O plebiscito realizado nesse domingo referendou a nova Constituição da Bolívia, votada há mais de dois anos pela Assembleia Constituinte, que traz inúmeros artigos favoráveis a uma grande participação dos povos indígenas daquele país.
Ao que indicam as pesquisas de boca-de-urna e por amostragem da contagem, o plebiscito teve cerca de 60% de votos favoráveis. A grande maioria desses votos se deu nos distritos (estados) andinos, como La Paz, Oruro e Potosi, estados mais populosos e com mais de 70%, enquanto que nos distritos do leste boliviano, como Santa Cruz, Beni, Tarija e Chuquisaca, a votação contrária chegou a 65%.
Os governadores desses últimos estados proclamam que não vão seguir essa Constituição em seus estados, já que eles a rejeitaram. Por sua vez, o presidente Evo Morales declarou que todos devem seguir a nova Constituição, conforme o plebiscito.
A situação vai inevitavelmente descambar num impasse entre esses dois tipos de Bolívia, impasse que já foi demonstrada em conflitos anteriores. A menos que Morales consiga apaziguar o ânimo dos vencidos, algo que ele já conseguiu através de negociação política.
A nova Constituição boliviana traz muitas novidades para a Bolívia e para a América do Sul. Na verdade, ela é a primeira constituição que verdadeiramente confere um novo status para os povos indígenas. Dá amplos poderes de autonomia para os 36 povos indígenas que habitam aquele país, especialmente em aspectos como controle ou escolha do seu desenvolvimento econômico, modos de tenência de terra e auto-determinação política e jurídica. Cria a figura da "justiça comunitária", pela qual determinados delitos podem ser julgados nos moldes que cada comunidade ou povo indígena decidir. A única restrição é que a pena de morte é ilegal, mas castigos físicos, multas ou restrições comportamentais poderão ser aplicados ao gosto da comunidade.
A representação congressual contará com a presença de representantes dos povos indígenas que serão eleitos por seus pares, não pelo voto universal. Algo como um sistema de cotas por representação. Não sei se cada povo indígena terá seu representante no congresso boliviano, mas pelo menos alguns estarão presentes.
A Bolívia dá um passo importantíssimo para consolidar os resultados do movimento indígena que tomou conta daquele país, majoritariamente formado por indígenas de origem quíchua e aymara, e mais 35 povos minoritários. Vai mais além do que qualquer outra constituição já feita no mundo, seja nas Américas, seja na Ásia e até na África, onde há tanta presença de povos diferentes.
A grande questão é: este foi um passo firme ou foi além das possibilidades atuais? Aí só os próximos meses e anos dirão.
Por sua vez, a Constituição dá amplos poderes centrais ao Executivo, inclusive de nacionalizar empresas estrangeiras. A propósito, além dos investimentos da Petrobrás, recentemente foram nacionalizados os investimentos petrolíferos da British Petroleum. Tal tipo de ação é que, ao final, poderá encrencar a vida da nova Constituição boliviana.
segunda-feira, 26 de janeiro de 2009
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Um comentário:
A Venezuela, em 1999, já conferiu aos povos indígenas lugar digno nas esferas de decisão. No Brasil, em 1988, isso não foi feito devido a dominação advindo do governo militar e das oligarquias políticas imperativas - visões reacionárias e anti indígenas dos constituintes e até mesmo de "aliados" dos povos indígenas.
Na Venezuela as reações contrárias também existiram.
No Brasil elas ainda prevalecem, até mesmo no atual Governo, ao exemplo da maneira como o PAC está sendo conduzido em relação aos povos indígenas e meio ambiente...
Os desenvolvimentistas ainda não entenderam que estão ultrapassados e que não se pode mais agir como os EUA, Inglaterra, França, Israel, Itália e outros que procuram sempre impor-se pela força econômica e militar.
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