segunda-feira, 11 de maio de 2009

Líder indígena peruano explica invasão de poços de petróleo na Amazônia peruana


O Peru decretou "estado de emergência" em quatro estados da Amazônia Peruana: Cuzco, Loreto, Ucayali e Amazonia. Está havendo uma grande disputa nessas regiões entre as companhias petrolíferas e os povos indígenas que habitam as terras em cujo subsolo há abundante fontes de petróleo. A disputa é, com licença do trocadilho, crua e dura.

O governo Alan Garcia até que buscou negociar com os índios, mas de um modo tão ineficiente, com tanta incapacidade de conversação, que só causou mais revolta entre as lideranças indígenas. O governo peruano não abre mão do poder sobre a exploração do petróleo outorgada a quem quer que ele queira. Já disse isso diversas vezes. Hoje são pelo menos três locais de poços de petróleo explorados por empresas estrangeiras que foram tomados por índios, além da interdição de diversas pontes e estradas, motivos pelos quais o governo decretou emergência. A principal alegação do governo é que uma minoria de índios não pode prejudicar o Estado peruana e a maioria de sua população que dependem dos royalties e impostos do petróleo. É desculpa muito grosseira.

Na entrevista abaixo, o principal líder da associação Aidesep, Alberto Pizango, esclarece a questão do ponto de vista dos povos indígenas. Argumenta que há exploração sem respeito ao meio ambiente e aos direitos dos povos indígenas. Até que não é contra o ato em si de explorar petróleo, mas quer participação e reconhecimento.

É certo que esta celeuma vai continuar e é bem possível que as disputas se tornem mais ásperas, com prisões e mortes, se o governo peruano não encontrar uma fórmula de negociação adequada.

O mapa ao lado mostra a divisão geográfica do Peru em três grandes regiões, que correm de norte a sul, e explicita as áreas da Amazõnia Peruana que estão "loteadas" para empresas de petróleo. Não esclarece exatamente onde há terras indígenas, uma concepção bem diferente do que temos no Brasil.

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Indígenas se rebelam contra empresas petrolíferas na Amazônia peruana
Índios tomaram três poços na região e querem revisão de concessões.
Leia entrevista com líder de nativos amazônicos peruanos.


Dennis Barbosa, do Globo Amazônia, em São Paulo


Indígenas peruanos estão mobilizados contra a forma como é feita a exploração petrolífera na porção amazônica de seus país. A Amazônia peruana foi praticamente toda loteada e leiloada a empresas nacionais e estrangeiras de exploração (veja mapa abaixo). Os índios reclamam dos impactos ambientais e sociais, e de não terem sido consultados sobre a extração de petróleo em terras que consideram suas.

No momento, eles mantêm três poços ocupados e prometem radicalizar sua oposição ao governo de Alan García, como relata em entrevista ao Globo Amazônia o presidente da entidade que encabeça nacionalmente o movimento, a Associação Interétnica de Desenvolvimento da Selva Peruana (Aidesep), Alberto Pizango. Leia abaixo entrevista do líder indígena:

Globo Amazônia: Na última semana, vocês bloquearam o Rio Napo no departamento (estado) de Loreto para impedir a passagem de barcos petroleiros, mas a Marinha rompeu o bloqueio com uma embarcação de guerra. O que aconteceu?

Alberto Pizango: Isso foi na terça-feira (5). As 5h30 da manhã, a Marinha de Guerra irrompeu o Rio Napo, que haviam fechado os irmãos secoyas e quechuas. Felizmente não houve danos humanos, apenas materiais. Fizeram afundar botes e barcos a motor, porque tinham que passar duas barcaças da [companhia francesa de petróleo] Perenco.

Globo Amazônia: Foi a reação mais violenta do governo até agora?

Alberto Pizango: Essa é uma clara provocação do governo aos povos que estão reclamando seu direito à vida, à liberdade e à soberania dos territórios do Peru.

Globo Amazônia: Em que exatamente a atividade petroleira afeta os indígenas da Amazônia peruana?

Alberto Pizango: Toda a Amazônia está quadriculada. Por isso todos os povos indígenas estão mobilizados e não vão permitir mais que o governo siga entregando os territórios dos legítimos peruanos.

Globo Amazônia: Pode exemplificar que tipos de problemas as petroleiras causam?

