vai rolar sobre esse tema.

Entretanto, as diferenças entre línguas, criadas pela passagem do tempo, não representam uma hierarquia. O máximo que se pode dizer é que algumas línguas contêm mais palavras do que outras, por força da complexidade material das culturas em que elas funcionam. Porém todas as línguas têm as palavras de que suas culturas precisam para representar suas características e propriedades. Todas são capazes de produzir todo e qualquer tipo de pensamento, do mais simples ao mais abstrato, usando palavras equivalentes, criando novas palavras ou tomando emprestado palavras de outras línguas. Por outro lado, nenhuma palavra de uma determinada língua corresponde perfeitamente a uma palavra de outra língua. O significado das palavras é determinado pelas circunstâncias em que a língua está inserida, que são específicas e mutáveis em cada cultura. O filósofo Luiz Sérgio Coelho de Sampaio chamou essa propriedade lingüística de “a ilimitada complacência do significado”.

Em segundo lugar, a partir dos estudos de Ferdinand de Saussure, os quais foram seguidos pelos trabalhos de Roman Jakobsen e Nicolai Troubetzkoy, ficou comprovado que a língua, concretamente formada por sons que se agregam em palavras, tem um caráter sistêmico. Sons tornam-se inteligíveis para os falantes de uma língua por se contraporem uns aos outros e por constituírem um sistema coeso, o sistema fonético, o qual exclui da compreensão qualquer outro som fora do sistema. Palavras representam alguma coisa real, mas só fazem sentido por convenção da língua, através de um ordenamento próprio, a gramática. O sistema fonético, a gramática e os significados das palavras, a semântica, nada têm a ver com a materialidade desses sons, e os falantes de uma língua aprendem tudo isso inconscientemente. Também descobriu-se que o caráter histórico das línguas se deve a uma tendência própria de instabilidade interna. Os sons dentro de um sistema mudam, o sistema muda, a gramática pode mudar e até o significado das palavras muda. Juntando-se o caráter sistemático com a instabilidade, pode-se prever em que direção uma determinada língua poderá mudar, por quais sons e fonemas e por quais arranjos gramaticais.

Assim, a Lingüística desenvolveu-se como uma teoria científica bastante sistemática, atraindo a atenção das demais ciências humanas. Como ela é não somente parte da cultura, mas quiçá sua parte mais essencial, não seria possível que a cultura também fosse estruturada da mesma forma? A partir da década de 1940, um egresso da filosofia, que havia se tornado antropólogo por ter feito pesquisas de campo entre diversos povos indígenas no Brasil, Claude Lévi-Strauss (1908-), passou a usar a teoria estrutural da Lingüística como um modelo para compreender a cultura, não apenas nos seus aspectos mais sociológicos, como a economia, a organização social, mas também nos menos concretos e mais inconscientemente elaborados, tais como ritos, mitos e crenças. Discutiremos a escola estruturalista da Antropologia em maiores detalhes mais adiante.

Antropologia como filosofia da cultura

Antropologia também se presume uma “lógica do homem”, no que ela se aproxima das matérias do campo filosófico: a lógica como a expressão formal de um modo de pensar e sua correspondência com um modo de ser, tal como foi intuído um dia pelo filósofo Parmênides; a metafísica como o conhecimento do ser próprio da vida e das coisas do mundo (do qual o homem partilha e pensa); e a hermenêutica, como modo de conhecer pela interpretação onde a palavra e os atos se interpenetram e dão sentido ao homem.

Nesse sentido, a concentração do interesse da Antropologia sobre cultura e a indagação sobre suas qualidades, seu ser, sendo este ser a própria representação do homem, o seu espírito, para falarmos nos termos de Hegel, faz da Antropologia uma coadjuvante mais sensitiva da Filosofia; daí é que podemos considerar que a Antropologia também é uma Filosofia da Cultura.

Como vimos, o pensamento antropológico surgiu no Iluminismo como uma especulação sobre o homem, sua natureza, suas transformações e seus potenciais. Os filósofos iluministas não fizeram propriamente pesquisas sobre outros povos, mas conheciam os relatos e livros escritos por viajantes que haviam estado com povos do Novo Mundo, da Ásia e da Oceania. A Europa havia se expandido desde 1500, conquistara muitos povos, à força das armas, mas não era ainda uma controladora absoluta deles, à força da economia. Só com o desenvolvimento de novos meios e técnicas de produção capitalista, é que o verdadeiro imperialismo europeu iria se estabelecer por quase todo o mundo, inclusive em antigas civilizações como as da Índia, da antiga Pérsia e até da China. A maioria desses livros descrevia costumes e hábitos de outros povos de um modo derrogatório, preconceituoso, tratando-os como sendo incompreensíveis e inaceitáveis para os europeus. Porém, diversos outros demonstravam que os costumes, por mais bizarros que fossem, faziam sentido para os povos que os praticavam, e que esses povos, como indivíduos, eram dotados de racionalidade mais ou menos semelhante à dos europeus. Pensavam, calculavam, projetavam; sofriam, amavam, adoravam. Mesmo escalonando os povos em uma hierarquia de inferior a superior, muitos filósofos iluministas sentiram que todos pertenciam à mesma espécie, que eram todos parte de uma humanidade única. Tal asserção adveio de um modo de pensar filosófico.

Rousseau, o mais sensível deles, sugeriu em dois livros importantes para a história da modernidade – O Contrato Social e A Origem da Desigualdade entre os Homens – que os povos chamados primitivos representavam na verdade estágios pelos quais todos os povos teriam passado. Seriam estágios próprios e necessários da humanidade. O estágio em que o homem já teria deixado de ser um animal bruto e solitário, ganhara razão e passara a viver em harmonia coletiva, Rousseau chamava de estágio do bom selvagem, quando o homem teria sido mais íntegro com sua natureza e, portanto, mais feliz. Tal afirmação carecia de um espírito propriamente científico, estava no nível da especulação, da dedução lógica, com base em percepção intuitiva e comparação difusa. De qualquer modo, foi da maior importância para o desenvolvimento do pensamento antropológico, tanto como parte da filosofia quanto como ciência.

