terça-feira, 30 de junho de 2009

General Félix, do Gabinete Militar, é enviado ao Mato Grosso do Sul

Está no Mato Grosso do Sul, como representante direto e de escalão ministerial do presidente Lula, o general Jorge Armando Félix, ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, o antigo Gabinete Militar. Foi enviado para tratar da delicada questão indígena naquele estado.

O general Félix é um homem amável e atencioso que está ao lado do presidente desde 2003. É de inteira confiança do presidente Lula. Em 2004 esteve com os índios Cintas-Largas, como se pudesse resolver aquela questão, mas logo desistiu.

O que estará fazendo o general? Disse que veio para pacificar a relação entre índios e brancos. Será um novo Rondon? Até agora ele se encontrou com o governador André Pucinelli, que ontem declarou que não vai aceitar desapropriações de terras de fazendeiros para demarcá-las em favor dos índios. Esteve hoje de manhã na Assembleia Legislativa conversando com deputados que em sua grande maioria apoia os fazendeiros. E esteve ontem com alguns representantes indígenas, de quem teria ouvido suas reivindicações e reclamos e teria-lhes pedido para enviá-las em documento para ele entregar ao presidente Lula.

E o ministro Tarso Genro, está sabendo dessa interferência?

O que o general Félix, com toda sua habilidade, poderá resolver?

O fato precedente é que, na semana passada, o governador Pucinelli e alguns deputados estiveram no Ministério da Justiça, mas não com o ministro Tarso, onde ouviu de um assessor que prosseguirá o processo de demarcação de terras no Mato Grosso do Sul, embora seguindo as orientações do STF, no sentido de ter a participação direta dos entes federativos, isto é, do governo do Estado e das prefeituras pertinentes. Tudo indica que o governador não gostou dessa informação, não passou recibo, mas ontem fez essa declaração um tanto petulante.

A situação é de tensão recalcada por todos os lados. Mas o que o general Félix tem a ver com isso tudo?

sexta-feira, 26 de junho de 2009

Lula sanciona MP das terras amazônicas com um veto

O presidente Lula sancionou ontem, com um veto importante, a MP 498, votada no Congresso, com alguns acréscimos.

Trata-se da aplicação de uma política fundiária que reconhece a presença de lavradores, sitiantes, colonos, agricultores e boiadeiros, de plantadores de cana e de fazendas de agronegócio naquela grande região brasileira.

A MP 498 foi formalmente enviada ao Congresso Nacional com a rubrica do presidente e do ministro do Desenvolvimento Agrário, porém, na verdade, foi inspirada nas análises e propostas do ministro Mangabeira Unger, da Secretaria de Assuntos Estratégicos.

Os argumentos de Mangabeira junto ao presidente Lula partiram da demonstração de que a situação fundiária na Amazônia era um caos absolutamente inviável e desconhecido, com menos de 4% de seu território ocupado formalmente legalizado. Até as pequenas propriedades urbanas das cidades amazônicas não tinham registro jurídico de propriedade. Assim, para se criar uma política ambiental e desenvolvimentista, não de cima para baixo, imposta aos ocupantes das terras amazônicas, mas com a participação de todos, fazia-se necessário regularizar a presença desses usos da terra através da titulação de terras em propriedades. A ideia filosófica é de que, se você é dono da terra, cuida dela com responsabilidade e visão de futuro.

No início, o ministro Mangabeira foi muito criticado por sua ousadia. As pessoas em geral falavam que isto seria o reconhecimento formal do capitalismo na Amazônia, como se se pudesse isolar a Amazônia do capitalismo brasileiro. Os ambientalistas, por sua vez, tinham objeções mais precisas, e até hoje permanecem contra as ideias por trás dessa MP e receiam por suas consequências. Acima de todos, ecoando as objeções de todos, a então ministra Marina Silva se contrapôs veementemente a essa MP. No debate interno no governo, ela se desconcertou com os argumentos do ministro Mangabeira, contra-argumentando que tais medidas iriam legalizar o crime de invasão e grilagem de terras, o esbulho de pequenos lavradores pela compra de suas ocupações, a continuação da exploração desordenada e, enfim, a intensificação da devastação ambiental da Amazônia.

O presidente Lula também sofreu críticas de amigos e companheiros. Venceram, na visão do Planalto, as ideias de Mangabeira. Agora está sacramentada uma nova política fundiária na Amazônia no governo do presidente Lula. Essa política basicamente declara que, quem tem terras na Amazônia até 1.500 hectares pode encontrar um jeito legal de torná-las suas propriedades, comprando-as em leilão facilitado. Quem tiver entre 401 e 1500 poderá comprá-las por um preço simbólico. E quem tiver propriedades com até 400 hectares poderá registrá-las sem pagar nada.

Há condicionamentos para a regularização dessas propriedades e para a sua manutenção, tanto de ordem ambiental no seu uso, quanto de ordem econômica, como a proibição de venda por algum tempo. No mais, o direito de propriedade prevalece. O veto presidencial se deu sobre o artigo 7º que permitia a obtenção de título de terra por pessoa jurídica, por empresas, quer dizer. Há inúmeras ocupações e usos de terra na Amazônia que são de empresas. Aí não se sabe o que vai acontecer com elas.

Lembro aqui, a propósito de uma comparação, que o grande presidente americano Abraham Lincoln, por volta de 1861, estimulou a grande colonização do oeste americano instituindo uma política que permitia a qualquer pessoa ou família se deslocar para o oeste do rio Mississippi, delimitar uma área de 120 acres (30 hectares ±), lá permanecer e cultivar por um mínimo de dois anos, que adquiriria direito de propriedade. Com isso os Estados Unidos se fizeram no campo pela pequena propriedade rural. Às custas dos povos indígenas que habitavam as terras mais férteis, há que se relembrar. Ao final, a sociedade americana se consolidou como uma sociedade básica de pequenos proprietários rurais, os farmers, que deram-lhe o fundamento de sua riqueza e de sua democracia.

No Brasil, mais ou menos pela mesma época, a coisa se deu diferentemente. Só tinha direito de propriedade quem fosse ao cartório e registrasse uma determinada terra, sem limites de tamanho. Assim, os pobres, agregados e homens livres que vivem em terras suposta de alguém ou entre tradicionais fazendas, sem condições e sem ao menos saber da famosa Lei da Terra (1850, regulamentada em 1854), não conseguiram regularizar suas posses e ocupações e terminaram perdendo-as, sendo expulsos ou absorvidos pelos fazendeiros em expansão.

O que acontecerá agora com a Amazônia? Terão razão os ambientalistas, os partidários do MST, a Igreja Católica -- ou terão razão os defensores da MP 498?

quinta-feira, 25 de junho de 2009

AGU interfere na ampliação da Terra Indígena Barra Velha

A demarcação de terras indígenas está chegando a um ponto insuperável e portanto insustentável: as ressalvas do STF.

Só no Mato Grosso do Sul são mais de 140 processos jurídicos nos diversos tribunais locais e regionais. São diversas terras indígenas por lá que estão em disputa, mesmo algumas que já foram demarcadas anteriormente à onda de protesto dos fazendeiros e políticos do estado.

Além da tensão conflitual, disputas jurídicas estão para se desenrolar em torno do reconhecimento de uma terra indígena para os Tupinambá, na região de Ilhéus, sul da Bahia. O relatório incluiu áreas que, levando em conta as ressalvas restritivas do STF, dificilmente poderiam ter sido consideradas como de ocupação permanente e tradicional, ao tempo da promulgação da Constituição de 1988, e com isso prejudicou a legitimidade para as áreas sobre as quais se poderia provar ocupação permanente e tradicionalmente com mais facilidade. Eis no que dá a precipitação e o afobamento no reconhecimento de terras indígenas. As partes estão em iminente conflito, há disputa entre índios, CIMI, Direitos Humanos e Polícia Federal, os interesses saíram da órbita local e atingem os políticos estaduais, inclusive o governador do estado, ninguém se submete à negociação, e a solução do problema fica muito difícil.

Outro exemplo igualmente caudaloso se dará em relação à ampliação da Terra Indígena Barra Velha, dos índios Pataxó da região de Porto Seguro. Há muitos anos, os Pataxó vêm lutando para o reconhecimento das terras que eles ocuparam desde que houve uma grande dispersão de seu povo a partir de uma ataque criminoso aos Pataxó que viviam na veneranda aldeia de Barra Velha, por volta de 1951. Desta vez, o governo federal age como se por antecipação ao que poderá vir em matéria de disputa jurídica.

