Vale a pena ler o Regulamento que constituiu o SPI pela simplicidade e pelos objetivos traçados. E principalmente pelas evidentes dificuldades em conseguir cumprir o dever de proteger os índios, que é o principal objetivo do SPI. O segundo seria dar-lhes condições de se equiparar aos demais brasileiros, pelo trabalho e pelo conhecimento. Em nenhum momento se declara ou ao menos está implícito que o objetivo do SPI era controlar os índios, cercear sua vida ou mudar suas culturas para todos ficarem iguais aos brasileiros. Este foi o grande libelo feita por alguns antropólogos do Museu Nacional, nos últimos 20 anos, contra o SPI e contra Rondon, e que a maioria dessa geração de novos antropólogos engoliu a seco. Ainda é tempo de pôr a mão na consciência e mudar suas visões do mundo.
______________
Decreto nº 8.072, de 20 de Junho de 1910
Crêa o Serviço de Protecção aos Indios e Localização de Trabalhadores Nacionaes e approva o respectivo regulamento.
O Presidente da Republica dos Estados
Unidos do Brazil:
Resolve, de accôrdo com a lei n. 1.606, de 29 de dezembro
de 1906, crear o Serviço de Protecção aos Indios e Localização de Trabalhadores
Nacionaes, sujeito ao regulamento, que com este baixa assignado pelo ministro de
Estado dos Negocios da Agricultura, Industria e Commercio.
Rio de Janeiro,
20 de junho de 1910, 89º da Independencia e 22º da Republica.
NILO
PEÇANHA.Rodolpho
Nogueira da Rocha Miranda.
Regulamento a que se refere o decreto n. 8.072, de 20 de junho de 1910
Do serviço de Protecção aos Indios e Localização de
Trabalhadores Nacionaes
Art. 1º O Serviço de Protecção aos Indios e Localização
dos Trabalhadores Nacionaes, creado no Ministerio da Agricultura, Industria e
Commercio, tem por fim:
a) prestar assistencia aos indios do Brazil, quer vivam
aldeiados, reunidos em tribus, em estado nomade ou promiscuamente com
civilizados;
b) estabelecer em zonas ferteis, dotadas de condições de
saiubridade, de mananciaes ou cursos de agua e meios faceis e regulares de
communicação, centros agricolas, constituidos por trabalhadores nacionaes que
satisfaçam as exigencias do presente regulamento.
TITULO I
CAPITULO I
DA PROTECÇÃO AOS
INDIOS
Art. 2º A assistencia de que trata o art. 1º terá por
objecto:
1º, velar pelos direitos que as leis vigentes conferem aos
indios e por outros que lhes sejam outorgados;
2º, garantir a efectividade da posse dos territorios
occupados por indios e, conjunctamente, do que nelles se contiver, entrando em
accôrdo com os governos locaes, sempre que fôr necessario;
3º, pôr em pratica os meios mais efficazes para evitar que
os civilizados invadam terras dos indios e reciprocamente;
4º, fazer respeitar a organização interna das diversas
tribus, sua independencia, seus habitos e instituições, não intervindo para
alteral-os, sinão com brandura e consultando sempre a vontade dos respectivos
chefes;
5º, promover a punição dos crimes que se commetterem contra
os indios;
6º, fiscalizar o modo como são tratados nos aldeiamentos,
nas colonias e nos estabelecimentos particulares;
7º, exercer vigilancia para que não sejam coagidos a
prestar serviços a particulares e velar pelos contractos que forem feitos com
elles para qualquer genero de trabalho;
8º, procurar manter relações com as tribus, por intermedio
dos inspectores de serviço de protecção aos indios, velando pela segurança
delles, por sua tranquillidade, impedindo, quanto possivel, as guerras que entre
si manteem e restabelecendo a paz;
9º, concorrer para que os inspectores se constituam
procuradores dos indios, requerendo ou designando procuradores para
represental-os perante as justiças do paiz e as autoridades locaes;
10, ministrar-lhes os elementos ou noções que lhes sejam
applicaveis, em relação as suas occupações ordinarias;
11, envidar esforços por melhorar suas condições materiaes
de vida, despertando-Ihes a attenção para os meios de modificar a construcção de
suas habitações e ensinando-lhes livremente as artes, officios e os generos de
producção agricola e industrial para os quaes revelarem aptidões;
12, promover, sempre que for possivel, e pelos meios
permittidos em direito, a restituição dos terrenos, que lhes tenham sido
usurpados;
13, promover a mudança de certas tribus, quando for
conveniente o de conformidade com os respectivos chefes;
14, fornecer aos indios instrumentos de musica que lhes
sejam apropriados, ferramentas, instrumentos de lavoura, machinas para
beneficiar os productos de suas culturas, os animaes domesticos que lhes forem
uteis e quaesquer recursos que lhes forem necessarios; introduzir em territorios
indigenas a industria pecuaria, quando as condições locaes o
permittirem;
16, ministrar, sem caracter obrigatorio, instrucção
primaria e profissional aos filhos de indios, consultando sempre a vontade dos
paes;
17, proceder ao levantamento da estatistica geral dos
indios, com declaração de suas origens, idades, linguas, profissões e estudar
sua tuação actual, seus habitos e tendencias.