Os filósofos alemães Kant e Hegel, aos seus modos distintos, especularam sobre a natureza do homem e da sua segunda natureza, a cultura. Viram o homem e a cultura como explicáveis somente por conceitos próprios, em processo de transformação contínua (a palavra evolução ainda não entrara em voga), em direção a uma meta, a um lugar que seria a afirmação de seu ser superior perante a natureza. Mais tarde, um discípulo de Hegel, Karl Marx, propôs, tal qual Rousseau, que o homem fora um dia feliz, num tempo de igualdade, mas que o surgimento da desigualdade o fizera perder essa condição. Desde então, toda a história da humanidade seria uma luta contra essa desigualdade, cuja raiz mais profunda estava na divisão social entre os que trabalham e aqueles que usufruem do trabalho alheio. Desconhecendo sua natureza anterior e seu potencial superior, o homem se alienara e sofria com isso. No desenvolvimento do capitalismo, cuja ascensão estava se dando a todo vapor e com toda a brutalidade desde as primeiras décadas do século XIX, Marx via o momento em que o homem poderia se dar conta de sua angústia e ter condições objetivas para superar a desigualdade social. Tal processo se daria pela autoconsciência do trabalhador, a classe social que mais perdera e mais se alienara no processo capitalista. Por ser maioria da população, por compartilhar coletivamente dos processos de trabalho e convivência, por terem uma cultura comum, enfim, a classe trabalhadora estava talhada e estaria destinada a destruir a ordem capitalista, arrancar o poder de mando dos capitalistas e do sistema social que os servia e os justificava, que os alienara e alienara toda a humanidade. Para tanto haveria que se organizar – e esta seria a tarefa de um partido político.

Marx interpreta o homem como ser duplo da natureza e da cultura. A natureza é o dado incontornável de onde surgem o homem e a cultura. O homem vira ser cultural por conta de sua evolução biológica, sem dúvida; mas é pelo trabalho, isto é, a tarefa realizada como meio para se obter algo mais do que o dado pela natureza, que o homem vira verdadeiramente um ser cultural. A cultura estabelece sua própria lógica, que conflita com a natureza. Tendo saído do domínio da natureza, é pela cultura que a natureza passa a ganhar sentido para o homem. Vulgarmente falando, a cultura não está mais na natureza, mas quer “dominá-la”. Essa duplicidade do homem o torna um ser contraditório, o que o projeta a estar em movimento incessante. De sorte que, para Marx, a história da humanidade seria a história das transformações culturais motivadas pela contradição essencial do homem, a qual se realiza, na prática, pela luta entre grupos sociais em posição de desigualdade. Toda cultura, mesmo aquela que parece absolutamente estacionária, está em processo de mudança.

Marx tinha essas idéias formuladas ainda em suas primeiras reflexões filosóficas, antes de tornar-se o revolucionário formulador da estratégia para apressar conscientemente a transformação da sociedade capitalista européia. Ao se defrontar com o conhecimento empírico sobre povos não europeus, especialmente povos que àquela época eram considerados primitivos ou selvagens, cuja literatura descritiva se avolumava e estava se transformando em teorias sobre evolução cultural, Marx buscou incorporar esses novos dados e idéias à sua teoria dialética. No livro A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado, esboçado com base em dados etnográficos e em análises de diversos autores da época, em especial Lewis Henry Morgan, Marx e Engels procuraram abranger toda a história da humanidade numa totalidade significativa. Ao final, Marx e Engels revelam-se discípulos de Hegel: o homem é um ser em movimento (outros filósofos mais tarde diriam “angustiado”), por ter perdido sua condição original de animal, é um ser dependente da cultura e tem uma direcionalidade própria que é de certo modo indecifrada. Constituído pela atividade do trabalho e, ao mesmo tempo, alienado devido ao trabalho, um dia, num futuro que pode ser vislumbrado, mas não determinado, o homem vai ter um encontro consigo mesmo, com sua verdadeira natureza, e assim entrar no reino da liberdade. Com Marx, a Antropologia é tanto ciência quanto reflexão filosófica.

Citamos o exemplo de Marx como um filósofo que busca em dados antropológicos um meio mais sensitivo e empírico para sustentar suas especulações filosóficas, e como suas especulações alimentam teoricamente os estudos antropológicos. Mas não é o único. Com efeito, desde meados do século XIX, na medida em que se iam disseminando os estudos – não mais simples relatos e descrições curiosas -- sobre povos não europeus, povos primitivos, povos sem Estado, povos não capitalistas, ou até povos atrasados, conforme eram chamados na época, os filósofos passaram a contar com esses dados nas suas reflexões sobre o homem. Alguns ficaram presos à dicotomia, criada no início da formulação da Antropologia como ciência, entre o suposto homem civilizado e o suposto homem primitivo, como se fossem duas entidades distintas e separadas por um imenso fosso de inteligência e racionalidade. Outros deixaram de lado a especulação e o ponto de vista europeu e passaram a se dedicar ao estudo empírico sobre esses povos, comparando-os entre si e com a sociedade e cultura capitalista, hodierna, contribuindo, assim, com a formulação de novos conceitos sobre cultura e sociedade e seu funcionamento. Entre os filósofos que passaram a ser antropólogos destaca-se o francês Émile Durkheim (1858-1917), que trouxe imensos aportes para a Antropologia como ciência humana e veio a ser o líder de uma escola conhecida como funcionalismo estrutural, como veremos mais adiante.