Eis que, recentemente, em Brasília, a Funai e o Ibama/ICMbio foram convocados pela Advogacia Geral da União para uma reunião na Câmara de Conciliação para tratar das disputas desses dois órgãos em relação à afetação da ampliação da Terra Indígena Barra Velha sobre o Parque Nacional Monte Pascoal. Quer dizer, de acordo com o relatório da Funai, uma parte dessa nova terra indígena cai sobre as terras desse parque nacional, e o Ibama/ICMbio não querem largar o osso.

A reunião foi péssima para a Funai e para os índios. A AGU decidiu que, seguindo as ressalvas criadas pelo STF, os Pataxó não têm direito sobre as terras que ocupam e as demais que querem ocupar, dentro do Parque, que deve pertencer exclusivamente ao ICMbio. Ignora completamente a história da concepção desse parque e da presença dos Pataxó. O pior ainda é que até as aldeias que se encontram fora do Parque, e que foram constituídas pelos índios ao longo das décadas de 1970 e 1980, como Guaxuma, teriam que ser evacuadas e os índios retirados.

Por sua vez, a Funai reconhece que está metida no atoleiro das ressalvas. O próprio procurador do órgão acha que não tem apelo diante dos argumentos da AGU, já que a instância suprema a se apelar é o STF e este já teria decretado, via votação sobre Raposa Serra do Sol, os condicionamentos que levaram a AGU a se manifestar contra a presença dos Pataxó no Monte Pascoal.

Pode uma coisa dessas? A que situação chegou o processo de demarcação???

quarta-feira, 24 de junho de 2009

A ideologia do "pesquisionismo"

Vale a pena ler esse artigo de Paulo Ghiraldeli, Jr., publicado no Observatório da Imprensa. Trata da forma como o Ministério da Educação encomenda pesquisas sobre determinado assunto, e essas pesquisas não passam de "surveys", simples coleta de respostas a perguntas previamente viciadas.

Nesse caso a pergunta era sobre preconceito racial nas escolas públicas do estado de São Paulo, e o resultado, naturalmente esperado e aclamado pelos burocratas do MEC, é de que o preconceito é horrível, que a escola é um antro de preconceitos.

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A ideologia do "pesquisionismo"

Por Paulo Ghiraldelli Jr. em 23/6/2009

O Brasil descobriu a pesquisa. Infelizmente, não é research, mas survey. E o pior, em alguns casos o resultado vem da universidade sob encomenda do governo, com cara de research, mas é survey. Em outras palavras: não fazemos mais investigação criteriosa, mas enquetes, e as apresentamos como pesquisa. E o pior ainda: os jornais estampam em suas manchetes o "resultado" do trabalho e, assim, eis que a cara do Brasil é desenhada como o que está na manchete. Na verdade, não é cara, é caricatura.

A mais recente pesquisa encomendada pelo MEC a um professor de contabilidade da USP é colocada no Estadão da seguinte forma: "Escola é dominada por preconceitos". Pronto, surge uma verdade, aparece um rosto para a escola brasileira. A escola agora não é só fraca, é o berço do preconceito. E com isso, com tal dogmatismo e falta completa de reflexão, os números secos, elaborados a partir da pretensa exatidão e objetividade da matemática (uma matemática pobre, na maioria das vezes), a denúncia do preconceito se põe a serviço da produção de mais preconceito. Agora, os que se acham sem preconceitos, vão se afastar da escola: "Nossa, lá é lugar do preconceito!" – assim reagirá uma parte da elite. Outra parte da população, ela própria na escola, irá dizer: "Nossa, eu nem percebia que estava vivendo num lugar tão horrível." E uma terceira dirá: "Ah, eu bem que sabia, lá na minha sala de aula, fora eu, todo mundo é preconceituoso."

A autoridade dos números

O terrível nisso é a interpretação do pesquisador, o professor-contador José Afonso Mazzon: "A pesquisa mostra que o preconceito não é isolado. A sociedade é preconceituosa, logo a escola também será. Esses preconceitos são tão amplos e profundos que quase caracterizam a nossa cultura" (Aqui). Ele foi pago (estou pasmo!) para fazer um serviço e concluiu isso aí! Ora, para dizer algo assim, alguém deveria ser pago?

Assim, as enquetes pagas a preço de ouro pelo MEC ou dizem banalidades, no melhor dos casos, ou então geram a meia verdade, quase a mentira, e têm como fruto, na população e a partir da imprensa, a própria mentira.

Anísio Teixeira construiu o INEP para que este órgão pudesse, entre outras coisas, fazer pesquisa educacional em termos quantitativos. Era pesquisa mesmo, não mera enquete. Mas, em geral, o que se faz agora é a enquete, a quantificação de dados a partir de perguntas que induzem aquele que responde a responder o que o pesquisador quer ouvir. O governo está ansioso por ouvir que suas ações parasalvar "pobres, negros, índios, pardos, deficientes e homossexuais" precisam de investimento – e eis que a pesquisa revela exatamente o que o governo quer escutar: que a escola é o lugar do preconceito contra tais grupos. Não é fantástico?

Há dois problemas com a pesquisa de tipo survey. Primeiro: ela é feita a partir de perguntas que, não raro, induzem um tipo de resposta. Quem já foi entrevistado por tais "pesquisadores" desses organismos governamentais, ou por grupos vindos da universidade para tal serviço, sabe bem do que estou falando e não vai me desmentir. Portanto, uma enquete não pode abrir mão da monografia histórica a respeito do local onde se colhem os dados da entrevista. O bom historiador e o bom filósofo sabem que o contador ou o economista raramente consegue imaginar que uma monografia sócio-histórica do local às vezes desmente de modo completo uma enquete, e quase sempre a corrige. Mas a coisa feita na base da survey, como os governos fazem ou encomendam, nunca usa tal metodologia integrada. Uma vez sugeri isso ao ministro Fernando Haddad, para o PDE, e nem resposta obtive. Ele preferiu colher dados, preencher um formulário e, então, achou que tinha "a realidade na frente dos olhos". Era mais fácil e mais rápido, pensou ele. Além disso, o que ele precisava era da autoridade dos números, não da realidade.

Sentimento não se contabiliza

O segundo problema da enquete ou survey é que, mesmo quando ela é rigorosa, mesmo quando todos os cuidados são tomados para que ela seja menos tendenciosa em suas perguntas, é que ainda assim ela não revela nenhuma verdade interpretativa, compreensiva da realidade. A enquete sempre dará números, e tais números, em formas de gráficos, não apontam nada a respeito de comportamentos reais. Por mais que você olhe uma pesquisa e ela diga que há preconceito em um grupo X contra um grupo Y, isso não dá nenhuma chance de você concluir, do modo absoluto que aparece na imprensa, que haverá ações concretas do grupo X no sentido de dificultar a vida de pessoas do grupo Y. Também é difícil de aferir se está havendo problemas desse tipo gerados a partir de um grupo contra outro.

A monografia histórica, observacional, com visão filosófica crítica, que cabe mais à pesquisa research, e não à pesquisa survey, pode trazer luz a um assunto. Por isso os americanos se viram maravilhados quando, ao lerem Max Weber, puderam perceber que aquilo que eles faziam, ainda que estivesse próximo do que Durkheim fazia, era deficiente. Os americanos evoluíram muito a partir daí, e hoje até mesmo as agências de propaganda americanas não confiam mais somente na survey. Essas agências, mesmo quando só querem apenas captar "tendências do mercado", optaram por ter filósofos e historiadores entre elas, para corrigirem as distorções e mentiras da survey, ou então para atuarem como consciência crítica da equipe de pesquisadores.

Depois da derrota de FHC diante de Jânio Quadros, nas eleições para a prefeitura de São Paulo em 1985, o sociólogo deveria ter aprendido sobre o perigo da survey. Mas, se aprendeu, não contou ao Paulo Renato. Pois foi na gestão do Paulo Renato, no MEC, que o pensamento do grupo do PTE (Pensamento Tecnocrático em Educação – confira: Filosofia e história da educação brasileira. São Paulo: Manole, 2009) adotou a survey como sendo a pesquisa par excellence. Um jornalista da Veja, ligado a tal grupo, chegou a dizer que tal tipo de pesquisa era a realização do ideal platônico de saída da Caverna: sem números, estaríamos na ilusão, com números de enquetes, chegaríamos à verdade, ao real. Nunca vi tamanha tolice. E o MEC do PT comprou essa idéia do MEC de FHC. Qualquer número, sendo número, é um bom número. Afinal, se veio da FEA e foi feito por alguém com o título de contador, como é que não haveria aí uma "conta" correta? Pensando assim, os funcionários do MEC não conseguem perceber que estão contabilizando sentimentos, não estão contabilizando cenouras. Todavia, sentimento, não se contabiliza, se descreve historicamente.