CAPITULO II
DAS TERRAS
OCCUPADAS POR INDIOS
Art. 3º O Governo Federal, por intermedio do Ministerio da
Agricultura, Industria e Commercio e sempre que fôr necessario, entrará em
accôrdo com os governos dos Estados ou dos municipios:
a) para que se legalizem convenientemente as posses das
terras actualmente occupadas pelos indios;
b) para que sejam confirmadas as concessões de terras,
feitas de accôrdo com a lei de 27, de setembro de 1860;
c) para que sejam cedidas aos Ministerio da Agricultura as
terras devolutas que forem julgadas necessarias ás povoações indigenas ou á
installação de centros agricolas.
Art. 4º Realizado o accôrdo, o Governo Federal mandará
proceder medição e demarcação dos terrenos, levantar a respectiva planta com
todas as indicações necessarias, assignalando as divisas com marcos ou padrões
de pedra.
Art. 5º Da planta e do memorial recpectivo, que deverá ser
o mais detalhado possivel, será dada cópia aos governos estaduaes e municipaes,
conservando-se o original no archivo da directoria.
Art. 6º Satisfeito o disposto nos artigos anteriores, o
governo providenciará para que seja garantido aos indios o usufructo dos
terrenos demarcados.
Art. 7º Os indios não poderão arrendar, alienar ou gravar
com onus reaes as terras que lhes forem entregues pelo Governo
Federal.
Art. 8º Os contractos dessa natureza que forem realizados
pelos mesmos, serão considerados nullos de pleno direito.
Art. 9º O governo providenciará para que nos territorios
federaes os indios sejam mantidos na plenitude da posse dos terrenos pelos
mesmos actualmente occupados.
CAPITULO III
DOS INDIOS
ALDEIADOS
Art. 10. Si os indios, que estiverem actualmente
aldeiados, quizerem fixar-se nas terras que occupam, o governo providenciará de
modo a lhes ser mantida a effectividade da posse adquirida.
Art. 11. As terras de que trata o artigo anterior serão
medidas e demarcadas na fórma do art. 4º.
Paragrapho unico. O governo, sempre que julgar necessario,
fará construir casas para residencia dos indios e estradas de rodagem para
ligação dos aldeiamentos aos centros de consumo.
Art. 12. Na medição e demarcação dos terrenos e na
concessão dos titulos, será observado o disposto no presente regulamento e nas
instrucções respectivas.
Art. 13. Quando os indios aldeiados, na forma do art. 10,
occuparem terrenos na visinhança de centros populosos, ser-lhes-ha concedida,
além da arca destinada á sua residencia habitual, uma superficie de terreno, em
logar conveniente, para as culturas a que se dedicarem.
CAPITULO IV
DOS INDIOS NOMADES E DOS QUE SE MANTIVEREM EM PROMISCUIDADE
COM CIVILIZADOS
Art. 14. A directoria, por intermedio dos inspectores,
procurará, por meios brandos, attrahir os indios que viverem em estado nomade e
prestará aos que se mantiverem em promiscuidade com civilizados a mesma
assistencia que lhe cabe dispensar aos mais indios.
Paragrapho unico. Para o serviço relativo aos indios
nomades poderá ser admitido pelo ministerio, sob proposta da directoria, o
pessoal extraordinario que fôr preciso.
CAPITULO V
DAS POVOAÇÕES INDIGENAS
Art. 15. Cada um dos antigos aldeiamentos, reconstituidos
de accôrdo com as prescripções do presente regulamento, passará a denominar-se
«Povoação Indigena», onde serão estabelecidas escolas para o ensino primario,
aulas de musica, officinas, machinas e utensilios agricolas, destinados a
beneficiar os productos das culturas, e campos apropriados a aprendizagem
agricola.
Paragrapho unico. Não será permittido, sob pretexto algum,
coagir os indios e seus filhos a qualquer ensino ou aprendizagem, devendo
limitar-se a acção do inspector e de seus auxiliares a procurar convencel-os,
por meios brandos, dessa necessidade.
Art. 16. Annexas aos campos de que trata o artigo
anterior, haverá secções especiaes para apicultura, sericicultura, pequenas
industrias, criação de animaes domesticos, etc.