De grande importância também, já no início do século XX, foram as proposições do fundador da psicanálise, Sigmund Freud, especialmente em seu livro Totem e Tabu, que trata das origens do tabu do incesto na sociedade humana, baseadas em inferências sacadas duplamente de interpretações de mitos gregos e do inconsciente do homem moderno. Muitos antropólogos, à época, recusaram a teoria do incesto de Freud, considerando-a fora do âmbito estritamente empírico da ciência, por mais que ele insistisse que seu posicionamento era de um cientista. Todavia, suas proposições deram uma nova perspectiva sobre o assunto, que era motivo de grandes indagações e das mais fantásticas hipóteses, um fato social praticamente universal nas sociedades humanas. Freud desenvolveu sua visão ou filosofia da cultura em diversos textos, especialmente em A Civilização e seus Descontentamentos, nos quais apela para a tomada de consciência como forma de o homem encarar os aspectos dominadores e anti-libertários presentes na cultura.

Mais tarde, Claude Lévi-Strauss (1908-) saberia como usar a especulação de Freud sobre o tabu do incesto para, juntando à análise científico-filosófica de Marcel Mauss (1872-1950) sobre a importância da reciprocidade na convivência humana, compor sua visão da constituição do homem como ser da cultura. A aplicação das descobertas da Lingüística estrutural deu-lhe o paradigma para especular, projetar hipóteses, testá-las e elaborar a teoria de que a cultura funciona como uma língua, meio inconscientemente, determinada por uma estrutura subjacente, e que a função do antropólogo é descobrir o modelo básico que está por trás e que determina a cultura e qualquer aspecto nela contido.

A Antropologia como filosofia da cultura se desenvolve tanto nos aspectos da epistemologia, isto é, das possibilidades lógicas do conhecimento, quanto da interpretação hermenêutica e também no campo das indagações teológicas. Filósofos e teólogos como Ernest Cassirer (1874-1945), Paul Tillich (1886-1965), Mircea Eliade (1907-1995?) e Teilhard de Chardin (1881-1955) são usufrutuários e contribuintes das possibilidades que a Antropologia suscita como lógica e filosofia da cultura. Entre os antropólogos propriamente ditos são poucos os que filosofaram sobre a cultura antes da década de 1980, certamente para não serem chamados de especuladores por seus pares. Podemos citar dois que desenvolveram aspectos filosóficos em seus trabalhos ainda na primeira metade do século XX, quais sejam Paul Radin (1883-1959), que escreveu sobre o indivíduo e suas propensões filosóficas e religiosas nas culturas indígenas e Gregory Bateson (1904-1980) cujo livro inicial Naven desponta como pioneiro do reconhecimento do autoconhecimento dos povos primitivos sobre sua cultura, e por isso é ainda hoje lido e admirado.

Por fim, deixaremos para o final do livro a análise de como alguns princípios derivados da Lingüística estão servindo, por meio da aplicação de proposições filosóficas, para a fundamentação de uma crítica à Antropologia como ciência. Tal crítica, que vem sendo difundida nos últimos 30 e tantos anos, advém da hermenêutica e da influência das idéias dos filósofos Nietzsche e Heidegger. O movimento intelectual que abriga tal crítica, hoje com muita influência na Antropologia praticada nos Estados Unidos e Europa, e outros pensamentos semelhantes, é conhecido como pós-modernismo.

Em contraposição apresentaremos nossa visão do que poderá ser o futuro da Antropologia como forma científica e filosófica do pensar sobre o homem. Tentaremos mostrar que essa nova visão não pode prescindir das contribuições feitas por outras correntes antropológicas na medida em que elas definiram aspectos lógicos do ser humano e abriram o espaço para novas pesquisas científicas e novas especulações filosóficas. É com o espírito de reconhecimento aos antropólogos e filósofos que definiram o nosso campo de atuação que este livro pretende concluir sua trajetória de explanações e proposições.

sábado, 26 de janeiro de 2008

Resultado da Enquete: "Que acha do arrendamento oficial de terras para a exploraçao da madeira na Amazônia?

A Enquete sobre o arrendamento oficial de terras na Amazônia teve uma ótima participação. 24 pessoas apresentaram suas opiniões, que se distribuíram da seguinte forma:

1. Vai intensificar a destruição da Amazônia................................................. 7 votos

2. Vai racionalizar a exploração da madeira.................................................. 4 votos

3. Vai criar novos barões da terra................................................................. 5 votos

4. Vai aumentar a corrupção nos órgãos oficiais........................................... 4 votos

5. Vai terminar afetando as terras indígenas................................................. 4 votos


A grande maioria está pessimista quanto ás perspectivas do arrendamento de grandes extensões de terra na Amazônia. Sete participantes acham que vai intensificar a destruição da Amazônia. Outros que vai aumentar o número de barões da terra, a corrupção e que poderá afetar as terras indígenas.

Porém 4 participantes acharam que o arrendamento oficial vai racionalizar a exploração da madeira. Esta é posição oficial do Ministério do Meio Ambiente e dos ambientalistas que foram a favor dessa lei.

Participem agora da Enquete seguinte: "Por que aumentou tanto a derrubada de matas na Amazônia?"

sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

Funai demite 16 funcionários de Cacoal e nomeia Nicoça Pio administrador

O jornal eletrônico Rondônia Agora traz outro furo. Até preocupante.

É que a negociação que o presidente da Funai fez com os Cintas-Largas foi demitir todos os 16 funcionários da administração de Cacoal e nomear o índio Nicoça Pio para chefe da administração. Bem, chefe interino, a ser confirmado.