MEC pisou na bola

Assim, a cada dia, os jornais fazem mais uma quase mentira aparecer como a verdade sobre o Brasil, principalmente sobre a escola brasileira, induzidos pelo nosso governo. O MEC do PT aprendeu rápido com o MEC do PSDB a confiar no que não é confiável, contanto que diga as coisas em termos de números. Paulo Renato, economista, ensinou Haddad, advogado, a seguir a metodologia dos moços da Veja, que se baseia em dois erros:primeiro, números dizem a verdade sobre intenções e sentimentos; segundo, números devem ser lidos e interpretados, mas a interpretação final dos números já é mostrada pelo próprio elaborador da pesquisa. Não é possível que hoje em dia ainda se cometam tais erros, mas eles cometem.

Não adianta quererem falar em "pesquisa qualitativa", para colocar objeção ao que digo. Não foi feita pesquisa alguma nos casos que o MEC apresenta como pesquisa (neste que cito e em outros que não cito); o que foi feito foi enquete. Isso também é pesquisa, em certo sentido, mas é algo que é colhido por mão-de-obra barata a partir de um questionário – altamente questionável – que é fornecido ao entrevistado de um modo breve, "na correria", e sem que o entrevistado possa refletir sobre o que lhe é perguntado.

Você pode saber quantos televisores existem em uma casa a partir da pesquisa de tipo survey, mas não conseguirá, salvo raros casos, apreender os sentimentos de alguém sobre temas polêmicos, sem uma pesquisa histórica. Quem leu Dilthey e Weber, e não só Durkhiem, sabe disso. Quem assistiu o filme Crash pode começar a perceber isso (o filme ganhou o Oscar há dois anos, e era preferido de Richard Rorty). A escola preconceituosa apontada pela pesquisa MEC-USP, caso os números nos falassem algo de verdadeiro, não sobreviveria. O índice de preconceito apontado é mais alto do que o indicado nos anos setenta entre a população de regiões altamente racistas nos Estados Unidos – e o bairro negro, naquela época, ardia em chamas. O MEC pisou na bola, alguns grandes jornais o acompanharam.

Historicismo e metodologia compreensiva

Não estou aqui advogando o fim da survey. Não estou aqui advogando que não consultemos mais as estatísticas. O que denuncio é que o "pesquisionismo" da gestão de Paulo Renato contaminou a de Fernando Haddad e isso não é nada senão ideologia – e do tipo daquela que já caiu em desuso nos lugares em que nasceu e fez sucesso. Os Estados Unidos, berço desse tipo de ação, têm optado claramente, em todo tipo de perscrutação para entender a realidade, por pesquisas de caráter teórico, com fundo histórico. Monografias histórico-filosóficas sobre escolas nos dão o que está ocorrendo lá; números de enquete, desse modo aí, não dão.

Durkheim não está errado, mas está empobrecido no governo do PT. Além disso, um pouco de Weber, um pouco de historicismo e metodologia compreensiva iria bem. Do modo como o governo do PT faz, qualquer garota que vende produtos Avon, ao querer ficar sabendo "qual a tendência do gosto das clientes", os supera.

terça-feira, 23 de junho de 2009

Governo peruano volta atrás e tenta novo diálogo com os índios

Passadas duas semanas desde que a Polícia Militar do Peru avançou, por ordem presidencial, sobre uma concentração de mais de 1.000 indígenas Awajun, que estavam embarrerando uma estrada federal numa província onde inicia a parte norte da Amazônia peruana, em protesto por não serem ouvidos a respeito de projetos de desenvolvimento em suas terras, o rescaldo de mortes não resultou em evidências a mais do que aquelas anunciadas poucos dias depois. Isto é, morreram 34 pessoas, sendo 24 policiais, 8 indígenas e 2 jornalistas. Tenho tentado saber como morrem 24 policiais num ataque desse tipo, cheio de armamentos, contra indígenas portanto arcos e flechas e porretes, mas os relatos são variados. Os índios dizem que foram mortos por fogo cruzado dos próprios policiais; os policiais e o governo peruano dizem que foram assassinados pelos índios depois de presos em emboscada. O relator da ONU para direitos indígenas, James Anaya, esteve no local e declarou que não houve massacre, nem genocídio, confirmando de certo modo as alegações do governo peruano.

Na semana passada, o presidente Alan Garcia, pressionado pela opinião pública nacional e internacional, decidiu cancelar dois de seus atos discricionários (poder que lhe fora concedido pelo próprio Congresso peruano) em que abria e loteava a Amazônia peruana para a exploração de petróleo e gás, sem levar em consideração a quem pertencia ou estavam destinadas essas terras. Isto é, os povos indígenas. Pediu ao Congresso peruano que revogasse esses decretos, o que foi feito sexta-feira p.p. E convidou os índios ao diálogo.

Uma tentativa de diálogo havia sido entabulada durante algumas semanas anteriores ao ataque policial, já que os índios tinham se levantado em protesto e fechado essa estrada desde abril p.p. Entretanto, o primeiro-ministro do Peru não se deu bem nesse diálogo. Era um diálogo de senhor para servo, próprio da elite peruana. Os índios endureceram e apostaram na radicalização. Deu certo. Isto é, excetuando as mortes, o resultado é que o governo vergou à demanda indígena, que agora quer instituir um diálogo verdadeiro, em diálogo entre partes respeitantes.

Os índios, ou pelo menos aqueles ligados à Aidesep, que é uma das três principais associações indígenas amazônidas do Peru, dizem que não são contra o desenvolvimento da Amazônia. Apenas querem ser ouvidos e participar. Ser ouvidos não como ato displicente, feito com ouvidos de mercador, mas ouvido em diálogo, onde suas opiniões se tornem contraditório a serem incorporadas. Querem também participar dos benefícios das riquezas que das suas terras, ou mesmo de terras vizinhas, da região sejam extraídas. Querem uma racionalidade nova na economia amazônida. Querem participar com garantia de receber dividendos e alferir ganhos.

Tudo isso é novidade no Peru, acostumado a tratar os índios do altiplano como se camponeses fossem. Talvez estes sejam sociologicamente camponeses, como interpretava José Carlos Mariátegui, o grande marxista peruano da década de 1920, mas os índios da Amazônia não o são. Têm consciência de suas diferenças culturais fundamentais em relação aos indígenas descendentes do Império Inca, e do caráter colonialista com que são tratados.

É interessante notar que, ontem mesmo, o governo da província de Cuzco, que foi a capital do Império Inca, declarou ter cancelado um investimento japonês de mais de 300 milhões de dólares para a construção de uma hidrelétrica na região de Canchis porque os índios da região protestaram que não a queriam em suas terras. Se a moda pega...

Um novo diálogo não vai ser fácil para o governo peruano incorporar. Não há tradição indigenista naquele país. Mas, temos que desejar boa sorte a todos. Talvez de onde não tenha tradição saia alguma coisa de novo. Difícil, porém não impossível.

No Brasil, está chegando a hora em que o diálogo com os índios terá que rejuvenescer de um modo diferente do que vem acontecendo ultimamente. Nem um diálogo paternalista, seja pelo lado do governo, seja pelo lado das Ongs, nem um diálogo inter-classe. O Brasil tem uma tradição indigenista que não é para ser descartada. Seu resultado é o reconhecimento dos povos indígenas como parte essencial da Nação. É tradição premente, real, objetiva e subjetiva, mas, dentro da história, é para ser superada, transcendida, reincorporada com o aprendizado do presente, com a presença manifesta dos povos indígenas em busca de um espaço digno na nação.

segunda-feira, 22 de junho de 2009

Tensão na Bahia: o caso Tupinambá

Esta semana que passou e as próximas que virão serão decisivas para o caso da demarcação do território dos índios Tupinambá, no sul da Bahia.

Localizada entre os municípios de Una, Buererama e Ilhéus, incluindo uma parte da vila de Olivença, esse território levou anos para ser delimitado. O relatório foi feito com cuidado, baseado nas afirmações dos Tupinambá sobre as terras que ocupavam por ocasião da rebelião que lá ocorreu em 1929-30, cuja liderança mais destemida foi a de Marcelino José Alves, que ficou conhecido como Caboclo Marcelino.

A recuperação dessas terras é o ideal dos Tupinambá. Entretanto, a resistência dos que, de um modo ou outro, de boa fé ou de má fé, ocuparam grande parte dos 47.370 hectares consignados no relatório da Funai, tomou proporções semelhantes àquelas que vêm acontecendo no Mato Grosso do Sul. Muitos são pequenos lavradores e chacareiros, com pequenos plantéis de cacau, alguns são sitiantes, outros são fazendeiros de gado, e há também investimentos modernos de turismo.