Art. 17. São extensivos aos indios localizados em
«Povoação Indigena» os auxilios conferidos no presente regulamento as tribus
cujos terrenos forem medidos e demarcados pelo Governo Federal, além de
alimentação, nos seis primeiros mezes de estabelecimento da povoação, soccorros
medicos e outros recursos, sempre que forem necessarios.
Art. 18. O ministro da Agricultura, Industria e Commercio
estabelecerá premios para os funccionarios da directoria, nos Estados, que
adquirirem perfeito conhecimento da lingua geral dos indios e de seus
dialectos.
Art. 19. O Governo Federal poderá acceitar a transferencia
para sua jurisdicção dos aldeiamentos ou quaesquer instituições destinadas á
educação dos indios, mantidos por governos estaduaes, municipaes ou por
associações, desde que lhe sejam cedidos os terrenos em que forem estabelecidos
e as respectivas installações.
Art. 20. Taes aldeiamentos ou instituições passarão logo
ao regimem instituido no presente regulamento para os similares creados pelo
Governo Federal.
Art. 21. Os indios trabalharão livremente e terão pleno
direito ao producto integral do seu trabalho.
TITULO II
CAPITULO I
DA LOCALIZAÇÃO
DE TRABALHADORES NACIONAES
Art. 22. O Governo Federal, por intermedio do Ministerio
da Agricultura, Industria e Commercio, e de conformidade com este regulamento,
promoverá a installação de centros agricolas, onde serão localizados os
trabalhadores nacionaes que, por sua capacidade de trabalho e absoluta
moralidade, possam merecer os favores consignados para esse fim.
Art. 23. Os centros agricolas serão estabelecidos em boas
terras de cultura, apropriadas á lavoura mecanica, dotadas de perfeitas
condições de salubridade, de mananciaes ou cursos de agua potavel, servidas de
meios faceis de communicação e proximas dos mercados consumidores.
Art. 24. O Governo promoverá, desde já, a fundação de um
ou dous centros agricolas, em cada um dos Estados em que julgar conveniente,
inclusive o Districto Federal, devendo sempre ser preferidas para esse fim zonas
cortadas por estradas de ferro da União, e que reunam os requisitos exigidos
pelo artigo anterior.
Art. 25. O numero de centros agricolas poderá ser
augmentado annualmente, conforme permittirem as dotações
orçamentarias.
Art. 26. Si os terrenos preferidos para a fundação de um
centro agricola forem de propriedade do Governo do Estado ou do municipio, o
Governo Federal procurará obtel-os por doação.
Paragrapho unico. Os centros agricolas serão de preferencia
estabelecidos nos Estados ou municipios que fizerem á União doação de terrenos
nas condições estabelecidas no art. 26.
Art. 27. Occorrendo o facto de pertencerem os ditos
terrenos a particulares, será sempre preferida a acquisição por composição
amigavel e de conformidade com o valor locativo das terras, verificado pelo
preço médio das vendas realizadas no ultimo quinquennio, e só em caso extremo
empregar-se-ha o recurso da desapropriação.
CAPITULO II
DA INSTALLAÇÃO
DOS CENTROS AGRICOLAS
Art. 28. A escolha de terras para a installação de centros
agricolas deve preceder exame circumstanciado, por parte da Directoria do
Serviço de Protecção aos Indios e Localização de Trabalhadores Nacionaes, afim
de serem verificadas as condições estabelecidas na alinea B, art. 1º, do
presente regulamento.
Art. 29. Além das alludidas condições, devem os terrenos
ter a superficie precisa para o futuro desenvolvimento dos centros agricolas e
expansão de suas culturas, devendo possuir igualmente terrenos de
matta.
Art. 30. Nas instrucções do presente regulamento, serão
estabelecidas regras que devem ser adoptadas para os trabalhos preparatorios do
«Centro Agricola», relativos ao levantamento hydrographico e da linha de
perimetro, medico e demarcação das terras, sua divisão em lotes, e respectivas
discriminação, abertura de estradas, construcção de casas e todos os trabalhos
technicos indispensaveis, que ficarão a cargo da respectiva
sub-directoria.
Art. 31. O Governo Federal estabelecerá nos centros
agricolas escolas primarias com curso diurno e nocturno, officinas, campos de
experiencia e de demonstração, com aprendizado agricola, depositos de
instrumentos de lavoura e as installações necessarias para o beneficiamento dos
productos da lavoura local.
Paragrapho unico. As escolas, officinas, campos de
experiencia e demonstração e aprendizados agricolas poderão ser frequentados por
filhos de lavradores estranhos aos centros agricolas, de conformidade com as
instrucções que regularem o assumpto.