Nicoça Pio é um Cinta-Larga muito inteligente e dos mais capazes de negociação e de responsabilidade. Ele tenta equilibrar as vontades mais veementes do cacique João Bravo com as ousadias e os discursos radicais dos mais jovens e mais influenciados pelos garimpeiros. O detalhe é que ele é casado com a irmã de Marcos Apurinã, que é o vice-coordenador da Coiab.

A demissão de 16 funcionários da Funai de uma vez só não é brincadeira. Pode dar certo, pode dar muito errado. Vamos ver.

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ÍNDIO ASSUME ADMINISTRAÇÃO DA FUNAI EM CACOAL

O cacique Nacoça Pio Cinta Larga assumiu a interinidade da administração da FUNAI em Cacoal em um acordo com a direção nacional do órgão. Pio assume a função ao lado do coordenador João Batista, garantindo a representatividade indígena na regional responsável pela Reserva Roosevelt. Outra reivindicação dos índios foi atendida: a exoneração de outros 16 servidores da FUNAI em Cacoal.

quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

Fulniô de novo na parada!

Os índios Fulniô estão de novo na parada dos protestos. Desta vez é contra a Chesf e a Funai por não terem recebido até agora o dinheiro da indenização pela presença há muitos anos de uma estação de redistribuição de energia em suas terras.

O acordo tinha sido feito em 2005-2006, o dinheiro foi repassado pela Chesf para uma associação Fulniô. Agora há um probleminha. Será que a associação ficou com o dinheiro e não o repassou?

Os índios estão sendo liderados por Marquinhos Fulniô, filho do chefe João Pontes. É fumaça, que é sinal de fogo!

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Fulni-ô fazem protesto em área de linhas de transmissão da Chesf
Índios da tribo fulni-ô, de Águas Belas, no Sertão pernambucano, estão acampados em cabanas de palha, nesta quinta-feira (24), em terrenos por onde passam linhas de transmissão da Companhia Hidro-elétrica do São Francisco (Chesf) que distribuem energia para vários estados do Nordeste.

O protesto é contra a Chesf e a Fundação Nacional do Índio (Funai), que teriam firmado um acordo em 2006, para indenizar a tribo em R$ 3 milhões. De acordo com os índios, o dinheiro teria sido repassado pela Chesf, ano passado, para uma associação apoiada pela Funai.

Marcos Fulni-ô, filho do cacique João Pontes, diz que o protesto será mantido até que o Ministério da Justiça se pronucie sobre o caso e investigue onde está o dinheiro. Ainda segundo o índio, se nada for resolvido, eles prometem atear fogo às linhas de transmissão.

Qual o mistério da viagem do presidente da Funai à Terra Indígena Roosevelt?

O jornal eletrônico Rondônia Agora postou ontem a notícia abaixo que trata de uma viagem do presidente da Funai à Terra Indígena Roosevelt, dos índios Cintas-Largas.

A postagem traz, inclusive, fotos do helicóptero em que fizeram a viagem, e de Jecinaldo Barbosa, o coordendador-geral da Coiab. Que será que estava fazendo o Jecinaldo, que tanto critica a política indigenista do governo? Parece que é a ligação da gestão atual com a Coiab. Só faltava o CIMI. Isso comprova também a suspeita de que o tal sequestro foi arranjado com o pessoal da Coiab.

A matéria diz que o diretor geral da Polícia Federal também estava na reunião, mas não aparece foto dele, e sim de um segurança da Funai e de um engenheiro agrônomo da ex-administração de Porto Velho.

Não sei qual o mistério que o jornal Rondônia Agora quer salientar. Na verdade, o Ministro da Justiça havia prometido à comissão de Cintas-Largas que estiveram em Brasília de enviar o presidente da Funai para tratar de assuntos pendentes de desenvolvimento econômico, após o fajuto sequestro que fizeram do procurador-geral de Rondônia e do enviado da ONU. Procurador que, aliás, segundo a matéria, também foi para a reunião na aldeia Cinta-Larga, mas de carro, não de helicóptero.

A matéria completa está abaixo. As fotos podem ser acessadas no endereço: http://www.rondoniagora.com/web/ra/noticias.asp?data=23/1/2008&cod=16294

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ENCONTRO MISTERIOSO NA RESERVA ROOSEVELT REUNE PRESIDENTE DA FUNAI,

PROCURADOR, QUE FOI SEQUESTRADO, E MEMBROS DA CÚPULA DA PF EM BRASÍLIA

Jornal Rondônia Agora

Envolto em um grande mistério, acontece nesta quarta e quinta-feira um encontro reservado na Reserva Roosevelt, palco da disputa por diamantes entre índios e não-índios e local do massacre de 29 garimpeiros em abril de 2004.

No encontro dentro da maior tribo dos Cinta-Larga estão o presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Márcio Meira, o chefe da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB), Jecinaldo Barbosa Cabral, o diretor-geral da Polícia Federal, Luis Fernando Correia, o coordenador da Operação Roosevelt, Mauro Spósito, e o procurador da República em Rondônia, Reginaldo Pereira da Trindade.

A reunião foi mantida em sigilo até a manhã de hoje, quando jornalistas da ALL TV Amazônia descobriram a reunião com representantes da Funai e cúpula da PF. No Portal da Funai na internet não há qualquer informação, muito menos na Superintendência da Polícia Federal. Nem mesmo os membros das barreiras, que cercam a reserva Roosevelt, tinham conhecimento da entrada dessas autoridades.

O presidente da Funai, Márcio Meira, a Polícia Federal e os caciques da tribo Cinta-Larga autorizaram a entrada de dois jornalistas para acompanhar a reunião. Segundo Meira, seriam discutidos temas como a saúde indígena, desenvolvimento sustentável com a extração de diamantes e mostrar o decreto de exoneração de 16 servidores da Funai que não estavam trabalhando à contento dos indígenas.