As recentes ressalvas exaradas pelos STF a respeito de demarcação de terras indígenas são um grave impedimento para o reconhecimento dessas terras. Em matéria publicada pela revista Última Instância, diversos juristas apontaram as novas dificuldade e as tensões que serão criadas daqui por diante. A principal ressalva que os advogados dos interessados estão usando, ao que consta, são a que requer a presença das entidades federativas nos próprios grupos de trabalho que definem os limites de uma terra indígena, e a data da promulgação da Constituição de 1988 como marcadora da ocupação indígena permanente. Em ambos os casos, o relatório de identificação está omisso.

A questão tupinambá está em grande dificuldade. Os índios não querem que haja nenhuma mudança na delimitação feita pelo relatório da Funai, o qual foi trabalhado minuciosamente entre eles e a antropóloga que o elaborou. Por outro lado, os terceiros interessados já demonstraram o quanto estão dispostos a fazer para não abrir mão das terras que ocupam. Já os políticos da Bahia estão muito receosos do que fazer. Há vereadores, deputados, o prefeito de Ilhéus e até um senador metido na disputa. O próprio governador da Bahia, Jacques Wagner, que quer se candidatar de novo e tem um leque de alianças, sabe que precisa dos votos da zona cacaueira para sua re-eleição. O caso tupinambá pesa aí, bem como o caso dos Pataxó, cujo relatório de delimitação também foi publicado recentemente e está causando igual furor na região de Porto Seguro.

Alguns dias atrás, a Polícia Federal foi acusada por cinco índios Tupinambá, inclusive uma mulher, de os terem torturado com chutes e choques elétricos. Isto teria acontecido num galpão de uma fazenda onde a Polícia Federal fora chamada para retirar índios que a teriam invadido. Também tem a ver com um cadáver encontrado na região, sobre o qual os índios, genericamente, foram imputados do assassinato. Os índios fizeram exame de corpo de delito em Brasília, levados pelo CIMI, que não confiava que isso pudesse ser feito honestamente em Ilhéus. A Secretaria de Defesa dos Direitos Humanos pediu investigação sobre o caso e a notícia causou constrangimento à Polícia Federal, que diz que não os torturou, mas que aplicou choques elétricos por um instrumento legal chamado tesar para dominar pessoas que resistem à voz de prisão. Sem querer o choque teria atingido também a região gonadal de um índio.

Fico preocupado também sobre as repercussões que estes casos podem ter sobre o caso dos Pataxó Hãhãhãe, da Terra Indígena Caramuru-Paraguaçu, que foi demarcada em 1938, tomada por invasores cacaueiros e fazendeiros e está em processo de decisão pelo STF desde 1983. O ministro Eros Grau deu seu parecer de relator do caso em agosto de 2008 de modo positivo aos Pataxó, porém, o ministro Menezes Direito pediu vistas e ainda não produziu seu voto. Como está de licença médica até agosto, o caso vai rolar por mais tempo. E a situação aumenta de tensão.

É preciso que os Tupinambá vejam todas as possibilidades de ação. Inclusive, acima de tudo, de negociação. Entre correr o risco de perder o caso no STF, por conta das ressalvas que eventualmente serão alegadas no contestatório dos terceiros interessados, melhor buscar meios de obter o território que se torne real.

segunda-feira, 15 de junho de 2009

Procurador Federal exige uma melhor Funai para os Cintas-Largas

A situação dos índios Cintas-Largas, especialmente das aldeias localizadas no estado de Rondônia, abeirando o rio Roosevelt, continua periclitante. Apesar da presença da Polícia Federal fazendo barreiras contra a entrada de garimpeiros de diamantes, o garimpo acontece de todo jeito. É uma situação muito difícil.

Lembremos que em abril de 2004, um grupo Cinta-Larga atacou um acampamento de garimpeiros que resultou na morte de 29 deles. Antes, em 2003, a Funai e a Polícia Federal haviam retirado os garimpeiros do mesmo local, mas continuaram a entrar em pequenos números, clandestinamente, explorando os diamantes que afloram na beira de um igarapé que desce no rio Roosevelt. Saíam e entravam, saíam e entravam. Os Cintas-Largas perderam a paciência e o resultado foi desastroso. Lembro-me bem, como presidente da Funai, que, ao tentar fazer compreensível a ação dos Cintas-Largas, lamentando pelo ocorrido e pelas mortes, sofri críticas generalizadas de muita gente boa, inclusive jornalistas que nunca tinham ouvido falar desses índios e de sua situação.

O Procurador Reginaldo Trindade, de Porto Velho, tem estado presente na questão Cinta-Larga desde 2007. Naquele ano ele esteve com um grupo de pessoas, que incluía um agente de Direitos Humanos da ONU, que foi supostamente sequestrado pelos índios até que fossem resolvido algumas pendências dos Cintas-Largas. O sequestro terminou em brancas nuvens, e as mudanças administrativas feitas em Cacoal diminuíram a capacidade de atuação da Funai. Estava na cara.

Eis que agora o procurador faz cobranças de maior participação e atuação da Funai. Espero que não caia em ouvidos moucos.

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MPF cobra mais atenção da Funai para Cinta Larga

Agencia Estado, por Ricardo Valota

SÃO PAULO - O Ministério Público Federal (MPF) em Rondônia (RO) emitiu nesta sexta-feira, 12, uma recomendação à Fundação Nacional do Índio (Funai) para que, dentro de 30 dias, tome algumas medidas que mostrem um tratamento de mais responsabilidade e profissionalismo com algumas questões relativas ao povo indígena Cinta Larga, designando equipe de técnicos e dando a estes servidores condições de trabalho para buscar soluções para os problemas que afetam os índios.

O MPF também recomenda que a Funai assegure a liberação regular de recursos ao desenvolvimento do trabalho, fixando datas-base certas e mensais; retome o trabalho de concepção, financiamento e execução dos projetos de alternativas econômicas à atividade mineral para o povo Cinta Larga; assegure o direito à alimentação e o acesso às aldeias; acompanhe e adote providências sobre os relatos de abusos praticados contra os índios pela Polícia Federal; impulsione a construção de casas com o aproveitamento de madeiras já apreendidas e atue para que a comunidade seja beneficiada com energia elétrica nas aldeias.

Além disso, segundo o MPF, a Funai deve também promover auditorias internas e fazer levantamento dos valores que foram destinados em prol do povo Cinta Larga, além de fazer gestão junto ao Ministério da Justiça para lotar ao menos um procurador federal da Funai para atuar, exclusivamente, junto à comunidade indígena. O MPF recomenda, ainda, que a Funai determine o levantamento das dívidas do povo Cinta Larga, distinguindo quais são regulares e quais são extorsivas, além de precisar o valor exato de cada.

O procurador da República Reginaldo Trindade afirma na recomendação que a desenfreada exploração de recursos minerais na terra Cinta Larga e o descaso com que a problemática tem sido tratada pela Funai têm causado vários problemas aos índios. "O vácuo deixado pela ineficiência da atuação do órgão indigenista tem sido preenchido por pessoas interessadas em lucrar às expensas da miséria de todo o grupo indígena. O descompromisso do Estado Brasileiro com a causa do povo Cinta Larga tem servido, assim, para tornar os índios reféns dessas pessoas; arcando, toda a comunidade, com o ônus decorrente desse contato violento", afirma o procurador.

Dentre os problemas dos índios, a recomendação menciona a carência de assistência jurídica; alimentação; moradia; estradas para permitir o acesso às aldeias; saúde e educação de qualidade; desrespeito por parte da Polícia Federal; dívidas dos índios e das associações indígenas. "Reconhece-se que muitos problemas da comunidade indígena estão bem além da governança da fundação indigenista. No entanto, a Funai é que precisa ser a instituição agregadora e catalisadora das soluções", enfatiza Reginaldo Trindade.

Geoglifos no Acre

Em diversas partes do Brasil há marcas de presença histórica e pré-histórica dos povos indígenas, seja de pinturas rupestres em itacoatiaras, seja de terraços e canais de escoamento de água.

No alto Xingu o arqueólogo americano Mike Heckenberger descobriu fortes evidências de presença de caminhos, canais e terraços que evidenciariam a existência, a cerca de 800 a 1000 anos atrás de uma sociedade hierarquizada, em forma de cacicato, naquela região onde hoje vivem os índios Kuikuro.

No Baixo Amazonas, especialmente na Ilha de Marajó e na região de Santarém, são grandes as evidências de sociedades densamente povoadas, com terraços construidos pelo homem onde se localizariam casas, possivelmente armazéns e templos.