CAPITULO III
DOS
TRABALHADORES NACIONAES
Art. 32. Os centros agricolas serão constituidos com
trabalhadores nacionaes domiciliados no mesmo estado e que satisfaçam as
seguintes condições:
a) não ter sido condemnado por crime de qualquer natureza,
nem ter soffrido prisão correccional por embriaguez ou contravenções;
b) ser chefe de familia ou solteiro com mais de 21 annos de
idade e menos de 60;
c) ser trabalhador agricola;
d) ter capacidade physica e aptidão para o
trabalho.
Paragrapho unico. Os chefes de familia serão sempre
preferidos, desde que satisfaçam as condições das letras a, c e d.
Art. 33. Aos trabalhadores nacionaes que tiverem de
estabelecer-se nos centros agricolas serão concedidos os seguintes
favores:
a) transporte para si e sua familia, com direito á
bagagem;
b) fornecimento gratuito de ferramentas, plantas e sementes
para as primeiras culturas;
c) auxilio para a manutenção de sua familia, dentro dos
tres primeiros mezes de estabelecimento do «Centro Agricola»;
d) recurso medico gratuito, pelo prazo de um
anno.
Art. 34. A área destinada a cada «Centro Agricola» será
dividida em lotes de 25 a 50 hectares, nos quaes serão construidas casas
destinadas aos trabalhadores nacionaes, de conformidade com o plano e as
condições estabelecidas pela directoria do serviço.
Art. 35. Os trabalhadores nacionaes poderão adquirir os
lotes que lhes couberem, mediante pagamento immediato ou dentro do prazo de seis
annos, a contar da data da sua installação no nucleo, cabendo-lhes, conforme a
hypothese, titulo definitivo ou provisorio da propriedade.
§ 1º O prazo fixado para o pagamento do lote poderá ser
reduzido pelo adquirente, de modo a permittir-lhe mais prompta acquisição do
titulo definitivo de propriedade, cabendo-lhe, no caso, o abatimento que for
arbitrado pelo ministro da Agricultura, até o maximo de 20 %, de accôrdo com os
seus habitos de trabalho e sua conducta.
§ 2º O abatimento a que se refere o paragrapho anterior,
poderá ser elevado a 30 %, si, dentro de quatro annos, da data de sua
installação, tiver o trabalhador cultivado com successo, a juizo do governo,
toda a área do seu lote, com reserva de 10 % do total das terras, que deverá ser
conservada em mattas, de preferencia nas parte altas.
Art. 36. O preço dos lotes, comprehendendo a casa, será
estabelecido pelo ministro da Agricultura, de accôrdo com a proposta do director
do serviço, tendo em vista as condições que lhes foram peculiares.
Art. 37. A amortização do debito contrahido pelo
trabalhador nacional começará logo que forem decorridos 24 mezes de seu
estabelecimento e será feita em prestações mensaes ou trimensaes, na razão
annual de uma quarta parte (1/4) da importancia devida.
Art. 38. As dividas dos trabalhadores serão escripturadas
em livros especiaes, rubricados pelo director do serviço, entregando-se ao
devedor uma caderneta em que serão feitos os assentamentos que lhe
corresponderem.
Art. 39. O trabalhador nacional que tiver de incorporar-se
a um «Centro Agricola» obrigar-se-ha:
1º, a estabelecer-se com sua familia, quando a tiver, no
lote que lhe fôr designado pelo director do serviço e a cultival-o
pessoalmente;
2º, a não crear animaes sinão em terrenos fechados, de
accôrdo com instrucções que lhe forem dadas pelo director do centro;
3º, a não arrendar, vender ou hypothecar o lote e as
respectivas bemfeitorias, nem fazer sobre elle proposta de venda ou qualquer
contracto que o prive de cultivar livremente, até que obtenha o titulo
definitivo de propriedade; não podendo vendel-o ou arrendal-o, mesmo depois de
obtido o titulo definitivo, sinão a pessoas que reunam as condições do art. 32,
a juizo do director do serviço e com approvação do ministro;
4º, a submetter-se ás regras e providencias que forem
estabelecidas pelo representante da directoria a bem da ordem e da disciplina,
quer em relação aos funccionarios do Centro Agricola, quer para com os seus
proprios companheiros.
Art. 40. Em caso de morte do trabalhador nacional a quem
houver sido expedido titulo definitivo ou provisorio de propriedade, passará o
lote, na fórma commum do direito, aos seus herdeiros ou legatarios.
Art. 41. Si o chefe de familia fallecido houver adquirido
o lote a prazo, tendo contribuido com tres prestações, será passado titulo
definitivo de propriedade em favor da viuva e dos orphãos.
Art. 42. Si a familia do chefe fallecido ficar em estado
de miseria, poderá o ministro, ouvido o director de serviço, expedir a favor da
viuva e orphãos o titulo de propriedade, independente de qualquer amortização.
Art. 43. O Governo Federal procurará estimular os
trabalhadores nacionaes, incorporados aos centros agricolas, concedendo premios
de animação para certas culturas, organizando exposições regionaes,
etc.