Um helicóptero da HELISUL, empresa contratada pelo Ibama, fez duas viagens levando, além das autoridades, dois engenheiros agrônomos e um diretor da Funai de Brasília. O presidente do órgão chegou por volta das 11h55min no aeroporto de Cacoal, proveniente de Cuiabá (MT). Márcio foi na frente e pediu autorização dos índios para os jornalistas entrarem na reserva, o que foi concedida.

Quando retornou da segunda viagem, o piloto da aeronave, comandante Sérgio, disse que havia lembrado de uma Instrução Normativo do IBAMA, proibindo o vôo com jornalistas à bordo. O curioso é que na segunda viagem, o mesmo comandante havia pedido para que a equipe se preparasse para seguir à reserva. “Me lembrei só agora que são proibidos vôos em aeronaves do IBAMA com jornalistas”, afirmou o comandante, que disse ainda ter ligado para seus superiores em Brasília no NOA (Núcleo de Operações Aéreas), quando na verdade já havia mesmo recebido ordens para não decolar com a imprensa. Assim que pousou, o helicóptero foi imediatamente coberto. Um caminhão de combustível aguardava, devidamente autorizado pelo presidente da Funai, para abastecer a aeronave para uma terceira viagem.

O mistério aumentou porque o procurador da República, Reginaldo Pereira da Trindade, também era esperado para a reunião. Ele não quis ir de helicóptero. Preferiu ir de carro de madrugada, segundo seu assessor, na frente de todos os outros integrantes da reunião para a reserva Roosevelt. Era, portanto, o único membro da equipe que participaria da reunião e não sabia sobre a autorização para ida da imprensa. O procurador só ficou sabendo que uma equipe de jornalistas acompanharia o trabalho da Funai com a chegada dos primeiros passageiros do helicóptero. Entre a segunda e a suposta terceira viagem, cancelada, surgiu na vaga memória do comandante uma Instrução Normativa, que segundo o próprio superintendente do Ibama em Rondônia, Osvaldo Pitaluga, é totalmente desconhecida.

Reginaldo Pereira da Trindade é o mesmo que foi mantido refém pelos Cinta-Larga no dia 7 de dezembro de 2007. Ele, a esposa, Margarete Geiareta da Trindade, o oficial do alto comissariado da ONU, David Martin Castro, um funcionário da Prefeitura de Espigão do Oeste e um funcionário da Funai ficaram 5 dias em poder dos Cinta-Larga. Não se sabe até hoje o que o procurador e seu amigo da ONU faziam na reserva. A própria ONU informou que David Martin não estava em missão oficial e, portanto, desautorizado a falar em nome da organização.

Resultado da Enquete: "Que acha da idéia de Mangabeira de fazer um Aqueduto do Amazonas ao Nordeste?"

A Enquete: "Que acha da idéia de Mangabeira de fazer um Aqueduto do Amazonas ao Nordeste?" teve a participação de 13 eleitores que votaram da seguinte forma:

Grande idéia! ..................................................... 3 votos

Idéia de jerico..................................................... 3 votos

Deixa para o próximo governo............................ 1 voto

Melhor dessalinizar a água.................................. 3 votos

Ótimo, assim deixa o São Francisco em paz!....... 1 voto

O Ceará pede a bença a Padim Mangabeira......... 2 votos

quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

Índios Guarani querem ser vereadores em Dourados

A participação de índios na política brasileira vem desde os tempos da gloriosa campanha do Xavante Mário Juruna, quando se candidatou e se elegeu deputado federal pelo PDT de Leonel Brizola, no Rio de Janeiro, em 1982, com 31.000 votos. Sua eleição foi saudada como o início da participação dos índios no Congresso Nacional. Porém, em 1986, tentando a reeleição, não recebeu nem um terço dos votos originais. Os eleitores cariocas haviam se cansado de algumas atitudes que o deputado havia tomado.

De lá para cá, muitos índios tentaram eleições para deputado federal ou estadual, como Samuel Karajá, Marcos Terena, Pedro Garcia, Jeremias Xavante e outros. No Amazonas quase que Pedro Garcia se elegia deputado federal pelo PT. Em Roraima, o filho do cacique Jacy Makuxi chegou perto. Marcos Terena tentou por diversas vezes. Na última, em 2002, para deputado estadual pelo seu estado Mato Grosso do Sul, teve menos de 250 votos. Sua popularidade não está com seu povo, que tem mais de 12.000 eleitores naquele estado.

No panorama municipal os índios têm tido um pouco mais de sucesso. Há pelo menos cinco indígenas prefeitos espalhados pelo Brasil e um pouco menos de uma centena de vereadores. Quando um índio se elege vereador, ele é assediado por todo tipo de gente, desde mocinhas até grileiros de terras. Na cidade de Gaúcha do Norte, há um índio Mehinaku vereador, e ele termina se enfronhando com o pessoal da cidade e os convidando para conhecer suas aldeias, etc.

Este ano, nas eleições municipais, haverá muitas candidaturas. A notícia abaixo trata das candidaturas de vereadores Guarani para as cidades de Dourados e Itaporã, que fazem limites com a Terra Indígena Dourados, com mais de 12.000 índios, portanto, pelo menos uns 6.000 eleitores. Certamente que, se todos votassem em um ou dois candidatos índios, eles seriam eleitos.

Os candidatos já estão com seus discursos prontos. E não são discursos muito diferentes dos discursos dos "brancos". Promessas e promessas, claro, e muita bravura. Certamente que a reivindicação de ampliação de terras é uma boa pedida, mas não para os eleitores não indígenas. Um dos candidatos já tem seu discurso moderado.