Eis que, no Acre, há uns gigantescos geoglifos, de formatos diferentes, estimados em mais de 1.000 anos, sobre os quais se sabe muito pouco. Quem os teria feito? Onde estão as culturas que o fizeram? Quais os seus significados? Teriam sido feitos por inspiração ou influência da região andina, ou seriam de culturas autóctones na região?


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Marcas milenares deixadas por índios no Acre podem ser vistas pela internet

Globo Amazônia, por Iberê Thenório, em São Paulo

Círculos, quadrados e octógonos gigantes feitos há pelo menos mil anos marcam o chão do Acre. Desde a década de 1970, quando foram descobertos, eles intrigam os arqueólogos, que ainda não conseguiram entender para que eram usadas essas estruturas, chamadas de geoglifos.

Foto: Governo do Acre/Divulgação

Formas geométricas desenhadas há pelo menos mil anos. (Foto: Governo do Acre/Divulgação)

Os desenhos chegam a ter 100 metros de diâmetro, e sua borda é desenhada em grandes valas, de 12 metros de largura por quatro de profundidade. Por uma ironia, só se conseguiu descobrir esses desenhos por causa do desmatamento, que “limpou” grandes áreas, deixando evidentes as formas geométricas.

Geoglifos do Acre
O que são Formas geométricas, na maior parte círculos e quadrados, desenhadas no chão.
Que tamanho têm As linhas têm cerca de 12 metros de largura e quatro de profundidade. Os desenhos chegam a ultrapassar 100 m de diâmetro.
Onde estão No Acre, entre Xapuri e Boca do Acre.
Quantos são Até hoje, já foram descobertos cerca de 200, mas estima-se que haja dez vezes mais que isso.
Que idade têm Pelo menos 1000 anos.
Para que serviam Ainda não se sabe. Cientistas imaginam que eles poderiam servir para abrigar aldeias, plantações ou centros cerimoniais


Quando o primeiro geoglifo foi descoberto, não se sabia que as valas formavam um desenho, e que havia tantos ali. Hoje, com a ajuda de aviões e imagens de satélite, já foram identificados cerca de 200. “Acho que já descobrimos em torno de 10%”, estima o cientista Alceu Ranzi, integrante da equipe que descobriu os geoglifos.

Com a chegada dos mapas virtuais, que utilizam imagens de satélite em alta resolução, os desenhos ficaram evidentes, e até os próprios cientistas puderam encontrar mais estruturas desse tipo. Veja, abaixo, alguns exemplos de como os desenhos milenares se espalham pelo chão do Acre

Segundo Ranzi, ainda se sabe pouco sobre os geoglifos. Apenas um deles teve a idade investigada cientificamente, e descobriu-se que o desenho tinha 1250 anos. “Eles podem ser aldeias, plantações, centros cerimoniais...”, conjectura o cientista.

Uma das poucas certezas dos arqueólogos é que o povo construtor dessas estruturas tinha força de trabalho e tecnologia para fazer grandes obras, além de dominar as formas geométricas. “Nos geoglifos, há figuras compostas. Quando há um quadrado dentro de um círculo, ele é equidistante das paredes. Será que o conhecimento explode em regiões diferentes do mundo? Lá na Grécia e na Amazônia?”, questiona o pesquisador.

Turismo

A maior parte dos geoglifos descobertos está espalhada por pastos e plantações particulares. Segundo Ranzi, o Ministério Público do Acre está preparando uma resolução para que os agropecuaristas ajudem a proteger os desenhos, evitando criar gado ou passar tratores por cima das valas.

Foto: Governo do Acre/Divulgação

Muitos geoglifos são cortados por estradas. (Foto: Governo do Acre/Divulgação)

Para valorizar essas estruturas e estimular o turismo cultual, Ranzi sugere que sejam construídas algumas torres de observação na beira das estradas, onde as pessos pudessem subir e ver os desenhos de cima. “Há vários geoglifos que estão na beira do asfalto. Alguns são cortados bem no meio por estradas”, conta

terça-feira, 9 de junho de 2009

Quantos indigenas estão presos no Brasil?

Para quem acha que a proposta de um novo estatuto do índio colocará o índio em pé de igualdade com os não-indios, ao imputar o índio como responsavel por seus atos, veja a matéria abaixo sobre o número de índios nas cadeias de Mato Grosso do Sul!

Nada menos que 148 índios estão encarcerados em Mato Grosso do Sul, o estado campeão nessa modalidade brasileira, seguido por Roraima e Santa Catarina. Efetivamente, são os três estados com mais problemas em relação aos povos indígenas brasileiros.

As razões de tantas prisões são as mais diversas, desde assassinatos até pequenos delitos, simples brigas ou bebedeiras. Para muitas pessoas, a escassez de terras para plantar e viver seu modo tradicional é a razão principal da tensão que sofrem os Guarani e os consequentes extravasamentos que resultam em delitos e crimes.

A matéria trata também do preconceito que as elites daquele estado parecem ter contra os indígenas. Segundo o CIMI, esse preconceito está presente inclusive no Judiciário local, dado que os postos mais altos do Judiciário são preenchidos por filhos da elite.

Enfim, os índios são imputáveis no Brasil, estão presos por motivos os mais diversos. Não se precisa fazer um novo estatuto para facilitar mais ainda a repressão.

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Mato Grosso do Sul é o estado com maior número de indígenas encarcerados

Daniel Mello
Repórter da Agência Brasil


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São Paulo - Em abril deste ano, os presídios de Mato Grosso do Sul abrigavam 148 indígenas, segundo levantamento da Agência Estadual de Administração do Sistema Penitenciário (Agepen).

Relatório estatístico do Ministério da Justiça aponta que, em junho de 2008, o estado mantinha 134 índios detidos. O número colocou Mato Grosso do Sul na posição de estado com maior número de indígenas encarcerados. Santa Catarina e Roraima, os dois segundos colocados, tinham à época 45 detentos índios cada.

O registro de abril é cerca de 48% maior do que o dos 101 detentos contabilizados em dezembro do ano passado e mais do que o dobro dos 71 que estavam nas cadeias e penitenciárias do estado em junho de 2006, dois meses depois da prisão do líder Guarani Kaiowá Carlito de Oliveira. O cacique é acusado de ser o mandante da morte de dois policiais civis em um confronto em Dourados (MS), no local reivindicado como Terra Indígena Passo Piraju.

O assessor jurídico do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Rogério Batalha, rejeita a acusação de assassinato e afirma que “o que houve foi uma defesa coletiva da comunidade agredida”. Os indígenas envolvidos alegam que foram ameaçados pelos policiais.

O caso de Passo Piraju é relatado por Batalha como um fato que acirrou as tensões entre índios e não índios no estado. Segundo ele, a repercussão dos acontecimentos na região fez com que os índios passassem a ser vistos como “pessoas agressivas e violentas”.

Em fevereiro deste ano, Carlito de Oliveira foi preso novamente, com mais quatro pessoas, por receptação de objetos furtados. Ele aguardava o julgamento final do crime em prisão domiciliar na aldeia de Passo Piraju.

Batalha qualifica a segunda acusação contra o cacique como “absurda”, aludindo ao baixo valor dos objetos (copos, cobertores, um armário, um botijão de gás, entre outros itens comuns). Os índios negam a acusação e afirmam que os objetos foram comprados para uso próprio.

Para o presidente da Comissão Especial de Assuntos Indígenas da Ordem dos Advogados Brasil (OAB) de Mato Grosso do Sul, Wilson Matos, o caso de Oliveira é “emblemático” em relação à criminalização dos índios.

O representante da OAB acredita que Oliveira e muitos índios de Mato Grosso do Sul sofrem perseguição das autoridades policiais e do Judiciário, o que justificaria, em parte, o elevado número de indígenas presos no estado. “Eles [os contrários ao processo de demarcação no estado] acham que o índio encarcerado não vai reivindicar as suas terras”, afirmou.

Na avaliação do procurador Marco Antônio Delfino, há uma “externalização do preconceito da sociedade sul-matogrossense”, principalmente em relação às penas, mais duras quando os réus são índios. “Até que ponto há isenção para o julgamento dessas pessoas [índios] na Justiça estadual?”, questiona o procurador.

Wilson Matos destacou o fato de grande parte dos promotores e juízes do estado pertencer a famílias de produtores rurais, contrários ao processo de demarcação de terras indígenas no estado. “Os juízes e os promotores são filhos das oligarquias, defendem a terra e os fazendeiros”, afirmou.