Art. 44. A's familias de trabalhadores, que tiverem filhos
maiores de 14 annos, aptos para o trabalho agricola, poderá ser concedida, além
do lote destinado ao respectivo chefe, a área de 12 hectares para cada um
delles, com a approvação do ministro da Agricultura.
Art. 45. O trabalhador nacional que se distinguir, por sua
actividade, poderá adquirir mais de um lote, a juizo do director do serviço,
desde que tenha pago o primeiro, ou quando tenha feito mais da metade do
pagamento.
Art. 46. O trabalhador que deixar de cultivar o seu lote
por espaço de tres mezes, a não ser motivo justificado de força maior, a juizo
do director do serviço, será excluido do «Centro Agricola», sem direito a
indemnização alguma, desde que não se ache de posse do titulo definitivo de
propriedade.
Paragrapho unico. No caso de já haver obtido o titulo
definitivo, será indemnizado da importancia que tiver pago aos cofres
publicos.
Art. 47. O trabalhador que, por sua má conducta, tornar-se
um elemento de perturbação para o « Centro Agricola», fica sujeito ao disposto
no artigo anterior.
Art. 48. A exclusão, em qualquer dos casos previstos nos
artigos antecedentes, será feita por acto do director do serviço, com recurso
voluntario para o ministro da Agricultura.
TITULO III
Da organização do serviço
CAPITULO I
DISTRIBUIÇÃO DOS
TRABALHOS
Art. 49. Os trabalhos previstos neste regulamento ficarão
a cargo de uma directoria geral com duas sub-directorias e dos inspectores e
mais funccionarios indicados no art. 52.
Art. 50. A' 1ª sub-directoria incumbe
especialmente:
a) projectar, orçar e dirigir a execução dos serviços de
demarcação dos territorios occupados por indios;
b) escolher as localidades em que deverão ser installadas
as povoações indigenas e os centros agricolas;
c) proceder á divisão e demarcação dos lotes ruraes,
levantamentos topographicos, construcção de casas nas povoações e centros
agricolas e nos predios necessarios á administração;
d) projectar e dirigir a execução de obras de saneamento,
construcção de caminhos, e reparação e melhoria das estradas de rodagem que
interessem ás povoações e centros agricolas;
e) estudar e construir, nos casos de necessidade, caminhos
vicinaes ou de ligação dos centros ou povoações ás estações de estradas de
ferro, portos maritimos ou fluviaes, ou a centros commerciaes;
f) preparar em cada lote rural a área destinada ás
primeiras culturas;
g) instituir e manter no escriptorio um archivo dos
projectos, plantas topographicas e outros papeis que se relacionem com as obras
em andamento;
h) executar quaesquer outros trabalhos technicos que lhe
forem confiados pela directoria geral.
Art. 51. A' segunda sub-directoria incumbe
especialmente:
a) propôr e zelar pela rigorosa execução das medidas
adoptadas para tornar effectiva a protecção aos indios e evitar a invasão de
seus territorios; as que forem conducentes a obstar os conflictos das tribus
entre si e com os civilizados, envidando esforços para tornarem-se primeiro
pacificas e depois amistosas as relações entre estes e aquelles;
b) installar e dirigir, na parte exclusivamente
administrativa, as povoações indigenas;
c) crear escolas, proteger o salario dos indios que se
empregarem como jornaleiros e adoptar ou pedir ás autoridades competentes todas
as medidas necessarias para a manutenção da boa ordem, segurança e
desenvolvimento das povoações;
d) installar e administrar os centros agricolas,
fornecendo-lhes gratuitamente ferramentas e sementes, como auxilio de primeiro
estabecimento, além de outras vantagens prevista neste regulamento ou
posteriormente instituidas em instrucções expedidas pelo director geral por
ordem do ministro, mediante proposta ou não do sub-director;
e) porpôr a creação de campos de experiencia e demonstração
junto aos centros agricolas;
f) ter a seu cargo os trabalhos relativos a exposições
regionaes, feiras e premios de que trata o presente regulamento, ou que forem
posteriormente instituidos;
g) executar quaesquer outros trabalhos que lhe forem
confiados pela directoria geral, além do expediente da repartição, registro de
papeis, e toda a escripturação que fôr necessaria para o bom andamento do
serviço.
CAPITULO II
DO
PESSOAL
Art. 52. O pessoal do serviço dividir-se-ha em
effectivo e extraordinario.
§ 1º O pessoal effectivo será o seguinte:
Na séde do serviço:
Directoria geral:
1 director geral;
1 primeiro official (servindo de secretario);
1 segundo official.
Primeira sub-directoria:
1 sub-director (technico);
2 ajudantes (technicos);
1 agronomo (technico);
1 desenhista;
1 desenhista auxiliar;
1 terceiro official.