Os índios estão sendo envolvidos pelas políticas municipais, pelos interesses coletivos, e mais, pelos interesses pessoais dos que têm poder. Esse envolvimento certamente é uma armadilha, onde haverá cada vez mais contatos e relacionamento próximo entre índios e não índios, e onde os índios, sempre minoritários e em posição dominada, serão aqueles a mudar de comportamento para se adaptar ao mundo envolvente.

Não haverá escapatória. É o processo de inclusão social, de integração política e de aculturação rápida. Alguns índios se darão bem, a maioria vai ficar mais à mercê do mundo envolvente.

Por outro lado, a inclusão social e a integração política levarão os índios a buscar oportunidades urbanas. No caso dos Guarani da Terra Indígena Dourados, o objetivo dos candidatos é esse mesmo. Obter oportunidades de emprego urbano para que aquela terra seja transformada numa espécie de bairro da cidade de Dourados. Urbanizar aquela área é o caminho da inclusão social. O processo vai ser longo e controvertido, e seu sucesso dependerá da visão de futuro que os índios venham a ter.

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Índios vão disputar vaga no legislativo de Dourados

Dourados Agora, colaborou Valéria Araújo
Indígenas de Dourados já se mobilizam para conquistar uma vaga na Câmara de Vereadores de Dourados. O corre-corre de candidatos em busca de apoio começou desde o meio do ano passado, quando dezenas de indígenas se filiaram a partidos políticos. Na estratégia para eleger o maior número de indígenas possível, os candidatos se filiam em partidos diferentes.

De acordo com o indígena da etnia caiuá Sergio Veron (DEM), os índios de Dourados e Itaporã já estão unidos para eleger dois representantes. "A idéia é ter pelo menos um vereador na área indígena que corresponde ao município de Dourados, assim como em Itaporã. Desta forma toda a reserva, que conta hoje com 14 mil indígenas, sendo 3,9 mil deles de Itaporã, vai contar com os benefícios resultado da luta dos novos parlamentares", afirma.

O objetivo, segundo correligionários e líderes do DEM é viabilizar recursos que garantam melhorias para a comunidade, que conta hoje com 14 mil habitantes, disputando espaço em 3.475 hectares de terra. "Somente o índio sabe o que de fato é melhor para ele. O branco nunca vai entender nossa cultura e por esta razão, nós mesmos temos que nos unir para garantir melhorias para o nosso povo", disse.

Segundo Veron, a reserva de Dourados "explodiu" ao invés de crescer. "Sem nenhum planejamento as aldeias parecem mais área urbana. Os indígenas estão sufocados, sem espaço para plantar, sem espaço para viver da terra. [...] Outra proposta é evitar fechamento de estradas. Com rodovias fechadas a economia da cidade é prejudicada e não queremos mais ser responsáveis por isto. Os comerciantes não devem pagar por um impasse que envolve governo e indígenas", reforça.

O cacique Renato de Souza, da aldeia Jaguapirú, se filiou ao PT do B. Em entrevista recente ao Dourados Agora ele disse que a chance de disputar uma vaga no legislativo trouxe esperança para a comunidade indígena. "Nunca pensei em me envolver na política, mas sinto que posso ajudar as famílias da reserva. O índio faz parte da sociedade e precisa ser ouvido. [...] Muitas coisas precisam ser mudadas com urgência como a violência na reserva, causada por alcoolismo, drogas e prostituição", afirma.

terça-feira, 22 de janeiro de 2008

"Apoena, aquele que enxerga longe". Resenha do livro de Lilian Newlands

Neste fim de semana li o livro "Apoena, aquele que enxerga longe", da jornalista Lilian Newlands e com a colaboração de Aguinaldo Ramos. A edição é da PUC-Goiás.

É um livro de depoimentos de diversos amigos de Apoena, mas especialmente de Denise Maldi Meirelles, sua primeira esposa, uma antropólogo de distinção. O livro contém trechos do diário de campo de Apoena, ainda na década de 1970, e de algumas reflexões suas sobre o indigenismo e seus dilemas, na década de 1990. A entrevista com Sílvio Meirelles, em 1992, é o trecho mais recente. Assim, não temos nada sobre seu último período na Funai, o que é uma grande pena.

Apoena, como se sabe, era filho de Chico Meirelles, um dos grandes sertanistas brasileiros. Por ele nutria imensa admiração, respeito e amor. Chico Meirelles o levava em suas expedições desde os 8 anos. Foi com essa idade que Apoena caminhou com seu pai e uma equipe de sertanistas e índios pelas matas do médio Xingu para fazer o primeiro contato com os Mekragnoti, um subgrupo Kayapó. Foi com Chico que Apoena se aproximou dos Cintas-Largas, e lá foi buscar os corpos de Possidônio Cavalcanti e Acrísio, mortos pelos Cintas-Largas por causa de um terrível mal-entendido entre eles, em 1973.

Apoena é portador de uma ficha de indigenista invejável. Nascido em aldeia Xavante, aos oito anos estava no contato com os Kayapó. Aos 15 estava na frente de atração dos Parakanã, na região onde hoje está a Usina de Tucuruí. Aos 18 anos estava com os Cintas-Largas, junto com seu pai. Aos 22 fazia o contato inicial com os Suruí, praticamente só, no meio da mata. Aos 24 foi para a frente de atração Waimiri-Atroari, depois da morte de Gilberto Pinto e companheiros. Aos 25 contatou os Avá-Canoeiro; e em seguida consolidou o contato com os Krenhacarore, atualmente conhecidos como Panará. Aos 28 anos contatava os Zoró, que eram inimigos dos Suruí, e fez as pazes entre eles. Aos 30 anos contatou os primeiros grupos Urueuauau.