A federalização dos casos judiciais envolvendo indígenas seria uma forma de amenizar o problema, de acordo com o procurador Delfino. Ele citou como exemplo o julgamento dos acusados de assassinar, em janeiro de 2003, o cacique Guarani Kaiowá, Marcos Veron. Em fevereiro deste ano, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região, atendeu ao pedido do Ministério Público Federal (MPF) e determinou que o julgamento no Tribunal do Júri ocorra em São Paulo.

Na ocasião, o MPF afirmou que a mudança no local do julgamento era necessária para garantir a imparcialidade dos jurados e evitar que a decisão sofra influência social e econômica dos supostos envolvidos no crime. Segundo o MPF, duas testemunhas teriam mudado seus depoimentos após serem contratadas para trabalhar em uma das propriedades do dono da fazenda onde ocorreu o conflito.

No pedido pela mudança de local do júri, o MPF também mencionou as manifestações do juiz estadual que preside o Tribunal do Júri da comarca de Dourados, Celso Antônio Schuch Santos. Em um julgamento presidido por ele, o magistrado teria se manifestado oralmente contra os indígenas e contra o procurador responsável pelo caso.

Foi também anexado ao pedido um laudo antropológico confirmando a existência de preconceito contra os indígenas por parte da população sul-mato-grossense, de políticos locais e de magistrados.

No entanto, o procurador Delfino ressaltou que a violência dentro das comunidades é muito forte, por isso, nem todas as prisões de índios podem ser atribuídas à criminalização. Segundo ele, essa violência se deve em grande parte à “situação de confinamento” que os indígenas vivem nas reservas e nos acampamentos.

“A responsabilidade é do governo federal que deixou os índios abandonados à própria sorte”, disse Delfino, ao se referir ao grande número de índios concentrados em reservas sem qualquer tipo de segurança.

Em entrevista à Agência Brasil, a juíza da 1ª Vara Criminal de Dourados, Dileta Terezinha Souza Thomaz, negou que haja perseguição a indígenas em Mato Grosso do Sul por parte da Justiça Estadual e da polícia do estado.

segunda-feira, 8 de junho de 2009

Quantas mortes no Peru?


É impressionante a desatenção da imprensa brasileira sobre o conflito que estorou no Peru entre tropas militares e os índios amazônidas que estão embarrerando as estradas e dutos petrolíferos. Os índios protestam contra uma série de decretos-leis emitidos pelo presidente Alan Garcia que abre a Amazônia para empresas petrolíferas. Os índios não foram consultados e sentem que esses decretos podem facilitar a tomada da Amazônia por essas empresas. Também sentem que estão perdendo a condição de preservar suas terras e garantir sua segurança.

Até agora morreram pelos menos 23 militares e um número desconhecido de indígenas, entre 9 e mais de 30. Talvez 60 mortes tenham ocorrido nos confrontos. E nada disso na imprensa. Mundo afora também é pouquíssima a repercussão. Por que será?

É surpreendente o número de militares mortos. Parece que uma parte deles havia sido detida pelos indígenas no início dos confrontos e, ao tentar resgatá-los, terminaram sendo mortos. Os índios alegam que não tinham armas de fogo e que os militares morreram pelo fogo cruzado de seus próprios companheiros. Difícil acreditar nisso.

No Peru, a tensão abre novas preocupações. Flutua sobre a nação o espectro do Sendero Luminoso. A oposição mais ferrenha culpa o morticínio ao governo Garcia. Os indígenas vinham armando protestos desde abril, quando fracassaram as negociações entre suas organizações representativas e o primeiro-ministro. O governo Garcia, aparentemente, não está nem aí para o quê os índios pensam. Quer porque quer explorar a Amazônia, cujas riquezas minerais e madeireiras considera patrimônio de todo o Peru. Não só dos índios. É o principal discurso governamental.

Desde abril os índios passaram a fechar estradas, passagens de barcos pelos rios e a tomar sedes de empresas de petróleo. O governo resolveu reagir e aí deu-se o conflito nesta sexta-feira p.p.

A organização indígena pareceu a princípio bem estruturada. Eram mais de 1.000 índios guerreiros em vários pontos na região norte do Peru, descendo para a Amazônia, nas províncias de Bagua e Utcubamba. Suas lideranças estão em Lima. O líder da Aidesep, uma das três principais organizações indígenas peruanas, Alberto Pizango, está foragido, com mandato de prisão por incitamento à violência.

Não há perspectiva de fim dos conflitos. Pode haver alguma parada, recuo estratégico, mas os indígenas amazônidas voltarão a reagir.

O grande problema do Peru é que não tem instituições de intermediação com os povos indígenas da Amazônia. Os índios dos Andes, vivendo em comunidades e vilarejos já conectados e integrados ao regime "colonialista" peruano, agem por meio de partidos políticos. Ou se rebelam em partes, como no caso do Sendero Luminoso. Já os amazônidas só recentemente é que iniciaram suas atividades políticos de envergadura maior. Assim, não têm eles mesmos como abrir negociações sérias com o governo.

A Amazônia Peruana está ao deus-dará.

sábado, 6 de junho de 2009

Confronto na Amazônia Peruana: pelo menos 33 mortos


Um grave conflito de proporções ainda desconhecidas se deu ontem na região amazônica do Peru. Segundo informações da Reuters e outros jornais, pelo menos 24 índios e 9 policiais teriam morrido por ferimento de balas. Outros 50 estariam em hospitais regionais.

O confronto vinha se desenhando há alguns semanas. Os índios amazõnidas, em uníssono, vinham protestando contra alguns decretos do presidente Alan Garcia que abriam a exploração de petróleo com amplas vantagens para as empresas.

Os índios, liderados pela organização Aidesep, tinham já fechado algumas estradas e invadido alguns canteiros de obras e instalações petrolíferas.

A negociação, levada pelo primeiro-ministro, andava morna, sem resultados.

O presidente Garcia resolveu abrir as estradas e enviou tropas para isso. Na manhã de ontem um destacamento policial foi atacado de surpresa por um grupo de 1.000 índios, resultando na morte de 5 policiais e 4 indígenas. Em seguida vieram reforços e as escaramuças penderam favoravelmente para o lado dos policiais.

Mais notícias virão nos próximos dias. O que sobra é um impasse muito grave. Os índios não abrem mão de sua participação no desenvolvimento econômico de suas regiões. São contra as empresas petrolíferas e não admitem a imposição. Já o governo do Peru está acostumado à repressão de índios sem tréguas.

A BBC de Londres colocou esse pequeno video no seu site.

4.000 pessoas protestam em Ilhéus contra delimitação de terra Tupinambá


A publicação do relatório de identificação da terra indígena dos índios Tupinambá levantou um protesto inesperado na região de Ilhéus, Una e Buerarema, no sul da Bahia.

Segundo a matéria abaixo, do jornal eletrônico A Região, que abrange notíciasa de diversas cidades, quatro mil pessoas foram às ruas para protestar contra esse relatório.

É muita gente. Se forem todos atingidos, a situação na região vai esquentar.

O relatório abrange uma área de 47.370 hectares, inclusive partes da cidade de Olivença, fazendas grandes e sítios pequenos. Deve estar bem argumentado para sustentar a barragem de protestos que virão por aí.

Essa região foi palco de uma intensa disputa na década de 1920, quando se deu uma verdadeira rebelião de índios contra os cacaueiros e boiadeiros que haviam invadido suas terras. Muitos índios da região terminaram se mudando para a Terra Indígena Caramuru-Paraguaçu, de onde também foram desalojados a partir de um ataque planejado da Força Pública da Bahia, em 1938, sob o pretexto de que estava sendo armada uma guerrilha comunista.

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4 mil protestam contra relatório da Funai

Cerca de quatro mil pequenos agricultores, trabalhadores rurais, fazendeiros, comerciantes e políticos de Buerarema, Ilhéus e Una bloquearam, na manhã desta sexta, a BR-101 por cerca de duas horas.

Mesmo debaixo de chuva, eles protestaram contra um relatório da Funai que indica os índios tupinambás como donos de 47.370 hectares de terra nos três municípios. O bloqueio da rodovia, em Buerarema, ocorreu entre às dez da manhã e meio dia.

Os participantes dizem que não vão aceitar a demarcação de terra. Eles já organizam novos movimentos para os próximos 15 dias. O objetivo é chamar a atenção dos governos estadual e federal para a demarcação, que consideram "uma fraude".

Os coordenadores do protesto denunciam que 16 fazendas em Ilhéus, Buerarema e Una já foram invadidas por supostos índios Tupinambás. Na primeira, um homem foi morto a facão e o suspeito é o irmão do cacique "Babau".