Alberto Pizango: Poluição de rios. São mais de 36 anos de exploração de hidrocarbonetos no Rio Corrientes sem que a [empresa de capital argentino] Pluspetrol tenha indenizado ou remediado. Ali segue-se poluindo e nossos irmãos achuares estão contaminados com chumbo e cádmio em seu sangue. Estão condenados a morrer.

Na província de Urubamba também houve, com a mesma Pluspetrol, sete rupturas de tubos e derramamentos sem que até agora nada tenha sido feito. Lá está poluído e os irmãos matsiguengas estão condenados a morrer. O Estado peruano está matando os povos indígenas. Há uma clara violação de direitos humanos, um claro genocídio em pleno século 21.

Globo Amazônia: E se o governo ou as empresas pagassem aos indígenas pela exploração dos recursos naturais? Neste caso, vocês aceitariam a presença dessas companhias?

Alberto Pizango: Talvez. Não se trata de que paguem ou não, mas de direitos. Trata-se de que não houve consulta a esses povos e de que o Estado peruano não tem uma lei que garanta que estas empresas, quando trabalhem na Amazônia, quando causem impacto ambiental e social, reparem ou indenizem. Simplesmente matam os povos, os seres humanos que estão ali.

Estamos dizendo ao governo que sentemos e reavaliemos isso, para que essas empresas entrem em igualdade de condições e que, se houver algum derramamento ou impacto, se possa pagar ou indenizar. A questão fundamental é o não cumprimento da convenção 169 [da ONU ] sobre o direito dos povos indígenas e dos cidadãos. (O convênio foi adotado em 1989 para garantir os direitos territoriais, sociais, culturais e econômicos dos povos indígenas e tribais.)

Globo Amazônia: Onde vocês estão concentrados para protestar contra a exploração petroleira?

Alberto Pizango: Estamos em toda a Amazônia, em 11 departamentos.

Globo Amazônia: E até agora não houve diálogo com o governo?

Alberto Pizango: Até agora não. Tentamos dialogar. Há acordos com o Legislativo e o Executivo, que se comprometeram a solucionar [a questão], mas não foi resolvido. Por isso, os povos indígenas radicalizaram e tomaram estações de bombeamento e anunciaram que também vão bloquear a estrada que liga o [departamento de] Amazonas com a costa.

Globo Amazônia: Quantas estações foram tomadas até agora?

Alberto Pizango: No momento há três ocupadas: duas no departamento de Loreto e uma no departamento de Amazonas.

Globo Amazônia: E se não houver diálogo há o risco de que se chegue a um confronto futuramente?

Alberto Pizango: A violência quem vai cometer é o governo. Nossos povos são pacíficos, apesar das contínuas agressões de que são alvo por parte dos governos republicanos. Mas as provocações do governo não vão ficar sem resposta, já que não consentimos a presença das empresas. Portanto, consideramos o governo de Alan García responsável pelas consequências que tenham suas provocações. Convocamos os organismos de defesa dos direitos humanos e as forças patrióticas e democráticas deste país a se unirem nesta luta pela derrogatória dos decretos legislativos e das leis entreguistas e anticonstitutcionais que este governo perpetrou.

O Globo Amazônia entrou em contato com o Ministério de Energia e Minas do Peru para ouvir o governo a respeito da exploração de petróleo na região em questão, mas não obteve resposta até o fechamento desta reportagem.

2 comentários:

Isabela Vieira disse...

Essa desculpa de que faz mal aos índios, mas bem para o resto da nação tem sido usada em vários discursos. Inclusive, aqui no Brasil. Tenho a sensação de a argumentação ganha cada vez mais força e não há nada que baste para evitar um retrocesso nesse ponto. Sigo inconformada.

guilherme disse...

A exploração dos recursos naturais minerais em terras indígenas na América do Sul sempre foi através da prática etnocida.
O livro do uruguaio Galeano As Veias Abertas da América Latina, apresentaram há mais de 30 anos atrás, com bastante clareza, esses latrocínios praticados pelas Igrejas e Estados Estrangeiros.
Hugo Chaves presenteou o Presidente dos EUA, Obama, para que aprendesse um pouco sobre respeito aos Povos.
A República sob interesses do capital sempre deflagrou revoltas dos povos explorados e usurpados.

 
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