A reflexão que Apoena faz sobre os contatos é muito importante para o indigenismo brasileiro. Mesmo porque é quase inédita. Nenhum indigenista, a não ser Orlando Villas-Boas, de diversos modos, publicou suas memórias sobre a necessidade e a tragédia dos primeiros contatos com povos indígenas. Assim, as reflexões de Apoena certamente vão balizar as reflexões que muitos indigenistas estão preparando como memória de seus trabalhos. Apoena sabe que os primeiros contatos são uma tragédia e sabe que não havia outra coisa a fazer. Sobre o contato com os Avá-Canoeiro, Apoena tem a coragem e a grandeza de conceder que talvez tenha usado um método que não teria feito se tivesse refletido mais. Durante algumas semanas andou procurando os Avá, que diziam não existir, até encontrar os rastros claros de passagem de índios. Um dia decidiu fazer o contato de sopetão, entrando no acampamento dos Avá-Canoeiro fazendo muita gritaria. Foi recebido com uma saraivada de flechas, uma delas tendo atingido o nariz de um companheiro Xavante. Depois soltaram rojões de fogos de artifício e com isso os Avá paralizaram. Apoena tentou delimitar um território para os Avá, mas os militares da Funai não apoiaram, e aí os Avá foram morar na Ilha de Bananal, no posto Canuanã, dos índios Javaé, onde estão os sobreviventes e seus herdeiros.

Sobre o contato com os Krenhacarore, há o depoimento escrito de Denise Maldi, que também estava com Apoena, junto com Inah, irmã de Apoena, e seu marido, Xará. É um depoimento bem escrito e emocionante. Aliás, a Denise escrevia com um estilo próprio muito interessante. Fala da longa caminhada que deram até a aldeia dos Krenhacarore, de serem acolhidos numa das casas e passarem a noite em claro ouvindo os guerreiros cantando cânticos de guerra, batendo borduna. Apoena ficara impassível, mas, tendo notado a presença de mulheres e crianças, estava tranquilo.

Entre os Waimiri-Atroari, Apoena foi para lá também com Denise, no começo de 1975, e se hospedou na mesma casa onde Gilberto Pinto fora morto, ainda com manchas do sangueiro que ficou.

Apoena teve muitas brigas com os militares da Funai. Logo após a crianção do Parque Aripuanã, que deveria se moldar no exemplo do Parque do Xingu, foi exonerado e transferido. Em diversas ocasiões no livro expõe as falhas da Funai, a burocracia e, sobretudo, as artimanhas anti-indígenas que existiam naqueles tempos. Com alguns militares ele mantinha bom relacionamento, como com o general Ismarth de Araújo, que foi superintendente e depois presidente do órgão no governo Geisel.

O livro esclarece a relação entre os Meirelles e os Villas-Boas. Havia uma disputa surda entre os dois desde a década de 1950, a qual a mídia e os indigenistas faziam eco maior do que o real. Apoena foi convidado pelos Villas-Boas para dirigir o Parque do Xingu, quando estes já não se sentiam com forças para estar lá, e estavam desgostosos com os rumos que dera o chefe substituto, o antropólogo Olimpio Serra. O convite foi feito no histórico encontro contra o projeto de emancipação dos povos indígenas, no Teatro TUCA, da PUC de São Paulo, em 1978. Apoena passou oito meses no Parque, mas não deu certo. Muitos índios do Parque ficaram contra sua presença, em parte pela influência de Olímpio.

Em nenhum momento dos depoimentos transparece qualquer mágoa, qualquer rancor de Apoena para com adversários ou ex-amigo. Aliás, em certo momento Apoena declara que não tem inimigos. Mesmo durante o breve período em que foi presidente da Funai, quando diversos indigenistas foram contra ele e conspiraram para que os índios não o quisessem, como o próprio Raoni e muitos Xavante, Apoena não demostra mágoa dos seus colegas. Apenas relata que os indigenistas haviam se dividido, que as contradições do período não permitiam enxergar as coisas melhor.

Apoena tinha consciência de sua dignidade e de seu nome na história do indigenismo brasileiro. Por isso não se atazanava com os tempos bicudos. O fato de Raoni dizer que não sairia de Brasília enquanto Apoena não fosse demitido, quando era presidente da Funai, não o abalou. Anos depois retomaria seu relacionamento com Raoni. (Aqui penso em mim mesmo, quando Raoni e Megaron também sairam com ódio mortal, insuflados também por alguns indigenistas despeitados, para me derrubar da Funai, entre abril e agosto de 2006. Em janeiro de 2007 estávamos abraçados em Colider, nas reuniões que promovi com os índios Kayapó da região.)

O principal legado de Apoena é a criação do Parque do Aripuanã (mérito maior para seu pai) e a demarcação de quase todas as terras indígenas do estado de Rondônia. Apoena foi um administrador sério e diligente. Vivia frugalmente em Porto Velho, mas sabia se divertir com os amigos. Sofreu muito pela morte de seus amigos, e especialmente de Zé Bell, que suicidou com um tiro de um revólver-caneta, no peito, quando era o direitor do Parque Aripuanã. Morte incompreensível, que só por um processo de filosofia asceta seria aceitável.

Interessante saber que, quando jovem, Apoena participou da famosa Passeata dos Cem Mil, na Cinelândia, no Rio de Janeiro, em junho de 1968, e que foi preso duas vezes naqueles tempos. Seu indigenismo foi sua saída de um possível engajamento mais forte no movimento anti-ditadura militar.

Apoena morreu de uma maneira trágica e besta, pelas mãos de um reles assaltante num caixa de banco em Porto Velho, em outubro de 2004. Sentimos muito sua falta.

sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

Mangabeira e suas idéias -- até para os índios!!

O Professor Mangabeira Unger, ministro de Assuntos Estratégicos, recebeu algumas incumbências do Presidente Lula. Uma delas foi de tratar de um projeto para a Amazônia.