Em uma das invasões, os ocupantes teriam expulsado o proprietário da fazenda, destruído as plantações e comemorado a ocupação fazendo churrascos com os animais da propriedade.

A Funai deu prazo de 90 dias para a defesa dos produtores e moradores da área que quer transformar em indígena. Elas somam 26% do território de Ilhéus, 5% de Una e 5% de Buerarema.

Leia a cobertura completa na edição deste final de semana.

sexta-feira, 5 de junho de 2009

Dia Internacional do Meio Ambiente


Pela primeira vez em muitos anos o Dia Internacional do Meio Ambiente está sendo comemorado com um travo na boca. Nem mais plantar uma árvore faz parte do ritual dos colégios. Até o ministro Minc anda abalado, com cada vez menos condições políticas de se manter no cargo. Além dos fazendeiros, os principais jornais do país estão com matérias negativas ao ministro e à política ambiental do governo. As Ongs ambientalistas não se contêm mais em críticas e soltaram sua verve depreciativa por todos os lados.

A ex-ministra Marina Silva está muito desgostosa com tudo que está acontecendo na área de meio ambiente. Em particular ela se rebelou contra a proposta do governo de regulamentar a propriedade de terras de posseiros de todas as alas na Amazônia. Segundo Marina Silva, nesse bojo entrarão os grileiros que tomaram terras à força, expulsando posseiros e derrubando a floresta. Ela acha que eles é que serão beneficiados ao fim desse processo de regulamentação. Por isso vai pedir em carta aberta ao presidente Lula para vetar alguns artigos dessa futura lei, que acaba de passar no Senado, depois de passar na Câmara.

É de lembrar que foi o ministro Mangabeira Unger quem instigou, há um ano, a discussão sobre a regulamentação de terras na Amazônia, dada a anarquia em que se situa, e sem cuja regulamentação não se pode implantar política ambiental ou desenolvimentista na região. Sua argumentação.

Igualmente preocupantes são os vaticínios de que a Terra vai passar por mudanças terríveis nos próximos decênios e que a culpa é do homem e a destruição ambiental que vem perpetrando. Poucos cientistas ainda põem em dúvida a influência humana sobre as mudanças climáticas que parecem estar em surgimento.

Assim, uma das poucas notícias boas é a reação da sociedade civil brasileira. Aí estão Lula e Cristiane Torloni mostrando um abaixo-assinado com mais de 1 milhão de assinaturas a favor da defesa da Amazônia. Cristiane está linda e Lula parece muito compenetrado. Assim vai.

terça-feira, 2 de junho de 2009

Davi Kopenawa, líder Yanomami, é homenageado na Espanha


Davi Kopenawa Yanomami, um dos maiores líderes indígenas do Brasil, foi homenageado hoje, em Madrid, pelo comitê Bartolomeu de las Casas, da Casa de las Americas, que premia figuras excepcionais na defesa dos direitos indígenas da América Latina.

Davi é reconhecido no Brasil e no mundo pela luta travada na década de 1980 que resultou na demarcação do grande território Yanomami, no governo do presidente Collor de Mello. E também por sua visão filosófica e religiosa sobre o meio ambiente e o papel das culturas indígenas na sua defesa.
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Líder ianomâmi recebe homenagem na Espanha

Da EFE, Espanha


Madri, 2 jun (EFE).- O líder ianomâmi Davi Kopenawa recebeu hoje uma homenagem em Madri por sua defesa dos direitos de seu povo e de outras terras indígenas no Brasil, em um ato no qual declarou que nasceu "para lutar" e que continuará o fazendo.

Chamado pela imprensa local de o "Dalai Lama da Amazônia", Kopenawa recebeu hoje uma menção honrosa do júri do Prêmio Bartolomé de las Casas, um prêmio convocado pela Casa América de Madri e pela Secretaria de Estado de Cooperação Internacional do Ministério de Assuntos Exteriores espanhol.

Este prêmio reconhece o trabalho a favor do entendimento com os povos indígenas e da proteção de seus direitos e valores.

Em entrevista coletiva em Casa América de Madri, o líder ianomâmi se mostrou "muito contente" e agradecido pelo prêmio.

Kopenawa é tido como um dos principais responsáveis por ter salvado o povo ianomâmi de sua quase extinção ao liderar uma campanha junto com a ONG Survival International e a Comissão Pró-Yanomami (CCPY) para conseguir a demarcação de suas terras, o que ocorreu em 1992.

Na década de 80, as áreas dos ianomâmis, espalhadas entre os estados de Amazonas e Roraima e a Venezuela, sofreram com a presença de milhares de garimpeiros em busca de ouro. Em apenas sete anos, 20% dos indígenas da tribo morreram.

"Eu nasci para lutar, para defender a meu povo", disse Kopenawa.

Apesar de as terras ianomâmis já terem sido demarcadas e reconhecidas oficialmente no Brasil, este povo indígena continua tendo "muitos problemas", segundo Kopenawa.

Para o líder ianomâmi, o Governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva "deve olhar mais" para os povos indígenas.

Os ianomâmis enfrentam graves problemas de saúde, muitas vezes relacionados a doenças trazidas pelo homem branco, como a tuberculose.

Este povo indígena é um dos que menos tiveram contato com outras civilizações dentre os existentes no Brasil e ocupa uma das maiores reservas do país, com cerca de 9,6 milhões de hectares.

"Não somos políticos. Nossa política é não destruir a terra. Que nos deixem viver e proteger a natureza, que nos dá saúde e alegria", concluiu Kopenawa.

Índios propõem diretrizes para novo programa de saúde

O Grupo de Trabalho do tema Saúde Indígena, criado pelo Ministério da Saúde para orientá-lo sobre a substituição da Funasa por uma secretaria especializada em saúde indígena, reuniu-se em Brasília e produziu uma singela emas consistente proposta sobre essa questão. Vale a pena conhecê-la.

Proposta indígena sobre sistema de saúde dos Povos Indígenas

Nós representantes indígenas no GT/Saúde Indígenas e participantes do seminário nacional de saúde indígena que vivemos em uma extensão de 1.100.490,8 KM2 em 630 terras da União - as denominadas terras indígenas, com população de 734.13 pertencentes aos 229; falando 170 idiomas no país; 19 famílias lingüísticas e ainda uma estimativa de 66 Povos Indígenas que vivem em forma natural.

Somos conscientes dos “investimentos destinados” aos Povos Indígenas entre esses o tema de saúde, que apesar de todos os esforços continua sendo um verdadeiro caos, embora, os dados e números produzidos pelos órgãos queiram demonstrar o contrario.

Como é de conhecimento nós os povos indígenas temos apresentado claramente por diversas ocasiões as seguintes questões:

1. O tema indígena é e deve continuar sendo de âmbito Federal;

2. Necessidade imediata de despolitizar e despartidarizar o tema indígena;

3. Os povos indígenas devem ser parte de todas as decisões, execução, planejamento... em todos os temas que nos envolvem;

4. Ter as organizações como referencia e estabelecer pontos focais ou responsáveis por cada área.

NA SAÚDE:

1. Fortalecer os DSEIs com autonomia administrativa e financeira, porem com composição indígena;

2. Estabelecer um sistema de saúde indígena de qualidade e de estado;

3. Criar a Secretaria de atenção e assistência de saúde dos povos indígenas e deverá ser composta por indígena;

4. Estabelecer uma comissão indígena permanente para propor o modelo, administração, financiamento, estrutura, assistência e outras demandas necessárias para a atenção de saúde aos povos indígenas;

5. Financiamento direto pelo MS ou seus órgão respectivos;

6. Eliminar a terceirização de repasse dos recursos indígenas;

7. Fortalecer a participação dos povos indígenas como instância de controle social;

Brasília, DF, 22 de maio de 2009.

Assinam,

Sebastião Manchinery - Representante indígena/Manxinerine Ywptowaka - Norte

Pablo Kamaiurá - Representante indígena - Centro Oeste/Condsi/Xingu

Irenildo Cassiano Gemes - Condsi/Potiguara

Crizando Xavante – Representante indígena/ACIX - Centro Oeste

Lazaro Calixto Xerente – Condsi/ Tocantins

Edimilson Terena – Representante indígenas/Condsi/Cuiabá - Centros Oeste

Edmundo Dzuaiwi Omore – Representante - COIAB

Robson Cassiano Soares – Represente indígena – Nordeste

Clovis Ambrosio – CONDIS - RR

segunda-feira, 1 de junho de 2009

O Globo diz que Blog desanca presidente da Funai


O jornal O Globo, de ontem, domingo, deu na coluna de Ilimar Franco, escrita com a colaboração de Evandro Éboli, dois grandes jornalistas, a Nota abaixo, que contem um certo tom de crítica, tanto por sugerir que o Blog e eu nos dedicamos a desancar o presidente atual da Funai e a política indigenista do governo Lula, quanto por ironizar que eu finjo que não tenho nada a ver com a coisa, ou como se eu não fosse parte da coisa criticada, ou ainda como se estivesse sendo infiel ao governo do qual participei.