Segunda sub-directoria:
1 sub-director;
2 primeiros officiaes;
2 segundos officiaes;
2 terceiros officiaes.
Portaria:
1 porteiro;
1 continuo;
2 serventes.
Nos Estados:
13 inspectores, sendo 1 para cada um dos Estados do
Amazonas, Pará, Maranhão, Bahia, Espirito Santo, S. Paulo, Paraná, Santa
Catharina, Rio Grande do Sul, Minas, Goyaz, Matto Grosso e 1 para o territorio
do Acre;
10 ajudantes, sendo 2 para cada um dos Estados do Amazonas,
Pará, Matto Grosso, Goyaz e para o teritorio do Acre;
13 escreventes, sendo 1 para cada inspectoria.
Nas povoações indigenas:
1 director, 1 ajudante e 1 escrevente.
Nos centros agricolas:
1 director, 1 chefe de
culturas e 1 escrevente.
Art. 53. Além do pessoal effectivo, haverá o pessoal
extraordinario que fôr indispensavel para a execução dos serviços de demarcação,
construcções, levantamentos topographicos, localização e outros que não puderem
ser executados pelo pessoal effectivo.
Art. 54. O pessoal extraordinario, inclusive medicos,
pharmaceuticos, professores primarios e mestres de officinas, será nomeado pelo
ministro, de accôrdo com as necessidades e sob proposta do director geral;
perceberá as gratificações que lhe forem arbitradas no acto da nomeação e será
mantido somente emquanto bem servir e durar a necessidade do serviço.
CAPITULO III
ATTRIBUIÇÕES DO
PESSOAL
Do director geral:
Art. 55. Ao director geral, immediatamente subordinado ao
ministro, incumbe:
a) distribuir, dirigir e fiscalizar os serviços instituidos
por este regulamento;
b) manter e fazer manter, pelos meios ao seu alcance, a
observancia das ordens em vigor;
c) propôr ao ministro, verbalmente ou por escripto, as
providencias que julgar convenientes para o bom andamento e melhoria dos
serviços;
d) preparar e fazer preparar as instrucções que houverem de
ser expedidas para a installação, regularização e desenvolvimento dos
serviços;
e) apresentar annualmente ao ministro um relatorio dos
trabalhos realizados;
f) prestar ás autoridades federaes e estaduaes,
espontaneamente ou mediante requisição, os esclarecimentos necessarios á boa
ordem o desenvolvimento dos serviços;
g) dar posse aos seus subordinados, fazendo lavrar e
assignar os respectivos termos de promessa;
h) impor as penas disciplinares, de conformidade com o art.
68 deste regulamento;
i) assignar a folha de vencimentos dos funccionarios sob
sua direcção, concedendo ou não a justificação das faltas por elles commettidas
dentro do mez, á vista do livro do ponto, e requisitar o respectivo
pagamento;
j) rever o expediente e lançar o - visto - quando não tiver
de dar parecer nos papeis que tenham de ser apresentados ao
ministro.;
k) ordenar as despezas com o expediente e mais objectos
necessarios á directoria e mais dependencias do serviço, dentro dos recursos
orçamentarios;
I) examinar as contas e requisitar ao ministro o pagamento
das aquisições quaesquer que se tenham de effectuar para os serviços sob sua
direcção;
m) requisitar das autoridades federaes e estaduaes as
medidas necessarias para a manutenção da ordem nos differentes pontes em que
exercer a sua jurisdicção:
n) exercer quaesquer outras attribuições que lhe couberem
por este regulamento e mais disposições em vigor.
Art. 56. O director geral, em seus impedimentos ou
ausencias desta Capital, por motivo de serviço, terá por substituto o
sub-director da 1ª sub-directoria, e, em falta deste, o da 2ª
sub-directoria.
Do secretario:
Art. 57. Ao secretario, subordinado e auxiliar immediato
do director geral, incumbe:
a) receber e enviar as respectivas sub-directorias os
papeis dirigidos ao director geral e que tenham de ser nellas
processados;
b) receber das sub-directorias e fazer chegar ao
conhecimento do director geral os papeis que por elle tiverem de ser
despachados;
c) providenciar sobre a expedição dos actos do director
geral, fazendo as devidas communicações;
d) auxilar o director geral nos trabalhos que este reservar
para si;
e) providenciar sobre a correspondencia epistolar e
telegraphica da directoria.
Dos sub-directores:
Art. 58. Os sub-directores, auxiliares immediatos do
director geral, são chefes das respectivas sub-directorias e, como taes, os
unicos responsaveis perante o director geral pelos serviços que por ellas
correm.