Assim, com o denodo que o caracteriza, partiu para criar esse projeto. Contatou a eminente geógrafa Profa. Berta Becker, contatou economistas de São Paulo e de Belém, fez contatos com os principais políticos da Amazõnia, a partir de seus governadores, abriu-se para o diálogo com a ministra Marina Silva (sendo a recíproca não verdadeira), enfim, leu alguns livros essenciais sobre a Amazônia e daí sacou suas idéias iniciais, as quais lança com ousadia para provocar debates no meio acadêmico, na mídia e entre os peritos do assunto.

Parece que está dando certo seu périplo pela Amazõnia. Leva consigo quase todo seu staff, seus conselheiros e assessores. Chamou alguns ministros para acompanhá-lo, mas eles se desculparam. Só o ministro da Cultura, Gilberto Gil, que o admira pelas idéias e pela ousadia. Nada o atemoriza. Abre o debate com os empresários, dos mais simples aos barras-pesadas, como os donos da Vale e da Alcoa. Joga duro no debate, não teme a controvérsia. Quer polêmica, porque acha que é a partir dela que nascem possibilidades de realização. Alguns dos seus assessores lhe pedem parcimônia nas falas, ele responde que não veio a ser ministro para desviar-se dos assuntos controvertidos. Veio para encarar a realidade.

Enfim, vai dar certo ou não vai dar certo o Professor Mangabeira tratando de colocar a Amazônia na agenda de salvação do Brasil e de si mesmo?

E o mais surpreendente é que ele tem idéias sobre índios! Acha que o Brasil é um misto de generoso e de cruel para com os povos indígenas. Reconhece seus direitos, demarca suas terras, mas proíbe-os ou não lhes dá condições de usar essas terras para o desenvolvimento de suas economias e sociedades.

Acha que é pela ciência, pelo conhecimento avançado que os índios podem se desenvolver, formular uma cultura que medeie sua relação com o mundo envolvente.

Mangabeira não teme dizer que o Brasil está no processo de integrar suas populações indígenas. Considera que a Constituição de 1988, ao conceder uma maioridade aos índios, os traz à responsabilidade sobre suas vidas, e essa responsabilidade tem que ser baseada no conhecimento da sociedade brasileira. Só os néscios acham que os índios não estão se integrando, com todo o processo educacional (especialmente de baixa qualidade) que aplicam sobre suas populações, com o sistema de saúde que se lhes administra, com os programas de assistência alimentar, inclusão social, etc.

É preciso que o indigenismo rondoniano possa ser ouvido por Mangabeira, antes que as Ongs neoliberais o ataquem de todos os modos e ele desista de incluir no seu Projeto Amazônia os povos indígenas.

O CIMI e as Ongs neoliberais já manifestaram críticas à peregrinação de Mangabeira. Mas aguardam um contato para explicar suas posições.

Vamos ver como se desenrolam essas relações nos próximos meses! De minha parte, estou aberto ao diálogo, mas também á polêmica. Não podemos é ficar parados enquanto o bonde passa e a situação da Funai está absolutamente inerme.

quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

Índios Guarani querem retirada de igrejas de suas terras

Bem, finalmente os índios Guarani resolveram barrar a presença permanente de igrejas em suas terras. A iniciativa partiu dos índios das terras indígenas Panambizinho, com 1300 hectares, homologada em 2005, e Panambi, com 600 hectares, que está em processo de expansão.

É uma grande novidade e uma grande ousadia, já que as religiões católica, evangélica e candomblé que convertem alguns índios não têm pruridos em construir igrejas nas terras dos Guarani.

Há anos vêm fazendo isso e achando que salvarão suas almas.

Vamos ver se na Terra Indígena Dourados, onde há influência de muitas denominações religiosas, os líderes indígenas resolvem também retirar as igrejas de suas terras.

Parabéns à Funai e sua administradora em Dourados pela coragem de apoiar os índios nessa tomada de decisão. O Ministério Público também tem que estar unido nessa tentativa.

As resistências vão ser ferozes. As Igrejas não querem perder espaço e poder, além de que, são motivadas por rivalidades históricas.

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Índios protestam contra instalação de igreja em aldeia

Eles temem a perda da identidade cultural.

Funai decidiu "defender a forma tradicional" de organização dos indígenas.

Índios de Mato Grosso do Sul pedem à Fundação Nacional do Índio (Funai) a retirada das igrejas de dentro das áreas de reserva.

Parte dos índios das aldeias de Panambi e Panambizinho não quer a instalação de uma igreja na área da reserva. Eles temem a perda da identidade cultural com o estímulo a uma tradição que não faz parte dos costumes da aldeia.

Para um cacique, se uma igreja for instalada, vai ser difícil evitar que representantes de outras religiões também queiram garantir espaço na aldeia.

O assunto gerou polêmica porque um grupo de indígenas costuma freqüentar os cultos religiosos. “Nós estamos aqui e nunca saiu briga, nada, só alegria e paz no coração”, afirma o representante da igreja, Donizete Capilé.

Margarida Nicoletti, administradora regional da Funai, foi chamada para acabar com o impasse. Depois de ouvir os índios, ela tomou uma decisão. “A Funai vai trabalhar para tirar da aldeia essas religiões. Eles não estão concordando com isso. Portanto, nós vamos defender a forma tradicional de se organizarem”, diz.

A decisão da Funai não deve ficar restrita à aldeia de Panambi. As igrejas situadas na reserva indígena de Dourados (MS) também serão notificadas. Para isso, a fundação vai contar com a ajuda da Polícia Federal e do Ministério Público Federal.

A decisão da Funai foi baseada em uma norma que orienta a preservação da cultura indígena.
 
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