Eis a Nota dos jornalistas.


O Globo, 31/05/09
Prato que comeu (Panorama Político)

Depois de quase quatro anos na presidência da FUNAI, o antropólogo Mércio Pereira criou um blog. Nesse espaço, tem se dedicado a desancar seu sucessor, Márcio Meira, e a política indigenista do governo.

Como se nada fosse com ele.


Bem, tenho alguns comentários a fazer sobre isso.

1. Em primeiro lugar, chamo a atenção para o leitor desse Blog de que sempre assumi que tenho, sim, tudo a ver com a política indigenista brasileira e me preocupo sobremaneira com o que acontece com ela. Assumo minha gestão na Funai com todo fervor e por isso mesmo é que me desconcerta ver o que está acontecendo lá nesses últimos tempos. Depois de quase quatro anos em que conseguimos realizar uma administração voltada para os interesses dos povos indígenas, em que a relação com os povos indígenas ficou equilibrada, onde foi realizada a Primeira Conferência Nacional dos Povos Indígenas, quando foram homologadas 67 terras indígenas totalizando 11.000.000 hectares, inclusive a Terra Indígena Raposa Serra do Sol, quando se abriram espaços de atuação a grande número de jovens indígenas em diversos setores importantes da Funai, sem intermediação de Ongs -- não há como não se preocupar com o que está acontecendo na atual gestão da Funai.

E discorrerei aqui sobre as falhas que tenho criticado.

Porém, não sem antes dizer que a crítica à atual gestão da Funai não compreende nem 10% das matérias que coloco, discuto ou comento neste Blog. Basta ver ao lado a amplitude de discussões deste Blog. O Blog não personaliza o presidente da Funai e sim sua gestão, que inclui alguns dos seus principais colaboradores. E não sem antes lembrar aos leitores desse Blog e do jornal O Globo que outras pessoas que tiveram atuação político-administrativa no governo Lula também fazem suas ressalvas e críticas a aspectos da política lulista, mesmo o apoiando na maioria de suas políticas, como eu o faço. Penso precisamente na ex~ministra Marina Silva (bem como em alguns de seus colaboradores), que passou seis anos como ministra, defendendo uma determinada política, é quadro petista, e que, de fora, como eu, critica com muita convicção aquilo que vê errado na gestão do seu sucessor, o ministro Carlos Minc, bem como critica veementemente o rumo que a política ambientalista vem tomando nos últimos tempos.

Podemos questionar: com razão ou sem razão? Não sei, há controvérsias. Mas o mesmo pode ser dito deste Blog. Pode ser que não tenha razão em alguns aspectos, mas para isso o Blog está aberto a comentários e criticas, como têm feito alguns participantes.

2. Portanto, critico a atual gestão da Funai pelos seguintes motivos:

A. Escanteou desde o início os principais indigenistas da administração, exceto um ou outro, e, em seus lugares, contratou um quantidade excessiva de quadros políticos sem experiência com povos indígenas e cujos interesses maiores são pessoais. A Funai se transformou, pela primeira vez, em cabide de emprego.

B. Demitiu quadros indígenas que trabalhavam com afinco e competência na Funai, tanto na sede quanto nas administrações regionais, pelos motivos mais mesquinhos. Deixou o órgão sem a capacidade de treinar pessoal indígena para ir aos poucos assumindo as ações indigenistas essenciais e um dia dirigi-lo em sua integridade.

B. Escancarou a Funai para a atuação direta de diversas Ongs, algumas com parentes e aderentes, nos cargos mais estratégicos do órgão. As mesmas Ongs que antes criticavam o papel indigenista da Funai, considerando-o caduco, hoje dão as cartas no órgão indigenista e o estão levando para situações extremas de impasses indigenistas e ineficiência de atuação. Há, inclusive, suspeita de favorecimento de contratos com Ongs que têm ex-diretores e colaboradores trabalhando na Funai.

C. Elevou o tom messiânico e salvacionista do órgão ao ponto em que, por reação explícita, o tradicional segmento anti-indigenista brasileiro passou a agir com destemor nos diversos campos políticos, seja o Congresso Nacional, os chamados entes estaduais e municipais e a opinião pública. Até um distinto filósofo, a quem extendo minha crítica com frequência, passou a se manifestar com críticas acerbas à Funai, aos povos indígenas e à política indigenista brasileira.

D. Esse tom messiânico fez até o Supremo Tribunal Federal, ao votar sobre o caso Raposa Serra do Sol, exarar uma série de ressalvas ao voto confirmatório da homologação daquela terra indígena, ressalvas estas que, ao serem aplicadas, invibializarão as necessidades de demarcação de terras de diversos povos indígenas ainda carentes de justiça e de terras.

E. Como resultado mais evidente, paralizou a demarcação de terras indígenas, mesmo aquelas que haviam sido objeto de portaria declaratória do Ministério da Justiça.

F. Agregou acriticamente, sem respaldo dos quadros mais consequentes do órgão, a Funai à pauta tradicional das Ongs e do CIMI, no que diz respeito à mudança do Estatuto do Índio, num momento extremamente negativo aos povos indígenas.

G. Ensejou o movimento indígena, controlado por algumas associações indígenas, a dar respaldo a essa intenção de mudanças, propalando uma proposta de novo estatuto do índio como se fosse a tábua de salvação dos povos indígenas e a alavanca que os propelaria para um novo patamar de relacionamento com a sociedade brasileira. Esqueceu, com isso, a participação de inúmeras lideranças de raiz que não querem que as mudanças propostas sejam efetivadas no Congresso Nacional. Especificamente falo da proposta de abolir a tutela do Estado aos povos indígenas.

H. Por todas essas ações, realizadas por atos administrativos intempestivos, a situação indígena brasileira encontra-se num impasse tremendo. Até o Conselho Indigenista Missionário (CIMI), que apoia a atual gestão da Funai, em seus variados editorias, reconhece o nível que chegou o anti-indigenismo brasileiro, a pressão exercida por políticos, jornais, governadores e outros sobre a questão indígena brasileira da atualidade.

I. Estar atento às ações da Funai tem sido minha preocupação como antropólogo há muitos anos. Não é de hoje, nem é sobre a atual gestão da Funai, que desenvolvo meu pensamento a favor dos índios brasileiros. Escrevi um livro sobre a política indigenista brasileira que abrange desde a época colonial até a Constituição de 1988 (Os índios e o Brasil, Vozes, com segunda edição em 1991), o qual teve duas edições e está traduzido para o inglês. Meu livro O índio na História (Vozes 2002) analisa a questão indígena brasileira em relação ao povo Tenetehara e trata da aplicação dessa política ao longo de 400 anos e das consequências para aquele povo indígena. Recentemente publiquei o artigo Por que sou rondoniano, na revista Estudos Avançados em que demonstro como o Marechal Rondon deu consciência indigenista ao Brasil e como criou as bases do nosso indigenismo, sem o qual estaríamos no nível atrasado que estão outros países, inclusive favorecendo as atitudes positivas a favor dos índios, como bem demonstra a demarcação de 13% do território brasileiro para os povos indígenas. Escrevi este artigo para tentar estabelecer a verdade sobre o que constitui o indigenismo e a relação entre o Brasil e os povos indígenas, pois que, para uma grande maioria das pessoas que trabalha para Ongs indigenistas, por falta de visão histórica, Rondon é visto como um homem que prejudicou mais do que ajudou aos povos indígenas brasileiros.

J. Continuarei em minha tarefa de avaliar criticamente aquilo que se faz na Funai, na política indigenista brasileira, nas políticas indigenistas de outros países, e no panorama internacional dos povos indígenas. Este Blog dedica mais da metade de seu espaço a essa tarefa. Futuramente, talvez, os demais assuntos que o concernem, como a Antropologia e a Cultura, absorvam mais a nossa atenção. Por enquanto está indo muito bem, com boa participação de leitores de mais de 400 cidades brasileiras, há dois anos e dois meses, da maneira como está.

Obrigado a todos pela atenção. Meus agradecimentos extensivos também a Ilimar Franco, Evandro Éboli e ao jornal O GLOBO pela oportunidade que me levou a fazer essa declaração explicativa.
 
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