A elles incumbe:
a) auxillar a direcção dos trabalhos segundo as instrucções
do director geral, distribuindo ao respectivo pessoal os serviços da competencia
de cada um;
b) dirigir, examinar, fiscalizar e promover todos os
trabalhos que competirem ás respectivas sub-directorias;
c) cumprir e fazer cumprir as ordens do director
geral;
d) apresentar ao director geral, até o dia 20 de fevereiro
de cada anno, as notas e elementos que lhe forem requisitados e os que julgarem
necessarios para a confecção do relatorio annual da directoria, com os
documentos que lhes servirem de base, bem como os dados necessarios para a
confecção do orçamento;
e) apresentar semestralmente ao director geral uma synopse
dos trabalhos realizados pela respectiva sub-directoria;
f) encerrar o ponto dos funccionarios subordinados, á hora
regulamentar.
Art. 59. O sub-director da 1ª sub-directoria terá sob suas
ordens immediatas dous ajudantes e um engenheiro agronomo, cujas attribuições e
deveres serão discriminados pelo mesmo sub-director, em instrucções expedidas
mediante approvação prévia do director geral.
Art. 60. As sédes das inspectorias, os deveres e
attribuições dos inspectores e pessoal das povoações indigenas e centros
agricolas serão discriminados em instrucções expedidas pelo ministro da
Agricultura, sob proposta do director geral.
Art. 61. O director geral fará a distribuição dos demais
funccionarios pelas diversas sub-directorias, incumbindo aos sub-directores
prescrever-lhes os seus respectivos deveres, guiando-se, para isto, pelos
regulamentos das repartições do Ministerio da Agricultura.
CAPITULO IV
VENCIMENTOS,
NOMEAÇÕES, DEMISSÕES, LICENÇAS, APOSENTADORIAS, MONTEPIO E OUTRAS
VANTAGENS
Art. 62. Os vencimentos dos funccionarios do serviço serão
os constantes da tabella annexa.
Art. 63. Serão nomeados, por decreto do Presidente da
Republica, o director geral e os sub-directores, e os demais funccionarios pelo
ministro da Agricultura.
Art. 64. A nomeação do director geral, bem como a do
pessoal technico, inspectores, ajudantes e pessoal das povoações indigenas e
centros agricolas será de livre escolha do governo.
Art. 65. A dos sub-directores, primeiros e segundos
officiaes será sempre por accesso dentre os funccionarios de categoria
immediatamente inferior, que tiverem dado melhores provas de competencia, zelo e
assiduidade ao serviço.
Art. 66. As nomeações dos terceiros officiaes serão feitas
mediante concurso, de accôrdo com as instrucções para esse fim expedidas pela
directoria geral.
Art. 67. Ficam extensivas aos funccionarios do serviço as
disposições contidas nos arts. 21 e 22 do regulamento da Secretaria de Estado da
Agricultura, Industria e Commercio.
Art. 68. No tocante as licenças, aposentadorias, montepio
e penas disciplinares, serão extensivas aos funccionarios do serviço as
disposições contidos nos artigos componentes dos capitulos VIII IX e X do
regulamento annexo ao decreto n. 7.727, de 9 de janeiro de 1909.
CAPITULO V
TEMPO DE TRABALHO E EXPEDIENTE
Art. 69. O trabalho, na Capital Federal, começará ás 10
horas da manhã e findará ás 3 horas da tarde nos dias uteis, podendo, porém, ser
prorogado pelo director geral, por urgencia de serviço.
Nos Estados, o trabalho começará nas horas indicadas nas
instrucções que forem expedidas pelo ministro, sob proposta do director
geral.
CAPITULO VI
DISPOSIÇÕES
GERAES
Art. 70. O Governo Federal procurará aproveitar os
indigenas em serviços industriaes compativeis com as suas aptidões,
remunerando-os de accôrdo com a sua capacidade de trabalho e conforme o
estabelecido para os mais trabalhadores.
Art. 71. Organizado definitivamente um «Centro Agricola» o
Governo Federal entrará em accôrdo com o governo local para o estabelecimento de
uma feira semanal nas proximidades do mesmo centro, prestando o auxilio
necessario para esse fim.
Art. 72. Haverá em cada «Centro Agricola» machinas e
instrumentos agricolas para serem vendidos pelo custo ou emprestados aos
trabalhadores, assim como serão montadas as machinas necessarias para
beneficiamento dos seus productos, mediante as condições que forem estabelecidas
e a juizo do governo.
Paragrapho unico. As machinas e instrumentos a que se
refere o presente artigo poderão igualmente ser emprestados aos pequenos
lavradores das proximidades, assim como as de beneficiamento poderão ser por
elles utilizadas nas mesmas condições em que o forem pelos trabalhadores do
«Centro Agricola».
Art. 73. O Governo Federal mandará fornecer gratuitamente
aos lavradores, residentes nas proximidades dos centros, sementes, mudas e
publicações relativas á agricultura e industrias ruraes, e mediante indemnização
a prazo de accôrdo com os recursos orçamentarios, conforme as instrucções que
forem approvadas pelo ministro da Agricultura, instrumentos e pequenas machinas
de lavoura, vehiculos e animaes para conducção dos productos agricolas e animaes
reproductores de raça, especialmente gallinaceos, suinos e caprinos adequados a
cada região.
Art. 74. Em caso de secca ou qualquer calamidade que
obrigue as populações ruraes a se afastarem das zonas em que se acharem fixadas,
procurará o Governo Federal localizal-as, de accôrdo com o governo estadual, em
outras zonas não assoladas do mesmo Estado, constituindo nellas centros
agricolas.
Art. 75. Sempre que houverem de ser feitas derrubadas,
aberturas de estradas, aterros e outras obras em proveito de um «Centro
Agricola», serão, de preferencia, utilizados trabalhadores nacionaes localizados
no mesmo centro, percebendo as diarias que forem fixadas pelo director do
serviço.
Art. 76. Os cargos de director geral, sub-director da 1ª
sub-directoria e seus ajudantes serão exercidos, de preferencia, por
profissionaes de reconhecida competencia.
Paragrapho unico, Terão preferencia para os cargos de
directores dos centros agricolas os agronomos diplomados e que tenham longa
pratica e experiencia de agricultura.
Art. 77. O ministro da Agricultura, Industria e Commercio
expedirá as intrucções necessarias para execução do presente
regulamento.
Tabella de
vencimentos a que se refere o art. 62 deste regulamento
VENCIMENTOS ANNUAES | ||
Categorias | Ordenado | Gratificação |
Director geral...................................................................................... | 12:000$000 | 6:000$000 |
Sub-director........................................................................................ | 8:000$000 | 4:000$000 |
Ajudante.............................................................................................. | 6:400$000 | 3:200$000 |
Agronomo........................................................................................... | 6:400$000 | 3:200$000 |
Desenhista.......................................................................................... | 4:800$000 | 2:400$000 |
Desenhista-auxiliar............................................................................. | 3:600$000 | 1:800$000 |
Secretario............................................................................................ | 6:400$000 | 3:200$000 |
1º official............................................................................................. | 5:600$000 | 2:800$000 |
2º official............................................................................................. | 4:000$000 | 2:000$000 |
3º official............................................................................................. | 3:200$000 | 1:600$000 |
Porteiro............................................................................................... | 2:000$000 | 1:000$000 |
Continuo.............................................................................................. | 1:600$000 | 800$000 |
Servente.............................................................................................. | -- | 1:800$000 |
Inspectorias | ||
Inspector............................................................................................. | 6:400$000 | 3:200$000 |
Ajudante.............................................................................................. | 4:800$000 | 2:400$000 |
Escrevente.......................................................................................... | 2:000$000 | 1:000$000 |
Povoação indígena | ||
Director............................................................................................... | 5:600$000 | 2:800$000 |
Ajudante.............................................................................................. | 4:000$000 | 2:000$000 |
Escrevente.......................................................................................... | 1:800$000 | 600$000 |
Centro agrícola | ||
Director............................................................................................... | 4:800$000 | 2:400$000 |
Chefe de culturas................................................................................ | 2:000$000 | 1:000$000 |
Escrevente.......................................................................................... | 1:800$000 | 600$000 |
Observações
1ª O director geral, sub-directores, ajudantes e agronomo,
inspectores e seus ajudantes, quando em serviço fóra da séde de seus trabalhos
terão direito a diarias que serão fixadas pelo ministro, não excedendo, porém,
as quantias de 20$ para o director, 15$ para os sub-directores e inspectores e
10$ para os ajudantes e agronomos.
2ª O logar de secretario será exercido por um primeiro ou
segundo official, escolhido pelo director geral, cabendo-lhe, quando no
exercicio do cargo, a gratificação mensal de 100$, além dos respectivos
vencimentos.
3ª A séde de cada inspectoria será fixada nas instrucções a
que se refere o art. 60 deste regulamento.
Rio de Janeiro, 20 de junho de 1910. - Rodolpho
Miranda.
Um comentário:
"Regulamento que constituiu o SPI pela simplicidade e pelos objetivos traçados."
"Em nenhum momento se declara ou ao menos está implícito que o objetivo do SPI era controlar os índios, cercear sua vida ou mudar suas culturas para todos ficarem iguais aos brasileiros.
Este foi o grande libelo feita por alguns antropólogos do Museu Nacional, nos últimos 20 anos, contra o SPI e contra Rondon, e que a maioria dessa geração de novos antropólogos engoliu a seco. Ainda é tempo de pôr a mão na consciência e mudar suas visões do mundo."
Sem Palavras, disse tudo, não se trata de um Decreto frankenstein.
ABRAÇOS
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